Na fila do supermercado, o caixa diz a uma Senhora idosa que deveria trazer os seus próprios sacos para as compras, uma vez que os sacos de plástico não eram amigos do meio ambiente.
A senhora pediu desculpas e disse: “Não havia essa onda verde no meu tempo.”
O empregado respondeu: "Esse é exactamente o nosso problema hoje, minha Senhora. A sua geração não se preocupou o suficiente com o nosso meio ambiente. "
"Você está certo", responde a Senhora, "a nossa geração não se preocupou adequadamente com o meio ambiente. Naquela época, as garrafas de leite, garrafas de refrigerante e cerveja eram devolvidas à loja. A loja mandava de volta para a fábrica, onde eram lavadas e esterilizadas antes de cada reuso, e eles, os fabricantes de bebidas, usavam as garrafas, umas tantas outras vezes. Realmente não nos preocupámos com o meio ambiente no nosso tempo. Subíamos as escadas, porque não havia escadas rolantes nas lojas e nos escritórios. Caminhávamos até ao comércio, em vez de utilizarmos o nosso carro de 300 cavalos de potência cada vez que precisamos de ir a dois quarteirões de distância.
(*)
Mas Você está certo. Nós não nos preocupávamos com o meio ambiente. Até então, as fraldas de bebés eram lavadas, porque não havia fraldas descartáveis. Roupas secas: a secagem era feita por nós mesmos, não nestas máquinas bamboleantes de 220 volts. A energia solar e eólica é que realmente secavam as nossas roupas. Os meninos pequenos usavam as roupas que tinham sido dos seus irmãos mais velhos, e não roupas sempre novas.
Mas é verdade: não havia preocupação com o meio ambiente, naqueles dias. Naquela época tínhamos somente uma TV ou rádio em casa, e não uma TV em cada quarto. E a TV tinha uma tela do tamanho de um lenço, não um telão do tamanho de um estádio; que depois será descartado como?
Na cozinha, tínhamos que bater tudo com as mãos porque não havia máquinas eléctricas, que fazem tudo por nós. Quando embalávamos algo um pouco frágil para o correio, usávamos jornal amassado para protegê-lo, não plástico bolha ou "pellets" de plástico que duram cinco séculos para começar a degradar.
Naqueles tempos, não se usava um motor a gasolina apenas para cortar a relva, era utilizado um cortador de relva, que exigia músculos O exercício era extraordinário, e não precisávamos de ir a um ginásio e usar passadeiras que também funcionam a electricidade.
Mas Você tem razão: não havia naquela época preocupação com o meio ambiente. Bebíamos directamente da fonte, quando estávamos com sede, em vez de usar copos plásticos e garrafas pet que agora enchem os oceanos. Canetas: recarregávamos com tinta umas tantas vezes, em vez de comprar uma outra. Abandonámos as navalhas, ao invés de deitar fora todos os aparelhos 'descartáveis' e poluentes, só porque a lâmina ficou sem corte.
Na verdade, tivemos uma onda verde naquela época. Naqueles dias, as pessoas apanhavam o autocarro e os meninos iam nas suas bicicletas ou a pé para a escola, em vez de usar a mãe como um serviço de táxi 24 horas. Tínhamos só uma tomada em cada quarto, e não um quadro de tomadas em cada parede para alimentar uma dúzia de aparelhos. E nós não precisávamos de um GPS para receber sinais de satélites a milhas de distância no espaço, só para encontrar a pizzaria mais próxima."
Então, não dá vontade de rir que a actual geração fale tanto em meio ambiente, mas não queira abrir mão de nada e não pense em viver um pouco como na minha época?
Sendo a natureza do problema sobretudo de ordem política, não se estranhará que, à medida que tal entendimento se vier a alastrar, se multipliquem as tomadas de posição sobre o Protocolo de Quioto de acordo com a diversidade de correntes políticas e ideológicas presentes no mundo contemporâneo. E, em tal contexto, certamente com crescente exuberância, já que desaparece – ou, pelo menos, se desvanece – o óbice científico e/ou técnico que por vezes condiciona a tomada de posição política em questões complexas.
Não custa prever que as tomadas de posição política se distribuam por um leque alargado que irá desde a rejeição do Protocolo de Quioto até à sua defesa acérrima. Notemos que, embora tenha sido subscrito por muitos países subdesenvolvidos, o Protocolo de Quioto pode no entanto vir a ser considerado como mais um instrumento de domínio dos países mais desenvolvidos, que, de resto, se destacaram na sua concepção e organização; em contrapartida, não faltará quem, de facto, o considere como um texto “evangelizador” dos tempos modernos, portanto, intocável.
