Reformistas ou reformadores opõem-se aos revolucionários, aos que querem não melhorar o capitalismo mas sim suprimi-lo. O revolucionário esforça-se, destruindo o seu meio, para se reconciliar consigo próprio, visto que o homem só está de acordo consigo se estiver de acordo com as relações sociais de que é, quer queira quer não, prisioneiro… O revolucionário não tem outro programa a não ser o demagógico. Digamos que há uma “ideologia”, ou seja, a representação de outro sistema, transcendente ao presente e talvez irrealizável. Mas só o sucesso da revolução permite discernir entre a antecipação e a utopia. Por conseguinte, se ficássemos nas ideologias, juntar-nos-íamos espontaneamente aos revolucionários que normalmente prometem mais do que os outros. É forçoso que os recursos da imaginação levem a melhor à realidade, mesmo desfigurada ou transfigurada pela mentira. Assim se explica o preconceito favorável dos intelectuais a favor dos partidos avançados.
Raymond Aron
In “Memórias”, Raymond Aron, ed. GUERRA & PAZ, 1ª edição portuguesa, Fevereiro de 2018, pág. 129
No seu livro «O mundo como vontade e representação», Schopenhauer considera que o que conhecemos através dos nossos sentidos, o conhecimento empírico, é a simples representação das coisas mas que a realidade dessas mesmas coisas é praticamente inacessível ao comum dos mortais.
Daí, Sue Prideaux, na sua biografia sobre Nietzsche intitulada «EU SOU DINAMITE» afirmar no final da pág. 69 que…
Toda a vida é anseio por um estado impossível [o da compatibilização entre a representação e a realidade] e, por conseguinte, toda a vida é sofrimento. Kant escreve de um ponto de vista cristão que tornava suportável o estado sempre imperfeito e sempre desejoso do mundo empírico porque seria possível esperar uma espécie de final feliz, caso se fizesse o esforço suficiente. A redenção era sempre possível através de Cristo.
* * *
Esta «saída» kantiana faz-me lembrar que só a fé move montanhas.
The chief beauty about time is that you cannot waste it in advance.
The next year, the next day, the next hour are lying ready for you, as perfect as unspoiled, as if you had never wasted or misapplied a single moment in all your life.
You can turn over a new leaf every hour if you choose.
Com a chegada dos Muçulmanos no século VIII, nasce a urbe que virá a gerar a cidade histórica actual. Al-'Ulya' (Loulé) é-nos descrita, pela primeira vez, nas vésperas da reconquista cristã, nas crónicas árabes de Ibne Saíde e Abd Aluhaid como sendo uma pequena Almedina (Cidade) fortificada e próspera, pertencendo ao Reino de Niebla, sob o comando do Taifa Ibne Mafom.
Esta descrição não deixa de ser relevante apesar dos cronistas, na alusão à Al-'Ulya', se terem preocupado em focar aspectos do estatuto urbano e valor estratégico da Almedina omitindo por completo qualquer tipo de menção sobre o traçado urbano e arquitectónico.
A segunda metade do século XII e princípios do século XIII foi uma época marcada por grande instabilidade política e militar no mundo islâmico com dissensões internas que se reflectem em todo o Garb Andaluz, assistindo-se a um movimento generalizado de construções militares.
É bem possível que Al-'Ulya' tenha sido fortificada durante este período.
Autores de renome como David Lopes, seguido por Garcia Domingues e José Pedro Machado identificaram o topónimo com uma origem árabe que se radica em significados que remetem para altura, como elevação, colina ou outeiro, donde as formas atestadas no árabe Al-‘Ulyã e Al-‘Ulya teriam evoluído até à forma actual Loulé.
(gentileza de Margarida Castro e Álvaro José Ferreira)
De português, tenho a nostalgia lírica de coisas passadistas,
de uma infância amortalhada entre loucos girassóis e folguedos,
a ardência árabe dos olhos, o pendor para os extremos:
da lágrima pronta à incandescência súbita das palavras contundentes,
do riso claro à angústia mais amarga.
De português, a costela macabra, a alma enquistada de fado,
resistente a todas as ablações de ordem cultural
e o saber que o tinto, melhor que o branco, há-de atestar a taça na ortodoxia
de certas vitualhas de consistência e paladar telúrico.
De português, o olhinho malandro, concupiscente e plurirracial,
lesto na mirada ao seio entrevisto, à nesga de perna, à fímbria de nádega,
a resposta certeira e lépida a dardejar nos lábios,
o prazer saboroso e enternecido da má-língua.
De suíço tenho, herdados de meu bisavô, um relógio de bolso antigo
e um vago, estranho nome.
RUI KNOPFLI
(1932–1997), viveu em Moçambique até 1975, um dos nomes mais importantes da vida cultural moçambicana. Consciente do labor poético, nunca cedeu a imediatismos portadores de ideologias, mantendo a sua independência artística, autonomia e, decerto, exclusividade. Autor bipátrida, cuja obra, para além de outros temas, denuncia uma procura sempre aflita de raízes e identidade (a nível pessoal e literário). Hoje em dia recuperado pela voz de novas gerações de poetas. Dentro da sua obra destacam-se as coletâneas «O País dos Outros» (1959), «Mangas Verdes Com Sal» (1969), «Memória Consentida», «20 Anos de Poesia – 1959/1979» (1979), «O Monhé das Cobras» (1997).
O rosto da mulher estava tapado por uma máscara, mas a minha imaginação desenhava-lhe as feições. Mascaradas, todas as mulheres se transformam em beldades famosas que todos os homens conquistam pelo seu encanto. A mulher com quem dançava pôs-se a fazer-me perguntas em italiano. Se eu dissesse uma palavra, todo o país ficaria ao corrente de que eu era americano.
- Ah! – exclamou ela numa voz cantante. – Esperava que fosse chinês.
- Então, sou chinês – disse eu em italiano.
- Sou condessa – disse com orgulho. – A minha família descende do décimo segundo Doge.
- É verdade? – perguntei.
- Esta noite, tudo é verdade. No Carnaval, todas as mulheres são condessas.
O meu italiano tinha chegado aos seus limites, assim, falei-lhe em inglês.
- A máscara torna a mentira mais fácil?
- A máscara torna a mentira necessária – respondeu-me.
- Então, não é condessa.
- Sou condessa, todos os anos, na mesma noite. E espero que toda a gente me preste as homenagens que mereço.
Dei um passo atrás e fiz-lhe uma profunda vénia.
- Minha condessa adorada.
- Meu servo – disse ela e, fazendo uma reverência, desapareceu na multidão.
“MÚSICA DE PRAIA” – Pat Conroy - Círculo de Leitores, ed. Setembro de 1996, pág. 62
(Lisboa, 30 de Maio de 1601 (07?) – Lisboa, 28 de Janeiro de 1693)
Um de seus poemas já conhecidos (outros haverá por descobrir…) intitula-se abreviadamente «Vozes de uma dama defunta» mas por extenso é…
Vozes de uma dama desvanecida de dentro de uma sepultura que fala a outra dama que, presumida, entrou numa igreja com os cuidados de ser vista e louvada de todos; e se sentou junto a um túmulo que tinha esse epitáfio que leu curiosamente: