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A bem da Nação

Recordando tempos do Colégio Militar

"Sobre o ensino da Filosofia

Eu tive um fabuloso professor de Filosofia. Foi o professor Edmundo Curvelo, no Colégio Militar, em 1946, por ocasião de uma muito curiosa experiência que vale a pena recordar. Havia, na altura, no então chamado ensino liceal, um exame no 6º ano (10º ano de escolaridade). O Ministério da Educação resolveu passar este exame para o 5º ano, mas não o quiz fazer sem antes realizar uma experiência pedagógica. Ou porque lhe era dificil faze-la numa escola dependente do Ministério, ou porque, simplesmente, a não sabia fazer, combinou com o Ministério da Guerra (antecessor do actual Ministério da Defesa) que a experiência fosse feita no Colégio Militar que dele dependia. O Ministério da Guerra, que não estava propriamente vocacionado para fazer experiências pedagógicas do ensino secundário, deu liberdade total aos professores do Colégio Militar para escolherem as disciplinas com os conteudos, programas, métodos de avaliação e exames que muito bem entendessem. É assim que eu não tenho o curso do liceu, mas sim o curso do Colégio Militar, reconhecido como equivalente pelo Ministério da Educação.

O professor Edmundo Curvelo já tinha sido meu professor de História, disciplina em que não tinha adoptado nenhum livro. Em vez disso, convenceu o Director a abrir aos alunos a biblioteca do Colégio Militar onde até à data não tinham acesso. Também não seguiu, que eu tenha notado, qualquer programa. Distribuia-nos temas que preparavamos e, depois, eramos nós que davamos as aulas (nalguns casos em francês). A Filosofia ensinada no Liceu tinha, na altura, quatro componentes: a Psicologia, a Lógica, a Estética e a Ética/Moral. Quando o professor Curvelo viu que não tinha de preparar os seus alunos para o exame oficial do 7º ano, pos imediatamente de lado a Estética e a Ética . Não falou do nome de nenhum antigo filosofo e interessou-se, sobretudo, pela Psicologia, em que só nos falou de duas coisas: das sensações e a da memória. Ensinou-nos a olhar para as nossas sensações e para a nossa memória e apaixonou-nos. E, como estava encarregue de organizar o Laboratório de Psicotecnologia do Colégio Militar, responsabilizou um aluno por cada aparelho de medida.

Passados todos estes anos, se escrevo artigos sobre a Educação é porque tive como professor o professor Edmundo Curvelo. As minhas reflexões pedagógicas e "filosóficas" são muitas vezes "diálogos" que imagino com ele, em que faço perguntas e tento imaginar como responderia. Por exemplo: eu digo: " Com a minha experiência de professor e lembrando-me das suas aulas, acho que o ensino da Filosofia, no início, só deve ter três componentes: as sensações, a memória e a inteligência, em que os jovens sejam ensinados a olhar para as suas sensações, para a sua memória e para a sua inteligência. Porque é que o professor, nas suas aulas, não falou da terceira componente?". Penso que ele responderia qualquer coisa do género: " Porque era prematuro. Olhar para a própria inteligência e para a dos outros não é facil. É algo que se deve aprender na Universidade e nem sempre se consegue (como sabe, eu fui depois ensinar na Faculdade de Letras)". Eu diria: " Agora, quando leio um texto fundamental do Einstein, ou de algum outro grande físico, já não me interesso pela Física. O que me interessa é ver como é que aqueles sujeitos usaram a inteligência para chegar aquilo. Já descobri que a Estética tem um grande papel. Agradeço-lhe bastante por não me ter dado nenhuma aula de Estética dando-me tempo para descobrir a sua importância. E o mesmo para a Ética/Moral". Acho que ele diria: "Quanto à Estética, aquilo de que vocês gostavam era de jogar futebol. E quanto à Moral, eram muito solidários uns com os outros o que eu apreciava muito".

