TAPAS Y CASTAÑOLAS - 2
O determinismo histórico de Marx autoproclamou-se uma falácia.
O mundo em que vivemos é quântico, não é um tabuleiro de xadrez e os modelos econométricos não passam de exercícios académicos cujas erroníssimas previsões deviam de ter pudor em sair pelas portas das Academias.
Mais vale recorrer a declarações sapientíssimas como aquela dos «prognósticos, só no fim do jogo».
Assim também o raciocínio falacioso de que qualquer pessoa – e não a+enas o Rei D. Juan Carlos - poderia ter conseguido fazer a transição da Espanha hermética e autocrática para a Espanha democrática e liberal. Trata-se (a da outra pessoa) cd uma experiência não experimentada a que é impossível conhecer os resultados. Que essa transformação era inevitável face aos condicionalismos da época. Sim! Isso ou exactamente o contrário. Em Espanha, como já o demonstraram inúmeras vezes ao longo da História, eles não hesitam muito para se ferrarem todos
a chapada.
Deixemo-nos, pois, de especulações e assentemos numa realidade indesmentível: quem fez a transição pacífica foi o Rei D. Juan Carlos e mais ninguém.
* * *
Corre por aí que o Rei D. Juan Carlos recebeu luvas do seu «irmão», o Rei da Arábia Saudita, no âmbito de um negócio de equipamento ferroviário. Aqui, sim, confesso a minha perplexidade e total incapacidade para defender o Rei emérito de Espanha. De facto, eu não sabia que a Arábia Saudita produz equipamento ferroviário e que D. Juan Carlos recebera luvas para convencer a Renfe a comprar o equipamento saudita. Também parece muito mal o Rei árabe andar por aí fora a corromper clientes. Faz-me lembrar Jacques Chirac que foi à África do Sul vender Mirages e, diz-se, distribuir algumas caixas de marrons glacés. Neste negócio também era o vendedor a corromper o comprador, o que dá para perceber como «argumento» de opção de compra. É feio, muito feio, mas percebe-se a tentação do infiel sobre o Rei cristão. O equipamento ferroviário (sobretudo o de última geração e topo de gama) de fabrico saudita é muito melhor que o homólogo alemão, inglês ou mesmo espanhol.
Afastando a ironia e regressando à seriedade, a distorção das condições normais de mercado a que vulgarmente chamamos corrupção, exerce-se do lado da oferta sobre a procura de modo a influenciar o comprador. O contrário seria um absurdo que apenas iria encarecer o produto comprado sem qualquer vantagem para quem tem a opção de compra.
Há quem refira o caso BES como exemplo, o que, novamente, é um absurdo. Efectivamente, se isso acontecia, seria o dito banco a oferecer condições bancárias excepcionais a quem procurava um local para guardar o seu dinheiro. Mais uma vez, a oferta a agir pois o inverso não faz qualquer sentido. E como, apesar dos baldados esforços dos marxistas, a Lei da Oferta e da Procura ainda não foi revogada, a das suas corruptelas também está a funcionar.
Portanto, daqui lanço uma sugestão aos que querem atacar D. Juan Carlos: arranjem outros exemplos pois com estes não atingem a honorabilidade do Pai da Democracia Espanhola.
E eu, filosoficamente republicano, não tenho envergadura para merecer mandato para a defesa de um Chefe de Estado ímpar que, afinal, é Rei.
(continua)
Agosto de 2020
Henrique Salles da Fonseca