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A bem da Nação

RATZINGER E FÁTIMA

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Do terceiro «segredo» de Fátima…

- Não é revelado nenhum grande mistério; o véu do futuro não é rasgado.

Da visão…

- Serão talvez apenas projecções do mundo interior de crianças, crescidas num ambiente de profunda piedade, mas simultaneamente assustadas pelas tempestades que ameaçavam o seu tempo.

Das revelações…

- A doutrina da Igreja distingue «revelação pública» e «revelações privadas»;

- A «revelação pública» (…) é o Antigo e o Novo Testamento;

- A «revelação privada» aplica-se a todas as visões e revelações verificadas depois da conclusão do Novo Testamento. O seu papel não é (...) “completar” a Revelação definitiva de Cristo, mas ajudar a vivê-la mais plenamente numa determinada época da história.

Das autoridades (credibilidades)…

- A autoridade das revelações privadas é essencialmente diversa da única revelação pública [onde] é o próprio Deus que nos fala;

- A revelação privada (…) manifesta-se credível porque faz apelo à única revelação pública;

- Às revelações [privadas] aprovadas não é devida uma adesão de fé católica; estas revelações requerem, antes, uma adesão de fé humana ditada pelas regras da prudência, que no-las apresentam como prováveis e religiosamente credíveis;

- É uma ajuda que é oferecida, mas não é obrigatório fazer uso dela;

- O critério para medir a verdade e o valor duma revelação privada é a sua orientação para o próprio Cristo; quando se afasta d'Ele, quando se torna autónoma ou até se faz passar por outro desígnio de salvação, melhor e mais importante que o Evangelho, então ela certamente não provém do Espírito Santo;

- Frequentemente, as revelações privadas provêm da piedade popular e nela se reflectem.

Das profecias…

- No sentido da Bíblia, [a profecia] não significa predizer o futuro, mas aplicar a vontade de Deus ao tempo presente e consequentemente mostrar o recto caminho do futuro;

- A predição do futuro tem uma importância secundária;

- Nas revelações [profecias] de Fátima, trata-se disto mesmo: ajudar-nos a compreender os sinais do tempo e a encontrar na fé a justa resposta para os mesmos.

Das visões…

- Não eram captadas por todos os presentes mas apenas pelos «videntes»;

- Trata-se (…) da percepção interior que, para o vidente, tem uma força de presença tal que equivale à manifestação externa sensível;

- Este «ver interiormente» não significa que se trata de fantasia, que seria apenas uma expressão da imaginação subjectiva. Significa, antes, que a alma recebe o toque suave de algo real mas que está para além do sensível, tornando-a capaz de ver o não-sensível, o não-visível aos sentidos: uma visão através dos «sentidos internos»;

- Os destinatários preferidos de tais aparições [são] as crianças: a sua alma ainda está pouco alterada e quase intacta a sua capacidade interior de percepção;

- Se na visão exterior já interfere o elemento subjectivo, isto é, não vemos o objecto puro mas este chega-nos através do filtro dos nossos sentidos que têm de operar um processo de tradução, na visão interior isso é ainda mais claro, sobretudo quando se trata de realidades que por si mesmas ultrapassam o nosso horizonte;

- O vidente (…) vê segundo as próprias capacidades concretas, com as modalidades de representação e conhecimento que lhe são acessíveis. (…) Tais visões não são em caso algum a «fotografia» pura e simples do Além, mas trazem consigo também as possibilidades e limitações do sujeito que as apreende;

- As imagens delineadas [pelos pastorinhos] são (…) fruto duma percepção real de origem superior e íntima; nem se hão-de imaginar como se por um instante se tivesse erguido a ponta do véu do Além, aparecendo o Céu na sua essencialidade pura, como esperamos vê-lo na união definitiva com Deus. (…) As imagens são uma síntese entre o impulso vindo do Alto e as possibilidades disponíveis para o efeito por parte do sujeito que as recebe, isto é, das crianças.

Interpretando o «segredo» de Fátima…

- Os pastorinhos experimentaram uma visão do inferno. Viram a queda das «almas dos pobres pecadores». Em seguida, foi-lhes dito o motivo pelo qual tiveram de passar por esse instante: para «salvá-las», para mostrar um caminho de salvação.

- O futuro não está de forma alguma determinado imutavelmente e a imagem vista pelos pastorinhos não é, absolutamente, um filme antecipado do futuro, do qual já nada se poderia mudar;

- O seu sentido é mobilizar as forças da mudança em bem. Por isso, há que considerar completamente extraviadas aquelas explicações fatalistas do «segredo» que dizem, por exemplo, que o autor do atentado de 13 de Maio de 1981 teria sido, em última análise, um instrumento do plano divino predisposto pela Providência e, por conseguinte, não poderia ter agido livremente, ou outras ideias semelhantes que por aí andam. A visão fala sobretudo de perigos e do caminho para se salvar deles;

- O caminho da Igreja é descrito como uma Via Sacra, como um caminho num tempo de violência, destruições e perseguições;

- Na visão, podemos reconhecer o século vinte como o dos mártires, como o dos sofrimentos e perseguições à Igreja, como o das guerras mundiais e de muitas guerras locais que ocuparam toda a segunda metade do mesmo, tendo feito experimentar novas formas de crueldade;

