Saga – Conjunto de narrações verdadeiras ou lendárias que ilustram a cultura ou a religião.
Sidharta Gautama, Buda, terá vivido entre 563 a.C. e 483 a.C. (80 anos) pelo que, na infância, Péricles (que viveu 66 anos de 495 a.C. a 429 a.C.), foi seu contemporâneo.
Segundo a tradição, o dente canino esquerdo do maxilar inferior de Buda começou por ser roubado da pira funerária por um dos seus seguidores e guardado durante cerca de oito séculos em Kalinga, actual Orissa, nordeste da Índia. As constantes violências dos reis circundantes no sentido de se apropriarem da relíquia, fizeram com que Guhasiva, rei de Kalinga, decidisse enviar o dente para o então recatado Sri Lanka (“a ilha do Senhor”) disso encarregando sua filha Hemamala que, sob a protecção do marido, Danta, viajou até à foz do Ganges disfarçada de peregrina com a relíquia escondida no cabelo. Essa viagem terá decorrido durante o séc. IV da nossa era.
Embarcados, atingiram a costa do Sri Lanka perto de Trincomalee, na costa leste da ilha. Ainda durante a viagem, os crentes budistas atribuíram vários milagres à relíquia a qual chegou finalmente à capital do Sri Lanka que então era em Anuradhapura, onde o rei Kirti Sri Meghavanna, que era um budista devoto, a colocou no seu próprio trono com muita veneração.
Desde que a relíquia chegou no séc. IV até aos finais do séc. X, poucas são as referências conhecidas mas é sabido que a procissão instaurada pelo rei Kirti se manteve durante esses seis séculos com grandiosidade ficando anualmente em exibição durante três meses rodeada de permanentes rituais e orações.
A relevância transcendental do dente foi de tal modo assumida que passou a ser considerado fundamental na legitimação do poder temporal a tal ponto que diversos reis acrescentaram o prefixo ‘Datha’ (Dente) aos seus nomes: Dathopatissa, Dathappabhuti, Dathamugalan, etc.
As permanentes incursões dos reis da dinastia Chola do sul da Índia fizeram com que o rei Vijayabahu I (1070-1110) mudasse a capital do Sri Lanka de Anuradhapura para Polonnaruva. Corria o séc. XI da nossa era e novamente a relíquia budista mudou de local, agora para um templo chamado Atadage e cujas ruínas são actualmente visitadas por multidões de turistas.
Conforme as crónicas Maha Vamsa[1], o rei Vijayabahu I mantinha relações de amizade com Anuruddha, rei da Birmânia, que pediu que lhe enviasse o dente para que os birmaneses o pudessem adorar. Sabiamente, o rei cingalês enviou uma réplica que passou a ser adorada na Birmânia. Aqui começa a história das réplicas do dente de Buda.
Em 1110 da nossa era, com a morte de Vijayabahu I, a situação política cingalesa degradou-se iniciando-se um período de confrontos entre vários líderes locais. A instabilidade fez com que os guardiães da relíquia temessem pela sua segurança e trataram, tão secretamente quanto possível, de a levar para local que consideraram seguro, Rohana, no sul da ilha.
Foi só em 1153, com a subida ao trono de Parakramabahu I, que a situação política voltou a acalmar e, então, o novo rei tratou de fazer o dente de Buda regressar a Polonnaruva.
Século XIII entrado e eis que a guerra regressa e a glória de Polonnaruva recomeça a decrescer com as constantes incursões de Kalinga Magha, primeiro rei de Jafanapatão (reinado 1215–1236), que é recordado pela agressividade na conquista e pelo fanatismo hindu. E mais uma vez os monges budistas se viram na necessidade de encontrar novo local para guardar a relíquia. Desta vez, o lugar escolhido foi Kotmale, a sul de Kandy, na região sul do maciço montanhoso central do Sri Lanka, porque se tratava de lugar quase inacessível e, portanto, seguro. Contudo, passados cerca de 50 anos, o rei Vijayabahu III transferiu a relíquia para um novo templo que fez construir em Beligala, a poente de Kandy. Mas o seu filho primogénito e sucessor no trono, Parakramabahu II (1236 – 1270), decidiu-se por nova localização e aí vai a relíquia em faustosa procissão até à rocha Dambadeniya, monólito imponente de acesso quase impossível por longuíssimas escadas (cerca de 1200 degraus) com perfil inapropriado ao comum dos mortais[2].
O pacífico e próspero reinado de Parakramabahu II foi, contudo, perturbado por uma invasão de javaneses oportunamente repelida e por uma grande seca. Mas o rei dedicou o seu reino à relíquia e diz a lenda que a seca cessou. E foi daqui que nasceu a crença de que o poder temporal dependia da posse da relíquia passando esta a ser o símbolo mais importante do reino merecendo mesmo uma cerimónia de entronização (abhiseka). Mas Bhuvanekabahu, irmão de Parakramabahu II e vencedor dos javaneses, edificou um santuário para o Dente Sagrado em Yapahuva, bem a norte da localização anterior, ou seja, o mais distante possível da costa leste por onde chegava o invasor javanês. E mais uma vez a relíquia mudou de localização.
Pouco depois deste reinado, o Sri Lanka foi novamente vítima de grande seca e invadida pelas tropas do rei Maravarman Kulasekaran I de Pandyan no sul da Índia que roubaram tudo aquilo a que conseguiram deitar mão, nomeadamente o Dente Sagrado. Corria o ano de 1280. Foi necessário esperar por Parakkamabahu III que foi pessoalmente à corte do seu suserano e rei indiano Kulasekaran persuadindo-o a devolver a relíquia. Isto, porque o Sri Lanka se encontrava sob a hegemonia do reino de Pandyan e assim continuaria por mais uma vintena de anos. A retoma da independência só foi conseguida durante a guerra civil que assolou o reino indiano entre 1308 e 1323 mas nessa época estava o Dente em Polonnaruva e, portanto, a recato das apetências indianas.
