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A bem da Nação

ADESÃO DA GUINÉ-EQUATORIAL À CPLP

 

 

 

Meditando sobre a questão do pedido de adesão da Guiné-Equatorial à CPLP, concluo por uma posição favorável.

Porquê?

Por várias razões histórico-políticas e realistico-imaginativas...

Historicamente, fomos nós, os portugueses, os primeiros europeus a desbravar aquela região do Golfo da Guiné e, portanto, temos toda a legitimidade para estabelecer laços preferenciais de cooperação com qualquer um daqueles países. Sucede que, entretanto, fomos substituídos em todos eles por outras potências coloniais ficando a Lusofonia ultrapassada pela francofonia e pela anglofonia. A castelofonia não vingou no Golfo da Guiné, pura e simplesmente, pelo que não apresenta qualquer sinergia real ou potencial.  Em termos de estratégia de cooperação internacional, a Guiné-Equatorial só poderia optar pela francofonia ou pela anglofonia com todos os inconvenientes que teria que enfrentar por ser mais fraco do que qualquer dos países regionalmente membros dessas tais fonias correndo quiçá riscos na manutenção da sua soberania nacional. Ou se mantinha isolada no contexto internacional ou optava pela Lusofonia.

1ª Conclusão: a adesão à Lusofonia é do interesse da Guiné-Equatorial e é mesmo a sua «tábua de salvação» (para a população nacional tanto lhe faz aprender português como 1ª língua estrangeira como lhe faz aprender francês ou inglês pois no dia-a-dia continuará a falar as línguas indígenas).

Do lado do mundo lusíada, que problemas temos se aceitarmos a adesão de um país riquíssimo em matérias-prima pelas quais temos a maior apetência? Dir-me-ão que se trata de um país em que prevalece uma ditadura, onde não são respeitados os Direitos do Homem, em que não há Sindicatos livres, em que a política de protecção do Ambiente é letra morta. O meu silêncio só será entrecortado por suspiros de nostalgia relativamente à situação angolana... Mais:  a convivência com o mundo lusíada só poderá gerar influências benéficas com vista a alguma democratização do regime político desse país.

2ª Conclusão:  a adesão da Guiné-Equatorial à CPLP só peca por tardia.

Admito que para a arrogante Espanha esta adesão da Guiné-Equatorial à esfera de interesses do desprezível Portugal e da Lusofonia possa ser um vexame histórico e que, portanto, tudo faça para que tal não aconteça;  admito que para a sôfrega França esta adesão da Guiné-Equatorial ao mundo lusíada seja uma facada na estratégia de reconstituição duma imperial francofonia (França não abandonou a cobertura do CFA pelo seu Banco central enquanto Portugal não fez algo de equiparável e perdeu a emissão monetária na Guiné-Bissau); admito que também a Grã-Bretanha esteja sequiosa do petróleo da Guiné-Equatorial.

3ª Conclusão:  todos os motivos apontados justificam a preferência que a Lusofonia deve dar à adesão da Guiné-Equatorial à CPLP.

resultado mais prosaico da minha meditação: um pouco mais de petróleo não incomodará os nossos interesses estratégicos…

 

 

Henrique Salles da Fonseca

LUSOFONIA - UM APELO À CPLP - DEFESA DA LÍNGUA PORTUGUESA

 

O PORTUGUÊS DEIXA DE SER LÍNGUA OFICIAL EM CABO VERDE

 

QUE FUTURO PARA TIMOR-LESTE?

 

A língua materna em Cabo Verde é o crioulo de base lexical portuguesa com a semântica portuguesa do século XV-XVII. A língua oficial de Cabo Verde é o Português e a Língua nacional é o crioulo cabo-verdiano (Krioulo); o governo visa tornar o “Krioulo” também a língua oficial. O português passa a  língua não materna.

 

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O Governo de Cabo Verde anunciou a introdução do Português como língua não-materna a partir do próximo ano lectivo.

 

O Português começará a ser ensinado como segunda língua já no ensino pré-escolar (4/5 anos) ”, revela VOA (1). Esta decisão talvez tenha mais um fundamento pedagógico e de eficiência linguística na estatística do que político. O Krioulo tem várias variantes (2).

 

Os portugueses descobriram as ilhas de Cabo Verde em 1445. Então as ilhas eram desabitadas; os cabo-verdianos de hoje são descendentes de portugueses e africanos. Hoje têm uma população crioula de cerca de 546.000 habitantes e cerca de 700.000 emigrantes.

 

A 19 de Dezembro de 1974, foi assinado um acordo entre o "Partido Africano para a Independência da Guiné (3) e Cabo Verde". A 5 de Julho de 1975, foi proclamada a independência de Cabo Verde; se não fosse o zelo ideológico próprio da descolonização, certamente Cabo Verde teria hoje autonomia administrativa com um estatuto semelhante ao da Madeira e dos Açores.

 

Portugal com o Instituto Camões tem apoiado o ensino de Português. A língua não só é importante pelo aspecto identitário e cultural mas também pela sua expansão e crédito a nível internacional.

 

Timor-Leste em situação mais arriscada que a de Cabo Verde

 

Em Timor-Leste, a situação do português é mais precária do que em Cabo Verde, devido ao contexto cultural e político externo envolvente.

 

O ecossistema linguístico (natural, mental e social) de Timor-Leste é muito variado. Timor-Leste tem, constitucionalmente, duas línguas oficiais: o Português e o Tétum, sendo o Tétum a mais falada. Só 25% da população escreve e fala o português (mais falado em Díli), 45% usam o bahasa indonésio e 56% o tétum. 40% da população é analfabeta. O indonésio e o Inglês são considerados línguas de trabalho. Em Timor-Leste há cerca de 15 grupos étnicos, dos quais 12 grandes tribos.

 

Aquando da proibição da língua portuguesa em Timor pela Indonésia em favor do indonésio (bahasa), os padres da igreja católica não seguiram a imposição e celebravam as missas em Tétum. O Tetum é uma língua austronésia com muitas palavras derivadas do malaio e do português, tornando-se numa língua crioula (tétum-praça).