- Uma frase da carta que a Irmã Lúcia escreveu ao Santo Padre no dia 12 de Maio de 1982: «A terceira parte do “segredo” refere-se às palavras de Nossa Senhora: “Se não, [a Rússia] espalhará os seus erros pelo mundo promovendo guerras e perseguições à Igreja. Os bons serão martirizados, o Santo Padre terá muito que sofrer, várias nações serão aniquiladas”»;

-  Não existe um destino imutável, [dado] que a fé e a oração são forças que podem influir na história e que, em última análise, a oração é mais forte que as balas, a fé mais poderosa que os exércitos;

- A conclusão do «segredo» lembra imagens, que Lúcia pode ter visto em livros de piedade e cujo conteúdo deriva de antigas intuições de fé;

- A visão da terceira parte do «segredo», tão angustiante ao início, termina numa imagem de esperança: nenhum sofrimento é vão e, precisamente uma Igreja sofredora, uma Igreja dos mártires, torna-se sinal indicador para o homem na sua busca de Deus. Não se trata apenas de ver os que sofrem acolhidos na mão amorosa de Deus como Lázaro, que encontrou a grande consolação e misteriosamente representa Cristo, que por nós Se quis fazer o pobre Lázaro; mas há algo mais: do sofrimento das testemunhas deriva uma força de purificação e renovamento, porque é a actualização do próprio sofrimento de Cristo e transmite ao tempo presente a sua eficácia salvífica;

- PERGUNTA: O que significa o «segredo» de Fátima?

– RESPOSTA: Os acontecimentos a que faz referência a terceira parte do “segredo” de Fátima parece pertencerem já ao passado»; quem estava à espera de impressionantes revelações apocalípticas sobre o fim do mundo ou sobre o futuro desenrolar da história, deve ficar desiludido; o que permanece é a exortação à oração como caminho para a «salvação das almas» e, no mesmo sentido, o apelo à penitência e à conversão; desde que Deus passou a ter um coração humano e deste modo orientou a liberdade do homem para o bem, para Deus, a liberdade para o mal deixou de ter a última palavra.

 * * *

 Eis o que Joseph Card. Ratzinger, então Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, afirmava em 2000 (documento não datado) no seu Comentário Teológico especial e que pode ser lido integralmente em

http://www.universocatolico.com.br/index.php?/texto-original-do-terceiro-segredo-de-fatima-comentado-por-bento-xvi.html

e que eu aqui resumi por transcrições sucessivas numa selecção que, espero bem, não lhe tenha deturpado o sentido.

Parece-me que o então futuro Papa Bento XVI tratava Fátima com algum racionalismo académico, especialmente erudito, afastando-se do fervor típico da fé popular que tem aquele santuário como «oráculo mariano».

Mas isto é apenas o que me parece…

 

Novembro de 2018

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Henrique Salles da Fonseca

(2015, à porta do Seminário de Rachol, Goa)

VIA CRUCIS – O CAMINHAR DA PESSOA CONSCIENTE – 7

 

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  1. Jesus é despojado de suas vestes

 

Jesus confessa: “O Filho do Homem será entregue aos seres humanos”. Os discípulos não entendiam o significado daquelas palavras (Lc 9,44s).

Os soldados roubaram-lhe a roupa mas embora ladrões, foram justos, à maneira mundana, no repartir entre eles a roupa (Jo 19,23-24). Roubaram-lhe a dignidade humana, a ética e agora fazem negócio com os seus restos.

 

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  1. Jesus foi pregado na cruz

 

No alto do monte, lá onde as ideias e as palavras se cruzam em sequências lógicas, Jesus é pregado na cruz e em nome da lei. Aquele Jesus queria levar tudo conscientemente até ao fim recusando mesmo o mórfio.

No contemplar da cruz, a inteligência e os sentimentos escurecem até à mudez. Jesus encontra-se sozinho e a sós com o Pai.” Meu Deus, meu Deus, por que me desamparaste?” (Sl 22,2).

 

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  1. Jesus morre na cruz

 

Mais forte que a morte é o amor. Crucificaram-no “à terceira hora … e à hora nona (15h00) morreu” (Lc 15.44). Jesus não morreu para apaziguar o medo daqueles que têm medo de Deus… Jesus morreu como viveu, dando testemunho do Homem livre e comprometido com o Homem, perdoando sempre (Lc.23,34). "Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito" (Lc 23,46).

 

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  1. Jesus é descido da cruz

 

Jesus morre abandonado dos seus e um estranho vem descê-lo da cruz. Já antes um samaritano (Lk 10,30-37), um estrangeiro cuida do homem roubado, não o padre, nem o doutor da lei. José de Arimateia- um homem honrado que esperava pela vida do messias, cheio de compaixão arranjou um lugar para colocar o corpo de Jesus, doutro modo teria sido colocado na vala comum dos crucificados… José tirou-o da cruz e envolveu-o num manto (Mk 15,42 – 46). Em torno da morte de Jesus também havia justos como este José (Lc 23,51).

 

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  1. O Corpo de Jesus é colocado no sepulcro

 

Deus não é um Deus dos mortos mas dos vivos (Mc.12,26s), por isso tem de ser procurado entre os vivos. A José junta-se Nicodemos que trouxe mirra e aloés para ungir o Senhor. Depois o sepulcro encontra-se vazio; Jesus adiantou-se, “o túmulo se esvaziará tal como o meu, um dia, se esvaziará”!

 

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  1. Deus despertou Jesus!

