Contributo para a nossa sobrevivência entre micróbios e robots
À chegada, o prestigiado Presidente da ACUM (Academia das Ciências Universal Microbiana) trocou algumas palavras com o colega (e candidato à sua sucessão): - Sabe, eu não dou muita importância a estas iniciativas do ministro Ogag, mas sempre é preferível falar para os jovens do que para os políticos.
Vieram chamá-los. Ao entrar na sala, milhares de jovens micróbios levantaram-se e aplaudiram fazendo vibrar as membranazinhas. Na realidade, não eram micróbios verdadeiros, mas robots de micróbios. A sessão era transmitida por vídeo-conferência para outras salas onde biliões de jovens micróbios, esses verdadeiros, a seguiam em directo com a possibilidade de fazerem perguntas.
Um elaborado programa permitia escolher as perguntas dos micróbios reais e fazer sínteses das suas intervenções que depois eram apresentadas pelos robots. Em sessões anteriores, os programas tinham eliminado as perguntas inteligentes e originais com o argumento de serem raras. As intervenções dos micróbios-robots tinham a tal ponto sido desinteressantes que o público tinha ficado com uma péssima impressão da juventude. Com o apoio da Academia tinham sido feitos programas alternativos, desde logo classificados de "elitistas", em que se procurava seleccionar as "perguntas inteligentes". Naquela reunião ia ser testado um destes programas. Os conferencistas, carregando num botão com a indicação "pi", podiam fazer com que os robots, em vez das perguntas "médias", fizessem "perguntas inteligentes".
O Presidente começou: - Venho fazer-vos uma comunicação da maior importância. Como sabeis, a nossa comunidade científica tem dedicado boa parte do seu tempo a decifrar o valiosíssimo espólio científico da extinta espécie humana que, pode-se dizer, se auto-liquidou com aquela questão da globalização que diminuiu a biodiversidade e a deixou exposta ao nosso mortífero ataque. Num dos últimos séculos da sua existência destacou-se um cientista chamado Albert Einstein. Os nossos matemáticos trabalham para decifrar a sua obra, que não terão ainda inteiramente compreendido, mas ele teve a simpática ideia de escrever obras de divulgação. É com base numa delas que eu vos trago uma informação importantíssima para nós, micróbios: "Nós vivemos no interior de um imenso molusco, finito, mas sem limites".
Sentiu-se na sala um ambiente de satisfação. Embora a questão dos limites não fosse muito clara, a ideia de viverem no interior de um molusco era manifestamente agradável para os jovens micróbios. Aproveitando o bom ambiente, o Presidente carregou no botão "pi"e disse: - Podem agora fazer perguntas.
O primeiro a falar foi um pequeno robot com uma expressão inteligente:
- Como é a pele dele?
- De quem?
- Do molusco.
- Não tem.
- Então como é que está separado do exterior?
- Não há exterior.
- Então, o molusco está dentro de quê?
- Está dentro dele próprio.
Houve um silêncio e, depois, um robot disse:
- Não entendo.
Outras vozes seguiram-se:
- Eu também não.
- Eu também não.
- Vou explicar, disse o Presidente. - Vocês têm os 6 pontos cardeais: Norte, Sul, Este, Oeste, para Cima e para Baixo. Se andarmos sempre numa direcção regressamos vindos do lado oposto.
Um robot com ar de líder estudantil levantou-se e disse:
- Quer o Senhor dizer que o nosso espaço não é euclidiano?
- Exactamente, disse o Presidente.
- Então, se o nosso espaço não é euclidiano, porque é que nos obrigam no 17º ano de escolaridade a fazer um exame da cadeira de Geometria Descritiva euclidiana a 4 dimensões? Esta cadeira deve ser suprimida.
- Não, disseram imediatamente outros robots. - A Geometria Descritiva serve para elevar as nossas médias para entrarmos na Universidade.
A polémica estudantil estalou na sala e o Presidente teve a maior dificuldade em dar a palavra aos robots que já a tinham pedido. O último foi um pequenino robot, que começou a falar muito lentamente:
- Se eu tiver um irmão gémeo, ele ficar parado e eu partir numa dessas viagens para um lado com regresso vindo do outro, como é que o Senhor me garante que não nos vamos encontrar, ele a mim e eu a ele virados do avesso?
- Virados do avesso?
- Sim, com a mão esquerda tocada pela direita.
O Presidente sentiu-se ele próprio virado do avesso e compreendeu que já não era capaz de dar mais explicações.
A polémica estudantil reacendera-se e todos queriam falar. O indicador do nível de entropia encrostado no púlpito atingira níveis altíssimos. Disse, então:
- Vou pedir aqui ao meu colega para vos explicar todas estas questões.
O acompanhante não se fez rogado. Subiu ao púlpito, desligou imediatamente o botão "pi" e perguntou:
- Querem que vos explique tudo de um modo muito simples?
- Sim, sim, gritaram os robots.
