O VALIOSO TEMPO DOS MADUROS
Contei os meus anos
E descobri que terei menos tempo para viver daqui para a frente
Do que já vivi até agora.
Tenho muito mais passado do que futuro.
Sinto-me aquele menino que recebeu uma taça de cerejas.
As primeiras, chupou displicente,
Mas percebendo que faltam poucas, rói o caroço.
Já não tenho tempo para lidar com mediocridades.
Não quero estar em reuniões onde desfilam egos inflamados.
Inquieto-me com invejosos tentando destruir quem eles admiram,
Cobiçando os seus lugares, talentos e sorte.
Já não tenho tempo para conversas intermináveis,
Para discutir assuntos inúteis sobre vidas alheias
Que nem fazem parte da minha.
Já não tenho tempo para administrar melindres de pessoas
Que apesar da idade cronológica, são imaturos.
Detesto fazer acareação de desafectos que brigam pelo
Majestoso cargo de Secretário Geral do coral.
As pessoas não debatem conteúdos, apenas os rótulos.
O meu tempo tornou-se escasso para debater rótulos, quero a essência,
A minha alma tem pressa...
Sem muitas cerejas na taça, quero viver ao lado de gente humana,
Muito humana; que sabe rir dos seus tropeços,
Não se encanta com triunfos,
Não se considera eleita antes da hora,
Não foge da sua mortalidade.
Caminhar perto de coisas e pessoas de verdade,
O essencial faz a vida valer a pena.
Mário de Andrade
DA WIKIPÉDIA:
Mário Raúl Morais de Andrade (São Paulo, 9 de Outubro de 1893 — São Paulo, 25 de Fevereiro de 1945) foi um poeta, escritor, crítico literário, musicólogo, folclorista, ensaísta brasileiro. Foi um dos pioneiros da poesia moderna brasileira com a publicação de seu livro Pauliceia Desvairada em 1922.