 

Um problema na expansão da língua estará na qualificação dos Professores que se sentem mais fluentes no tétum e no indonésio. O crescimento de uma língua depende muito dos factores económicos, políticos e ideológicos circundantes. Timor-Leste estará muito dependente do empenho dos países membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) para não ser sufocado.

 

Timor-Leste (Timór-Timur), é uma nação transcontinental com cerca de 1 143 667 de habitantes, que deve a sua existência nacional à sua vontade política, ao português e ao catolicismo. Timor encontra-se numa situação contextual diferente da de Cabo Verde; mas se Timor-Leste também remeter o português para segunda língua corre o perigo de se dissolver em línguas e dialectos e com o tempo ser absorvida pela cultura indonésia. A existência de uma cultura mista e polivalente na região é de muita importância em termos futuros de uma maior interligação entre as culturas.

 

O jornalista Max Stahl adverte que "sem a língua portuguesa, não há nação em Timor-Leste”(4). De facto, Timor-Leste, tem a sua razão de ser como país pela sua diferença (uma diferença que cria pontes étnicas e intercivilizacionais) dependendo ela do investimento a fazer nos seus factores de identidade e de identificação; doutro modo será, com o tempo, dissolvida na parte ocidental de Timor indonésio. A vontade dos povos também muda conforme as circunstâncias e interesses surgentes.

 

Para quem estiver interessado em conhecer melhor as etnias e o ecossistema linguístico (natural, mental e social) de Timor recomendo a obra “Léxico Fataluco-português” do salesiano Pe. Nácher, meu antigo confrade (5).

 

Em 1975, Timor-Leste declarou a sua independência, mas no final daquele ano foi invadido e ocupado pela Indonésia sendo anexado como sua 27° província.

 

Os timorenses resistiram e o antigo Timor português transformou-se no primeiro novo Estado soberano do século XXI, em 20 de Maio de 2002. A atribuição do Prêmio Nobel da Paz ao bispo Carlos Ximenes Belo e a José Ramos Horta em outubro de 1996 contribuíram imenso para a concretização da independência de Timor-Leste na sua afirmação contra a Indonésia país agressor. A sua relevância vem-lhe também do facto de ser com as Filipinas os únicos países asiáticos cristãos.

 

Timor-Leste tem 1.183.643 habitantes (censo de 2015) e cerca de 10.983 estrangeiros (5.501 indonésios, 1.139 chineses, 726 filipinos, 517 australianos e 318 Portugueses. O catolicismo tem sido um elemento de ligação e conciliação entre todos os grupos da população.

 

Por volta de 1975, só 30% da população timorense era católica o resto era na sua maioria animista. Devido à agressão indonésia contra a colónia portuguesa, as diferentes tribos envolvidas na defesa conta a Indonésia e para afirmação da independência tornaram-se católicas. O movimento de libertação Fretilin envolvia uma mistura de teologia da libertação e de comunismo. O cristianismo é visto como símbolo da luta pelos valores humanos (6).

 

Há dois factores que testemunham o domínio na humanidade através da História: a economia e a ideologia. Hoje o cidadão queixa-se dos povos colonizadores do passado que dominavam os povos menos fortes, hoje as finanças e a economia de potências política e economicamente fortes dominam e provocam uma colonização aparentemente mansa…

 

Na polis não se tem mostrado eficiente combater a economia e a ideologia, dado o problema vir da força destas; a alternativa poderia ser a igualdade: ou tornar-se todos fortes ou tornar-se todos fracos; mas o problema é que na natura não há nada igual e o que poderia criar uma certa igualdade na sociedade e na cultura mostra-se impossível dado esta seguir as leis da natura. Para se chegar a uma paz social digna do nome, seria preciso provocar-se um salto na estrutura da consciência humana que superasse as leis da causalidade e as leis da selecção natural; mas também este estádio poderia trazer consigo o problema da estagnação.

 

Para mim não esqueço o empenho e a acção social de pessoas como o Pe. Nácher que professando uma crença religiosa não a impõem e empenham todas as suas forças no serviço do bem-estar e do bem comum, promovendo a pessoa e as populações independentemente do povo, da raça ou da fé que professem.

 

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António da Cunha Duarte Justo

 

 

 

A LUSOFONIA E... OS OUTROS

 

Há poucos dias reuniram-se os ilustres (?!) presidentes dos países de língua portuguesa, e não só, e a memória foi rebuscar alguns textos escritos sobre lusofonia, nos idos de 2003, e que parece estarem ainda up-to-date. (Desculpem o texto um pouco longo. Em 2003 deu 3 ou 4 textos separados!).

 

Lusofonia deveria significar simplesmente o uso da língua portuguesa, como simples deveriam ser as pessoas que pensam, para que o pensamento saísse mais puro, menos rebuscado; dentro deste conceito, Lusofonia deveria facilitar e sobretudo promover a troca de informações e de culturas, o enriquecimento mútuo, a maior aproximação e compreensão entre as pessoas, as tais que seriam lusófonas, enfim um considerável instrumento de Paz, e até de progresso.

 

O que é estranho é que tanto se fala de Lusofonia, e a maioria dos dicionários não traz essa palavra! Nem cá nem lá! Só o bom e “velho” Aurélio diz ser “a adoção da língua portuguesa como língua de cultura ou língua franca por quem a não tem como vernácula”!

 

Se os dicionários a não trazem é porque se trata de vocábulo novo! E os mendicantes vocábulos novos chegam e logo são carregados de conotações políticas e até político-imperialistas! Entram os mestres a discutir-lhes o valor, as atitudes, os problemas causados por tão ingénuo aglomerado de nove letras, e num instante, ao invés de se promover uma maior aproximação entre gentes remotas, sustentam-se discussões assexuadas que aprofundam as divergências entre os povos lusófonos, sejam eles do vernáculo, da cultura ou da franca.

