A VERGONHA E O ORGULHO
Oriundo, como sou, de uma família ocidentalizada da classe média de Istambul, tenho de admitir que por vezes também sucumbo à crença de que a pobreza e a fragilidade da Turquia derivam das suas tradições, da sua cultura antiga e das várias formas como organizou socialmente a religião – que embora bem intencionada, é curta de vistas e até mesmo simplória.
Os ocidentalizados sonham transformar e enriquecer o seu país e a sua cultura imitando o Ocidente. Uma vez que o seu derradeiro objectivo é criarem um país mais rico, mais feliz e mais poderoso, tendem igualmente a ser «nativistas» e fortemente nacionalistas; podemos certamente ver estas tendências nos Jovens Turcos e nos ocidentalizados da jovem República da Turquia. Mas, enquanto alguns dos movimentos simpatizantes do Ocidente se mantêm profundamente críticos relativamente a certas características básicas do seu país e da sua cultura – embora não o façam com o mesmo espírito e ao mesmo estilo dos observadores ocidentais – vêem também a sua cultura como defeituosa, por vezes até mesmo inútil. Isto dá origem a outra emoção muito profunda e confusa: a vergonha.
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Quando tento compreender esta vergonha, esforço-me sempre por relacioná-la com o seu oposto, o orgulho.
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É partilhando as nossas vergonhas secretas que alcançamos a libertação; foi isto que a arte do romance me ensinou.
In «OUTRAS CORES», ed. EDITORIAL PRESENÇA, 1ª edição, Março de 2009, pág. 236 e seg.