ESCRITORES QUASE ESQUECIDOS - 6
MENINO JESUS DA MINHA COR
Meu Natal Timor,
Meu primeiro Natal.
Quantos anos tinha?
Nunca o soube ao certo.
Minha Mãe-Menina
Fez-me o seu presépio:
Uma encosta arrancada ao Ramelau [1]
Com uma gruta ausente
Cheia de Maromak [2]
E perfume de coco.
Um búfalo e um kuda [3]
E o bafo quente dos seus pulmões.
E um menino sobre a palha de arroz
E folhas de cafeeiro.
Um menino branco
Igual aos que chegavam de longe.
- Ínan [4], quem é?
- É o Maromak-Filho [5] e teu irmão!
E eu recuei, porque via no berço
Um menino rosado,
Um menino branco
Igual aos que chegavam de longe.
- Ele é, mais do que todos, teu irmão...
- Mas como pode ser um meu irmão?
- É teu irmão: firma-lhe bem os teus olhos, meu amor!
E eu, obedecendo,
Firmei-me todo n’Ele.
E vejo-O desde então
Também da minha cor!
Fernando Sylvan
[1] - Monte Ramelau – a montanha mais alta de Timor
[2] - Maromak - Deus
[3] - Kuda - Cavalo
[4] - Ínan - Mãe
[5] - Maromak-Filho – Deus menino
* * *
Fernando Sylvan (pseudónimo de Abílio Leopoldo Motta Ferreira) nasceu em Díli, Timor-Leste, em 26 de Agosto de 1917.
Foi presidente da Sociedade de Língua Portuguesa durante duas décadas.
Participante ativo na Resistência Timorense.
Foi poeta, prosador, dramaturgo e ensaísta.
Morreu em 25 de Dezembro de 1993, em Cascais, Portugal, onde morou grande parte da sua vida.
Para saber mais, ver em https://pt.wikipedia.org/wiki/Fernando_Sylvan