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A bem da Nação

CITANDO...

… Bento Mântua

«O homem, quando entra para o Regimento, perde a sua personalidade. Começa por trocar um nome por um número, deixa de ter vontade própria para passar a ser um autómato, um instrumento da vontade dos que se dizem superiores».

In «PAZ, GUERRA E FORÇAS ARMADAS», Óscar Gomes da Silva, DG Edições, Janeiro de 2019, pág. 18

Mas (e há sempre outras versões), tudo depende…

  • Da qualidade do comando próximo que ou trata o homem como homem ou o trata como carna para canhão;
  • Do sentido de missão induzido pelo comando do Regimento;
  • Do sentido de missão absorvido pelo homem;
  • Da solidariedade inerente ao espírito de corpo.

Se assim for, o homem aceita o número como um complemento anódino do seu nome, assume a missão colecyiva como um compromisso da sua própria vontade e reconhece na hierarquia os dotes inerentes a um Comando de qualidade.

 

Foi desta «tropa» que me coube e que cumpri com muita honra a bem da Nação.

MOVENDO MONTANHAS

 

No seu livro «O mundo como vontade e representação», Schopenhauer considera que o que conhecemos através dos nossos sentidos, o conhecimento empírico, é a simples representação das coisas mas que a realidade dessas mesmas coisas é praticamente inacessível ao comum dos mortais.

Daí, Sue Prideaux, na sua biografia sobre Nietzsche intitulada «EU SOU DINAMITE» afirmar no final da pág. 69 que…

Toda a vida é anseio por um estado impossível [o da compatibilização entre a representação e a realidade] e, por conseguinte, toda a vida é sofrimento. Kant escreve de um ponto de vista cristão que tornava suportável o estado sempre imperfeito e sempre desejoso do mundo empírico porque seria possível esperar uma espécie de final feliz, caso se fizesse o esforço suficiente. A redenção era sempre possível através de Cristo.

* * *

Esta «saída» kantiana faz-me lembrar que a fé move montanhas.

Henrique Salles da Fonseca

2020

No ano da peste, estamos sãos;

No ano da morte, estamos vivos;

No ano da fome, temos a mesa posta…

Agradeçamos a quem no caos pôs a ordem,

A quem na doença pôs a saúde,

à quem na morte pôs a fé.

31 de Dezembro de 2020

Henrique Salles da Fonseca

O PROBLEMA IBÉRICO

segundo Fernando Pessoa

 

Fortemente aristocrática na sua constituição espiritual, ferrenhamente católica no seu habitus moral, absurdamente tradicionalista no conjunto quotidiano dos seus usos e costumes, Castela apresenta-se como um elemento anteprejudicador de uma confederação, e como um elemento (e é isto que aqui importa) violador da nossa grande tradição árabe — de tolerância e de livre civilização. E é na proporção em que formos os mantenedores do espírito árabe na Europa que teremos uma individualidade à parte.

Assim o espírito castelhano é fundamentalmente inimigo, no seu espírito, da Ibéria. Mas estes característicos, que tornam Castela magnificamente incompetente para hegemonizar na Ibéria admiravelmente a dispõem para equilibrar as tendências (em outros sentidos excessivas) dos dois outros povos ibéricos. Por onde se vê que tudo se acha harmonizado pelo Destino para a futura confederação.

O segundo grande inimigo da Ibéria é a França. O espírito francês é o grande inimigo do espírito comum às populações ibéricas. Grande inimigo não só na sua constituição espiritual, senão também nos efeitos que tem tido para a degradação e decadência do autêntico espírito ibérico. A França herdeira directa da tradição romana, no que ela tem de estreitamente grega, a França representa na Europa não um país criador (como a Itália de onde vem a arte, ou a Inglaterra, de onde nasce a política), mas um país distribuidor e aperfeiçoador dos elementos que os outros povos fornecem. Tão pouco criador é o espírito francês que, para obter a única ideia que dentro dele se realizou, teve de chamar um suíço, Jean-Jacques Rousseau, e para pôr fim magnificamente à anarquia que daí adveio, teve de descobrir um italiano, Bonaparte.

Lúcidos, completos no seu nível inferior, os franceses têm sido os corruptores danossa civilização ibérica. O seu espírito romano, sem a força romana, é fundamentalmente inimigo do nosso espírito romano-árabe, ao mesmo tempo complexo e intenso, e disciplinado e rude.

O terceiro inimigo da Ibéria é a Alemanha.