 

A Língua Portuguesa ainda é uma língua viva. Vivíssima. Continuam a entrar vocábulos novos, vindos dos mais diversos lugares, populares ou eruditos, adoptados pelos lusófonos em tantas partes deste mundo, como estes mesmos, lusofonia ou embasar, sem que haja o cuidado de os receber, cuidando unicamente da sua etimologia infantil, porque pura, com carinho e entusiasmo, tal como se recebe com alegria a chegada de um novo ser ao seio da família.

 

A famosa frase de Fernando Pessoa, língua/pátria, com que se incham os peitos e enchem os ouvidos, começa a fazer pouco sentido para aqueles a quem a tal Lusofonia não mais lhes aparece do que sob a forma de uma imposição.

 

Tudo isto sem que a etimologia seja posta em causa! O que está em causa não é a causa, mas os efeitos!

 

A pergunta que fica para que cada um pense bem, e é simples: - Afinal o que é Lusofonia?

 

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Em que língua se canta a alegria do samba?

 

Vários amigos e mestres acorreram em meu auxílio, e correram inúmeros dicionários. Só se encontrou uma “definição razoável” na enciclopédia Universalis, francesa, e a partir da ideia “mãe”, francofonia, que terá sido criada em 1880, mas só posta ao serviço do país a partir de 1960, quando a França deixa de ser potência colonial.

 

Portugal... acorda para isso bem mais tarde, depois de ter reconhecido todos os seus, profundos, erros da descolonização, de que deveria ter mais experiência do que qualquer outro. Não falando em Bombaim que “amavelmente” ofereceu aos ingleses, já em 1822 tinha passado pelo vexame de não querer reconhecer a independência do seu “maior” e mais querido filho!

 

Corre “atrás do prejuízo”, cria os PALOP´s e com eles nasce a tal Lusofonia.

 

Se nos limitarmos à ideia simplória do que seja Lusofonia = entendimento, por oposto ao que seria, e talvez ainda seja, uma Babel, um diálogo de surdos, o desenvolvimento desta comunidade pode ser uma maravilha.

 

Para isso é fundamental não permitir que se crie no espírito dos Outros, aqueles que têm a língua portuguesa com língua de cultura ou franca, o que se passou, e talvez ainda se passe, nas ex-colónias francesas, que começaram por recusar a francofonia que lhes surgia “como uma máquina de guerra visando manter as possessões francesas amarradas a uma dependência linguística e colonial”.

 

O Brasil já decretou que a segunda língua a ser ensinada nas escolas vai ser o castelhano. Não admira, porque está rodeado de países castelhanófilos por quase todo o lado. Deveria ter decretado que fosse uma das línguas vernáculas, como o tupi ou nheengatu. Não o fez, o que é pena, mas...

 

Nada disto o vai afastar da língua portuguesa, como alguns velhos do Restelo já manifestaram, de forma tão caricata e egoísta que perde todo o senso de verdade. Se o Brasil trocasse a língua, o que não acontece porque não é exactamente uma mercadoria que se pode tornar obsoleta e descartável, Portugal choraria no seu orgulho ferido, no seu isolamento, mesmo dentro da UE. Como isso não deve acontecer, ainda insiste em olhar os Outros umbiculatus às caravelas!

 

Chegam a sorrir do alto das suas baixas cátedras quando se dão conta que alguns dos tais Outros, soberanos povos, escrevem registro ou embasar, porque Camões talvez preferisse registo ou basear.

 

Entendimento sim. Mas primeiro o respeito. E por fim... aproveitar o que os jovens têm para nos enriquecer a todos. Sempre.

 

Mas Lusofonia? Com os olhos de quem? Do venturoso Manuel I°, rei de Portugal, dos Algarves, d´Aquém, d´Além Taprobana e do que mais au diante s´ouvirá?

 

Portugal há muito, muito, deixou de ser o pai, o irmão mais velho, o guardião dos “bons costumes”. Houve um período, de crucial importância, em que esse pai parece ter ele próprio imigrado, deixando os “filhos” abandonados a si próprios; um dia repara que os filhos tinham crescido, estavam feitos, independentes, com o seu próprio esforço e a graça de Deus. Então o “velho pai” reaparece e quer reentrar para o seio da família. Entrou e trouxe madrasta atrás, a UE.

Quer reassumir as funções de condutor! As barbas dos Vascos da Gama e outros ilustres, do alto do seus conhecimentos, tremeram! As barbas dos avós, mais experientes, mais sensatos, que sem terem o que perder, reconhecem de imediato a maioridade daqueles que passaram a ter que dar satisfações unicamente aos seus, às suas casas. O “pai” não aceitou isso com facilidade. Teimoso, acaba por afastar os filhos, que podem até respeitá-lo, mas não admitem interferências. Se quiserem conselhos eles os irão solicitar.

 

Nas festas dos seus aniversários estes comemoram o terem nascido, crescido, vingado. Aquele quer lembrar-se do que fez para o nascimento.

 

Estes erram, quando em vez, tropeçam, levantam-se e querem seguir em frente com toda a força da sua juventude. Aquele esquece os erros que cometeu e as palmadas que lhes deu, quanta vez sem razão!

 

Não se pode ficar sentado em cima de ruínas do passado, olhando para baixo, nem na cabeceira das mesas de reuniões! Ninguém mais lidera ninguém.

 

Se queremos todos a Lusofonia, se queremos permanecer unidos, só o conseguiremos desde que se olhe para qualquer um de “nós” como exatamente igual.

 

O Brasil não é só samba, como Angola não é só fome e diamantes, nem os Outros são só... assim como Portugal também não é o dono da verdade.

 

Em primeiro lugar somos todos gente. Nenhum pode pensar de outro jeito.

 

Se o fizer, ou ainda não assimilou que o neocolonialismo, como qualquer outro complexo, que são vírus a eliminar.

 

E, entre irmãos, vamos acabar com os vírus ou... nos afastamos.

 

É sabido que no Brasil se fala e escreve de forma diferente de Portugal. E em Angola. E em Moçambique e em Cabo Verde, e em... Eu acho isso óptimo, desde que não se deturpe ou se estropie a concordância o que prejudicaria o entendimento.