 

Teresa de Lisieux dizia, “não olheis para a cruz! Olhai para o crucificado!” Nele Deus continua a história de cada um de nós. Não procureis entre os mortos quem vive, Ele ressuscitou. O nosso Deus não é um Deus do destino, ele é um Deus da relação, um Deus que se trata com denominativos como: paizinho, mãezinha… Se Jesus tivesse morrido a revolução não teria sentido porque permaneceria abandonada à violência em sequências de ritos e rituais repetitivos através da História. Assim permanece um paradigma da vida e de relação de pessoas, da humanidade que é uma família divina a querer encontrar-se e a erguer-se para se encontrar de olhos nos olhos.

 

A cruz demonstra o Homem sofre devido à sua própria imagem e às ideias que o prendem.

 

Muitos cristãos costumam meditar em frente ao crucifixo. A melhor experiência que se pode ter ao meditar será sentir como Jesus desce da cruz e se vem colocar no coração, como desce para o meio da comunidade.

 

Nas sombras das asas do Senhor (PS 63,1-9), nas sombras do seu caminho minha alma se refresca da sede que tem de ti!

 

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António da Cunha Duarte Justo

Teólogo e pedagogo

VIA CRUCIS – O CAMINHAR DA PESSOA CONSCIENTE – 6

 

 

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  1. Jesus encontra as mulheres chorosas de Jerusalém

As mulheres choravam como se tratasse de uma caso de luto. Jesus que bem percebia o engano das pessoas que o seguiam e que não entendiam realmente o que se estava a passar. Então Jesus vendo que mortos choram os mortos, quebrou o silêncio e disse: “Filhas de Jerusalém, não choreis por mim, chorai por vós e pelos vossos filhos! " Sim, Jesus previa aqui que muitos dos seus seguidores não entenderam que o que estava a acontecer era vida, e que apenas conseguiam ver o que se encontra sob as mortalhas (Lc 23,27-31); Jesus pressentia que as estruturas que ele criticara e revogara continuariam a subsistir sem que as pessoas tivessem um olhar de olhos nos olhos como o de Maria e Jesus, uma experiência vivência que eleva o Homem para Filho de Deus; elas entendiam muito de sentimentos, ideias, de leis e moral permanecendo prisioneiras delas sem assumirem a vida divina, a vida da cruz que cada filho de Deus é chamado a levar; não, os mortos são os que choram aquele que está bem vivo e aguenta com a dor sem a projectar em ninguém. Jesus via através das lágrimas aquilo que as motivava e ao constatar a comédia que a vida organiza não aguentou mais … e quebrou com o seu silêncio. As lágrimas não seriam em vão se no outro dia as pessoas fossem diferentes… Jesus quebrou o silêncio ante tanta falta de entendimento.

 

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  1. Jesus cai pela terceira vez sob o peso da cruz

Se Jesus tivesse ficado na Galileia como muitos outros, como fazem aqueles que procuram o sucesso da vida, nada disto teria acontecido e o mundo continuaria na mesma, prisioneiro de ideias a viver ideais, longe da vida; se não tivesse levado tão a sério o seu Pai, se tivesse sido mais diplomático e hipócrita como todos nós, o sofrimento seria um pouco anestesiado pelo dia-a-dia. Em última análise Jesus é que foi o culpado por querer afirmar no mundo uma nova consciência de ser humano; uma consciência de homem livre e sem medo, liberta de opiniões e outras sujeições. Ele é culpado por ter ousado querer fazer de cada um de nós o caminho a verdade e a vida e não apenas espectadores e seguidores de seja quem for.

 

Jesus superou as medidas do bom pensar e do bom sentir. É abandonado dos homens bem pensantes que se sentem obrigados a controlar e determinar o que é bom e o que é mau, o que é verdadeiro e falso. Sob a verdade destes homens sofre a Verdade que é vida e contacto directo com Deus. (Imaginem que alguém se distanciasse das escolas de ensino, da estruturas religiosas e políticas, das opiniões dominantes, seria deitado ao ostracismo tal como Jesus o foi. A malta quer é teatro para aplaudir ou condenar para seguir as práticas e as regras do jogo que se destinam a manter a hipocrisia, o domínio e as vaidades; imaginemo-nos que nos encontraríamos com Jesus de cara a cara de olhos nos olhos; isso não pode acontecer porque teríamos de nos tornar nus para não cairmos no equívoco de pensarmos que nos encontramos com o outro quando na realidade nos encontramos com a ideia que fazemos dele, presos que andamos nos argumentos, do cálculo, da insensatez numa tática de vida a meias entre proveito e ânsia de vaidade,

 

Entendiam que Jesus deveria reagir à sua maneira, uma maneira dialética e polar do que é bom e mau pensar. De todos abandonado sem braços acolhedores, nem seio de mãe que o acolha fica entregue à liberdade dos braços de Deus. Dois criminosos a seu lado Lc 23,32

 

(continua)

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 António da Cunha Duarte Justo

Teólogo e pedagogo

VIA CRUCIS – O CAMINHAR DA PESSOA CONSCIENTE – 5

 

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  1. Simão de Cirene ajuda Jesus a levar a cruz

Os soldados têm pressa e colocam a cruz aos ombros de um homem de fora, um homem da margem que viu pela primeira vez Jesus. Um homem de fora, que se encontrava ali por curiosidade, ajuda Jesus a transportar a cruz (Lc 23,26). Que terá levado Simão a observar a via crucis de Jesus? Ele sentiu-se levado por aquela força que nos leva a assistir quem precisa no momento oportuno. Simão são muitos, são a multidão que ajuda de fora sem perceber o que realmente está a acontecer.