O distanciamento, senão a rejeição, do Protocolo de Quioto pode entretanto basear-se mais em razões de ordem técnico-económica do que política[cf. MOURA (2004)], na linha da concepção de que os sacrifícios económicos que implicará não parecem ser justificados pelas eventuais vantagens que resultarão da sua aplicação.
Segundo a nossa análise, em face das dúvidas de ordem científica e da natureza de ordem política que parecem subjazer ao Protocolo de Quioto, também não encontramos razões fortes para a sua defesa. Mas cabe alertar para os riscos da rejeição pura e simples do Protocolo de Quioto, que, no concreto, pode começar pela rejeição do comércio de emissões (comércio, que, a nível comunitário, começa a ser organizado) e acabar no abandono do estudo do impacte das alterações climáticas. É que falta saber se, da aplicação do Protocolo de Quioto, e admitindo que esta vai conseguir evitar um retrocesso económico, resultará ou não uma dinâmica de transformações que em muito ultrapasse a questão da emissão dos gases com efeito de estufa.
Na verdade, independentemente da sorte do Protocolo de Quioto, importa velar por duas questões de fundo que, à partida, lhe podem vir a ser associadas: a insuficiente capacidade actual para produzir energia a partir de fontes renováveis, a nossa fraca capacidade para, em termos globais, nos adaptarmos às alterações climáticas. Trata-se de dois desafios que se colocam à Humanidade, não se vendo como se pode continuar a falar de desenvolvimento sustentável sem os encarar.
Quanto à produção energética, independentemente do muito que se pode vir a beneficiar das melhorias ligadas aos ganhos de eficiência no consumo, importa não escamotear que a energia é uma questão central – produção material, produção de serviços, mobilidade – na organização da vida cómoda em sociedade evoluída, pelo que, a eliminar desigualdades sociais, as necessidades de energia vão crescer muito, mesmo que a população mundial não crescesse. E se o petróleo não acaba amanhã, sabemos que a sua disponibilidade já foi muito mais significativa. A produção de energia a partir de fontes renováveis não é, portanto, um problema que possa ser adiado mais ou menos indefinidamente. Aliás, embora que em referência fugaz, a própria Comissão Europeia não deixa de colocar[cf. CE (2005)b, pp. 25 e 27] na paleta das formas de energia a desenvolver a via da energia nuclear. O que, sem esforço, pode ser aceite como uma medida prudente na procura de um leque de formas de energia disponíveis, em alternativa à forte dependência do carvão, cujas reservas são mais duradouras.
Quanto às alterações climáticas, independentemente dos nossos esforços para tentarmos reduzir as nossas eventuais influências no clima, configuram-se como um dado da história geológica, pelo que se não vê como poderemos alhear-nos delas, quando, além do mais, como já referimos, se pretende caminharmos para o desenvolvimento sustentável. Não é de crer que a Humanidade logre nas próximas décadas uma situação que a imunize dos efeitos devastadores que podem estar associados às alterações climáticas; mas, da mesma forma que nos podemos e devemos preparar melhor para enfrentar as consequências doutros cataclismos (sismos, erupções vulcânicas), também as alterações climáticas devem estar na agenda científica, económica e política.
E se muitos estudos são necessários para entender melhor os fenómenos em causa, uma consideração elementar cabe enfatizar: quanto maior for o saber e a produção de riqueza, mais hipóteses tem a Humanidade de conseguir melhores condições para enfrentar agruras mais extremas da Natureza. Que se desenvolva, pois, a ciência e que cresça a economia, por forma a que a criação de melhores infra-estruturas seja possível bem como a segurança a nível pessoal. É claro que isto também implica a distribuição de riqueza, não apenas a sua produção, mas esse já é um velho problema político bem mais conhecido.
Ora, a respeito destas duas questões de fundo – produção energética sem petróleo e alterações climáticas –, nada parece estar garantido com o Protocolo de Quioto, já que não é de excluir que, a vingar, o mesmo possa vir a ser reduzido à questão da emissão de gases com efeito de estufa. Mas quem optar pela crítica pura, eventualmente combate, do Protocolo de Quioto {se é que, em verdade, vai ser preciso combatê-lo na versão actual, tal é o número de problemas que o dito tem pela frente [cf. VICTOR (2004)]}, será bom que não esqueça que, mesmo que por ínvios caminhos, o Protocolo de Quioto pode, pela dinâmica das transformações que logre introduzir, ser parte de um programa que, eventualmente, traga no seu bojo algo de muito positivo para a Humanidade.
Visto que, em vez de uma estrada recta e segura para a resolução dos problemas ligados às alterações climáticas, que é uma imagem que traduz a ideia que os entusiastas do Protocolo de Quioto dele gostam dar, pode o mesmo, no entanto,
configurar-se como o centro de uma encruzilhada em que podem confluir várias estradas, nem todas com direcção respeitável, é certo, mas dispondo de algumas com potencialidades não desprezáveis.
