GENTE QUASE ESQUECIDA
MARIA DE LOURDES DE MELO INFANTE D’OLIVEIRA
Maria de Lourdes de Melo Infante d’Oliveira nasceu em Lisboa em 11 de Fevereiro de 1904. Terminou o curso liceal no Liceu Passos Manuel, onde conheceu o futuro marido, António Lopes Branquinho d’Oliveira, com quem casou em 22 de Dezembro de 1927 e com quem formou um casal com uma dinâmica rara do ponto de vista quer científico quer humano.
Licenciou-se em Medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa em 1928. Cedo abandonou a prática clínica que exerceu em Pediatria entre 1929 e 1932 e se dedicou por inteiro à Fitopatologia.
Em 1933 parte com o marido para Inglaterra. Data da sua primeira estada em Cambridge, entre Janeiro de 1933 e Dezembro de 1934, a especialização em Bacteriologia e Virologia fitopatológicas de que foi a incontestada pioneira em Portugal, respectivamente com o estudo de uma bacteriose em Lingustrum japonicum e uma virose em faveira. Foram os seus principais modelos os trabalhos desenvolvidos por Walter John Dowson (1887-1963) em bacteriologia e Keneth Manley Smith (1892-1981) em virologia. Numa segunda estada, de Outubro de 1936 a Maio de 1937, em Cambridge, consolidou a robusta formação metodológica que inculcou nos seus colaboradores e tirocinantes no Departamento de Fitopatologia da Estação Agronómica Nacional (EAN), do qual foi cofundadora com o marido.
Exerceu a chefia do Departamento de Fitopatologia por duas vezes, primeiro no período de 1942 a 1947, em que o marido foi professor de Patologia Vegetal e Entomologia Agrícola no Instituto Superior de Agronomia (ISA) e Director do Laboratório de Patologia Vegetal Veríssimo de Almeida e, depois, entre 1971 e 1974, ano em que se jubilou por limite de idade. Curiosamente, datam desses dois períodos louvores publicados no Diário do Governo, o primeiro (2ª Série, nº 144, de 15 de Junho de 1942) relativo ao registo de uma patente da técnica de extracção do ágar-ágar, que durante o período da 2ª Guerra Mundial era escasso, desenvolvida a pedido do Instituto Bacteriológico Câmara Pestana e o segundo (2ª série, nº 31, de 6 de Fevereiro de 1974) «pelos seus trabalhos a bem da agricultura nacional e do desenvolvimento científico do País».
Na opinião dos colaboradores e discípulos foi nas quatro décadas que trabalhou no Departamento a sua força motriz, iniciando e promovendo o estudo em áreas do conhecimento em Fitopatologia que, como já se afirmou, eram anteriormente uma «página em branco» em Portugal como a Bacteriologia e Virologia fitopatológicas. Co-orientou o primeiro trabalho final de curso defendido no ISA sobre bactérias «Uma bacteriose dos limões», de Raul V. G. Cabral (1938).
Após iniciar a Bacteriologia Fitopatológica em Portugal, soube manter durante a sua vida de trabalho uma atitude pouco sensível às modas e manteve-se sempre ligada à investigação prática e de importância económica actual (doenças da oliveira, batateira e hortícolas) ou potencial (fogo bacteriano das pereiras). Foi igualmente orientadora dos dois primeiros trabalhos finais de curso defendidos na ISA sobre vírus «Uma virose de alface transmitida por afídeos», de Humberto F. Dias (1947) e «Caracterização duma virose da alface», de Amarilis Alberty (1948). Com estes dois discípulos, a que se juntaram Maria de Lourdes Borges e Óscar Amaro de Sequeira, teve a Virologia Fitopatológica um auspicioso início em Portugal.
Dos trabalhos desenvolvidos por Maria de Lourdes d’Oliveira, destacam-se os estudos de vírus de tabaco, de cucurbitáceas, de cebola, de brássicas e de plantas espontâneas como repositórios de vírus.
Um aspecto também muito importante da actividade de Maria de Lourdes d’Oliveira teve a ver com o papel, verdadeiramente inovador para a época, da normalização, ao estilo das publicações científicas internacionais, dos trabalhos escritos em Portugal. Esta sua preocupação relaciona-se com o forte empenho no prestígio e dignificação do trabalho científico nacional e na sua inserção na comunidade internacional que sempre procurou.
Demonstrou a sua capacidade de organizadora exímia, quer promovendo reuniões científicas internacionais em Portugal, quer em acções de carácter social, como a organização de campos de férias e creches para os filhos dos trabalhadores da EAN.
Faleceu em 21 de Agosto de 1980, cerca de um mês após ter proferido um colóquio na EAN sobre os primórdios da mesma.
Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária, I. P.
In “História e Memórias da Estação Agronómica Nacional – 75 anos de actividade”