De acordo com Marco Pólo, Kublai Khan, então Imperador da China, enviou um mensageiro a Polonnaruva para que lhe enviassem a relíquia mas Parakkamabahu III enviou uma réplica que foi faustosamente recebida na corte chinesa. E assim se regista uma segunda réplica.
Contudo, mais uma vez foi decidido mudar a capital, desta vez para Kurunegala, a mais de 100 kms a sudoeste de Polonnaruva e lá vai o Dente Sagrado em solene procissão até novo templo para ele edificado especialmente onde, aliás, não ficou muito tempo uma vez que nos finais desse séc. XIV se regista mais uma mudança, desta feita para Gampola, a nova capital do país a sul de Kandy.
Só que a capital mudou-se para Jayawardenapura Kotte[3] e o rei Vira Bahu decidiu fazer-se acompanhar da relíquia. Foi aí que os invasores chineses a foram encontrar exigindo a sua entrega para ser adorada na China. Contudo, segundo a tradição, terá sido uma réplica (a terceira) que seguiu viagem ficando o dente verdadeiro no Sri Lanka guardado em lugar seguro.
E foram diversas as razões que fizeram com que o nomadismo da relíquia continuasse: de Ratnapura para Mulgirigala Vihara e depois para Ridivihara até que finalmente foi levada para Kandy.
E foi em Kandy que os portugueses encontraram o Dente de Buda quando em 1505 chegaram ao Sri Lanka.
Com quase dois metros de altura, D. Lourenço de Almeida, filho do vice-rei da Índia D. Francisco de Almeida, sempre dando mostras de grande bravura, era conhecido como o "diabo louro". Apesar das iniciais relações amistosas, uma das suas façanhas foi a tomada do reino de Kandy pela força assim ficando a tutelar a segurança da relíquia budista.
A administração portuguesa prolongou-se no tempo até que em 1560 o dente é roubado do templo por quem achava que o budismo impedia a implantação do cristianismo e é levado para Jaffna a fim de embarcar para Goa onde deveria ser destruído. Essa seria a forma então considerada mais pragmática de levar à destruição do budismo.
E aqui entram em cena três personagens importantes, a saber: D. Constantino de Bragança, então Vice-rei da Índia e, portanto, do Ceilão também; D. Gaspar Leão Pereira, então Arcebispo de Goa também ele com jurisdição sobre o Ceilão; Martim Afonso de Mello, comerciante, que na sua rota entre Pegu (Birmânia, hoje Myanmar) e Goa, estava de passagem por Jaffna. E nesse ano de 1561, coube-lhe trazer o recado dos príncipes de Pegu que estavam dispostos a pagar tudo o que os portugueses quisessem para entrarem na posse da relíquia.
Consta que as finanças públicas do Estado Português da Índia não estavam naquela época em grande euforia e o mandato de D. Constantino de Bragança seria precisamente o de tentar repor alguma solidez nessa matéria mesmo que isso significasse um vice-reinado vitalício.
O que é claramente sabido é que a relíquia foi enviada para Goa e que o Arcebispo a submeteu a julgamento pela Inquisição. A sentença foi a da destruição em almofariz seguida de lançamento do pó em água corrente.
Mas também se diz que D. Constantino de Bragança, não se conformando com a situação financeira do seu Estado, terá conseguido por meios mais ou menos drásticos entrar na posse do dente que era então tido como o verdadeiro, de Buda, substituindo-o por réplica que, essa sim, foi publicamente destruída em almofariz por ordem de D. Gaspar e o pó resultante lançado às águas do Mandovi.
Terá sido em grande segredo que a relíquia regressou a Kandy (e não a Pegu) com os crentes budistas a afirmarem que miraculosamente o dente sagrado se materializou no seu templo depois de ter sido destruído em Goa.
Também não está totalmente explicada a razão pela qual D. Constantino de Bragança regressou ao reino nesse mesmo ano de 1561 em vez de prolongar vitaliciamente a sua comissão de serviço. Como ficaram, entretanto, as finanças públicas de Goa? Terá seguido mais alguma réplica para Pegu?
Lisboa, Janeiro de 2016
Henrique Salles da Fonseca
(junto da piscina dos monges em Polonnaruva, Sri Lanka)
BIBLIOGRAFIA:
The history of the Sri Dalada wa – Government of Sri Lanka
(texto destinado à revista BROTÉRIA da Província Portuguesa da Companhia de Jesus)
[1] - Relatos históricos sobre os reis do Sri Lanka escritos pelos monges sedeados em Anuradhapura.
É difícil acreditar que o Espírito que baixa nos humanos (nem em todos...) o faça só para desaparecer com os restos, a carcaça, quando estes morrem.
Do mesmo modo parece pouco verosímil que o Espírito baixe nos humanos para com cada um deles ficar apenas um átimo de tempo em relação ao tempo eterno.
Há muito que corre na Tv, como ajuda à conscientização sobre o aquecimento global, o desprezo pelo ambiente, o constante despejar de lixo e químicos nos rios e mares, no dizimar das florestas, e outras barbáries, uma frase:
“A Natureza não precisa dos homens. Os homens é que precisam da Natureza.”
Se considerarmos que a Natureza é obra de Deus ou, porque não, Ele próprio, podemos usar a mesma expressão trocando a palavra Natureza pela palavra Deus.
O triste de tudo isto é vermos que o homem se julga superior à Natureza porque com o maior à vontade a vai destruindo, consciente, ganancioso, alguns se enchendo de dinheiro sujo, conspurcado, para no fim terminar comido pelas lagartas.