 

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  1. Verónica chega a Jesus o sudário para limpar o rosto

A Verónica, numa reacção espontânea, limpou o suor do rosta de Jesus, como refere a legenda do séc. 12. Verónica aquela mulher já preparada pela vida para a encarar de rosto no rosto, desejava que as dores e o suor não escondessem o rosto do Senhor. Na visibilidade do verdadeiro rosto de Jesus que se marca no lenço encontra-se a intenção de mostrar que, no que acontece no calvário, se esconde um verdadeiro rosto que é vivo e vivificante; as pessoas não devem continuar do lado de cá da vida fixadas a ver as marcas do caminho... Jesus tem um rosto que nos olha. Na sua cara cada um de nós tem a oportunidade de reconhecer e ganhar um rosto.

 

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  1. Jesus cai pela segunda vez

Encontramo-nos num mudo levedado pelo poder dualista de fariseus e Heródes que vivem de súbditos e dependentes; sistemas democráticos ou não democráticos tendem em manter o povo a olhar de baixo para cima e à procura do pão. A Tora, a lei encontra sempre um motivo para colocar alguém debaixo da cruz.

 

Os amigos assistem ao acontecimento de longe. Não querem ser identificados como seguidores de um condenado. Não entenderam nada de Cristo, encontravam-se como que aturdidos sob as enxurradas de ideias que lhes passavam pela cabeça. As ideias substituem o sentir e a empatia com Jesus; de Jesus tinham ouvido muita coisa que lhes ficara na cabeça e nos lábios mas não tinha passado da barreira do entendimento para o coração, para acção. Não entenderam nada, ficando a girar no intelecto como o hamster a pedalar no seu criceto.

 

(continua)

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António da Cunha Duarte Justo

Teólogo e pedagogo

VIA CRUCIS – O CAMINHAR DA PESSOA CONSCIENTE – 4

 

 

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  1. Jesus cai sob o peso da cruz

 

Ninguém podia entender o núcleo da sua boa nova onde não há as instituições da violência e da repressão. Jesus tinha ferido profundamente a religiosidade popular e institucional do povo ao criticar a instituição e as práticas religiosas e ao afirmar a Boa-nova da alegria que não culpabiliza ninguém e deste modo desmascara os cães de guarda de Deus e do Estado. A crença e a lei constituíam elementos impeditivos de uma relação mais directa com Deus e com o povo. O JC anuncia uma metanóia para a liberdade e insujeição mostrando com a sua vida o preço da liberdade. As instituições querem, muitas vezes, um Deus grande, um Estado grande à custa da humanidade e do povo; Jesus Cristo convida a não nos orientarmos tanto por regras e moralismos mas para através da relação com o interior divino… Jesus traz uma mensagem de alegria e não de tristeza. Ele quer as pessoas libertas do jugo do medo, por isso apela à mudança porque toda a vida é processo e transformação, não algo meramente estático fixado em lei ou normas que nos distraem do essencial: a relação pessoal e interpessoal. Jesus acaba com o pensamento em branco e preto, em termo de certo ou de errado; para Ele basta a fé, a experiência de amor que salva (Mc 5,13).

 

 

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  1. O encontro de Jesus com Maria

 

 

A mãe lá está, bem à margem do caminho, sofrendo no silêncio o mau caminho do seu povo. A mãe pensa como o filho e sente como mãe, por isso não fala, fica em silêncio (Há momentos em que só o silêncio pode falar, a conversa torna-se em barulho de altifalantes pensantes ensurdecedores: um falar para não ouvir a voz do coração, o outro a falar em nós).

 

Não são homens que batem, são as fardas dos soldados que chicoteiam o inocente em nome da ordem e da instituição.

 

O encontro de Maria realiza-se, sem falas, de coração para coração numa troca de olhares porque a verdadeira vida não é experimentável no mundo das ideias e das palavras. No brilhar das lágrimas dolorosos que saem do encontro de seus olhos sai uma luz, uma experiência diferente da vida ordenada e secular. Naquele olhar brilha o dia de Páscoa, aquele Dia em que é sempre dia sem adormecer e em que a dor não estorva. No encontro verdadeiro não há palavras porque estas só distraem da profunda vivência que só é possível no encontro de rosto com rosto.

 

Para chegar à luz da experiência daquele encontro houve o caminho solitário no silêncio da dor que liberta; no mesmo caminho da fé se encontram mãe e filho na consciência de que o caminho da fé é diferente porque leva ao encontro que chega até a abstrair da razão para chegar a “compreender” numa vivência de que tudo se encontra unido e não separado. No momento do encontro a mãe percebeu a dureza das palavras que o filho lhe dissera quando a evitou (colocando a coisa de Deus acima das coisas familiares e lhe disse “não sabias que me devo ocupar das coisas de meu Pai?” Lc 2,49 s); naquela trocar de olhares de mãe e filho a mãe compreendeu novamente que o caminho de Deus não contempla a amarra de laços sanguíneos; no encontro Maria viu que seu filho sempre teve razão, porque empenhado na libertação das pessoas olhando cada uma de olhos nos olhos, não se podendo por isso deixar perder em nenhuma delas, por mais amável que fosse; no encontro de olhos nos olhos ateia-se um novo fogo, o fogo do amor que torna tudo presença. Naquele encontro se realiza a metanóia (para lá do pensamento) que exige um repensar da normalidade que nos prende e cativa; neste olhar se realiza a maternidade de uma mãe que se alegra nos crentes e incrédulos. No encontro dá-se uma fecundação que gera nova realidade.

