Quem trabalha para além da superfície das coisas, embora possa enganar-se, limpa o caminho para os outros e pode até fazer com que os seus erros sirvam a causa da verdade.
Edmund Burke
In «Uma Investigação Filosófica Acerca da Origem das Nossas Ideias do Sublime e do Belo», ed. EDIÇÕES 70, Setembro de 2013, pág. 73
Escolhamos um dia para representar a tragédia mais sublime e comovente à nossa disposição; designemos os actores mais populares; não olhemos a gastos na encenação e decoração; unamos os grandes esforços da poesia, da pintura e da música; e quando tivermos reunido o nosso público, exactamente no momento em que as suas mentes estiverem tensas de expectativa, divulguemos a notícia de que um criminoso de Estado de extracção elevada está prestes a ser executado na praça ao lado; num ápice o teatro esvaziado demonstraria a fraqueza relativa das artes imitativas e proclamaria o triunfo da simpatia real.
Edmund Burke(1729-1797)
In «Uma Investigação Filosófica Acerca da Origem das Nossas Ideias do Sublime e do Belo» com primeira edição em 1757, ed. Edições 70, Setembro de 2013, pág. 66
[Um dos ramos] das paixões sociais é aquele que diz respeito à sociedade em geral.
Quanto a isto, observo que a sociedade, meramente enquanto tal, sem quaisquer relevos particulares, não nos dá qualquer prazer positivo quando a gozamos; mas a solidão completa e absoluta, isto é, a exclusão total e perpétua de toda a sociedade, é uma das maiores dores positivas que somos capazes de conceber.
Logo, quando comparamos o prazer da sociedade em geral com a dor da solidão absoluta, a dor é a ideia predominante. Mas o prazer de qualquer gozo social particular ultrapassa bastante a perturbação causada pela falta desse gozo particular, de modo que as sensações mais poderosas que dizem respeito aos hábitos da sociedade particular são sensações de prazer.
A boa companhia, as conversas animadas e os laços de amizade enchem a mente de grande prazer; uma solidão temporária, por outro lado, é em si mesma agradável.
Isto talvez prove que somos criaturas concebidas tanto para a contemplação como para a acção, uma vez que tanto a solidão como a sociedade têm os seus prazeres.
Tal como a partir da observação anterior podemos discernir que uma vida inteira de solidão é contrária aos propósitos do nosso ser, já que nem a própria morte nos causa terror maior.
Edmund Burke
In «Uma Investigação Filosófica Acerca da Origem das Nossas Ideias do Sublime e do Belo», ed. Edições 70, Setembro de 2013, pág. 62
A CAUSA FINAL OU A DIFERENÇA ENTRE AS PAIXÕES QUE PERTENCEM À AUTO-PRESERVAÇÃO E ÀS QUE DIZEM RESPEITO À SOCIEDADE DOS SEXOS
A causa final da diferença de carácter entre as paixões que dizem respeito à auto-preservação e aquelas que se dirigem à multiplicação da espécie é digna de observação por direito próprio.
Uma vez que a realização dos nossos deveres de todo o tipo depende da vida e a sua realização com vigor e eficácia depende da saúde, somos muito fortemente afectados por tudo o que ameace destruir qualquer delas; mas uma vez que não fomos feitos para aceitar simplesmente a vida e a saúde, o mero gozo delas não é acompanhado de qualquer prazer real, para que não nos entreguemos à indolência e à inacção em virtude dessa satisfação.
Por outro lado, a geração da humanidade é um grande propósito e é necessário que as pessoas sejam motivadas para ela por um grande incentivo. Por isso é acompanhada de um grande prazer; mas uma vez que de modo nenhum foi concebida para ser a nossa ocupação constante, não é adequado que a ausência deste prazer deva ser acompanhada de uma grande dor. A diferença entre os homens e os outros animais a este respeito parece ser notável. Os homens estão sempre igualmente dispostos para os prazeres do amor e é por isso que a razão deve guiá-los quanto à ocasião e ao modo como devem entregar-se a eles. Se uma grande dor surgisse na falta desta satisfação, receio bem que a razão iria encontrar grandes dificuldades na realização da sua função. Mas os outros animais, que obedecem a leis para a execução das quais a sua razão pouco participa, têm as suas estações determinadas; nessas alturas não é improvável que a sensação de falta seja muito perturbadora porque o fim tem que ser satisfeito ou não será atingido, talvez para sempre; uma vez que a inclinação só regressa com a estação.
Edmund Burke
In «Uma Investigação Filosófica Acerca da Origem das Nossas Ideias do Sublime e do Belo», Edições 70, Setembro de 2013, pág. 60