Uma seda chinesa, roubada do palácio do imperador da China durante a segunda Guerra do Ópio (1856-1860), representa um tubarão que devora um crocodilo que devora a serpente que devora a águia que devora a andorinha que devora a lagarta.
Toda a natureza se devora, raro no entanto entre indivíduos da mesma espécie, excepto entre aqueles a quem foi concedido o Espírito!
Todas as religiões acreditam numa outra vida, somente porque lhes custa a compreender que os homens tenham recebido um Espírito para se demorar tão pouco tempo nos seus corpos.
Os cristãos acreditam na ressurreição dos mortos, e que vão encontrar os seres queridos que partiram primeiro. Naturalmente não vão ressuscitar com os mesmos corpos que tiveram um dia, nem encontrar alguém! Os muçulmanos acham que no céu deles, tipo reserva especial cinco estrelas, vão-se deleitar com um monte de virgens, e que por lá ficarão eternamente... até se enjoarem uns dos outros!
Então o que significará a “Ressurreição” para os cristãos? Qual a compensação depois de morrer, deixando de lado a velha fórmula de “inferno, purgatório, limbo para os recém-nascidos e paraíso”?
O mesmo que para os muçulmanos, em que os “mártires” vão para SPAs cinco estrelas e os outros ficarão a rastejar-se andrajosos e esfaimados comendo os restos que caem das mesas dos Elíseos?
Sem ser espírita, nem nunca ter presenciado uma sessão de espiritismo, e ao fim de muitos anos a pensar no que será a vida post mortem, a resposta mais lógica que encontro é na reencarnação.
Cristão, a ressurreição, nada mais é do que a continuidade da presença do espírito nalgum corpo até que tendo atingido a perfeição, esse Espírito acabe se incorporando à “Legião dos Espíritos Eternos” na Paz total, que esta mesma não se consegue compreender o que seja.
O Buda, que anos passados da sua morte houve quem tenha querido deificar para que criando mestres-sacerdotes budistas estabelecer assim uma hierarquia, afirmava que a sua eterna busca, enquanto na terra, era compreender, encontrar, o que era a Verdade, e lamentava-se que ia morrer sem a ter encontrado e compreendido.
Estes mistérios que não foram, nem são, revelados aos homens, têm pelo menos a vantagem de poder proporcionar àqueles que gostam de pensar, e olhar para dentro de si próprios, a meditação que os leve a distinguir o Eu-Espírito do Eu-Ego, carne que não tarda a apodrecer.
O Além e o Aquém, formam uma unidade indivisível, enquanto o indivíduo permanece como ser vivente na Terra. Por muito que ele queira separar, para destruir tudo que se encontre ao seu redor, quer seja roubando, matando, insultando, desmoralizando a pedra base da sociedade, a família, o Espírito que lhe foi emprestado, sai maculado. E só se limpa se se tornar a incorporar noutro indivíduo.
Os hinduístas consideram que, sendo todos os seres viventes obra da Criação, e são, devem ter os mesmos privilégios dos humanos, e desta forma os respeitam, e assim mantém um equilíbrio entre o Eu e o Ego. Aí está uma forma de respeitar a Natureza... enquanto o dinheiro não lhes acenar com riqueza ou prestígio ou mais comodidades. Nesse momento, na generalidade, o equilíbrio desaparece.
A dificuldade em compreender, se possível, um pouco mais sobre o Além, está na permanente onda de “verdades” jogadas para cima dos homens por “mestres” de todas as religiões. E, como Buda, ninguém sabe o que é a Verdade.
Santo Agostinho não se atreveu a conhecer a Verdade, mas deixou dito: “A Verdade está em nós mesmos, e o pecado também!”
Menos teologal, Shakespeare, põe na boca de Júlio César: “A culpa, caro Brutus, não está nas estrelas, se somos seres inferiores, está dentro de nós mesmos.”
E o homem de bem, que procura alcançar a paz, ainda neste mundo, sofre terrivelmente uma permanente luta entre o Bem e Mal. Não adianta isolar-se, refugiar-se num mosteiro ou no alto duma montanha numa miserável ermida, e fazer penitência todo o tempo. Esse isolamento acaba sendo uma demonstração de egoísmo, à procura de se salvar somente a si. E os outros, todos, que precisam de ajuda, que têm que viver o combate, todo o dia, a toda a hora, podendo, por exemplo, dizer como Sócrates ao passar nas ruas dos comerciantes, “quanta coisa aqui de que não preciso”, sabendo que o mal sempre vem de fora.
“É no dar que se recebe.” Não se trata do dar e receber mercadorias ou dinheiro, limpo ou sujo. Fundamentalmente dar Amor. Dar-se. Curioso como os políticos que, em teoria, devia ser isso que era sua obrigação, dar-se, trabalhar pelo bem dos povos, a partir do momento que viram Suas Insolências, esquecem-se completamente do Outro, e só se lembram de aumentar o seu pecúlio!
Esses, segundo os hindus, devem reencarnar em algo execrável, além de, com certeza, na hora da morte ficarem apavorados por saberem que no Além não vão para o salão nobre!
Em chegando a hora, temem por saberem que enquanto neste mundo pouco ou nada deram, ou muito roubaram, e como é dando que se recebe, o máximo que vão receber é a “conta a pagar”.
A vida na Terra nada representa em termos de Tempo, mas o suficiente para cada um mostrar o quanto se interessou pelo Outro, quanto Amou.
Vai ser o “Poverello” que lhe irá perguntar:
- Onde viste ódio, levaste amor?
- Quando te ofenderam, perdoaste?
- Onde viste discórdia, procuraste a união?
- Quando encontraste a dúvida, animaste com a fé?
- Onde estavam os erros, mostraste a verdade?
- Aos desesperados, deste-lhes alguma esperança?