 

(continua)

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António da Cunha Duarte Justo

Teólogo e pedagogo

VIA CRUCIS – O CAMINHAR DA PESSOA CONSCIENTE – 3

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  1. Jesus toma a cruz aos ombros

 

Depois do encontro com as autoridades Jesus pegou na cruz aos ombros, não uma cruz culpabilizante nem justificadora; era a cruz da vida e dos males acumulados pela história da vida…. Foi então desprezado pela multidão do povo, porque também este só repete o que os chefes pensam, dizem e mandam… O povo fraco, geralmente coloca-se ao lado dos fortes, numa reacção compensatória da própria impotência. Mas Jesus não vinha para os fortes da sociedade nem para os que tinham adquirido o mérito de bons à custa da objectivação do que é sujeito, do inobjectivável…

 

Os dirigentes e o povo não aceitam reconhecer em Jesus as próprias feridas porque inconscientemente sabem que se tivessem a nobreza de alma de Jesus teriam de questionar a vida leviana a que foram acostumados e em que investiram…

 

Os soldados vendam-lhe o rosto, para lhe poderem bater; estão habituados a não encarar a vida de rosto no rosto; contentam-se com viver uma vida em segunda mão, uma vida de outros que é a negação da vida. Jesus, na tradição do servo de Deus (Is 53,33 s) suporta os pecados dos outros.

 

Não o querem na cidade, querem-no extramuros; numa reacção inconsciente querem-no nos caminhos fora dela onde se encontram os excluídos da sociedade (esquecem porém que lá é que se encontra Deus a incluir toda a humanidade). Ao colocá-lo fora dos muros fizeram inconscientemente como manda o dia-a-dia da normalidade… Carregam-no com as traves (uma símbolo da horizontalidade a outra da verticalidade; Jesus leva o mundo às costas no que ele tem de pesado; transporta o peso da própria cruz não o deixando para os outros; com uma consciência superior assume também os males dos outros.

 

Querem-no fora porque, no seu entendimento, um Messias teria de andar pelos seus caminhos e seguir a obrigação de perfeccionismos e de virtude passadas a ferro pela sociedade, teria de seguir a ordem social e familiar como qualquer outro… Nem tão-pouco os amigos aguentam a realidade de um homem adulto que encara a vida de frente sem culpar ninguém. Eles querem Deus, à sua maneira, pelo que Jesus terá de ir morrer como o enforcado fora do povoado e, longe dos homens e de Deus; Jesus porém segue o caminho sempre em frente em silêncio; ele sabe que na mentalidade do povo um condenado pela lei é considerado um amaldiçoado de Deus (Dtn 21,23).

 

Deus permite tudo isto porque assim mostra que uma vida vivida só orientada pela lei é destrutiva, individual e institucionalmente… Jesus encontrava-se repleto de Deus e mostrava, no seu andar, quão diferentes são os caminhos da Verdade em comparação com os caminhos da normalidade de povo, governantes, religiosos e políticos. Como se mantêm prisioneiros de uma visão dualista da vida pensam que Deus se vingou em Jesus como se Ele fora um amaldiçoado de Deus.

 

Não, aqui não se trata de castigo; aqui está em jogo o assumir de uma nova consciência, de uma nova maneira de ser e estar no mundo que integra o mundo todo em si. No calvário não se trata de realizar uma pena devida à humanidade; Deus não é nenhum justiceiro como o quereria a mentalidade dualista e instrumentalizadora de quem nos governa. Deus não precisa de resgate… Ele caminha connosco, contigo e comigo, de maneira inclusiva e amorosa, assumindo também o sofrimento, numa reacção positiva à vida.

 

(continua)

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António da Cunha Duarte Justo

Teólogo e pedagogo

VIA CRUCIS – O CAMINHAR DA PESSOA CONSCIENTE – 2

 

VIA SACRA

 

Na seguinte texto vou reflectir um pouco no sentido da espiritualidade da via crucis. Inicialmente meditava-se sobre as 8 estações do calvário referidas nos evangelhos; posteriormente mais ampliadas.

 

A semana santa, tal como a cruz do calvário, são vias de espiritualidade. Na observação da cruz não se trata de fomentar um sentimento masoquista mas de se descobrir o Cristo que é salvação e afirmação da vida alegre, independentemente do caminho-cruz. Jesus é o companheiro de vida que ajuda a integrar os opostos e as incongruências no de correr da vida.

 

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  1. Jesus é condenado à morte

 

Ao ser condenado à morte, Jesus não abre a boca; ele sabe que perante quem se arma em juiz não há argumento profundo porque o juiz segue uma visão dualística que não permite um diálogo ao nível de sujeito para sujeito (de carácter inclusivo).

