UMA MÃO CHEIA DE PROBLEMAS
Em 1750, mais de 200 anos após o Tratado de Tordesilhas, é assinado o «Tratado de Madrid» ou «Tratado dos Limites» como também ficou conhecido, que, mais uma vez, procurou resolver pela via diplomática os problemas de fronteiras entre os territórios pertencentes à Coroa portuguesa e aos domínios espanhóis, constituindo uma nova etapa na trajectória das missões jesuítas.
A Colónia de Sacramento passou de novo para a posse de Espanha em troca dos Sete Povos das Missões, da margem esquerda do rio Uruguai. Os índios deveriam abandonar as suas terras, retirando-se do actual Rio Grande do Sul para a margem ocidental do rio Uruguai, hoje território argentino e paraguaio. É decretado o gradual desmantelamento das missões.
Os guaranis não acolheram bem a decisão da entrega das terras e das aldeias edificadas ao longo de décadas. O abandono das terras representava a ruína total dos povoados e a destruição de toda as actividades económicas, sociais, políticas e religiosas vividas naqueles espaços. Os guaranis resistiram às determinações régias e o contingente militarizado das reduções passou a representar uma ameaça aos intentos das potências ibéricas que decidiram invadir as missões. Para a Europa, era inconcebível que os indígenas não fossem súbditos fiéis e obedientes, comportando-se de acordo com as monarquias ibéricas. Em Maio de 1754, dois exércitos vão contra os redutos: um português vindo de Norte por mar; outro espanhol vindo do Sul pelo rio Uruguai. A 12 de Fevereiro de 1761, optou-se pela substituição do «Tratado de Madrid» pelo «Tratado do Prado», que estatuía a entrega dos Sete Povos das Missões e da Colónia do Sacramento aos antigos donos. Novos conflitos eclodiram e a paz só viria a ser restabelecida em 1777 com o «Tratado de Santo Ildefonso». Durante todo este percurso, a indefinição de fronteiras na região platina foi uma constante.
O «Tratado de Madrid» representa o início de uma série de transformações que viriam a comprometer as relações entre a Igreja e o Estado, com incidência na América do Sul. A guerra guaranítica e a ocupação dos Sete Povos pelos Exércitos ibéricos acabaram por provocar o declínio demográfico, a dispersão dos índios e por pôr fim à comunidade de jesuítas e guaranis. O período que decorreu entre 1753 e 1769 caracterizara-se por uma significativa dispersão populacional. Neste processo, não podem ser só considerados os factores externos mas também factores de ordem interna, como a rigorosa disciplina imposta na sequência da ocidentalização e as contendas entre chefes locais desejosos de manter a supremacia na região.
Vencidos, destroçados e espoliados das terras onde viviam, os índios abandonaram as aldeias – uns regressaram aos matos, outros foram para junto das cidades dos colonos, outros, ainda, acompanharam os luso-brasileiros, povoando as primeiras vilas do Rio Grande do Sul.
Novos aldeamentos indígenas surgiram com uma administração secular, baseada em modelos de organização social e política, ajustados a outros princípios.
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E a pergunta que resta colocar é: e que danos foram provocados aos portugueses por ali abandonados?
Henrique Salles da Fonseca
BIBLIOGRAFIA:
HISTÓRIA DA COMPANHIA DE JESUS EM PORTUGAL, Maria de Deus Beites Manso, EDIÇÕES PARSIFAL, 1ª edição, Setembro de 2016, pág. 163 e seg.