Por exemplo, a esta luz, a sequestração do dióxido de carbono pode tornar-se um alvo não prioritário do saber científico e técnico, bem como pode perder prioridade a procura de métodos alternativos relativos a processos de transformação não energética com libertação de dióxido de carbono (exemplo emblemático disto é a produção de clínquer, na fabricação de cimento), mas o saber para a mudança tecnológica ligada à produção e distribuição de energias renováveis já é urgente enquanto promessa de libertar a Humanidade da dependência excessiva dos combustíveis fósseis.
Por tudo isto pensamos que, tendo em conta o peso institucional da ONU e, em particular, o da União Europeia, será prudente, sem minimizar os riscos que um tal programa encerra, exercer uma vigilância crítica sobre a aplicação dos dispositivos previstos pelo Protocolo de Quioto e políticas e medidas relacionadas, a fim de tentar retirar proveito dos objectivos vantajosos que, eventualmente, lhe podem estar associados.
A vigilância crítica justifica-se tanto no âmbito das políticas e medidas internas ao programa no espaço comunitário europeu, no sentido de conceder clara prioridade à promoção de tecnologias energéticas sobre fontes renováveis, como no âmbito mais geral da sua difusão, designadamente pelos países menos desenvolvidos. No plano interno europeu e, em particular, para Portugal, importa que a promoção das novas tecnologias não implique atraso no crescimento económico; no plano da sua difusão pelos países menos desenvolvidos, se as novas tecnologias são de saudar como meios alternativos à disposição de quem procure o desenvolvimento, as mesmas não têm no entanto de se transformar em caminho único para o crescimento económico, em particular, enquanto subsistirem tão pesadas dúvidas no plano científico quanto aos efeitos da utilização de combustíveis fósseis nas alterações climáticas.
E se colocamos o acento tónico das conclusões da nossa reflexão na esfera da economia, em particular, das políticas industriais correlacionadas com esta problemática, lembremos, no entanto, que delas podemos retirar importantes indicações para hierarquizar linhas de investigação científica neste tema tão vasto e tão cheio de interrogações. Desde logo na esfera da economia ecológica.
FIM
BIBLIOGRAFIA
BAIRD, C. (2002), Química Ambiental, Tradução de Maria Angeles Lobo Recio e Luiz Carlos Marques Carrera, Bookman, Porto Alegre, Brasil.
CE (2005)a, Winning the Battle Against Global Climate Change, título da Comunicação COM (2005) 35 final, de 9-2-2005, Bruxelas, da Comissão Europeia, dirigida ao CE, PE, CESE e Comité das Regiões sobre a estratégia de redução de emissões no médio e longo prazo, isto é, após 2012.
CE (2005)b, Comission Staff Working Paper / Winning the Battle Against Global Climate Change / Background Paper, disponibilizado pela Comissão Europeia em anexo à versão draft de CE (2005)a.
CHANG, R. (1994), Química, 5.ª Edição, McGraw-Hill, Lisboa.
FELLENBERG, G. (2000), The Chemistry of Pollution, translated by Allan Wier, John Wiley & Sons, Chichester, England.
FERRY, L. (1992), A Nova Ordem Ecológica, Tradução de Luís de Barros, Edições Asa, Lisboa.
MOURA, R. (2004), Protocolo com uma morte anunciada, in Le Monde Diplomatic, Setembro de 2004, pp. 26-27, versão portuguesa.
PEREIRA, J. S. (2002), Alterações Climáticas – O Papel dos Engenheiros Florestais, in Ingenium, Mar/Abr 2002, pp. 30-34, Ordem dos Engenheiros, Lisboa.
SANTOS, F. D. et al (editors) (2002), Climate Change in Portugal. Scenarios, Impacts and Adaptation Measures. Siam Project, Gradiva, Lisbon.
VICTOR, D. G. (2004), The Collapse of the Kyoto Protocol and the Struggle to Slow Global Warming, Princeton University Press.
Tendo em conta o antes exposto, somos levados a pensar que a razão de fundo que, em particular, motiva a posição da Comissão Europeia, conquanto não declarada, é de ordem política, não científica. (Privilegiamos a Comissão Europeia nesta análise por ser geralmente reconhecido o seu papel de liderança no atingimento do Protocolo de Quioto e pela diligente capacidade de iniciativa que vem exibindo na tomada de medidas inspiradas ou previstas pelo Protocolo).