Mas aqui temos mais a temer o espírito alemão que a Alemanha propriamentedita. Estes herdaram o espírito romano na sua parte superior (ao contrário dos franceses que lhe herdaram a parte que já neles era secundária, porque basilarmente grega). Mas casaram-no com aquele curioso elemento de incompletidão que é distintivo dos bárbaros do Norte, que não sabem equilibrar duas coisas [...]

Nós, ibéricos, somos o cruzamento de duas civilizações — a romana e a árabe. Na França e na Alemanha a civilização romana existe sobreposta ao fundo original, sem outro influxo civilizacional. Somos, por isso, mais complexos e fecundos, de natureza, que a França ou Alemanha, que, quando tomarmos consciência da nossa ibericidade devem existir aproveitadamente no horizonte do nosso desprezo.

Fonte:  texto de Fernando Pessoa

MÉRTOLA NO ALENTEJO: LEGADOS ROMANO, ÁRABE E CRISTÃO

LIDO COM INTERESSE – 92

Nietzsche-Prideaux.jpg

 

  • Título - "EU SOU DINAMITE – A vida de Friedrich Nietzsche”
  • Autora – Sue Prideaux
  • Tradutor – Artur Lopes Cardoso
  • Editora – Círculo Leitores
  • Edição – 1ª, Abril de 2019

* * *

Leitura muito instrutiva para quem, como eu, nada sabia sobre Nietzsche, da pessoa e das respectivas ideias.

A vida de Nietzsche dividiu-se em três fases fundamentais:

  • A da infância e juventude a que corresponde a formação escolar e académica;
  • A da idade adulta, a que corresponde a produção intelectual;
  • A da loucura com perda total de raciocínio congruente, capacidade de leitura e até de fala minimamente entendível.

Em todas as fases há informações interessantíssimas mas vou apenas referir que:

  • Na primeira fase, Nietzsche frequentou as Universidades de Bonn e de Leipzig sem nunca concluir a licenciatura em Filologia Clássica (nem em qualquer outra) pois a Universidade de Basel convidou-o para ele assumir a cátedra de Filologia Clássica mesmo sem a respectiva licenciatura pois era do conhecimento geral que ele sabia mais da matéria do que qualquer outro, licenciado ou doutorado;
  • Da segunda fase retiro apenas as quatro ideias-chave que refiro mais à frente e deixo muita informação importante por referir pois este texto não é (nem pretende ser) um tratado sobre a filosofia nietzschiana;
  • Da terceira fase retiro a dependência total em que Nietzsche ficou dos cuidados mais elementares da mãe (de muito fraca cultura) e da irmã que era uma nazi assumida que não hesitou em deturpar toda a obra do irmão para o enquadrar no nazismo. É claro que ela sabia que o próprio não estava em condições de a contradizer e os amigos do filósofo puseram-se à distância com medo da Gestapo. Foi necessário chegar ao derrube do nazismo para limpar todo o lixo que infestou a obra de Nietazsche, já ele morrera muito antes.

Nietzshe-Munch.jpg

(Edvard Munch)

Ideias-chave[i]

 