- Aos abandonados, velhos, tristes deste alguma alegria?
- E àqueles que viviam nas trevas, mostraste o caminho da luz?
- Procuraste ser mais consolado do que consolar os outros?
- Esforçaste-te para melhor compreender os outros do que te fazeres compreendido?
Por fim ouvirás: “Pois é, se não te deste, nada tens para receber; se não perdoaste, como queres que te perdoem agora? Não morreste para o teu Ego, como queres ganhar a vida eterna?”
E antes da tua alma abandonar o corpo, que vira pó, verás ou o sorriso do Santo ou duas lágrimas que descerão pela cara.
1. As reflexões de Bento XVI em Regensburg, sob o título “Fé, Razão e Universidade”, são notáveis, não tanto pelo que revelam, mas por terem sido feitas por quem foram. Creio que, por uma vez, um Papa do nosso tempo veio a público expor o que pensa sobre o fenómeno religioso – e não só sobre a religião cristã -oferecendo-se à crítica e ao debate, longe da sombra protectora das “verdades de fé”.
Tenho para mim que Bento XVI -ao basear estas suas reflexões num juízo escrito por alguém que tinha à porta a ameaça, não religiosa, não filosófica, mas chãmente militar, do Islão – foi, apenas, inoportuno. E inoportuno porque daria, como deu, argumentos vários a fundamentalismos vários de quadrantes vários, sabendo que não iria obter nada de substancial em retorno. O que ninguém poderá negar é que esse mesmo juízo tem acompanhado o pensamento europeu ocidental desde que os muslim (os que seguem o Profeta) começaram a disputar-lhe territórios e vidas.
Como não discuti-lo, pois, ainda que isso nos lance uns contra outros? Só que, finada a fé marxista, uma tal discussão está fatalmente circunscrita às religiões do Livro – porque, hoje em dia, só elas são militantes, como militante era o marxismo. E é aqui que talvez resida o nó do problema: não na substância, mas na militância que todas elas apregoam, incentivam e louvam por ser “o” caminho certo para levar de vencida a lei da morte.
2. Ao comentar as palavras de Bento XVI, Miguel Sousa Tavares (Expresso) não escapa, ele próprio, ao apelo do “pensamento correcto” -afinal uma outra forma de militância. Desde logo, quando esquece Bartolomeo de las Casas, e tantos outros menos conhecidos, nos primeiros e trágicos dias da conquista do Novo Mundo. O simples facto da voz do bom freire ter sido silenciada não deve silenciar em nós a sua memória. Seguidamente, quando coloca no mesmo saco a pílula, o direito ao aborto, a eutanásia e a ciência, como se tudo isso partilhasse uma mesma categoria lógica. Quem defende o primado tolerante da Razão não pode ser tão tosco na manipulação dos conceitos!
3. Por estranho que pareça, a história do Cristianismo é, quanto a isto, exemplar – na exacta medida em que nos ajuda a perceber os trajectos históricos das outras duas religiões bíblicas.
“Honrar a Deus” e “amar o próximo” são os mandamentos comuns às três religiões. Mas divergem elas sobre o que entender por “próximo”. Para o Cristianismo, graças à inspiração genial de S. Paulo, o próximo é “o outro”, qualquer “outro” – ideia que, ao longo dos séculos, tem vindo a derrubar sucessivos (pre)conceitos culturais. Para as outras duas religiões, porém, o próximo é só aquele que connosco partilha a mesma forma de honrar a Deus – o que é dizer, a mesma fé.
Divergências semelhantes sobre a ideia de Deus afastam-nas ainda mais umas das outras.
E se olharmos desapaixonadamente para o que nos rodeia, as três religiões do Livro só têm em comum uma mesma referência histórica -que cada uma delas, aliás, lê e interpreta a seu modo:
(a) para a Religião Judaica e o Islão, Deus é “Aquele que é” – e, assim assumido, sem causa nem finalidade, é inacessível à Razão;
(b) para muitos cristãos, Deus é ainda “o completamente Outro” de Gabriel Marcel – tão impenetrável pela Razão quanto o anterior;
(c) para Bento XVI, Deus oferece-se à Razão -não é mais “o completamente Outro”, “Aquele que é”, mas “Aquele que se revela”.
4. E, não obstante, “No princípio era a Palavra (logos)...” – nisto pelo menos as três religiões do Livro concordam. Mas essa Palavra não era ainda a Revelação. Era tão-só a capacidade de distinguir e de codificar e relacionar de maneira coerente o que se distinguia. Era, afinal, o logos capaz de pensar a ideia transcendente de Deus e de gerar o mito. Como escreveu Feuerbach, a ideia de Deus, goste-se ou não, é ainda uma categoria do pensamento, tem as suas raízes na mente e, por consequência, fica tão contingente e datada como qualquer outro pensamento (“não é Deus que criou o Homem à imagem e semelhança de Deus; é o Homem que cria Deus à imagem e semelhança do Homem). Por isso, sem a tese da Revelação tão cara a Bento XVI, o Deus transcendente, tal como o Deus de Feuerbach, é apenas a ideia do invisível que está ao alcance de cada um criar e recriar conforme melhor se lhe ofereça. Neste contexto, como estranhar que as religiões do Deus transcendente sejam também as religiões de uma ideia de Deus de sentido único, em que o mito é permanentemente imposto ao colectivo dos crentes como acto de fé, o santo e a senha dos que a elas dizem pertencer?