- Muito bem. Vocês sabem o que é o "big bang"?
- Sim. Até já fizemos exames sobre isso.
- Óptimo. O "big bang" foi o instante em que nasceu o molusco em que agora vivemos. Fica tudo claro?
- Sim, sim.
- Há mais alguma dúvida?
- Não, não.
"Como os humanos na fase última", pensou o Presidente, mas, como não havia mais perguntas, encerrou a sessão.
No dia seguinte a Imprensa sublinhou a excepcional clareza da intervenção do acompanhante, que quase todos os jornais apresentaram como futuro Presidente da ACUM.
As recentes SCUT (Sociedades de Cidadãos Ultrajados e Tiranizados) tiverem uma aparição baseada na anedota e incompetência nacional e na idiotice e oportunismo político. Estou tão triste e indignado que resolvi iniciar uma série de textos de humor de várias cores, para dar riqueza e opção de escolha. O Humor que vou privilegiar é branco, negro, amarelo, verde e de cores intermédias. Assim servirá todos os eleitores e opções partodárias (*); e, quiçá, até vou ser convidado para candidato a ministro ou para o prémio Nobel; já que para ser Nobel, basta ter o nome de um erva do monte e escrever português sem pontuação. Eu, pelo menos, e segundo o critério dos meus velhotes, nasci para ser santo. Não há pachorra... Aqui vai o primeiro, incidente do acidente telefónico:
Drrriiiiiimm! Está? Sim, sou eu! E você quem é? Não conheço! Conheço? Especifique. Ah! É o amigo do Manel que é conhecido de um cunhado do Zé que é irmão do primo que é marido da Faneca que é mãe do Janeca que é meu afilhado... Sim! Estou a ver e que deseja o meu ilustre amigo! Se é que eu posso fazer alguma coisa por si? Poderei? Tem a certeza? Bom então combinamos para almoçar porque isto de pedir favores pelo telefone é perigoso... Está a ver, você pode estar a ser objecto de escuta telefónica à conta de pedidos que ande por aí a fazer e prendas que ande por aí a dar, sobre os quais, até, já poderá estar a decorrer uma operação oculta com um nome de código qualquer relativo a uma qualquer palhaçada e eu é que me lixo. Almoçar ou jantar? Tudo bem, mas não, Homem! Também não podemos combinar o restaurante onde repastaremos, pelo telefone. Já sabe, põem escutas na mesa, ou rodeiam a mesa de infiltrados, disfarçados de jornalistas, por exemplo, e, no dia seguinte, vem tudo escarrapachado nos jornais. É uma coisa simples? Sei lá... Você é que diz que é simples, mas como eu não quero que me diga pelo telefone, lá teremos que repastar. E é melhor não dizer já pelo telefone. Arranjaremos outro meio de comunicação. Nunca se sabe! As coisas que às vezes nos parecem simples, transformam-se numa crise nacional de proporções inimagináveis. Esta não? Tem a certeza? Bem, seria melhor jogar pelo seguro! Não acha preferível falarmos no restaurante? Claro que é você a pagar o repasto! Nunca ouviu dizer que não há almoços grátis? Se você me pede um favor, almoçamos e paga o repasto. Quando eu tiver o seu pedido equacionado e resolvido encontramo-nos noutro restaurante – já não pode ser no mesmo por causa das tais operações esquisitas – e eu comunico-lhe o que tiver a comunicar. Fica muito caro para uma coisa tão simples? Ò Homem! Verem-nos juntos já pode ser considerada corrupção e pode sair muito caro. Não? Eu sei lá o que é que você anda para aí a fazer. Seja lá o que for, declararei veementemente que desconheço! Eu até nem o conheço. Você é testemunha de que eu desconheço as suas actividades... e nem sequer estou agora a falar consigo. Mas posso estar a ser escutado! Eu sei, mas se os investigadores me estiverem a escutar sem ordem do Juíz certo, isto é tudo mandado destruir. Ah sim? Então venha cá ao escritório, deixe um envelope à minha Secretária em meu nome, ponha num papel o nome do restaurante e a hora e eu lá estarei. Aviso já que nestes repastos só como marisco e bebo champanhe. Se pode deixar à minha Secretária? Claro que pode. Ela tem as mesmas mordomias que eu e se quiser ter o lugar assegurado tem de se manter na linha, até pode ser uma agente infiltrada.Mas perde o tacho e o motorista se eu topar que ela não é de confiança. Fique bem e até ao repasto.
O telefone desligou-se e eu não vos maço mais... com esta, claro! Cumprimentos intergalácticos.
Luís Santiago
(*) Nova palavra do léxico português que significa parir político-partidário
NOTA: Não ponho PS (Post Scriptum) em vez de NOTA, por razões óbvias. Qualquer semelhança entre o texto acima e a realidade é pura coincidência, dado tratar-se da fértil imaginação do Autor posta em palavras.