A verdade é que, a ter êxito o programa em marcha na União Europeia, vão ser desenvolvidas novas tecnologias de produção e utilização energéticas em alternativa à queima dos combustíveis fósseis. É a procura de uma economia menos dependente do carbono. Objectivo que não custa considerar como estratégico para a União Europeia (EU), em face da crescente dependência do exterior da UE que se verifica no abastecimento energético do conjunto dos seus Estados. Mas trata-se de um objectivo cuja enunciação causaria óbvias dificuldades na frente diplomática: são conhecidas as preocupações dos produtores de petróleo acerca do ritmo de inovação nas alternativas ao petróleo e a extrema acuidade com que seguem as flutuações da procura do “ouro negro”, o que se reflecte na flutuação dos seus preços. Um cartel significativo deste mercado, a OPEP, é fonte recorrente de notícias há muitos anos. De resto, é uma evidência da história do último século a polarização de muitos e graves conflitos em torno da questão petrolífera (mais recentemente estendida ao gás natural), de tal forma que se pode dizer que, se o mundo economicamente desenvolvido tem tirado partido da utilização do petróleo, o mesmo mundo não se vem entretanto conseguindo furtar à ameaça da perspectiva da escassez do petróleo, que, sabemos, não é inesgotável. Mas que, por ora, só parece ser especialmente valorizado enquanto for considerado fonte maior do abastecimento energético, não parecendo bastante para a sua valorização enquanto fonte material para a produção de objectos (produção material).
É certo que, em rigor, a Comissão Europeia já reconheceu a importância estratégica da procura de alternativas ao petróleo [cf. Livro verde para a segurança de abastecimento energético da União, COM(2000)769, Bruxelas]. Mas é de todo compreensível, tendo em conta as dificuldades da diplomacia, que, ao alertar [cf. CE(2005)b, p. 28] para a necessidade de reforçar o financiamento das actividades dirigidas para as novas tecnologias energéticas (e de transportes) no âmbito do próximo Programa-Quadro, a Comissão Europeia não insista na caracterização de uma situação que pode ser configurada como, de facto, um garrote condicionador do desenvolvimento económico europeu no longo prazo, senão já no médio prazo [De resto, no citado e extenso documento CE(2005)b sequer se faz referência explícita ao Livro verde, de 2000. A referência à segurança do abastecimento energético aparece apenas como um co-benefício da redução dos gases com efeito de estufa - cf. CE(2005)b, p. 32 - , remetendo o texto para as previsões relativas ao consumo energético em 2030 constantes do World EnergyOutlook, da Agência Internacional de Energia, e não para as do citado Livro verde, da UE]. Convenhamos que, em vez dessa argumentação, o recurso ao que se apresenta como uma eventual retórica de recorte ambientalista se encaixa muito bem na circunstância. Tirando aqui a Comissão Europeia partido de certos caminhos que a problemática do ambiente vem percorrendo, no caso, na frente diplomática. Um percurso, cabe assinalar, que tem sido trilhado com o contributo de muitos, não apenas com o concurso do Conselho Europeu ou da Comissão Europeia, reconheça-se.
Ilustra isto mesmo que vimos de afirmar o facto de, recentemente, o Conselho Europeu não se ter eximido a «confirmar» (cf. Conselho Europeu de Março de 2005, Conclusões da Presidência, p. 15) o limite de 2 ºC para a «subida média da temperatura», em relação aos níveis da época pré-industrial, em ordem a atingir o objectivo último da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas. Esta decisão não se radicará, queremos acreditar, na convicção de que o Conselho Europeu esteja imbuído de competência científica para o efeito, antes se deverá a que, na linha do que já muito antes acontecera – em concreto, rezam os registos relativos a Junho de 1996 que o Conselho Europeu «acredita» [cf. CE (2005)b, p. 8.Mesmo que de passagem, notemos entretanto que, em texto mais virado para a divulgação, a referência ao acreditar é substituída pela mais convincente referência de o limite de 2 ºC ter sido «estabelecido» pelo Conselho Europeu em 1996, cf. L’Environement pour les Europeens, n.º 19, Março de 2005, CE, p. 4. Mas isto não impede que a referência ao limite dos 2 ºC possa aparecer independente da decisão do Conselho Europeu: em recente documento do staff da Comissão Europeia afirma-se que a «ciência diz-nos que» devemos respeitar o limite de 2 ºC para conter os estragos ligados às alterações climáticas, cf. CE (2005)b, p. 8] que o limite de 2 ºC não deve ser excedido – o Conselho Europeu entende ser aceitável, porventura
recomendável, intrometer-se em domínio que, a nosso ver, àciência cabe cobrir, não à política. É caso para dizer, a César o que é de César, não o que à ciência respeita.