Pela teoria da Revelação, Deus não é mais uma ideia construída a partir de determinadas referências abstractas que dão corpo a uma fé – é, sim, uma experiência, uma realidade a apreender. Talvez Bento XVI não se tenha apercebido de que, ao defender isto, não se limita a reconciliar a ideia de Deus com a Razão. Está também a remover a fé para o terreno mais escorregadio da exegese dos vestígios de uma realidade revelada; está a tirar de cena os depositários das referências que dão forma a uma ideia de Deus que exclui o livre pensar; está a esvaziar, em suma, as razões que justificam uma hierarquia religiosa, a separação entre ungidos e simples crentes. Mas Carreira das Neves (Expresso) apercebeu-se, e por isso escreve: “(...) o Papa terá que perceber que a sua voz e o seu logos já não pertencem mais aos meios académicos (...)”. Ou seja, não é possível manter uma Igreja, com a sua fé e as suas hierarquias vigilantes, e dar livre curso à Razão.
5. O que não cessa de me surpreender é o facto de as três religiões do Livro se organizarem segundo linhas mestras em tudo idênticas: “honrar a Deus” na esfera pública; “amar o próximo” no recato das consciências individuais (apesar de o Islão, inovador neste ponto, impor a conduta ostensivamente pública da esmola ritual).
Que assim tenha acontecido no Cristianismo, é algo que ficou registado na História com enorme clareza. Constantino via que o Império se esfarelava, que tinha de o manter unido – coisa que, sabia ele também, não estava mais ao alcance, nem das suas legiões, nem do seu aparelho administrativo-fiscal.
Faltava-lhe uma ideia que congregasse e condicionasse, sem esforço nem custo, as mentes dos seus súbditos; que, aceite, não imposta, se propagasse espontaneamente entre eles; que fixasse um único referencial de valores sobre os quais ele, Constantino, iria refundar o seu poder. Faltava-lhe uma religião – e teve-a.
Era a parte pública da religião que interessava Constantino. Foi uma religião pública, à maneira imperial, que a incipiente hierarquia cristã lhe ofereceu. De novo o ritual iria pôr à prova os vínculos de pertença e, por aí, reforçar a coesão político-social. De novo o poder se afirmaria defensor último de ideias, mitos e preceitos que a generalidade dos súbditos reconhecia e prezava. De novo uma hierarquia religiosa apareceria a alicerçar a polis, conferindo-lhe estabilidade e recebendo em troca o seu quinhão de poder.
Ainda hoje é evidente que o poder temporal carece da teatralidade dos rituais, e da estupefacção que causa. Mas, por mais voltas que se dê, não é fácil teatralizar o acto de “amar o próximo” – posto que, nele, natureza humana, espaço e tempo se confundem. “Honrar a Deus”, sim, sempre foi terreno fértil para rituais de onde facilmente emerge um outro logos insusceptível de ser reduzido ao logos dos não-iniciados – e, por isso mesmo, capaz de gerar uma hierarquia.
Uma pergunta se impõe, então: como seriam as coisas se as religiões do Livro, todas elas, tivessem remetido para o foro íntimo o 1º mandamento e trazido para a esfera pública o 2º mandamento?
6. Tal como o Islão, também o Cristianismo conheceu cismas, movimentos purificadores e lutas fratricidas (o facto de o Judaísmo ter sido mantido longe do poder poupou-o a muitos destes tormentos, mas não a tantos outros). Contrariamente às sociedades islâmicas, porém, as sociedades cristãs europeias cedo propenderam para manter em águas separadas poder religioso e poder temporal, conferindo a cada um a sua hierarquia (não sei dizer porquê, mas foi assim). Na Europa, a derrota que a concepção absolutista do Estado infligiu ao poder temporal do papado foi, até melhor ver, definitiva – mas, excepção feita à monarquia inglesa, não tão profunda que animasse os Estados a chamarem a eles, também, o modo como o 1º mandamento deveria ser vivido.
O Judaísmo, destruída Jerusalém, só agora, num pequeno pedaço do Médio Oriente, dispõe de poder temporal bastante (o que não facilita a resolução dos problemas que por lá se vivem). O Islamismo sempre o possuiu, proclamando embora que ele só se justifica enquanto defensor dos crentes (muslim) – o que é dizer, enquanto instrumento do Islão. Na Europa, e nas restantes sociedades de matriz ocidental, o poder temporal é agora laico, afirma-se equidistante de todas as religiões e com isso remete o 1º mandamento para a esfera privada. Que Bento XVI me perdoe, mas nestas circunstâncias não vejo como a Razão possa, alguma vez, chegar a reunir as três religiões do Livro.
O 10 de Junho foi escolhido por ser também o Dia Nacional de Portugal, quando a nação portuguesa celebra a morte de seu maior génio, Camões.
Antecedentes históricos
O primeiro rei de Portugal, Dom Afonso Henriques, notabilizou-se não só pelo valor guerreiro e nobre, mas principalmente por uma grande santidade. É assim que o próprio Nosso Senhor Jesus Cristo lhe aparece para manifestar ao mesmo o desejo de fundar um grande reino através de seus descendentes e pedindo que coloque os símbolos da Paixão no brasão de Portugal.
