PODEMOS Ó NO PODEMOS?
O bipartidarismo espanhol parece estar a evoluir para um sistema quadri-partidário, a julgar pelas sondagens mais recentes. Assim, o aparecimento de um partido populista de extrema-esquerda (Podemos) cuja ascensão fulgurante parecia imparável, apresentando-se, mesmo, há relativamente pouco tempo como a primeira força em termos das prováveis intenções de voto, é contrariado pela emergência de uma nova força nascida na Catalunha, mas anti-independentista “Ciutadans/Ciudadanos”, recentrada em torno de propostas mais moderadas, mas sem deixar cair as bandeiras da luta contra a desigualdade, a pobreza e a exclusão social. Surpreendentemente, obtém 12,2% em eleições regionais e a partir daí anuncia a sua intenção de se transformar em partido nacional, o que conseguiu de forma espectacular.
Os partidos que tradicionalmente têm dominado a cena política espanhola desde a morte de Franco, ou seja o PP e o PSOE, incapazes de, por um lado, facultar respostas adequadas e coerentes à crise, por outro, sacudidos por escândalos internos e, finalmente, sem capacidade de reacção à investida do Podemos e de outras forças centrífugas, começaram a erodir as respectivas bases sociais de apoio. Por estas e por outras razões, em Novembro, o Podemos, para surpresa geral, estava na “pole position”.
Todavia, o alinhamento do Podemos com a Grécia de Tsipras, a sua indefinição quanto aos “nacionalismos” – uma questão de primeira grandeza e de enorme sensibilidade na vida política da Espanha –, agravada, igualmente, por alguns escândalos políticos e financeiros e pela ambivalência no jogo tradicional entre esquerda e direita, acabaram por não lhe ser totalmente favoráveis e o entusiasmo inicial esmoreceu.
Numa fase recente, a mensagem anti-austeridade do Podemos, a defesa da renegociação da dívida, por conseguinte, a proximidade com as teses do Syriza, adornada por alguns toques latino-americanos (Chavistas) fez ganhar dividendos a Pablo Iglesias e à sua gente. Mas o terreno da política é movediço: as teses de Tsipras não têm consistência (e começamos a estar conscientes disso mesmo, dia após dia) e, por outro lado, a inspiração bolivariana acaba por não ser muito apelativa para o eleitorado espanhol.
Por isso, dizia-me um amigo catalão pró-independentista: “Se estes avançam no terreno, é certo e sabido que a Catalunha declara unilateralmente a independência”. Ao que eu acrescentaria: e logo a seguir os bascos e provavelmente outros que estão na fila de espera. Isto num quadro hipotético de uma vitória de Iglésias em Dezembro, que é duvidoso que se concretize.
Em suma bem vistos todos os lados da questão, perante um quadro actual de empate técnico a 4, todas as combinações passam a ser possíveis, mas, principalmente, 2: PP-Ciudadanos ou PSOE-Ciudadanos. A chave parece, pois, estar nos Ciudadanos e não no Podemos. Mas outros arranjos são conjecturáveis, bem entendido.
Por isso, há dois dias, na conferência que proferiu na Sociedade de Geografia, a que estive presente, o Prof. Adriano Moreira não se mostrou particularmente preocupado com a situação espanhola. A meu ver, está-se, de facto, perante uma mudança de cenário, agora a 4, e perante a formação inevitável de coligações. Mas muito água há-de ainda correr pela nora. Os jogos ainda não estão feitos.
Francisco Henriques da Silva