  • Eterno retorno – Ideia que vem da Antiguidade (o Universo e toda a existência regressam sucessivamente através do tempo segundo um padrão cíclico) que Nietzsche retomou. O eterno retorno nietzschiano relaciona-se com a filosofia do determinismo, na qual as pessoas são predestinadas a repetir os mesmos actos sucessivamente: “Como uma ampulheta, a vida sempre se reverterá e esgotar-se-á novamente - um longo momento transcorrerá até que todas as condições das quais se evoluiu retornem na roda do processo cósmico. E então encontrar-se-á toda a dor e todo o prazer, todo o amigo e todo o inimigo,(…)”
  • Niilismo – Para Nietzsche há dois tipos de niilismo, o passivo e o activo. O passivo (ou incompleto), em que, por exemplo, através do anarquismo, há a demolição dos valores dando lugar a novos valores. É a negação do desperdício da força vital na esperança vã de uma recompensa ou de um sentido para a vida; opondo-se frontalmente a autores socráticos e, obviamente, à moral cristã, nega que a vida deva ser regida por qualquer tipo de padrão moral tendo em vista um mundo superior pois isso faz com que o homem minta a si próprio enquanto vive a vida fixado numa mentira. Assim no niilismo não se promove a determinação de valores fixos uma vez que tal determinação é considerada uma atitude negativa. O niilismo activo (ou completo) é onde Nietzsche se coloca  propondo uma atitude mais activa: renegando os valores metafísicos, redirecciona a sua força vital para a destruição da moral. Após essa destruição, tudo cai no vazio: a vida é desprovida de qualquer sentido, reina o absurdo e o niilista não pode ver alternativa senão esperar pela morte (ou provocá-la). Há-de-se considerar, contudo, que Nietzsche nunca sugeriu práticas suicidas. O próprio filósofo apenas indaga com ironia em "A Gaia Ciência" se "aquele que quer chegar à 'felicidade do céu' se se deve também preparar para ser 'triste até à morte”. O autor respondeu à sua própria pergunta: "É certo que com a ciência se pode favorecer um e outro objetivo. Talvez agora se conheça mais a ciência por causa da sua faculdade de privar os homens do prazer e de os tornar mais frios, mais insensíveis, mais estóicos. Mas nada impede também que nela se descubram as  faculdades de grande aliviadora de dores! - E então, talvez fosse descoberta ao mesmo tempo a sua força contrária, a sua prodigiosa faculdade de fazer brilhar para a alegria geral um novo céu estrelado!". Para Nietzsche, o fim último do niilismo consiste em que, no momento em que o homem nega os valores de Deus, deve aprender a ver-se como criador de valores e no momento em que entende que não há nada de eterno após a vida, deve aprender a ver a vida como um eterno retorno, sem o qual o niilismo seria sempre um ciclo incompleto.
  • RessentimentAssim mesmo, em francês, trata-se do sentimento de superação de uma situação de constrangimento associada à inveja e à necessidade de culpabilização de alguém por esse sofrimento.
  • Übermensh – O super-homem é o que consegue a hipertrofia de todos os valores do indivíduo, possui a sede do poder manifestado criativamente pela superação do niilismo, pela reavaliação dos velhos ideais e pela criação  de novos ideais, sempre num processo contínuo de superação.

* * * 

Sue Prideaux apresenta-nos um personagem bem diferente do que eu esperava como alguém com um verdadeiro sentido do humor, com gosto pela vida, abominando a beatice da mãe e o nazismo da irmã, um europeísta «avant la lettre», uma vítima da medicina arcaica, um doente para quem a ciência chegou tarde de mais.

Lido com interesse e com gosto.

 

Junho de 2020

Henrique Salles da Fonseca

 

[i] - Nesta secção, segui a Wikipédia e não o livro

FRASES DE NIETZSCHE

 

In 3ª Consideração Intempestiva – Schopenhauer como educador

 

Temos de seguir um curso um pouco ousado e perigoso nesta vida em especial porque, aconteça o que acontecer, estamos destinados a perdê-la.

* * *

O artista está relacionado com os amantes da sua arte como um canhão pesado com um bando de pardais.

* * *

O Estado nunca tem qualquer serventia para a verdade como tal, apenas para a verdade que lhe é útil.

* * *

O Estado quer que os homens lhe prestem o mesmo culto que anteriormente prestavam à Igreja.

 

 

DA BOA OU DA MÁ AUDIÇÃO

Teatro de Bayreuth.jpg

Foi no dia 13 de Agosto de 1876 que se inaugurou o Festival de Bayreuth no teatro cujo projecto e construção foram supervisionados pelo próprio Wagner. Tudo começou com «O anel dos Nibelungos» em que Siegfried mata o dragão. Este, ameaçado pelo herói, abana vigorosamente a cauda, revira os olhos e deita fumo pelas narinas.

É Cosima Wagner que nos conta nos seus diários que a única oficina que encontraram para fabricar uma máquina que, devidamente revestida imitando um dragão, abanasse a cauda, revirasse os olhos e contivesse depósitos que permitissem no momento certo fazer sair fumo pelas narinas do «boneco», se situava em Inglaterra. Adjudicado o trabalho, foi o dragão fabricado mas a montagem final das três partes, cauda, corpo e pescoço (e cabeça, presumo), deveria ser feita no destino.

Quase tudo bem. A cauda e o corpo chegaram a Bayreuth a tempo e horas mas o pescoço foi enviado para Beirute porque o funcionário do Despachante encarregado do envio dessa peça tinha problemas de audição. Ou seria o mandante do despacho que tinha problemas de dicção? Cosima não esclarece quem a lê mas o Festival foi inaugurado na data prevista, sem que nem o dragão nem Wagner perdessem a cabeça.

Imagine-se a gritaria histriónica que haveria e quantas cabeças rolariam se nas vésperas da inauguração do primeiro festival de folclore de Santa Marta de Tornozelo faltassem as pandeiretas…

Novembro de 2019

Henrique Salles da Fonseca

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