Dom Afonso Henriques tinha uma grande e entranhada devoção ao Arcanjo São Miguel. Antes do rei haver tido a visão de Nosso Senhor, apareceu-lhe um Embaixador angélico, dizendo-lhe: "Sois amado do Senhor, porque sem dúvida pôs sobre vós, e sobre vossa geração depois de vossos dias, os olhos de sua misericórdia, até a décima sexta descendência, na qual se diminuirá a sucessão, mas nela assim diminuída, Ele tornará a pôr os olhos e verá". Em seguida, declara o próprio rei: "Obedeci, e prostrado em terra, com muita reverência, venerei o embaixador e Quem o mandava. E como posto em oração, aguardava o som, na segunda vela da noite ouvi a campainha, e armado de espada e rodela saí fora dos reais, e subitamente vi à parte direita, contra o nascente, um raio resplandecente indo-se pouco a pouco clareando, cada hora se fazia maior. E pondo de propósito os olhos para aquela parte, vi de repente, no próprio raio, o sinal da Cruz, mais resplandecente que o sol, e um grupo grande de mancebos resplandecentes, os quais creio que seriam os santos anjos.." O santo rei, chorando maravilhado com a visão, vê finalmente Nosso Senhor, que lhe diz: "Não te apareci deste modo para acrescentar tua fé, mas para fortalecer teu coração neste conflito, e fundar os princípios do teu reino sobre pedra firme. Confia, Afonso, porque não só vencerás esta batalha mas todas as outras em que pelejares contra os inimigos da minha cruz. Acharás tua gente alegre e esforçada para a peleja, e te pedirá que entre na batalha com o título de rei. Não ponhas dúvida, mas tudo quanto te pedirem lhes concede facilmente. Eu sou o fundador e destruidor dos reinos e impérios, e quero em ti e em teus descendentes fundar para Mim um império, por cujo meio seja Meu nome publicado entre nações mais estranhas. E para que teus descendentes conheçam Quem lhes dá o reino, comporás o escudo de tuas armas do preço com que Eu remi o género humano, e daquele por que Fui comprado pelos judeus, e ser-Me-á reino santificado, puro na fé e amado da minha piedade". Até os dias de hoje permanecem os estigmas da Paixão no escudo da grande nação portuguesa.
Um episódio demonstra quanto os homens que cercavam o rei Dom Afonso Henriques eram também de grande valor. O rei de Leão, Afonso VII, estava cercando as tropas de Afonso Henriques e a derrota deste parecia iminente. Egas Muniz, que fora educador de Afonso Henriques, vai até Afonso VII e empenha sua palavra de que seu antigo pupilo lhe prestaria obediência. Confiando na promessa do nobre português, o rei de Leão levanta o cerco. Como Dom Afonso Henriques não cumpriu a palavra, que aliás não dera, Egas Muniz vai até junto do rei de Leão, acompanhado da mulher e filhos, em traje de penitente, pedindo que o mesmo lhe castigue por não se ter cumprido o que prometera. E o castigo, Egas Moniz o sabia, poderia ser a pena de morte. Admirado com tal grandeza de alma, o rei manda de volta e em paz o fidalgo português.
Dom Afonso Henriques continua suas conquistas, principalmente contra os mouros. Em 1147 domina Santarém, que era um grande baluarte islâmico. Algum tempo depois, sob o comando pessoal de Al-Baraque, rei de Sevilha, Santarém é sitiada. O santo rei vê-se impotente para liderar a defesa dos cristãos pois estava ferido numa perna e sem poder montar a cavalo. Mesmo assim, arrisca-se e vai lutar pela defesa de seus homens em Santarém. Quando se encontrava no meio dos combates, Dom Afonso Henriques vê, junto de si, um braço levantado brandindo uma espada. Percebe claramente que um Anjo do Senhor estava a seu lado para protegê-lo.
Quando os combates estavam em sua fase mais renhida e sangrenta, o braço angélico começou a desferir mortais golpes contra os mouros, os quais fugiam aterrorizados e deixavam o campo de batalha à mercê dos soldados cristãos. Os próprios soldados agarenos, presos durante a batalha, confessaram ter visto o braço angélico armado com a espada a lhes deferir mortais golpes.
Como prova de gratidão por tão insigne favor divino, Dom Afonso Henriques fundou a Ordem militar com o nome de "São Miguel da Ala" (a palavra "ala" é aplicada no sentido de "levantada" ou "alada"), em honra daquela intervenção angélica. Seus descendentes estabeleceram o costume de colocar nos seus filhos os nomes dos três Arcanjos, São Miguel, São Gabriel e São Rafael, também em honra desta batalha.
Cresce a devoção ao Anjo de Portugal ao longo dos anos
A pedido do rei Dom Manuel e dos bispos portugueses, o Papa Leão X instituiu em 1504 a festa do «Anjo Custódio do Reino» cujo culto já era antigo em Portugal.
Oficializada a celebração tradicional, Dom Manuel expediu alvarás às Câmaras Municipais a determinar que essas festas em honra do Anjo da Guarda de Portugal fossem celebradas com a maior solenidade. Na referida festa deveriam participar as autoridades e instituições das cidades e vilas, além de todo o povo. Por determinação das Ordenações Manuelinas a festa do Anjo de Portugal era equiparada à festa do Corpo de Deus, já então a maior festa religiosa de Portugal, em que toda a nação afirma a sua Fé na presença real de Cristo na eucaristia.
Esta celebração manteve o seu esplendor durante os séculos XVI, XVII e XVIII, período em que Portugal mantinha grande poder e muita religiosidade, e decaiu no século XIX quando o país já estava em decadência.
De acordo com o testemunho dos Pastorinhos de Fátima, em 1915 e 1916 o Anjo de Portugal apareceu por diversas vezes a anunciar as aparições de Nossa Senhora nesta sua Terra de Santa Maria e deu aos Pastorinhos a comunhão com o «preciosíssimo corpo, sangue, alma e divindade de Jesus Cristo» como ele próprio declarou.
O culto do Anjo de Portugal teve o seu maior brilho nas cidades de Braga, Coimbra e Évora, especialmente na diocese de Braga, Sé primaz de Portugal, onde se celebrava a 9 de Julho.
No tempo de Pio XII a festa do Anjo de Portugal foi restaurada para todo o País e transladada para o dia 10 de Junho a fim de que o Dia de Portugal fosse também o Dia do Anjo de Portugal.
Nota: O que muitos desconhecem é o facto de Custódio significar protector e da Lenda de S. Jorge também fazer parte da História do Anjo Português. S. Miguel, S. Jorge são idênticos em diversos aspectos, daí o nosso povo antigamente ter cruzado ambas as histórias.