 

Em todo o interrogatório das autoridades romanas e do sinédrio Jesus apenas responde a Pilatos dizendo que é o „testemunho da verdade”). Pilatos pergunta “o que é a verdade?”. Jesus não responde certamente porque sabia que Pilatos, não entenderia uma resposta que desse porque só a equacionaria no sentido do discurso de direito (racional, na tradicional mentalidade exclusiva do ou… ou); este discurso não conhece pessoas nem relação, apenas conhecem objectos e interesses, prémio ou castigo.

 

Jesus dos interesses que se juntam em torno dos juízes, do direito da política e da religião, muitas vezes à custa da relação humana e de uma verdade mais profunda. A verdade é processo e, a nível real-místico, só se encontra na relação pessoal, na inter-relação do eu e do tu com o nós.

 

O caminho do calvário é a resposta do silêncio a uma sociedade empedernida, incapaz de compreender o que é a Verdade dado esta ser relação e nunca uma abstracção intelectual a serviço deste ou daquele poder. Por tudo isto Jesus emudeceu! Só tinha a hipótese de calar, mesmo perante a boa vontade de Pilatos que perguntava num cenário de mentalidade dualista do poder, a mentalidade ordinária do dia-a-dia; uma resposta a nível de justiça só poderia contribuir para o barulho e confusão de que a lei vive.

 

(continua)

 

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 António da Cunha Duarte Justo

Teólogo e pedagogo

VIA CRUCIS – O CAMINHAR DA PESSOA CONSCIENTE – 1

 

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O Homem sofre devido à sua própria imagem e às ideias que o prendem

 

Jesus, no seu caminhar, revela-se não só como médio (união com Deus) mas também como mensagem (caminho, verdade e vida). O segredo da via crucis está em superar a dor sem a transmitir a outros, uma vida sem a necessidade de bodes expiatórios, uma existência como processo de transcendência e inclusão. Deste modo Jesus quebrou com a prática comum da cadeia da violência. Com o exemplo do calvário inicia-se assim uma nova idade, a idade da paz. Esta perdeu-se pelo caminho encontrando-se soterrada sob a folhagem da história. As estruturas do poder realizaram porém uma regressão à maneira antiga do exercício do poder como violência e a repressão.

 

Nele encontra-se um modelo de vida para lá dos habituais dualismos, racionalismos ou morais; a dimensão da sua actividade não se perde nos meandros de explicações porque a dimensão da sua actividade é a fé, a relação interpessoal, a relação mística, a única que implica transformação profunda.

 

Jesus mostrou o absurdo da imagem de um Deus vingativo, violento e mesquinho, que a sociedade civil e religiosa usa muitas vezes para melhor legitimar o seu poder e a sua violência. Deus não precisa de vítimas nem de sacrifício. Jesus ao assumir a qualidade de vítima desmascara a violência e torna supérfluo o recurso à vítima que amarra a alma humana quando Jesus lhe deu asas para voar. Nele se revela a possibilidade de nos mudarmos. Em Jesus Cristo, Deus revela-se o misericordioso que deslegitima qualquer violência (Mt 9,13; 1Cor13,3.13); o JC, ao assumir o ser de vítima, acabou com todos os sacrifícios e questionou a realidade do dia-a-dia baseada numa mentalidade que se movimenta entre o crime e o castigo, o criminoso e a vítima. Jesus acaba com a violência como meio de resolver os problemas; revela a fragilidade e maldade de uma vida e de um poder baseados numa mentalidade dual-polar legalista (que menoriza a realidade a: de um lado o bem e do outro o mal!).

 

Numa visão, verdadeiramente cristã, a realidade não é bipolar; ela implica uma terceira dimensão integrante inclusiva e integrante da vida na fórmula trinitária. À dimensão polar acrescenta-se uma outra dimensão: a dimensão da liberdade, da graça e do amor: o contrário da polaridade da obediência, do espírito legalista e justiceiro.

 

No JC todas as contas estão saldadas e em vez da teoria ou da moral inicia-se um novo reino que é encontro, relação directa com Deus (o tal Reino de Deus). O caminho do calvário é tão largo que leva nele vencedores e vencidos, maiores ou menores pecadores, acabando com a concorrência e com o prémio e o castigo; a cruz só conhece vencedores porque a sua força impulsionadora é a misericórdia e o amor. A via-sacra (caminho da cruz) acaba com o ciclo circulatório da violência (poder) e da repressão (Rom 12,21), supera também uma visão intelectualista redutora da vida. Já Platão dizia: "Podemos facilmente perdoar uma criança que tem medo do escuro; a real tragédia da vida é quando os homens têm medo da luz."

 

O sofrimento assumido torna-se no método alternativo, o único capaz de fomentar saúde e salvação, o único capaz de libertar do sofrimento provindo das próprias imagens. O caminho da cruz é um outro modo de perceber as coisas, uma solidariedade sem limites nem extremos e, como tal, não responde a um mal com outro mal; de facto também o mau é vítima do mal. A via crucis é a alternativa à história humana em que a violência se alterna em nome de ideais e a pretexto da revolução. O único verdadeiro revolucionário da História é Jesus mas a sua revolução só se encontra activa em diferentes biótopos sociais que integram a doutrina com a mística (conventos, crentes e grupos que procuram concretizar na sua vida a realidade do JC).

