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A bem da Nação

NOTAS SONORAS

 

 

Nem todas as notas são musicais. Há-as de Banco, de rodapé, etc.

 

Som, qualquer som? Não! Nem todo o som é correcto no momento certo. Nem na música nem na conversa.

 

Mas se há curiosidades como essa de um bemol poder ter exactamente o mesmo som que um sustenido, isso não significa que se possam escrever indistintamente. Também na língua francesa é muito difícil distinguir um «an» de um «en» no som de inúmeras palavras. E há mesmo quem se aplique a pronunciar o «in» como se fosse «en» ou «an».

 

Foi o caso que há tempos aprendi na Antena 2 pela voz do compositor Pedro Amaral que se dedicou a explicar a Sinfonia Fantástica de Hector Berlioz e em que a certa altura disse que o compositor se inspirou em diversas cenas campestres para imaginar a dita sinfonia. Por exemplo, o andamento tal (já não recordo qual) foi inspirado numa cena a que ele assistiu em que dois pastores conversavam «pendant le rancer des vaches». Acabo de escrever da forma correspondente à exacta pronúncia que ouvi. Julgando eu que era fluente em francês, logo me apressei num acto de contrição reconhecendo a minha enorme ignorância e necessidade de continuar a aprender...

 

Chegado a casa (ouço rádio enquanto conduzo), fui de imediato à procura de esclarecer o que as vacas teriam estado a fazer. Servi-me do dicionário que usei desde sempre e recorri também ao tradutor do Google.

 

«Rancer» – é verbo que não existe, pura e simplesmente;

«Rance» – corresponde a ranço e não estou a ver como tal coisa poderia atacar as vacas vivas e inspirar uma sinfonia que é mesmo fantástica;

«Rencer» – é verbo que também não existe;

«Rence» – não existe tal palavra.

 

Até que me restou o «rince» e o «rinçage» como enxaguar.

 

Ruisseau-vaches.jpg

 

Finalmente, deu para imaginar que os pastores conversavam enquanto tinham as vacas dentro do riacho, a enxaguar. Essa, sim, uma cena que pode inspirar um artista por muito prosaico que seja lavar o estrume colado à pele dos animais.

 

Só que o «in», o «en» e o «an» não são como o sustenido e o bemol: correspondem a sons diferentes, por mais subtis que sejam essas diferenças e um compositor como Pedro Amaral não deve confundir sons. Trata-se, afinal, da sua profissão (creio mesmo que inspiração).

 

Esclarecido o cenário, voltei a ouvir da capo al fine a Sinfonia Fantástica de Berlioz na gravação que possuo e confesso que nos cinco andamentos da obra não vislumbrei qualquer cornúpeto, quer sujo quer enxaguado.

 

Os artistas são mesmo... uns artistas.

 

Henrique Salles da Fonseca

Henrique Salles da Fonseca

(no Jardim da Estrela, Lisboa, com o «Caramelo»)

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