Hoje sabe-se que o nosso Anjo Custodio é o Arcanjo S. Miguel e também que o nosso padroeiro é o famoso Guerreiro S. Jorge...
PAPA EM VISITA DE ESTADO À ALEMANHA ACOMPANHADA DE APLAUSO E CRÍTICA
O ressentimento e o ódio descem à rua acompanhados de deputados
A convite do presidente da Alemanha, Christian Wulff, Bento XVI visita pela primeira vez oficialmente a Alemanha, de 22 a 26 de Setembro, na qualidade de chefe de Estado do Vaticano.
Uma Visita Papal ao País de Lutero não é empresa fácil.
Parte dos Deputados do partido comunista “Die Linke” e alguns outros vão estar ausentes à sessão parlamentar onde o Papa fala (22 de Setembro). Alguns pretendem juntar-se a manifestações paralelas contra o Papa nas ruas de Berlim. Aí juntar-se-ão grupos defensores do aborto, o grupo “divertimento de pagãos em vez do medo do inferno”, um comício de homossexuais e de lésbicas, o movimento “nós somos igreja”.
Grave é o facto de Deputados não compreenderam que são representantes do povo e que também têm católicos como seus eleitores. Deputados não se representam a si mesmos. Cada vez assistimos mais a uma sociedade em pé de guerra. A sociedade divide-se em lutas de trincheira. Antigamente as maiorias determinavam a norma. Hoje, minorias organizadas querem ditar o dizer. Exigem tolerância para si mas não toleram as ideias dos outros. Contra o cristianismo levantam a voz porque sabem que não têm nada a recear. Perante o islão acobardam-se e vergam a espinha. O Dalai Lama também é contra o aborto mas para a estratégia dos anticatólicos isso não interessa registar.
A informação da comunicação social, em questões de Papa, parece congregar os arautos da guerra escura contra o catolicismo. Por vezes tem-se a impressão de não estarem interessados em narrar, mas apenas em cuspir. A nomenclatura da polémica e da demagogia aproveita para fomentar uma imagem do Papa como inimigo perigoso do progresso e das opiniões de estatística. Assiste-se a umalavagem ao cérebro.
Um Papa que pretende um momento de reflexão conservadora num progressismo absolutista é tido como desmancha-prazeres.
Ele não serve os poderosos, é um espinho nos olhos de muitos que se encontram em posições-chave da sociedade (economia, política, ciência e religião).
O Papa não obriga ninguém a aceitar as suas ideias. Provoca porque acredita em Deus; provoca por estar à frente duma instituição que defende as crianças por nascer (outros defendem as rãs e ainda bem); por acreditar na ordem natural da criação; por ser contra as guerras do Ocidente; por defender igualdade, solidariedade; por condenar um sistema capitalista financeiro e social que de crise em crise destrói um mínimo de solidariedade social entre pobre e rico; por condenar um estilo de vida que conduz à ruina da pessoa e da nossa civilização; provoca por ter uma convicção que desagrada a uma nomenclatura que só quer opinião. É contestado por comunistas e capitalistas.
“ Deus está morto, não há razão para vociferar tribulação” anuncia Siegel.online. Como resposta, também irracional, poder-se-ia dizer: Hitler tentou construir uma ordem estatal e social sem Deus e Estaline também…
Os filósofos Adorno e Horkheimer falam duma filosofia do “Iluminismo” que difunde " com sinais do mal triunfante".
A propaganda dum paganismo politeísta pretende desligar o Homem de todas as incorporações. Quer uma religião civil com o deus dinheiro e o consumo como liturgia. A felicidade não se pode reduzir a gozo a curto prazo; a masturbação satisfaz o momento mas não cria futuro. Os resultados do ateísmo podem ver-se no nazismo e no estalinismo. Os resultados de dois mil anos de cristianismo são magros. Temos que nos unir, todos crentes, ateus e pagãos, amigos e adversários, para juntos nos tornarmos melhores e assim possibilitar um mundo melhor. O que temos feito é prolongar a guerra querendo ter sempre razão.
O papa vê na razão uma expressão de Deus e Deus como a súmula do ser e do sentido. Num mundo que cada vez desrespeita mais a pessoa, vê Deus como garante de individualidade e dignidade humana. Num mundo do ateísmo ele defende Deus. Com a morte do Deus da Bíblia desaparece a base duma existência civilizada.
Quem critica o Papa tão ferozmente não o conhece nem leu os seus livros. Alimenta-se do preconceito, não é honesto. Desconhece que no cristianismo, ao lado dos dogmas, o cristão tem uma consciência soberana. Não chega catar algumas afirmações do Papa discutíveis e reduzi-lo a elas para apanhar pessoas incautas para o seu rebanho.
Deparamo-nos muitas vezes com um jornalismo de campanha. Dirigido ao ânimo das pessoas e não à razão. Assiste-se à adulteração da informação. A propósito da visita do papa a Madrid com mais de um milhão de visitantes, as notícias falam primeira e detalhadamente dum grupo de 5.000 demonstrantes e doutro grupo de 150. Concede-se nas páginas dos jornais espaços extensos a críticos, espaços que não se concedem aos conteúdos transmitidos pelo Papa. Assiste-se a uma afectação anti-romana em que se fazem afirmações de “católicos escuros”. Jacobinos de várias facções coordenam as suas acções contra o catolicismo.
Uma igreja com comunidades em todas as nações precisa dum cargo da unidade. Os Papas apesar das sombras e pecados na História serviram a unidade da fé e a ideia duma comunidade global em que o irmão e o próximo vivem em paz. Como Papa não é um funcionário duma organização, a ele obriga-o só a Bíblia e o serviço à humanidade. A Igreja é uma comunidade peregrina sempre em processo e em mudança precisando naturalmente também ela de mudança.