 

(continua)

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António da Cunha Duarte Justo

Teólogo e pedagogo

MAOMÉ PROFETA EM MECA E GUERREIRO EM MEDINA

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Uma Solução para o Futuro: Identificar os dois Rostos do Corão

 

Para tentar resolver o conflito inerente ao Corão (1) e às Hadith (1) e possibilitar a sua interpretação pacífica no Islão, peritos da religião muçulmana defendem que será indispensável conhecer e reconhecer os dois rostos de Maomé: o do seu período de profeta e o do seu período de guerreiro (chefe de estado), ambos incluídos no Corão. Só assim se poderá ordenar e compreender as revelações ocasionadas pelo arcanjo Gabriel que Maomé teve durante 23 anos e que se dividem nas suras de Meca e nas suras de Medina. Em Meca, Maomé acreditava poder convencer as tribos árabes que praticavam o politeísmo em torno da Caaba e poder reuni-las sob a religião do seu livro em elaboração para o povo Árabe, um livro à semelhança da Bíblia do povo judeu e do povo cristão. Os mequenses não aceitaram a sua mensagem, obrigando-o a abandonar Meca com os seus sequazes. Depois da Hégira para Medina, (Hégira = fuga de Maomé de Meca para Medina, que marca o início (622) do calendário islâmico). Em Medina, Maomé organizou-se como homem de Estado conseguindo subjugar Meca e alargar o islão. Serve-se das revelações de Medina para vincular no Corão a união de Estado e Religião. Esta estratégia revelou-se muito profícua para a época, contribuindo para a expansão do Islão em períodos posteriores.

 

Os Conteúdos das Suras do Corão nas Épocas de Meca e de Medina

 

O Corão é formado por Suras/versos que se dividem em revelações do tempo de Meca e em revelações do tempo de Medina. As suras de Meca eram curtas e dirigidas principalmente aos mequenses; as suras de Medina eram longas e dirigidas principalmente aos habitantes de Medina. Há critérios que os imames usam para distinguir umas das outras. As de Meca ocupam-se com a reverência, o temor de Deus, o castigo de Deus para os pecadores, as provas da existência de Deus, a vida depois da morte, as histórias de Maomé e eventos de gerações passadas e as suras de Medina tratam das normas da sharia, direito civil e de culto, de assuntos de governo/estado, da adesão ao Corão e da luta por Alá (jihad) e da lida com a guerra e seus despojos.

 

Segundo a análise da maioria dos estudiosos muçulmanos as suras de Medina são as seguintes: 2, 3, 4, 5, 8, 9, 24, 33, 47, 48, 49, 57, 58, 59, 60, 62, 63, 65, 66, 110. As restantes 82 suras são as revelações de Meca com excepção de 9:42 revelada em Tabuk e de 43:42, revelada em Jerusalém. Quanto às suras 1, 13, 55, 61, 64, 83, 97, 98, 99, 112, 113, 114 os peritos do Islão não estão certos se são suras das revelações de Meca ou de Medina.

 

O conteúdo entre as suras (revelações) de uma época e da outra são tão contraditórias que literatos chegam a afirmar que Deus mudou de opinião.

 

O antigo imame e professor de história islâmica da Universidade do Cairo Al-Azhar, no seu livro “Islam and Terrorism” adverte, sob o pseudónimo Mark A. Gabriel, que os imames recebem instruções para, na apresentação do Corão, darem mais relevo às suras de Maomé como guerreiro (as suras de Medina).

 

O Islão com a sua reivindicação de validade universal atrai intolerância fomentando a radicalidade dentro da comunidade islâmica em relação aos de fora do islão e, como reacção, a intolerância dos de fora em relação ao Islão. O perito em estudos islâmicos DR. Abdel-Hakim Ourghi apela aos muçulmanos para não esconderem os aspectos violentos de Maomé (Corão). Segundo refere ele, no Bonner General-Anzeiger, Maomé podia ser considerado profeta fundador de uma religião na sua fase de Meca, entre 610 e 622. "Após a sua emigração de Meca para Medina, temos a ver com um estadista que repetidamente tomou medidas violentas contra outras religiões, contra judeus e cristãos".

 

De facto, o Corão e a Sharia precisam de ser submetidos a uma análise histórico-crítica para possibilitar nele um rosto mais pacífico, a valorização do indivíduo e o reconhecimento do próximo (não muçulmano) como ser com igual dignidade. Uma cultura que subjugue o indivíduo e não reconheça a igualdade da dignidade de homem e mulher, está condenada a ficar presa em estruturas sociológicas do passado, tendo de empregar a violência ad intra et ad extra para poder subsistir. Tudo o que não serve o Homem e a Humanidade tornar-se-á supérfluo. O desenvolvimento e a excelência de uma sociedade pode ser comprovado através da maneira como tratam a mulher e o indivíduo.

 

O mundo islâmico, principalmente através de emigração de seus fiéis em massa para a Europa, experimenta um choque de culturas, que vai, pouco a pouco, provocando, no seu meio, a autorreflexão do Islão e o surgir de pessoas como o DR. Ourghi que conseguem elevar a discussão do Corão e da Sharia a um nível filosófico, antropológico e sociológico abertos. Muitos estudiosos do Islão na Europa procuram ultrapassar uma interpretação, até agora limitada à jurisprudência e à história, para possibilitarem a criação de uma ciência teológica no sentido de iniciarem uma teologia muçulmana baseada numa abordagem científica histórico-crítica possibilitadora do seu desenvolvimento no sentido de um Islão com um novo rosto adaptado à realidade circundante e ao tempo e que possibilite uma imagem de Deus/Alá não só ligado a uma cultura mas aberto à globalidade e à multiplicidade das culturas. Para o cientista islâmico DR. Ourghi, uma renovação só poderá ser conseguida "quando o Islão não se compreender como comunidade militante que luta pelo domínio sobre todo o mundo" como apregoam as revelações e os ditos de Maomé de Medina.

