PRIMAVERA EM FLOR – 3
Porque estamos em democracia, a autocracia de Ana Ferreira não faria hoje qualquer sentido pelo que foi substituída pela hegemonia de duas famílias poderosas chegadas não do amigo Continente mas sim da Madeira. E como me foi contado por diversos portosantenses em conversas separadas, a economia da ilha é dominada por esses dois clãs a quem o povo atribui todos os males de que padece. - Mas o Governo Regional da Madeira mudou, disse eu. Ao que me responderam geralmente com um encolher de ombros significando algo como «wait and see». Talvez seja por causa deste confronto intra-regional que a Autarquia local é socialista e não social-democrata. E eu, que nada tenho a ver com o assunto, pergunto-me se o mal é do ovo ou da galinha: votam num Partido diferente, não têm o apoio do Governo Regional; não têm apoio do Governo Regional e protestam votando num Partido diferente. Se são adultos e já andam nestas andanças há décadas, não vejo que se perfilem candidatos interessados em resolver o despique.
Os problemas de que se me queixaram são dois: os horários das ligações marítimas beneficiam os madeirenses e prejudicam seriamente os portosantenses; os hotéis modernos (de 5 estrelas) praticam o regime de «tudo incluído» nada deixando transbordar para a economia local.
E nós (a minha mulher e eu), antes de ouvirmos essas queixas, tínhamos já tomado a decisão de não irmos de barco à Madeira pois teríamos que lá ficar uma noite para nada visitarmos ou duas noites para podermos ter um dia de visita; optáramos pelo regime de dormida e pequeno-almoço para podermos cirandar por onde nos apetecesse sem ficarmos agarrados a um único hotel. E o povo da restauração agradeceu muito acolhendo-nos com verdadeira simpatia. Almoçámos todos os dias nos bares-restaurantes na praia e ao jantar não repetimos um único restaurante para tentarmos «distribuir o mal pelas aldeias».
Em termos turísticos, Maio não é carne nem peixe pois fica depois da Páscoa e antes do Verão. Mas os pilotos dos aviões estrangeiros têm muito medo do aeroporto da Madeira e dias houve em que fugiram 4 ou 5 para o Porto Santo cuja pista foi inicialmente construída pela NATO e hoje, depois de civilizada, é uma maravilha de conforto. E os turistas desses aviões desviados fazem quase sempre um «night stop», expressão banal na gíria local. Pelo menos o valor dessa curta hospedagem fica na ilha. Mas convenhamos que é curto pois soubemos que no nosso hotel chegámos a estar apenas três hóspedes: nós os dois e uma velhota alemã que se metia alegremente nos copos. E cá está mais uma alemã que há muitos anos vai para o Porto Santo.
As ligações aéreas regulares com a Madeira são feitas com um avião de 18 lugares (o maior, pois há um outro de 4 lugares que vi estacionado no aeroporto mas sobre que não ouvi falar) que parece desempenhar a missão a contento dos locais mas fizeram-nos logo saber que a empresa concessionária da ligação é do continente amigo e não da Madeira. As ligações aéreas de emergência - evacuações de cariz médico - são feitas pela Força Aérea de avião (ou de helicóptero para os casos que exijam a utilização do heliporto no Hospital do Funchal).
Não cheguei a perceber qual a missão da Marinha e do Exército mas admito que ambos exerçam missões de soberania. In extremis, de quem os locais dependem é da Força Aérea; os outros Ramos das Forças Armadas, por pouco que façam em termos operacionais, sempre largam umas maçarocas localmente e isso o povo vê com muito bons olhos.
O campo de golfe está muito amarelado e tiveram que me apontar o único praticante que lá estava quando subi ao Pico de Ana Ferreira; os courts de ténis não tinham actividade quando por lá passámos e o cartódromo está abandonado.
Parece que da modorra local nem só os madeirenses serão os culpados.
E finalmente vi flores que alegraram a nossa Primavera: eram umas ervas daninhas que - também elas e não apenas as «boazinhas» - floriam junto a um muro de cimento que esse, coitado, não floresce.
E por aqui me fico assim pondo um ponto final na reportagem sobre o Porto Santo. Obrigado pela companhia e até à próxima!
Maio de 2015
Henrique Salles da Fonseca