Após graves acidentes na vida, torna-se, por vezes, necessário reaprender a andar ou a falar. A reaprendizagem, porém, não se aplica apenas a um indivíduo que sofreu um trauma, seja ele físico ou psíquico. A reaprendizagem também é necessária nas nações que caíram na escravidão ou no caos. Por vezes, nota-se isso em pormenores pequenos, mas cuja análise é demolidora.
Durante os famigerados sessenta anos do domínio filipino, a beleza da escrita lusa caiu num fosso.
A grande maioria dos manuscritos medievais ou renascentistas portugueses são de fácil leitura. Os mestres ensinavam os seus alunos a escrever com beleza estética e com a obrigatoriedade da leitura se tornar fácil. Durante a sujeição à governação estrangeira, já não houve estes cuidados. O resultado foi que cada um escrevia da forma que queria e hoje é geralmente muito mais difícil ler manuscritos portugueses do século XVII, do que outros de séculos anteriores. Quando Portugal regressou a mãos lusas, reintroduziu-se a arte de bem escrever, que se manteve durante séculos. Porém, foram necessárias duas gerações para vincar a reaprendizagem.
Desde 1975, implantou-se uma errada interpretação de “ liberdade”, deixando os alunos criar as suas próprias formas de escrita, que, por vezes, nem eles próprios conseguem decifrar! Toda a ideia da escrita como meio de salvar conhecimentos ou de os transmitir a outros, caiu assim por terra.
Não tenho dúvidas em afirmar de que para Portugal voltar a ser mais do que um local geográfico num mapa, se torna necessário reerguer tudo, mesmo o que parece um insignificante pormenor como é o da reaprendizagem da beleza da escrita. Esta exige ordem e disciplina mental e sem a mesma não vamos a lado nenhum. Esta ordem e disciplina têm de vir do berço!
Os primeiros professores serão sempre os pais, que devem dar o exemplo e guiar os filhos. A escola terá uma tarefa gigante a cumprir, mas apenas o conseguirá com matéria-prima válida e disposta a isso. O futuro de Portugal disso dependerá!
Rainer Daehnhardt
(*) Manuscrito sobre pergaminho. Século XIII ( Museu-Luso-Alemão)
Uma das primeiras palavras de muitas crianças é: “ Dá! “, por vezes sistematicamente repetida até obter o que deseja.
Cabe aos pais de decidir se “dão” ou não “dão”.
A falta de paciência e o não ralar-se leva muitos a escorregar pela saída mais fácil e dão. Por vezes tantas vezes dão que a criança se considera no direito de exigir.
Este pseudo direito é depois levado à exaustão e temos crise no ensino doméstico. De quem é a culpa? Da criança? Não, dos pais, que cederam demais vezes.
O dar é um gesto belo e precioso e deve ser recebido e entendido como tal!
O dar não é um cumprir de uma ordem dada por quem se julga com poderes para isso.
O dar deve ser voluntário, sem imposições nem segundas intenções.
Quem dá porque pensa ter assim direito a algo, não deu nada apenas pagou o que espera receber.
O dar sem nada pedir em troca é o “DAR ISABELINO” carregado de fé e beleza.
Se recebesse algo em troca ficaria sujo e sem valor. Por isso devemos reaprender a dar sem nada pedir ou esperar.
Também o receber tem muito que se lhe diga. Há quem simplesmente rejeita o receber com medo de ficar algo a dever.
Também há quem imediatamente deseja retribuir o gesto de uma dádiva querendo pagá-la.
Tal situação é um tanto complicada porque existe uma fininha linha que divide o belo gesto do compartilhar da alegria do recebimento de uma oferta com espontânea entrega de outra, do triste desfecho de querer pagar o que estava destinado a ser oferta gratuita, acabando assim a sujar e anular uma bela acção nitidamente incompreendida como tal.
Assim, num começo da reaprendizagem da criação de uma geração válida, tanto o dar como o receber deve ser aprendido como gestos belos sem nada pedir ou esperar. Tudo isto exige a utilização da parte direita dos nossos cérebros onde se aloja o sentimento, o coração e o subconsciente.
Quem apenas tiver acesso ao lado esquerdo do seu cérebro nunca compreenderá como se pode dar sem nada esperar, porque a lógica materialista e o egocentrismo lhe ceguem a visão para O BELO e O BEM.
Porém perdido não está. Pode-se lhe explicar que as leis do universo se regem por leis matemáticas onde cada acção terá como resultado uma reacção.
Facto é que quem boas acções para outros faz também boas recebe e não necessariamente dos mesmos, nem na mesma vida.
O mesmo também acontece com as más acções.
Porém tanto umas como as outras não são destinadas a um corpo mas à alma que nele se alberga. Isso implica o senão de quem ainda se identificar apenas com o seu corpo, com ele desaparecerá.
Porém quem viver na consciência que seu corpo é apenas um veículo que o transporta durante uma estadia terrestre facilmente encontrará acesso ao BELO e ao BEM por ele aqui semeado.
Rainer Daehnhardt
(*) Litografia de um quadro da colecção de D. Luis I (Museu-Luso-Alemão)