SANGUE BOM
Nunca sofri de raça
Minha pele é muito boa
Tenho sangue mouro de Goa
E sangue louro de Mombaça,
Saiba o Senhor
Minha raça é meio-errante
Num dia sou quase zulu
No outro dia, xavante
Mulato, preto-fulo,
Saiba o Senhor
Raça danada, eu não creio em raça, não!
Raça é superstição de gente mal arraçada,
Saiba o Senhor.
Eu não creio em raça, não, raça danada.
Raça é superstição de gente mal arraçada
Eu não creio em raça, não.
Raça danada, eu não creio em raça, não.
Eu sou o avesso da raça
Minha alma é muito à toa
Gosto d'amêijoas com jimboa
A toda a mistura acho graça,
Saiba o Senhor.
Minha raça é um jardim.
Num dia sou quase azul
No outro, cor de marfim
Sou Bissau e sou Cochim,
Saiba o Senhor.
Raça danada, eu não creio em raça, não.
Raça é superstição de gente mal arraçada
Saiba o Senhor: eu não creio em raça, não, raça danada
Raça é superstição de gente mal arraçada
Eu não creio em raça, não
Raça danada, eu não creio em raça, não
José Eduardo Agualusa
(Para o Caetano Veloso que quis um dia saber a minha raça)