O motivo estratégico da procura de uma economia menos dependente do carbono é decerto bastante para conseguir a unidade, em torno deste programa, dos diferentes Estados-Membro, incluindo o Reino Unido, que, desta vez, apesar da relevância internacional e da natureza do assunto, não alinha com os EUA na rejeição ao Protocolo de Quioto. E isto ocorre mesmo dando-se o caso de o Reino Unido ainda ser um dos poucos Estados europeus com reservas de carvão. Mas o carácter de longo prazo de que a estratégia se revestirá terá ditado o distanciamento neste ponto entre os tradicionais aliados das margens atlânticas.
Estratégia que, eventualmente, pode falhar o alegado objectivo de vencer a batalha contra as alterações climáticas a nível planetário, no sentido de impedir estas, mas que pode tentar ganhar a aposta na mudança tecnológica, ao estilo ou por via de inspiração schumpeteriana.
A esfera das motivações políticas não se esgota, porém, nesta razão estratégica. Notemos que a concepção do Protocolo de Quioto comporta, entre outros, um óbice de monta: a ausência de um mecanismo eficaz que penalize o Estado que resolva sair do Protocolo, ou seja, a ausência da capacidade de retaliação. Por isso, não é por acaso que se admite agora a necessidade de o Protocolo de Quioto vir a ser ligado à Organização Mundial do Comércio.
Só que aquilo que se apresenta, por ora, impossível de resolver, ou, pelo menos, que é de muito difícil resolução no quadro global (ausência de autoridade que imponha retaliação), é facilmente resolúvel no quadro da União Europeia, enquanto entidade supranacional. A oportunidade de afirmação política para a burocracia centrada em Bruxelas trazida pelo Protocolo de Quioto é, evidentemente, de ouro, desde logo no quadro interno europeu. E, conseguindo êxito, nem que seja só no
comércio interno de emissões, fácil é de antever como se abrirão as velas ao vento em ordem a rotas mais alargadas...
Podem, é certo, tecer-se muitas outras e as maiores dúvidas sobre a viabilidade dos dispositivos postos em marcha pelo Protocolo de Quioto (quem vai pagar, e quanto, quem vai receber, e quanto, e afinal porquê?, não parecem questões facilmente ultrapassáveis a nível internacional) ou observar que talvez seja pouco sério tentar avançar com o mesmo sem os EUA, como propõe David G. Victor [cf. VICTOR (2004)]. Mas o que, do ponto de vista político, parece estar em jogo explica sem ambiguidades o ímpeto que Bruxelas coloca nesta frente política.
* - Engenheiro Químico IST, Doutorado ISCTE, Professor no ISCTE
Ao Protocolo de Quioto parece continuar a faltar uma base científica inquestionável, mas, em compensação, não lhe falta base política.
Contudo, em alternativa à total rejeição do mesmo, considera-se a hipótese de que possa vir a haver lugar a uma forte vigilância crítica à aplicação das políticas e medidas correlacionadas, levando em conta a mudança tecnológica que pode estar associada ao Protocolo de Quioto. Reflexos na hierarquia de linhas de investigação científica podem ocorrer.
1.A Natureza do Problema
De muitos pontos de vista, são várias e delicadas as questões que se continuam a levantar em torno do Plano Nacional das Alterações Climáticas (PNAC), do comércio de emissões de gases com efeito de estufa, do Protocolo de Quioto. Importa, antes de mais, analisar a natureza do que está em causa.
Se atentarmos na versão claramente dominante entre nós, todos estes assuntos se interligam e têm uma raiz comum, a saber: em resultado da industrialização, vêm-se acumulando na atmosfera gases com efeito de estufa, de que resulta o aquecimento global do planeta, que, por sua vez, induz as alterações climáticas, com consequências económicas e sociais possivelmente desastrosas.
Daí que o assunto tenha passado a constituir desde há anos um tema obrigatório da agenda ambiental, de que resultou finalmente o estabelecimento do Protocolo de Quioto, hoje formalmente em vigor, após o compromisso definitivo da Rússia.
Mais, para a Comissão Europeia, e apesar de os EUA terem rejeitado o Protocolo de Quioto e de a Austrália não o ter ratificado, não só há que ir em frente, como, literalmente, trilhando o caminho aberto pelo Protocolo de Quioto, assim se vai vencer a batalha contra as alterações climáticas a nível planetário[cf. Winning the Battle Against Global Climate Change, título da Comunicação da Comissão Europeia ao CE, PE, CESE e Comité das Regiões sobre a estratégia de redução de emissões no médio e longo prazo, isto é, após 2012, doravante referida por CE (2005)a, datada de 9 de Fevereiro de 2005].
E através de que mecanismo vai ser isso possível? Basicamente, através da contenção na produção antropogénica de gases com efeito de estufa, objectivo primeiro do Protocolo de Quioto, cuja extensão no pós-2012 se admite agora dever ser tal que o aquecimento global, em relação aos primórdios da industrialização, não ultrapasse os 2º C, limite tido como máximo tolerável para evitar alterações climáticas brutais. Como ainda só teremos subido 0,6º C, restar-nos-ão assim alguns anos para podermos atingir o objectivo de a economia continuar a crescer sem que aquele limite seja ultrapassado.
