UM MAPA NOVO E UM EQUÍVOCO JÁ ANTIGO
Tinha iniciado há dias um artigo sobre este tema mas ao ler hoje no DN as declarações da Sra. Ministra Assunção Cristas resolvi alterar para a forma de carta aberta a ela dirigida.
Para começar quero recordar uma comunicação que apresentei na Academia de Marinha em 1984 que tinha por título “O Mar no passado e no futuro de Portugal” e onde afirmava que o nosso País tinha conseguido ganhar a sua independência e o papel essencial de ponta de lança da expansão europeia no século XV, porque os Reis portugueses ao longo das primeiras dinastias tinham entendido a importância de termos uma Marinha de excelência.
E então com a possibilidade de aumentar o nosso território marítimo voltava a colocar-se esta importância, mas seria essencial imediatamente recuperar a Marinha que após a revolução de 74 tinha sido parcialmente destruída, pois caso isto não fosse realizado mais tarde o novo mapa seria mais uma vez um mapa cor-de-rosa, como é sabido de muito triste memória.
Ora aconteceu que enquanto a missão encarregada do aumento do território fez um excelente trabalho e o resultado está bem à vista com o mapa agora entregue à nossa juventude, aqueles a quem competia reestruturar a nossa Marinha nada fizeram, entendendo-se a Marinha como o conjunto da Armada, em tempos chamada Marinha de Guerra, da Marinha Mercante ou de Comércio, da Marinha de Pesca e da Marinha de Recreio.
Note-se que desde a primeira dinastia Portugal desenvolveu aquilo que Michael Porter veio pretender ensinar-nos que é o “cluster” do Mar, que nós tivemos efectivamente até Julho de 74 quando foi decretado o seu fim, e desde então a Marinha foi sendo progressivamente atacada. E estou à vontade para falar disto pois fui o primeiro Secretário de Estado da Marinha Mercante.
Durante o PREC houve um ataque de índole ideológico às empreses grandes que foram estatizadas e/ou destruídas e ainda hoje só se fala em PMEs como se fosse possível cumprir o que está escrito na Constituição quanto à independência nacional se não tivermos empresas nacionais de grande porte. Mas o que não destruímos estamos agora vender a capitais estrangeiros.
Em termos de Marinha Mercante estamos em posição residual e como não temos empresas para ela vocacionadas a recuperação não passa de um desejo como pouca probabilidade de sucesso tanto mais que, como também a Marinha de Recreio tem sido muito mal tratada, a nossa população foi afastada da utilização do Mar e portanto não há pressão da opinião pública.
Quanto à Marinha de Pesca desde a recusa da sua reestruturação em 1982, o que tem favorecido os intermediários e prejudicado os produtores e os consumidores, tem vindo a atrasar-se e precisa de ser recuperada em conjunto com as actividades turísticas da Marinha de Recreio ainda muito mal exploradas.
A publicação dos 39 projectos prioritários é prova bastante do enorme equívoco que é falarmos muito do Mar e nada da Marinha e como tenho dito mas não sido ouvido, Mar sem Marinha não é mais do que paisagem.
Curiosamente no Ministério a que preside a Sra. Ministra há projectos que proporcionarão alguns milhares de postos de trabalho sem investimento estatal à espera de decisão superior e que por razões desconhecidas não saem das gavetas governamentais.
Entretanto as decisões tomadas a nível europeu apontam para que sejam em Bruxelas e como não temos empresas com capacidade para a exploração de muitas das riquezas potenciais do oceano Atlântico Norte situadas no nosso território, a cor do mapa vai passar provavelmente a tons cor-de-rosa.
Lisboa, 3 de Abril de 2014