 

O permanecer na insistência e alegação de o Islão ser o possuidor e senhor da verdade universal, (e até legitimar com ela a violência contra outras crenças) além de fomentar a intolerância, dá perenidade à perseguição e à guerrilha islâmica impedindo um diálogo aberto e não fingido com outras religiões. De facto, a grande maioria dos peritos e representantes do Islão entrincheiram-se em citações de lindas e poéticas revelações do Corão, calando a verdadeira realidade de uma estratégia baseada no Maomé de Medina. A secundar esta ideia está a prática islâmica de que uma mentira em benefício do Islão é considerada uma verdade ao serviço de Alá.

 

O muçulmano Ourghi critica também a hipocrisia reinante em sociedades islâmicas, atestando de moral dupla estados que têm o Islão como religião de estado, dizendo: “O 'Islão cruel' e a Sharia são válidos apenas para a população pobre, os dominantes não se comportam segundo o Islão.

 

No terceiro „Phil.Cologne“ da cidade de Bona na Alemanha, Ourghi também se expressou criticamente, sobre os organismos de tutela muçulmana na Alemanha. Segundo testemunhou as organizações coordenadoras dos diferentes grupos islâmicos, tal como a União Turco-Islâmica, são controladas por órgãos governamentais dos países de origem.

 

De facto, tabém isto constitui um grande problema porque impede a capacidade de integração de muçulmanos noutros países que se sentem obrigados a terem de se afirmar em contraposição às culturas de acolhimento. A abundância de dinheiro concedida por países islâmicos e magnates para a construção de mesquitas e instituições fomentadoras do islão no estrangeiro torna os países de acolhimento cegos na concessão de direitos para tais planos. Catar e a Arábia Saudita investem centenas de milhões na implantação do islão mais radical na Europa.

 

A ambivalência de Maomé de ser profeta para os de dentro e guerrilheiro para os de fora, possibilitou-lhe a conquista e consequente construção de um grande império muçulmano, vendo-se este hoje obrigado a procurar as melhores suras do Corão para demonstrar o seu espírito pacífico. Esta estratégia torna-se ineficiente num tempo em que cada pessoa passa a ter acesso à formação, à informação e à cultura. A evolução dos povos e das armas de combate na disputa entre religiões e culturas já não é a mesma que no passado, o que pressupõe uma mudança de estratégia. A expansão do Islão no mundo ocidental revelar-se-á como precário dado combater o saber global e, de momento, contar apenas com o apoio de forças políticas e económicas europeias que se vêem obrigadas a engolir cobras e lagartos para poderem captar o capital árabe, mas, numa outra conjuntura, facilmente mudarão de estratégia. As resoluções da Cimeira G7, na sua decisão de até ao fim do século reduzir as energias fósseis determinarão o total enfraquecimento económico dos países produtores de petróleo e de carvão.

 

Em tempos de globalização, manter-se preso no tempo e na cultura árabe impossibilita o desenvolvimento e a adaptação ao Homem e ao tempo; a cultura árabe, para poder acompanhar a mudança de paradigma da sociedade ocidental terá de submeter a sua religião a um aferimento científico que a torne capaz de dar resposta ao desenvolvimento do cidadão e poder viabilizar o seu contributo indispensável para a sociedade ocidental que precisa urgentemente de correcções que a civilização árabe poderia ajudar a efectivar.

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António da Cunha Duarte Justo

Teólogo

QUARESMA

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Acabou o Carnaval, uma parte bela da vida dedicada mais ao exterior, para se seguir uma outra parte, também bela, que é a vida interior. Com a quarta-feira de cinzas começa a Quaresma (quarenta dias antes da Páscoa) em que cristãos e muitos não cristãos procuram dedicar espaço também para o jejum e abstinência. Quaresma é, para os cristãos, um tempo de purificação em que se participa na entrega e sofrimento da vida de Jesus, para preparar em si mesmo a realização da Páscoa. Trata-se de superar a rotina da vida para possibilitar a experiência da vida interior. Com o jejum adquire-se maior sensibilidade e maior presença de espírito nas relações humanas e espirituais.

 

Segundo a tradição, o jejum e abstinência implicam uma tríade: jejuar, rezar e dar esmolas. Tudo isso deve acontecer no silêncio e discrição para se não alimentar a ambição nem o narcisismo; isto tem como finalidade purificar a pessoa de maneira que se torne mais aberta e sensível para o próximo e para Deus, para o corpo e para a alma.

 

Há várias formas de jejum, entre elas, renúncia a tabaco, álcool, dispensa de doces, jejum do telemóvel, do querer levar a sua avante, etc. Deste modo fortifica-se também a vontade e ajuda-se a suportar a frustração. As satisfações exteriores diminuem-se um pouco para beneficiar as interiores. Tem-se o benefício de se sentir um tempo, uma pausa do habitual aparentemente inútil e sem um objectivo concreto. Isto possibilita a vivência de experiências diferentes das habituais e dá oportunidade à criatividade e à intuição.

 

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António da Cunha Duarte Justo

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