POETA ESQUECIDO
RUI DE NORONHA
(1909–1943), o precursor da moderna poesia moçambicana, conhecido pelos seus sonetos
SURGE ET AMBULA (Levanta-te e anda)
Dormes! e o mundo marcha, ó pátria do mistério.
Dormes! E o mundo avança, o tempo vai seguindo…
O progresso caminha ao alto de um hemisfério
E no outro tu dormes o sono teu infindo…
A selva faz de ti sinistro eremitério,
onde sozinha, à noite, a fera anda rugindo.
A terra e a escuridão têm aqui o seu império
E tu, ao tempo alheia, ó África, dormindo…
Desperta. Já no alto adejam negros corvos
Ansiosos de cair e de beber aos sorvos
Teu sangue ainda quente, em carne de sonâmbula…
Desperta. O teu dormir já foi mais que terreno…
Ouve a voz do Progresso, este outro Nazareno
Que a mão te estende e diz – “África, surge et ambula”.
(Ruy de NORONHA, Sonetos, s/d [1943], In FERREIRA, Manuel - «No Reino de Caliban III», Lisboa, Plátano Editora,1984, p. 37)