 

Nos casos, por exemplo: "se casou" ou "casou-se"; para mim é igual (tal como escreveu o grande Mestre Agostinho da Silva) e assim uso indiferentemente uma "fórmula" ou outra de acordo com a situação que, no momento, me soa (soa-me?) melhor ao ouvido.

 

Sou um intransigente defensor do que considero (pelo meu prisma/ bitola de educação e conhecimentos) da verdade e correção (aqui já se tirou o "c" mudo que, teoricamente, abria a vogal antecedente).

 

Fazem-se acordos ortográficos com uma dúzia de mestres jarretas e depois, mesmo admitindo que chegam a acordo, entra em vigor por Lei e pouca gente disso toma conhecimento. E por fim revoga-se a lei, o acordo e tudo que seja complicar o que é tão simples.

 

Mas o que vejo com imenso gosto é que o enriquecimento da língua portuguesa, com todos estes detalhes, muitos deles que nem técnicos são, mas somente diletantes, é inegável. Entram vocábulos, continuam a entrar, de todos os cantos do mundo, criam-se novos com gente como José Luandino Vieira, Mia Couto e o grande brasileiro João Guimarães Rosa, e em vez de os desprezarmos devíamos agarrá-los, todos, com unhas e dentes.

 

Garrett foi censurado pelos seus anglicismos.

 

Em vez de juntarmos os sábios no Olimpo, devíamos andar a catar por todos os cantos da tal Lusofonia as palavras que em todos esses cantos fazem parte do vocabulário corrente, popular, e introduzi-las num dicionário único para o conhecimento dos tais 250 milhões.

 

Não deveria, nem poderia chamar-se (olha o "se" depois!) Dicionário de Português, mas com humildade, ou antes, com verdade: Dicionário da, e não de, Lusofonia. Teria talvez mais de 3.000 páginas, e pelo menos um comprador: eu!

 

Aí entraria: garina, molecagem, cachupa, maximbombo, treco, machamba, putos, como há séculos entrou o caqui, que vem do hindu e que significa exatamente aquela cor amarelada... do caqui, e entrou o tanque, vindo do mesmo povo!

 

Também era bom que explicasse coisas como: no Brasil talho é açougue mas todos os açougues têm um talho!!! E que a palavra troço, no Brasil pode ser um monte coisas, como por exemplo: um sujeito cai para o lado com um ataque e o povo diz: Deu-lhe um troço! ou então o sujeito engasga-se, tosse e por fim: "entrou-me aqui um troço...".

 

E ainda poderia explicar que bolsos e algibeiras são, mais ou menos, a mesma coisa. Com a diferença que ninguém no Brasil tem algibeiras na roupa! Só tem bolsos!

 

A conversa está bâoa, mas vou ficar por aqui. Este assunto continua no próximo número!

 

Com o aumento do turismo imagnemos o seguinte diálogo. Qualquer aeroporto no Brasil. Chega uma excursão de portugueses a visitar este Novo Mundo. É recebida por um simpático agente de viagens, Severino.

 

- Seu Severino?! Ora venha lá esse bacalhau!

(! ? ! ? Severino ter-se-á esquecido de levar balhau para o aeroporto?)

- Seu Joaquim, estimo que o siô tenha feito uma ótima viagem.

- Muito boa. Viemos na brasa. Olhe, trouxe uma chusma da minha confraria p´ra ver o que o nosso primo descobriu.

- Ahhh! O siô tem aqui um primo?

- O Cabral, rapaz. O Cabral é que descobriu! Queremos ver o que aquele gajo descobriu com os balúrdios que lhe deram p´rá biage. Vamos lá na mecha entrar nessa caminete.

- Olhe bem, oh! seu Joaquim. Vamos por partes: a chusma que o siô diz que traz aí, vai ter que declarar na alfândega, p´ra não ter póbremas. Depois o seu Cabral não descobriu quase nada porque mal esteve onde é hoje Porto Seguro, e por fim não consta que ele tivesse deixado por aí qualquer balúrdio. Mas podemos indagar. Ainda mais uma coisinha, só. Se querem ir para a Mecha, vamos ter de perguntar onde isso fica, que eu, há 50 anos aqui... não conheço. E ir de caminete... é muito incomodo. Só pau de arara.

- Não é nada disso amigo Severino. E isso de ir na mecha quer dizer nas gáspeas, na ponta da unha. E trazemos nas algibeiras um bocado de carcanhóis p´ra gozar.

- ?!?!?

- Nós queremos é ver as maravilhas desta terra.

- Ah! Isso tem p´ra chuchu.

- Qual chuchu qual carapuça. Ninguém daqui quer chuchu, mas vamos todos ficar à coca a ver se passa alguma rapariga atiradiça.

- ? ! ? !

- P´ra começar, amigo Severino não me arranja aí uma malga d´áuga?

- Ai! Que me vai dar um troço! Esta profissão é uma choça!

 

Neste momento Severino dá-se por vencido. Arrasado. Por azar nem sequer traz consigo um dicionário de português Lá-Cá-Vice-Versa. De qualquer modo coca é assunto tabu, e ele, agente de viagens credenciado, não quer entrar nos domínios do narcotráfico. Pior ainda com raparigas e ainda por cima atiradiças. E terá que se haver com mechas, gáspeas e pontas de unha. É macumba. Que Deus o livre e mais o Senhor do Bonfim sem faltar o “padim Ciço”!

 

Linguagem bonita, variegada, mas incompreensível. Balúrdio p´ra cá, chuchu p´ra lá, coca e chusma., e etcs..

 

Joaquim insiste:

- Amigo Severino! Onde é que posso arrear o calhau? Estou à rasca e ainda por cima vim no avião no meio duns bifes, parvos, armados em carapaus de corrida! Nem consegui matabichar em condições.

 

E chamam a isto Lusofonia.

 

Severino chora, desespera-se, e sonha com clientes chineses. Muito mais fácil. Muito “xin” e muito “fun” mas com a grande vantagem do gesto que explica tudo.

