Ainda lá nas altas coordenadas
Voltemos às coordenadas lá do Norte. Peço aos meus leitores habituais (serão sete?) que me perdoem a longa ausência das escritas, mas... mas... enfim.
O Brasil é uma terra de gente maravilhosa. Tenho-o dito e repetido vezes sem conta, excepção para as classes políticas que se embebedam com o poder e deixam o povo a seco. Mas não é isso que impede que encontremos, a todo o instante e nos mais humildes lugares, aquela gente que reparte connosco um sorriso e uma fatia de pão, e ainda nos chama de «meu bem»!
Lá nas bandas do Norte isso é mais difícil de acontecer, mas não impossível.
Londres. Um corre-corre de gente para todos os lados, vindos de todas as origens, claros e escuros, meios-tons, ignorando-se e cruzando-se nas ruas e nos milhares de transportes públicos sempre cheios, tudo impecavelmente no horário, a maioria viajando neles em silêncio, lendo um dos muitos jornais gratuitos ou não, diariamente distribuídos aos passageiros.
Mas de repente nota-se num pequeno movimento, num sorriso, numa atitude, que ali está alguém diferente. Uma senhora, baixa, magra, de pouca idade, que ao entrar no bus cumprimenta com alegria o condutor e logo volta atrás para ajudar outra mais idosa a carregar o seu carrinho de compras, independendo da cor ou aparente status financeiro da idosa ou idoso.
Sai de casa, ainda noite no Inverno, com aquele frio de fazer cair o nariz e regressa ao fim do dia nas mesmas condições, cansada do trabalho e das viagens, mas sem perder o humor e a determinação. O marido há uns anos se foi por outras saias fáceis e calculistas e ela ficou com só o filho, um garotão adolescente que segue o seu caminho nos estudos e no corpo que parece não parar de crescer.
Boa parte das casas daquela cidade foi construída nos anos 30, de modo que a manutenção e as reformas são indispensáveis para manter a habitabilidade segura e confortável. Obras em casa, o que é sempre um tremendo transtorno. Tudo isto encara a nossa «heroína» com naturalidade e no fim, após pagar (e caro, que em Londres tudo é caro!) ainda se preocupa em arranjar um presentinho para cada um dos operários, que, como é óbvio, ficam espantados com tal atitude.
Alegre, reúne à sua volta alguns amigos e durante esse tempo a tristeza fica mais longe daquele bairro!
Mas não tentem enganá-la. Quando jovem resolvia as ofensas no «tapa». Hoje, discute os seus direitos com firmeza, e nos mais ínfimos detalhes, acabando sempre por receber a admiração e a simpatia dos reclamados.
Nasceu em Angola, completou a adolescência no Brasil e com vinte e tantos anos nas bandas do Norte, não perdeu as raízes dos povos que lhe deram essa força e alegria de viver.
Bem-haja, e obrigado pelo exemplo.
Rio de Janeiro, 7 de Dezembro de 2007
Francisco Gomes de Amorim