Embora se não explique tudo, tem-se adiantado, ao jeito de explicação científica, que, como é do conhecimento corrente, são de muitos milhões as toneladas de dióxido de carbono – apresentado frequentemente como o principal dos gases com efeito de estufa – que a Humanidade vem colocando na atmosfera em resultado da queima dos combustíveis fósseis (petróleo, gás natural, carvão). Sendo que o fez concentradamente no último século/século e meio. A emissão anual actual rondará os 6 mil milhões de toneladas de dióxido de carbono e a acumulação dá-se porque o ritmo da retirada do dióxido de carbono da atmosfera não iguala o ritmo das emissões conjuntas, de origem natural e humana, para a atmosfera.
Ora, para mais repousando nestas explicações, como a ideia de prevenir situações mais ou menos catastróficas é do óbvio agrado geral, fácil é entender a adesão a estas preocupações e a ampla aceitação do conjunto de expressões que, na mente de milhões de pessoas, significarão o mesmo: alteração climática <> aquecimento global <> Protocolo de Quioto.
Acontece, porém, que as mudanças que se estão a começar a colocar em prática, desde logo o comércio de emissões, não são gratuitas, antes levantam sérios obstáculos, para além dos custos de oportunidade que também têm. No caso de Portugal, por exemplo e em resultado de um apertadíssimo objectivo global consentido na negociação tendente ao estabelecimento das licenças de emissão de CO2, são de prever dificuldades, a somar às existentes, em particular no que respeita às actividades exportadoras. Não obstante, as reacções havidas têm sido do tipo de quem, no mínimo, considera politicamente incorrecto levantar objecções de fundo à questão.
1.1– A Base Científica
Como seria de esperar, um assunto desta envergadura não avançaria, em especial a partir de Bruxelas, sem a indispensável cobertura científica.
Com a criação e actuação do IPCC(International Panel for Climate Change, ligado à Organização das Nações Unidas), dá-se por resolvido o problema. Mercê de modelos computorizados sobre o funcionamento do clima que têm sido desenvolvidos nos últimos anos, apesar das incertezas científicas que restam, conclui-se como provável (para não dizer, simplesmente, possível, já que se trata de cenários de evolução do clima) que as emissões dos gases com efeito de estufa estejam a originar o aquecimento global, a que se atribuem as alterações climáticas.
Só que, para a Comissão Europeia, as incertezas são aparentemente irrelevantes e tudo se passa como se o que é provável (ou possível), já seja certo. E como há alterações climáticas significativas, não há tempo a perder. Daí o seu programa. Que, eventualmente, não teria de ser igual, caso fosse determinado pelo princípio da precaução, aplicado de forma prudente, está bem de ver.
Não se estranhará, por isso, que, quando aparece a dúvida sobre a natureza profunda do que está em causa, a resposta incida sobre o alegadamente elevado número de cientistas que apoia este ponto de vista, não sobre a explicação científica propriamente dita. Para o primeiro-ministro britânico Tony Blair, por exemplo, ainda há cientistas que não estão de acordo com a importância dos gases com efeito de estufa de origem antropogénica nas alterações climáticas, mas são minoritários e em número decrescente (cf. The Economist, 1 de Janeiro de 2005, p. 29).
Aqui ocorre observar como tudo seria bem mais simples em ciência se o conhecimento científico fosse atingível pelo critério das regras democráticas . . .
Ora, o que, no plano científico, encontramos[cf. CHANG (1994), pp. 801-807] como incontroverso nesta área é que o dióxido de carbono concorre para o efeito de estufa pela facto de a estrutura molecular da substância química (CO2) ser dotada de 3 átomos, ao contrário do que acontece com o oxigénio (O2) e o azoto (N2), principais constituintes da atmosfera, que têm moléculas biatómicas mas mononucleares. A molécula de dióxido de carbono é susceptível de absorver radiações infravermelhas porque a energia recebida é posta ao serviço da criação de momentos dipolares(Grandeza física, cujo módulo se define pelo produto de uma carga eléctrica por uma distância), momentos que se extinguem quando a energia que “excitou” vibracionalmente a molécula for reemitida, de novo sob a forma de radiações infravermelhas, para a terra. É o efeito de estufa. Porém, a molécula da água (H2O) também é triatómica e heteronuclear [Como o é a molécula do óxido nitroso (N20); as moléculas de metano (CH4) e do hexafluoreto de enxofre (SF6) são estruturas ainda com mais átomos], para além de ser polar, o que lhe confere propriedade similar à do tão falado dióxido de carbono. Propriedade que escapa ao oxigénio ou ao azoto, como referimos, pela comum incapacidade estrutural de as respectivas moléculas, por serem mononucleares, gerarem momentos dipolares[A explicação científica aqui referida pode ser aprofundada – cf. BAIRD (2002), pp. 195-242. Não propomos aqui o seu aprofundamento por, atendendo ao objectivo do presente artigo, isso nos parecer dispensável].