 

Finalmente, bagagens despachadas, a chusma à porta do aeroporto aparece seu Severino no ônibus para os levar ao hotel.

 

Joaquim, ao seu lado não perde por continuar a conversa. Aliás o monólogo.

 

- Sabe? Eu aldrabei os meus compadres e disse-lhes que íamos ficar num hotel que só tem burros! E por isso era mais em conta.

- ! ? ! ? ! ? !

- Mas como eles são todos uns carolas, sabe?, dois são chúis e um é cabo de esquadra, afeitos a topar qualquer léria, não se preocuparam. Só um é que não devia ter vindo. É um rabeta, todo do reviralho, que no tempo do António da calçada levou umas sarrafadas boas e agora está meio xarope!

- ! ? ! ? ! ?

- Seu Joaquim! O siô por acaso não sabe falar português?

 

A (des)conversa deixara-o demasiado encucado. Aqueles caras falam uma língua estranha entremeada de português. Deviam ser, no mínimo do Pralàquestão.

 

Pois é sim do “Pra lá que estão”, feitos donos da língua, quando eles mesmo têm dificuldade em unificá-la e entender-se.

 

Viatura automóvel de transporte coletivo, de 20 ou 40 lugares pode chamar-se, nos países lusófonos, autocarro, tócar quando se está apressado, caminete, ônibus, maximbombo, chapa cem (ou duzentos, agora que está mais caro!) e talvez ainda mais nomes, sobretudo hoje aos de menor capacidade, como lotação, van e kombi!.

 

Queremos Lusofonia? Então temos que fazer alguma coisa por isso. Alguma coisa, não. Muita coisa.

 

Lusofonia não são carcanhóis, chusma de balúrdios nem malga d´áuga. Mas é também tudo isso. Entram ainda os sarrafeiros do reviralho, as garinas e os maximbombos, uma boa larada e uma brasa, quer esta seja uma mulher, uma boa sesta, velocidade alta ou uma criança remexida como cantava o Adoniran Barbosa.

 

Mas, por favor, entendamo-nos. Não custa muito. É só, todos, querermos.

 

Vamos fazer um dicionário da LUSOFONIA?

 

02/09/03

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Francisco Gomes de Amorim

XI CIMEIRA DA CPLP EM BRASÍLIA

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COMUNIDADE DE POVOS E CIDADÃOS

 

Uma boa Ideia de António Costa que se desejaria ver Programa

 

Tornou-se público que no encontro da Cimeira da CPLP, o chefe do governo português defende a ideia da liberalização da residência dos cidadãos dos países de língua lusófona.

 

A ideia de que a CPLP é “uma comunidade de povos mais que uma comunidade de países” numa altura em que se elaboram contratos CEPA com o Canadá e TTIP com os USA, seria oportuno que Portugal também fizesse valer os seus interesses estratégicos, como membro da CPLP na União Europeia. Vai sendo tempo de se colocarem os laços dos cidadãos acima dos laços comerciais. Os moinhos da política são vagarosos mas as ideias vão transformando o mundo.

 

A Este respeito veja-se, entre outros: “Universidade da Lusofonia para a Integração do Espaço lusófono – Antecipar o Futuro” (LUSOFONIA, A CHANCE DE FUTURO DOS PAÍSES LUSÓFONOS

 

Nestes e outros artigos defendi sempre a Ideia que agora o Primeiro-Ministro tão bem expressa: a comunidade lusófona é “uma comunidade de povos mais que uma comunidade de países”, uma comunidade de pessoas e povos.

 

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António da Cunha Duarte Justo

O LUSOTROPICALISMO

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A versão moderna do mito do quinto império é ensaiada através das teorias Lusotropicalistas sistematizadas por Gilberto Freyre, que, do meu ponto de vista, são bem mais antigas, as quais aparecem em alguns pronunciamentos, principalmente nos debates sobre a questão ultramarina, no Século XIX, um pouco por consequência da independência do Brasil.

 

O Lusotropicalismo não é somente uma teoria sociológica. Quanto a mim, uma tentativa de dar rosto científico a um pressuposto ideológico. Por isso, os estrategas do Estado Novo acolheram com muito entusiasmo o discurso lusotropicalista.

 

Constituída a primeira machadada na herança sonhada, criada e deixada por Dom João II, quero lembrar aqui que, pouco tempo antes e não por mera coincidência, Gilberto Freyre fora hóspede convidado de Salazar naqueles territórios, foi buscar mais subsídios para consubstanciar as suas teorias lusotropicalistas, ido de Cabo Verde.

 

Nessa mesma década, a de 60 do Século XX, os movimentos nacionalistas de Angola, Guiné-Bissau e Moçambique iniciavam a luta armada de libertação, designada inicialmente por Salazar de campanhas de África contra o terrorismo, baptizada depois de campanhas contra o comunismo por Marcelo Caetano e Guerra colonial após o 25 de Abril.

 

Até meados de 70 do Século XX e no limiar das independências das colónias africanas, jamais alguém utilizou o conceito lusófono ou lusofonia para se referir ao que quer que fosse.

 

Então, por que razão é que só depois das independências emerge de uma forma evidente este conceito?

 

A década de 60 do Século passado é conhecida por década de África. A maior parte das colónias africanas da Grã-Bretanha e França tornaram-se Estados independentes na primeira metade dessa década. Os interesses políticos e sobretudo económicos fizeram com que as ex-potências coloniais desenhassem uma estratégia de continuidade com outra roupagem.

 

Quer isto dizer que ao colonialismo clássico se seguia o panorama neo-colonial. E uma das configurações que esse novo modelo tomou foi o de comunidade linguística. Assim nasceram as comunidades francófona e anglófona.

 

Contudo, um olhar mais atento há-de provar-nos que a língua como factor de formação das comunidades em apreço não passava de um pretexto. A França, por exemplo, manteve a sua presença ostensivamente, indo da moeda até a presença militar, através da Legião Francesa, com o único fito de salvaguardar os seus interesses. A francofonia e a anglofonia são sobretudo um produto neo-colonial.