Convém lembrar os grandes professores porque, sem eles, os sistemas educativos arriscam-se a ser grandes máquinas burocráticas, bloqueadas por dentro pelos seus programas e avaliações internas, que perdem o sentido do que deviam e poderiam ser. A escrita deste texto foi estimulada pelo artigo: "Ensino da Filosofia deve começar no Básico" do Professor Pedro Miguel Melo de Almeida, publicado no "Expresso" de 26 de Fevereiro.

António Brotas Professor jubilado do IST"

Este texto foi publicado no jornal "Notícias de Arronches" da terra natal do professor Edmundo Curvelo.
O Professor Augusto Franco de Oliveira proferiu, no dia 19 de Outubro de
2005, no Centro de Filosofia das Ciências da Universidade de Lisboa, uma conferência com o título "A Lógica de Edmundo Curvelo". O lançamento do 1º Caderno de Filosofia das Ciências deste Centro, com o título "Cartas de Edmundo Curvelo a Joaquim de Carvalho (1947-1953) e outros inéditos" ,e de que é autor teve lugar lugar no dia 21 de Outubro, na Livraria Buchholz.

Lembro-me muito bem de Edmundo Curvelo. Só foi nosso professor no 7º ano, mas marcou-nos. Sempre embrulhado na sua gabardina «trincheira» branca e a careca descoberta, mesmo à chuva, com uma protuberância  no alto da cabeça, ao que aprece para acomodar a inteligência que não cabia  toda no crânio.  Tinha um olho que olhava em ângulo recto. Como não podia deixar de ser, foi vítima de perseguição do malvado «Cajais». Anos mais tarde, suicidou-se. Não creio que tenha sido por causa do Casais. Deve ter sido qualquer problema de metafísica. O Prof. Brotas apanhou-o bem. «Não interessa tanto saber o que os cientistas descobriram; o que interessa é saber  como é que descobriram o que descobriram».

Estou a vê-lo.

Luís Soares de Oliveira

CURTÍSSIMAS - 1

A  BOA  EDUCAÇÃO 

 

Naquele tempo... segunda metade do século XIX, quando não havia telefones, nem fax, nem e-mails via Internet, as pessoas comunicavam-se por cartas ou pequenos bilhetes, muitas das vezes enviados ao destinatário por portador, para rapidamente trazer de volta a resposta.

Era assim que, por exemplo, Bulhão Pato, que morava na “outra banda” de Lisboa, mandava convidar uns quantos amigos para uma almoçarada em sua casa. Almoço que ele fazia questão de preparar! Deixou o seu nome ligado à gastronomia, com as famosas “ameijoas à Bulhão Pato”, e, segundo me dizia, há muitos anos, um dos seus convivas, quando alguém não lhe elogiava os petiscos, o anfitrião amuava, e o “deselegante” podia ter a certeza de não voltar a ser convidado!

Francisco Gomes de Amorim, meu xará e bisavô, foi contemporâneo e amigo desta gente, que fazia questão na elegância das palavras e nas demonstrações de amizade.

 Francisco Gomes de Amorim, bisavô, pintado pelo seu bisneto Francisco Gomes de Amorim (caneta de ponta de feltro)

Não deixavam de ser mordazes e até ferozes ao combater uma idéia ou o governo quando fosse necessário, mas sempre o cuidado com a nossa rica língua portuguesa, era seu apanágio.

Uma das cartas mais bonitas que eu vi em toda a minha vida (e olhem que vai sendo longa) escreveu-a Julio César Machado (1835-1890) a meu bisavô. Não era bem uma carta. Letra grande, linhas inclinadas para ocupar bastante espaço da folha, dizia assim:

 

Amorim

O que tu queres é apanhar um abraço em papel ofício!

Ele aqui vai, até porque não há outro aqui na repartição.

Teu do c.ão

Julio C. Machado

 

Quanta elegância, amizade e carinho numa folha de “papel ofício”, dobrada em quatro e enviada, por portador a um amigo!

Será que perdemos esta qualidade? Mesmo no século da tecnologia, o romantismo continua a ser tão bonito. Infelizmente raro!

 

Rio de Janeiro, 21 de Fevereiro de  2007

Francisco Gomes de Amorim

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