A religião é mais feminidade, como a razão é mais masculina. A igreja é mulher, é mãe. A sua padroeira é Maria. Uma sociedade extremamente masculina, que impôs os padrões da masculinidade à mulher, critica uma Igreja em que a feminidade é guardada a nível de fé. Nos ataques jacobinos sistemáticos e organizados a nível mundial contra a Igreja parece querer branquear-se uma sociedade extremamente injusta para poderes escuros poderem agir à vontade, sem ninguém que lhes fale à consciência. A Igreja, como cada pessoa e cada instituição é pecadora. Se cada um olhasse para os próprios defeitos talvez compreendesse melhor os outros.
No intervalo de uma mesa-redonda sobre religião e paz entre os povos, na qual ambos (eu e o Dalai Lama) participávamos, eu, maliciosamente, mas também com interesse teológico, lhe perguntei em meu inglês capenga:
- Santidade, qual é a melhor religião? (Your holiness, what`s the best religion?)
Esperava que ele dissesse:"É o budismo tibetano" ou "São as religiões orientais, muito mais antigas do que o cristianismo."
O Dalai Lama fez uma pequena pausa, deu um sorriso, me olhou bem nos olhos – o que me desconcertou um pouco, porque eu sabia da malícia contida na pergunta – e afirmou:
- A melhor religião é a que mais te aproxima de Deus, do Infinito. É aquela que te faz melhor.
Para sair da perplexidade diante de tão sábia resposta, voltei a perguntar:
- O que me faz melhor?
Respondeu ele:
-Aquilo que te faz mais compassivo (e aí senti a ressonância tibetana, budista, taoista de sua resposta), aquilo que te faz mais sensível, mais desapegado, mais amoroso, mais humanitário, mais responsável... Mais ético... A religião que conseguir fazer isso de ti é a melhor religião...
Calei, maravilhado, e até os dias de hoje estou ruminando sua resposta sábia e irrefutável...
Colunista iraquiano afirma: "É difícil lembrar um período em que os árabes cristãos tenham estado em maior perigo do que hoje".
Num artigo no jornal iraquiano Al-Zaman, publicado simultaneamente em Londres e Bagdad, cuja linha editorial é independente e liberal desde a década de 1940, o colunista Majid Aziza dá destaque à situação da população árabe cristã no mundo muçulmano. A seguir, alguns trechos do artigo publicado em 14 de Setembro de 2004:
"Os cristãos nascidos em países árabes estão a fugir das suas regiões de origem. Hoje em dia, essa informação é divulgada em todo o mundo e é cem por cento verdadeira. As estatísticas mostram que um grande número de cristãos árabes está a emigrar para lugares menos perigosos para eles e seus filhos, como Estados Unidos, Canadá, Austrália e Europa. Os motivos são, por um lado, a perseguição que os órgãos governamentais movem contra eles e, por outro lado, os grupos extremistas...
Na Palestina, os cristãos estão quase extintos em consequência do controle que os extremistas muçulmanos têm sobre a questão palestina e da marginalização dos cristãos, sem mencionar o impacto negativo da intifada (dirigida pelas organizações islâmicas) sobre os cristãos da Palestina
Os cristãos têm vivido há séculos nas regiões conhecidas actualmente como países árabes, juntamente com outros grupos religiosos e, principalmente, com os muçulmanos que participaram com eles das aflições da vida. Mas os cristãos perderam o apoio de seus concidadãos islâmicos por muitas razões, inclusive pelo extremismo religioso entre alguns muçulmanos, pelo aumento da população islâmica [por motivos religiosos], pelos actos de discriminação, coerção e expulsões individuais e colectivas de cristãos e pelas pressões que os cristãos vinham sofrendo até mesmo quando serviam os seus países. Há muitos exemplos disso na Palestina, no Iraque, no Sudão, no Líbano, no Egipto e noutras nações.
Aproximadamente 4 milhões de cristãos libaneses emigraram na sequência das pressões impostas pelos muçulmanos. Mais ou menos meio milhão de cristãos iraquianos deixaram o seu país pelos mesmos motivos... Hoje a situação está a ficar pior por causa da discriminação por parte dos salafitas, extremistas muçulmanos. Na Palestina, os cristãos estão quase extintos em consequência do controle que os extremistas muçulmanos têm sobre a questão palestina e da marginalização dos cristãos, sem mencionar o impacto negativo da intifada que é dirigida pelas organizações islâmicas sobre os cristãos palestinianos. Em relação aos cristãos coptas do Egipto, o que o governo e os muçulmanos fizeram e continuam a fazer com eles daria para encher páginas e páginas de livros e jornais, explicando os actos de coerção, discriminação e perseguição. O que está a acontecer também com os cristãos na Argélia, Mauritânia, Somália e outros países é um problema que ocuparia espaço demais para ser explicado.
Essa situação ocorre igualmente nos países muçulmanos não-árabes. Em nações islâmicas como o Paquistão, Indonésia e Nigéria, os cristãos também sofrem perseguição. No Paquistão, os líderes muçulmanos decretaram uma fatwa [decisão religiosa] permitindo a matança de dois cristãos para cada muçulmano morto pelos ataques americanos no Afeganistão, como se os americanos representassem o Cristianismo no mundo. Noutros países os cristãos vivem com medo, sob a sombra de ameaças e enfrentam uma crescente série de agressões cada vez que os Estados Unidos e seus aliados executam uma operação militar contra qualquer país muçulmano.
Os cristãos têm medo do que lhes possa acontecer nesses países. A situação é muito grave e requer atenção urgente. É difícil imaginarmos qualquer outro tempo em que os cristãos tenham enfrentado maior perigo nesses países do que actualmente..."