 

Esta é a terceira questão que ponho à discussão, será por aproximação à designação destas duas comunidades que se foi buscar o termo lusofonia? Se assim foi, terá havido o cuidado de se reflectir sobre as diferenças dos factores?

 

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 LOURENÇO DO ROSÁRIO

A LUSOFILIA NUMA PERSPECTIVA DE FUTURO

VI

 

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Queremos liberdade de comunicação; não queremos libertinagem na comunicação

 

Dentre todos os meios de comunicação hoje ao dispor – e são muitos – a televisão é seguramente o que maior influência exerce nas populações, em especial nas mais frágeis. E quando refiro as mais frágeis significo as que não dispõem de capacidade de defesa contra as influências perversas que lhes possam chegar mais ou menos sub-repticiamente: incitação à violência pela apologia da competição como conceito global, exploração mediática do desespero do derrotado, incitação da revolta contra o dominador (esse que até ao passo anterior era o deus da glória) e assim sucessivamente num círculo contínuo de altos e baixos de euforia e desespero. Ciclos tão úteis para a instalação de ambientes propícios às subidas e quedas das Bolsas internacionais, à manipulação de preços, à gestão dos interesses especulativos de quem quer comprar na baixa para logo de seguida vender na alta. E se os célebres ciclos de Kondratiev[1] não funcionam com o ritmo desejado, há que provocá-los pois não se pode perder tempo “à espera de Godot”.

 

Tudo, porque não há tempo a perder na conquista de posições de liderança, nos lucros que têm que ser cada vez maiores… Mesmo que o produto seja tóxico, ele tem que ser apresentado como sublime.

 

Foi essa mentalidade competitiva – em que tudo vale desde que se alcancem os objectivos – que levou as empresas a despedirem os profissionais experientes para admitirem jovens bem mais baratos, a actual geração dos 1000 (€, claro). E o que fazemos a tanto aposentado prematuro? Deixamo-los pelos jardins a jogar às cartas ou a consumirem o álcool do desespero por inadaptação a uma situação que muitos consideram injusta?

 

Até que a bolha rebentou, os Bancos faliram e os Tesouros nacionais foram chamados a cobrir os dislates que a ganância, a amoralidade, o hedonismo e a ausência de Ética permitiram. Carpe diem...

 

Esta é, pois, a hora de todos pagarmos a insensatez de que nos deixámos rodear.

 

Se queremos obstar a piores cenários do que aquele por que estamos a passar, comecemos por instaurar a ética da comunicação.

 

Sigamos a sugestão de Karl Popper quando ele preconiza que os jornalistas e sobretudo os produtores de televisão sejam alvo de um auto-controle ético exercido por uma Ordem com poderes suficientes para retirar a licença profissional a quem insista no sofisma de «dar às pessoas o que eles dizem que elas querem», a violência, a competição e o sexo.

 

A exploração sensacionalista dos noticiários para quem só há assassinos e corruptos expande o ódio e vicia na denúncia. Não haverá outros cenários menos trágicos? Não haverá outros temas que nos suscitem a busca de soluções construtivas?

 

O mundo da comunicação social vai ter que mudar muito até que se transforme num instrumento de desenvolvimento das populações a que se dirige. Tudo porque, se o poder dos órgãos de comunicação não for totalmente esclarecido, a democracia poderá não subsistir de forma verdadeiramente duradoura. Com programas cada vez mais medíocres – prosseguindo com Popper – (...) só nos resta ir para o Inferno! (...).

 

E se não quisermos ser cilindrados pelo fatalismo infernal, recordemos Hegel quando ele diz que é necessário disciplinar a vontade natural incontrolada, conduzi-la à obediência de um princípio universal e, nesse enquadramento, promover o exercício da liberdade individual.

 

Por tudo isto, dizemos que temos pela frente um século de glória ou de desespero conforme consigamos ou não dar esperança ao Mundo Lusófilo trazendo de volta os valores éticos tanto na dimensão individual como na colectiva, tudo devidamente harmonizado na nossa convivência pluri-cultural e internacional; se conseguirmos transformar a comunicação social num instrumento educativo e não mais de alienação; se conseguirmos impor aos governantes que se rejam por um inultrapassável Sentido de Estado; se inventarmos um novo modelo de desenvolvimento que dê esperança a quem hoje se sente desesperado.

 

Eis como, com tanta coisa por fazer, nos parece imprescindível acelerar o passo no caminho que se abre à Lusofilia pois amanhã é já o primeiro dia do futuro.

 

Terá, então, a Lusofilia um futuro? Sim, sobretudo se nós, a sociedade civil, lho dermos.

 

 

FIM

HSF-Mékong.jpg

Henrique Salles da Fonseca

(algures no Mekong, Novembro de 2014)

 

 

[1] - Nikolai Kondratiev (1892-1938) economista russo que teorizou sobre os ciclos económicos

A LUSOFILIA NUMA PERSPECTIVA DE FUTURO

V

 

L'école.png

 

Educar é hoje uma missão muito difícil

 

É claro que os pais se preocupam com o bem dos filhos. Sabemos que depende deles o futuro da sociedade e não podemos deixar de fazer o melhor pela formação  das novas gerações. Temos que lhes dar uma forte capacidade de se orientarem na vida e sobretudo de distinguirem o bem do mal.

 

A "ruptura entre as gerações" de que tanto se fala resulta da não transmissão de certezas e valores. Resulta da interrupção criada pela renúncia daqueles que deviam assumir a função educativa: os pais. Estão em causa as responsabilidades pessoais dos adultos, que são reais e não devem ser escondidas, mas também a atmosfera difusa a que se referia Lipovetsky na citação anterior, aquela mentalidade e forma de cultura que fazem duvidar do significado do bem. Então, torna-se difícil transmitir de uma geração para a outra algo de válido e de certo, regras de comportamento, objectivos credíveis com base nos quais construir a própria vida.