É de tal modo assim que, tendo em conta a importante proporção relativa de vapor de água na atmosfera terrestre, cabe(cf. Global Warming: a closer look at the numbers, in http://geograft.com) à água e não ao dióxido de carbono a parte do leão do efeito de estufa. O vapor de água contribui com 95 % do efeito de estufa. Ou seja, apenas 5 % do efeito de estufa não é explicável pelo vapor de água, mas ainda assim estes 5 % não são da total responsabilidade das actividades humanas; eis por que se estima que a contribuição antropogénica do dióxido de carbono para o efeito de estufa se queda por 0,117 % e o Protocolo de Quioto, caso vingasse, não mais implicaria do que reduzir 0,035 % do efeito de estufa, no que respeita ao dióxido de carbono. Nesta linha de raciocínio, a conclusão é óbvia: a alteração da composição atmosférica provocada pelas actividades humanas é diminuta para efeitos do fenómeno do efeito de estufa. Para o Prof. S. Fred Singer, o Protocolo de Quioto não teria(cf. Global Warming: a closer look at the numbers, in http://geograft.com) mais do que um efeito imperceptível – cerca de 0,05 ºC – por volta de 2050.
Estamos, é claro, habituados a ouvir outros números acerca do papel do dióxido de carbono, concretamente, que é da ordem dos 72 % a sua contribuição para o efeito de estufa. Ora, esta cifra obtém-se descontando a contribuição do vapor de água e avaliando a contribuição do dióxido de carbono (e diga-se que total, de origem natural e antropogénica) no conjunto dos outros gases considerados no Protocolo de Quioto: metano, óxido nitroso, hexafluoreto de enxofre e outros.
Dir-se-á que o vapor de água, ao contrário daqueles gases também com efeito de estufa, com origem antropogénica [designadamente resultante da queima dos derivados de petróleo e do gás natural (Cabe lembrar que os derivados de petróleo, bem como o gás natural, são na sua maior parte hidrocarbonetos (compostos químicos à base de carbono e hidrogénio), daí que a sua combustão completa dê origem a vapor de água, além de dióxido de carbono)] não se acumula praticamente na atmosfera, pelo que, se queremos ver a influência das actividades humanas na alteração da composição atmosférica, lógico é que dêmos destaque aos gases que se acumulam na atmosfera. Entretanto, isso não nos autoriza a esquecer a globalidade do efeito e como é de efeito de estufa que se quer falar, não podemos esquecer a contribuição dominante do vapor de água para o mesmo.
Mas não é apenas por causa da contribuição do vapor de água que há quem conteste a alegada importância do dióxido de carbono antropogénico no efeito de estufa.
Global Warming: A Chilling Perspective, in http:// geocraft.com
Quanto ao clima e às suas evoluções, da disciplina da geologia há quem colha leitura muito diversa para o que está a acontecer. Quanto ao aquecimento global, pode dizer-se(cf.Global Warming: A Chilling Perspective, in http://geocraft.com) que, em rigor, não é de agora, ele vem tendencialmente verificando-se nos últimos 18 mil anos, desde o fim da última idade do gelo. E a explicação que, com base na teoria dos ciclos de menor amplitude temporal (ver gráfico), fornece para a evolução da temperatura média do planeta consente a interpretação de que pode ser mera coincidência verificar-se o aumento de temperatura que se vem registando desde a segunda metade do século XIX em simultâneo com o aumento do consumo dos combustíveis fósseis.
Muito curioso, a este propósito, é que se a teoria dos ciclos se continuar a observar, podemos afinal estar nas vésperas de um novo ciclo de arrefecimento, pelo que a última coisa que nos conviria fazer é tentar reduzir a presença de dióxido de carbono na atmosfera.
Seja como for, parece avisado que retenhamos a possibilidade de o aquecimento global implicar alterações climáticas, mas não rejeitemos a hipótese de as alterações climáticas ocorrerem por causas diversas.
