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A bem da Nação

SHALOM – 8

 

 

Bom dia! Eram 7,30 da manhã quando o motorista pôs o autocarro a andar connosco já lá dentro depois de, mais uma vez, nos termos levantado de madrugada, arranjado, tomado o pequeno-almoço e passado pelo crivo da Segurança do Estado de Israel ao fundo da escada do portaló. O nosso destino era uma visita a Yardenit, junto ao Mar da Galileia (Lago Tiberíades) e a Nazaré.

 

Lá fomos novamente pelo sopé do Monte Carmelo (que entretanto aprendi significar «jardim») até encontrarmos o mega cruzamento rodoviário onde está o sósia do Walter Ulbricht no logótipo do Kentucky Fried Chicken. Virámos à esquerda e mesmo assim passámos-lhe à direita. Não há dúvida, o tipo era mesmo das esquerdas e contagiou o sósia!

 

Logo de seguida voltámos a ver campos primorosamente amanhados e a certa altura ficámos com um extenso lago ao nosso lado esquerdo. Tratava-se de um lago artificial destinado a abastecer todo o litoral do país com água captada no Lago Tiberíades que, por esse motivo, raramente tem capacidade para abastecer o Rio Jordão. E como é o Jordão que abastece o Mar Morto, há que fazer alguma coisa para que este não morra mesmo. O quê? Pois parece que o Governo aprovou finalmente o projecto de captar água no Mar Vermelho dessalinizando-a e elevando-a à altura suficiente para que depois escorra para norte em direcção ao Mar Morto. O nosso guia «José por um dia que afinal já eram dois» não estava informado de quando começam os trabalhos que admito possam constituir um bom pretexto de emprego para alguns desempregados portugueses. Tenho quase a certeza de que Israel preferirá mão-de-obra mais ou menos competente importada de Portugal do que ficar dependente da força laboral dos árabes.

 

E lá fomos andando nestas conversas até ao miradouro sobre o Mar da Galileia (Lago Tiberíades) onde parámos para ver a paisagem. Foi neste percurso que passámos por uma aldeia com um hospital bastante maior do que as necessidades locais de saúde poderiam justificar. E à pergunta do porquê de um hospital tão grande em terra tão pequena, logo ficámos a saber que se trata de um estabelecimento hospitalar público que foi recentemente ampliado para acolher os civis sírios vítimas da guerra civil em curso na Síria. Afinal, os judeus não são assim tão maus como os pintam.

 

 

Yardenit, o nosso primeiro destino, localiza-se junto das comportas que controlam os fluxos de água do Mar da Galileia para o Jordão e constitui um local aprazível onde os peregrinos se podem purificar nas águas santas do rio. É sabido que S. João baptizou Cristo num local bem mais a sul, frente a Jericó, mas essa era uma zona perigosa durante a guerra israelo-árabe e foi escolhido este local como bem mais seguro para os peregrinos que reconhecem santidade a todo o percurso do Jordão. Aliás, foi na região circundante do Mar da Galileia que Jesus encontrou os seus primeiros discípulos (Pedro, André, João, Mateus e Tiago, o Maior) e onde realizou diversos milagres (curando a sogra de S. Pedro, ressuscitando uma criança que tinha sido dada como morta, curando um leproso, devolvendo a saúde ao servente de um centurião). Ou seja, o local é muito apropriado para os efeitos da purificação a que o baptismo se refere. E se antes esta purificação era também física, hoje ela é eminentemente espiritual. A quantidade de peregrinos justifica bem a dimensão das instalações de apoio onde voltei a encontrar um numeroso grupo de africanos que desta feita eram cristãos do Gana e não judeus do Biafra como os que encontrei nas redondezas do Monte Sião. Nós, os do nosso autocarro, só molhámos os pés mas os africanos foram aos vestiários onde se despiram e envergaram umas togas brancas com as quais entraram no rio até ficarem totalmente submersos. Sem qualquer cerimónia específica, sempre diziam uma prece (para mim ininteligível pois que me pareceu numa língua minha desconhecida) e manifestavam sonora satisfação pela purificação que sentiam. Deu gosto ver. E voltei a pensar em como são felizes os que têm fé.

 

Dali seguimos para Nazaré com passagem (sem paragem) por Canaã onde o nosso guia chamado «José por um dia que afinal já eram dois» nos apontou o local da casa onde, diz a tradição, ocorreram as bodas em que Jesus transformou a água em vinho. Infelizmente não houve tempo para passar sequer pelo Monte das Beatitudes onde Jesus terá proclamado o Sermão da Montanha... «Felizes os pobres de espírito pois deles será o Reino dos Céus...».

 

Nazaré é hoje uma cidade mas nos tempos bíblicos era uma pequena localidade com muitas grutas que os habitantes adaptavam a habitações. Foi naturalmente essa a opção de S. José e de Nossa Senhora e foi numa gruta, portanto, que o Anjo anunciou a Maria que geraria o Filho de Deus.

 

Actualmente governada por uma vereação muçulmana pois a vereação anterior, cristã, terá primado pelo imobilismo e foi derrotada nas eleições anteriores, em Nazaré não fomos assoberbados por qualquer muezzin ou sua gravação mas ao subirmos a rua que do largo principal conduz à Basílica da Anunciação, deparei com um cartaz publicitário em inglês que dizia qualquer coisa do género: «Vocês, cristãos, têm uma religião que só anuncia mas nós, muçulmanos, temos a autêntica religião, a do verdadeiro Deus.» Logo pensei que o muezzin tinha de ser substituído por qualquer outra agressão. E, sim, ali estava ela!

 

 

Era meio-dia quando entrámos na Basílica da Anunciação e tivemos a sorte de ter que esperar um pouco para que na Gruta os monges franciscanos acolitassem um Padre na oração do Angelus. Muitos sentimentos emotivos no nosso grupo e nos peregrinos que nos rodeavam, desta vez japoneses. Também ali a arquitectura (moderna) envolvente do lugar sagrado tende a desviar a atenção do fundamental. Mas aqui a decoração é muito mais sóbria do que em Belém ou Jerusalém onde os ortodoxos dão largas ao seu sentido estético.

 

Concluída a visita, eis que pelos auriculares ouvimos o nosso guia «José por dois dias» a convocar-nos para o autocarro a fim de regressarmos a Haifa para embarcarmos, almoçarmos e zarparmos de regresso a Chipre.

 

À laia de fechadura destas crónicas, para dizer que, afinal, ainda havia alguma coisa por dizer relativamente à Terra Santa – quanto mais não fossem os sentimentos pessoais e o que as circunstâncias da viagem me foram trazendo à memória.

 

Espero não ter maçado muito e recomendo que, logo que possam, não deixem de visitar um país construído com paixão, Israel.

 

Deo volente, nobis viventibus

 

Abril de 2014

 

 Henrique Salles da Fonseca

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