 

Estas dificuldades são a outra face da moeda que é a liberdade e esta constitui uma relação biunívoca com a responsabilidade. A liberdade de cada um de nós cessa onde começa a do nosso vizinho e se queremos ser livres, então temos que assumir a responsabilidade dos actos que livremente praticamos. Só é responsável quem é livre e a actual irresponsabilidade não é atributo por que devamos pugnar. Não pactuemos com a transfiguração da liberdade em libertinagem. Sejamos merecedores da liberdade de que usufruímos.

 

E é disso que aqui tratamos: de uma educação que o seja verdadeiramente e não se limite ao débito de programas curriculares de mera base científica, sem qualquer orientação pró-ética. Há pais angustiados com o futuro dos filhos; os professores sofrem com a degradação das escolas e do sistema de ensino; a sociedade, no seu conjunto, vê postas em dúvida as próprias bases da convivência e muitos são por certo os jovens que não querem ser deixados sozinhos perante os desafios da vida.

 

Por tudo isto, parece urgente assentar naquilo que devemos apelidar de exigências comuns de uma educação ética.

 

A educação reduz-se à dimensão de mera instrução quando se limita a dar noções e informações deixando de lado a grande pergunta: o que é o bem? E seguindo nessa senda, há que distinguir entre o bem individual, o bem plural e o bem nacional que servem para a vida dos governados, os contribuintes. Mas a essas dimensões do bem há que juntar o Sentido de Estado, ou seja, o bem a que devem obedecer os governantes, os contribuídos, a quem cumpre gerir a causa comum.

 

E se a causa comum resulta duma discussão democraticamente desenvolvida, ela tem que assentar em princípios morais que derivem linearmente do conceito de bem, tudo conjugado num edifício a que deveremos chamar política de base ética e bem comum. Ou seja, a Ética e o Sentido de Estado estão ligados numa relação íntima em que nenhum dos dois pode existir sem o outro.

 

Mas há outra questão que tem a ver com o equilíbrio entre a liberdade e a disciplina.

Educação bem sucedida é a que dá formação para o recto uso da liberdade e as regras de comportamento, utilizadas no dia-a-dia, formam o carácter. Só um carácter bem formado permite a preparação necessária para se enfrentarem as vicissitudes que não faltarão ao longo da vida. E é do disciplinado uso da liberdade que naturalmente resulta o sentido de responsabilidade, essa que começa por assumir uma dimensão individual e a partir da qual construímos a responsabilidade plural, como residentes numa cidade, como membros de uma nação.

 

E as ideias, os estilos de vida, as leis, as orientações gerais da sociedade e a imagem que dela dão os meios de comunicação ao exercerem uma grande influência sobre todos nós – tanto para o bem como para o mal – impõem-nos que cuidemos da formação das novas gerações de modo a que elas saibam com exactidão distinguir entre o que devem escolher e o que devem rejeitar, sem se deixarem influenciar por motivações menos transparentes dos fazedores públicos de opinião tantas vezes ao serviço de interesses mais sinuosos do que aquilo que descortinamos à primeira vista.

 

(continua)

 

Henrique Salles da Fonseca

Henrique Salles da Fonseca

A LUSOFILIA NUMA PERSPECTIVA DE FUTURO

 IV

 

Hedonismo.jpg

 

Reinventando uma Ética para o século XXI

 

Essa, a missão que se espera das elites e, mais concretamente, ao que devemos conduzir as elites lusófilas: a educar seguindo um conjunto de princípios éticos de inspiração universal mas sem descurar o enquadramento étnico de cada comunidade ou País da Lusofilia.

 

Chamemos-lhe educação cívica ou outro nome que possa ser mais consensual, discutamos o conteúdo programático duma tal disciplina curricular dos Ensinos Oficiais em cada um dos nossos países mas não deixemos a juventude entregue ao hedonismo reinante e sem um rumo ético.

 

É que mais perigoso do que viver numa sociedade imoral é deixarmos que se forme uma sociedade amoral.

 

Esta questão é tanto mais grave quanto os pais se demitiram da função educativa dos filhos deixando essa tarefa para os professores, função para que estes não estão formalmente preparados e quando muitas vezes nem conseguem dar o programa curricular que lhes está consignado em matérias mais prosaicas do que éticas.

 

Professores que estão hoje no fio da navalha em que se transformou a sociedade actual. Lembram domadores de feras pois deixaram de ter como principal missão ensinar os programas oficiais e passaram a ter que domar umas criaturas a quem os pais disseram que tudo lhes é devido, que a tudo têm direito sem esforço. Foi disso que os demagogos convenceram os pais e estes transmitiram aos filhos, toda a irresponsabilidade transfigurada em direito.  É claro que agora o esforço de retorno à vida responsável, ao inadiável realismo, vai ser um processo muito doloroso e os primeiros a dar de frente com o problema são os Professores. E como os pais não perceberam que a vida de irresponsabilidade que o laxismo lhes incutiu já acabou, revoltam-se e … vão às Escolas bater nos Professores. Eis o cenário em que deambula o «professor perdido».

 

Urge devolver a dignidade aos professores.

 

(Continua)

 

Henrique SF em Angkor Wat (NOV14).JPGHenrique Salles da Fonseca

(em Angkor Wat, Camboja, Novembro 2014)

A LUSOFILIA NUMA PERSPECTIVA DE FUTURO

 

III

 

Power and Glory.jpg

Chegados à filosofia do poder, deparamo-nos com a anomalia de todos os direitos serem outorgados aos poucos campeões e todas as obrigações serem imputadas a um mar de vencidos.

 

E o que será melhor? Ser-se servo num eldorado ou Senhor num mundo de miséria?

 

A aculturação das populações a um modelo standard e globalizado corta o acesso às raízes culturais mais endógenas e isso anula a ética étnica, essência da cultura mais íntima dos povos. Mas a etnologia é hoje objecto morto de Museu bolorento e escassamente visitado. Em simultâneo, quando esse desenraizamento conduz as pessoas para o mundo da globalização competitiva, então está-se a enviar populações inteiras para um mundo em que não há que olhar a meios para alcançar fins. Se a isto somarmos a atracção que as cidades exercem sobre as populações rurais flageladas pelas guerras, pela inviabilização da ruralidade e pela apologia do urbanismo, compreenderemos a selva urbana em que as nossas grandes metrópoles se transformaram. Pululam os exemplos no espaço lusófono.