Não deixa de ser intrigante, entretanto, que, do ponto de vista da base científica, o actual estado das coisas conduza ao panorama esboçado (Realmente, estamos a simplificar. A controvérsia é extensa e compreende outros pormenores, até, por exemplo, ao nível da mera linguagem usada na referência à substância dióxido de carbono: para os entusiastas do Protocolo de Quioto o dióxido de carbono é um poluente, enquanto que outros estranham como se pode chamar assim a uma substância central na organização da vida na Terra, já que metade da massa florestal é constituída por dióxido de carbono, retirado à atmosfera pela via fotossintética). Então não parece óbvio que se deveria organizar o diálogo frutuoso entre perspectivas tão antagónicas? O problema é que, de momento, o mesmo parece, no mínimo, adiado. Do lado da Comissão Europeia [Ou,se se quiser, do lado do seu staff; confira o extenso documento CE (2005)b], por exemplo, o silêncio é total sobre a visão contrária. Por sua vez, do lado dos que contestam o significado do dióxido de carbono antropogénico nas alterações climáticas, a acusação é cortante: a hipervalorização do papel do dióxido de carbono no efeito de estufa resulta simplesmente da eliminação do papel do vapor de água no efeito de estufa, ou seja, as estatísticas e os modelos computorizadas da parte oposta não consideram (cf. Global Warming: A Chilling Perspective, in http://geocraft.com) a contribuição do vapor de água.
Assim, a avaliar pelos conhecimentos científicos a que conseguimos aceder até ao momento sobre este assunto, são no mínimo duvidosos os fundamentos científicos em que se apoia o Protocolo de Quioto (O Anexo A do Protocolo de Quioto exclui, com efeito, a água, melhor, o vapor de água, da lista dos gases com efeito de estufa) e que a Comissão Europeia invoca para basear um programa de iniciativas tão vastas como o que propõe na linha do aprovado pelo referido Protocolo.
FIM DA I PARTE (de 3)
* - Engenheiro Químico IST, Doutorado ISCTE, Professor no ISCTE
As novas sobre o clima e a repercussão dele sobre o meio ambiente são assustadoras. Mesmo com todo o alarde das pesquisas científicas e das organizações não governamentais que divulgam os graves riscos que a população mundial corre, muitos governos ainda não perceberam a importância da tomada de medidas urgentes para tratar e resguardar a natureza.
Segundo o IPCC (sigla inglesa para Painel Internacional para Mudança Climática), em Abril deste ano, em Bruxelas, sairá um relatório questionando o impacto que o efeito estufa está trazendo ao clima e as alterações sobre o meio ambiente, dele decorrentes. Segundo o jornal australiano “The Age”, há sérias perspectivas para um futuro próximo de fome e falta de água potável. Segundo estudos já divulgados, a temperatura do planeta está aumentando e pode chegar ao final deste século a mais de 4, 5 graus C acima dos níveis normais pré-indústrias, levando ao degelo gradativo das calotes polares e à elevação do nível dos mares com a possibilidade do desaparecimento de parte das cidades litorâneas em todo o planeta.
A Austrália, reciclando a água de esgoto para fazer frente à seca e aos incêndios, mudanças climáticas, tempestades e inundações em uns lugares, calor intenso e secas em outros, é a natureza em desequilibro, gritando sua revolta contra a poluição, ameaçando a biodiversidade e a persistência da vida humana na face da terra. Se não houver conscientização e atitude generalizadas da população e dos governos para a protecção do que resta dos nossos recursos naturais, o futuro será de facto preocupante.
Que temanho teria o buraco do ozono quando Fernão de Magalhães descobriu o Estreito que ficou com o seu nome?
O Brasil é um dos países mais ricos em recursos hídricos e vegetais da Terra, mas por falta de educação ambiental e de políticas adequadas, ou por políticas egoístas e equivocadas, está perdendo a guerra contra a destruição do seu ainda rico meio ambiente. A poluição, por falta de atitudes governamentais efectivas e correctivas na área de limpeza urbana e saneamento, o desmatamento desregrado de áreas agricultáveis, o desrespeito às matas nas orlas fluviais, os esgotos escoados para os rios e mares sem o devido tratamento, o desleixo da população que joga lixo e plástico em ruas, praias e mangueirais, ameaçando a preservação da flora e da fauna, o desperdício com a má utilização da água doce, a exploração descontrolada da Amazónia, as queimadas e a destruição de parcelas enormes da floresta, pulmão do planeta, são atitudes que prejudicam não só a qualidade de vida as pessoas do país, mas de todo o mundo.
O noticiário da TV diariamente anuncia:
Lixo espalhado no espaço e no fundo do mar, maré vermelha, desaparecimento de espécies de animais e plantas, ar carregado e abafado nas cidades, clima quente onde era frio, frio onde era quente, tempestades de granizo no Verão, praias de águas sujas, inadequadas para banhos, chuvas constantes e abundantes levando à destruição de estradas, barreiras, pontes, casas, árvores e plantações. Inundações, tsunamis, secas, até na região amazónica, incêndios ambientais, todos esses sinais devem ser interpretados como um aviso do que nos espera.