 

E como diz Gilles Lipovetsky no seu livro “O crepúsculo do dever”, (...) A sociedade post-moderna ou post-moralista designa a época em que o dever se adocicou e tornou anémico, em que a ideia do sacrifício pessoal se ilegitimou socialmente, em que a moral já não exige que as pessoas se devotem a uma causa superior, em que os direitos subjectivos dominam os mandamentos. (...) o mal transformou-se em espectáculo, o ideal pouco engrandecido. Se perdura a crítica do vício, o heroísmo do bem enfraquece. Os valores que reconhecemos são mais tidos como negativos do que como positivos. (...) triunfa uma moral indolor (...).

 

Neutralizadas tanto a Moral como a Ética clássicas e modernistas, no pós-modernismo promoveu-se a competição em que tudo serve para subir na ostentação. E subir JÁ! A globalização fez isso aos países chamando-lhe competitividade. O que interessa é alcançar os objectivos. Como? Isso é o que menos interessa desde que eles sejam alcançados e, também nesta dimensão macro, JÁ!

 

O hedonismo deixou de ser uma chaga individual para assumir a dimensão plural e, pior, passar a ser considerado «politicamente correcto». O carpe diem horaciano é hoje adubo dos discursos políticos e faz doutrina junto da mole de incautos que ouve, aplaude e, pior que tudo, crê.

 

Podemos, querendo, promover o regresso do discurso da verdade sob pena de, pelo silêncio, darmos guarida a soluções que passem por fora da democracia pluralista em que queremos viver.

 

Aqui chegados, urge perguntar que solução temos à nossa frente. Adoptarmos o imobilismo monástico à espera que a crise passe? Entregarmo-nos, à moda muçulmana, nas mãos do fatalismo indiscutível? Preconizarmos um regresso às origens étnicas, folclóricas?

 

Não nos parece que atitudes de medo, de fatalidade ou de recuo sirvam o futuro por que ambicionamos.

 

Pelo contrário, creio que devemos partir rumo ao futuro pois é natural a ânsia de progresso dos povos a que pertencemos.

 

Sim, temos o direito de subir mas temos a obrigação de promover a subida dos que nos rodeiam para podermos dizer como Nelson Mandela que “a educação é o grande motor do desenvolvimento pessoal. É através da educação que a filha de um camponês se pode tornar doutora, que o filho de um mineiro se pode tornar chefe de uma mina, que o filho de trabalhadores agrícolas pode vir a ser Presidente

de uma grande nação. É o que fazemos do que temos, não o que nos é dado, que distingue uma pessoa de outra.”

 

Mas façamo-lo cumprindo os valores de alguma Ética, aquela que urge reinventarmos.

 

(continua)

 

Bombaim-2008.JPG

Henrique Salles da Fonseca

(em Bombaim, Janeiro de 2008)

A LUSOFILIA NUMA PERSPECTIVA DE FUTURO

II

 

Capacitação.jpg

 

Eis ao que andamos: a puxar as gentes para cima.

 

O fulgor da Lusofilia poderá ser provocado se cada um de nós, os lusófilos, decidir interceder nesse sentido desenvolvendo acções pessoais, locais e regionais para que numa fase mais globalizadora possamos definir as tais complementaridades e estabelecer uma rede de cooperação que promova a língua portuguesa no âmbito duma lusofilia que se irá progressivamente definindo e afirmando.

 

Essencial é que todos saibamos o que cada um faz para que possamos transmitir inspiração, evitar incompreensões e optimizar a acção.

 

Na certeza, porém, de que a língua portuguesa só poderá assumir a relevância que para ela desejamos se for o veículo dos originais de temas que mobilizem a sociedade globalizada, nomeadamente de relevância científica, tecnológica e artística. A divulgação deste tipo de trabalhos é urgente e fundamental para a nossa afirmação no mundo.

 

Noutra dimensão, tenho como fundamental lançar um apelo para a construção de uma Ética Lusófila e para a exigência de um imperativo Sentido de Estado.

 

Herdeiros de um processo de regulação moral da conduta humana necessária ao bem-estar colectivo, deitámos quase tudo a perder e eis-nos chegados à filosofia do poder, aquela em que o objectivo mais elevado é o poder e que resulta claramente de um espírito de permanente competição.

 

Como cada vitória tenderá a elevar o nível dessa mesma competição, o final lógico de tal filosofia é o poder ilimitado e absoluto. Aqueles que buscam o poder podem não aceitar as regras éticas definidas pelos costumes e a tradição enquanto, pelo contrário, adoptam normas próprias e se regem por outros critérios que os ajudam a obter o triunfo. Tentam mesmo convencer as outras pessoas de que são éticos no sentido do objectivo supremo por eles definido tentando conciliar o poder e o reconhecimento da moralidade. Assim foi que se sentam na cadeira do poder muitos daqueles para quem a ética é palavra vã. Daí ao poder absoluto, à ausência de regras consensualmente (leia-se democraticamente) construídas, à ausência de Direito e à dissolução do Estado de Direito, vulgo o fascismo, não dista muito ou não dista mesmo nada. Ignorados os princípios que definem o bem-comum, instala-se o “salve-se quem puder”, sobrepõe-se a razão da força à força da razão.

 

Globalizada a competição e sacralizados os critérios da competitividade, não mais resta qualquer esperança de sobrevivência aos que não sejam campeões. E a alternativa para os não campeões – em que o 2º classificado mais não é do que o 1º vencido – é unicamente a de serem servos. Servos mais ou menos mitigados, mais ou menos engravatados, numa gaiola mais ou menos dourada mas servos e apenas isso.

 

Todos os direitos aos poucos campeões; todas as obrigações ao mar de vencidos.

 

(continua)

 

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Henrique Salles da Fonseca

(algures no Sri Lanka em Novembro de 2015)

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