MOÇAMBIQUE REVISITADO – 15
Chegada a Maputo a meio da tarde depois de vôo sem história e sem hospedeira loira madraça. E será que a outra era mandriona e esclavagista como dei a entender? Não creio, bem vistas as coisas, ela apenas ia a examinar a adjunta para a «largar» e lhe passar carta profissional. Mesmo que esta versão não corresponda à verdade, pelo menos é mais simpática. Desta vez, a tripulação era toda negra.
Como que por magia, o Polana deve ter adivinhado que nós estávamos a chegar e tinha uma carrinha de transfer à nossa espera. Melhor assim do que de táxi.
Check in para o Polana Mar novamente mas apenas para duas noites na sequência do que voaríamos para Lisboa.
Retoma da bagagem que tínhamos deixado em depósito por não precisarmos dela no Bazaruto e… onde está o bastão mágico? Qual bastão? Uma bengala? Não! Um bastão não é uma bengala. Que não sabiam do que se tratava. Venha o Chefe disto. Veio o Chefe daquilo. Não sabia do que se tratava. Que eu não tinha registado o depósito do bastão. Porque me disseram que não era necessário. Venha o Chefe do Chefe. Veio o Chefe daquilo tudo que se fez de muito zangado com o pessoal de turno mas que não teve a magia para fazer aparecer o bastão mágico. Vamos dar o assunto por encerrado aqui mas que fique bem claro que se trata de um caso de gatunagem.
E se, quanto a mim, a magia ficou por se realizar, não sei se o bastão castigou o gatuno ou se, pelo contrário, lhe agradeceu por o ter livrado de vir para a Europa tirando-o da sua querida África.
Invocados os Xicuembos que por ali andassem, ficou tudo mais calmo com a nossa decisão de passarmos o dia seguinte no hotel com piscina a condizer com as salsas ondas da baía índica lá em baixo. Pequeno almoço na grande varanda, almoço leve entre dois mergulhos, decidimos ficar por ali dando dois dedos de conversa para a direita e para a esquerda. Em português, só o pessoal que se desfazia em mesuras e vergonha vergonhosa por causa do bastão. Sim, a notícia circulara e todos sabiam do desaparecimento do bastão. E até que ponto o sentimento de repulsa era sincero? Não sei nem virei a saber porque se eu soubesse que um estrangeiro queria levar um bastão mágico para fora de Portugal, eu tudo faria para que isso não acontecesse. Da mesma forma que se fosse uma tela da Joséfa de Óbidos e de modo contrário aos quadro do Miró que não fazem cá falta nenhuma. Mas estes, saindo, só depois do devido pagamento. E o «meu» bastão, afinal, não era meu porque faz parte da mágica africana.
No dia da piscina, pelo final da tarde e antes de nos dirigirmos à sala de jantar, passámos pelo sítio onde antigamente era a esplanada do «tout Paris» e demos lá de caras com um antigo guerrilheiro que se fazia rodear de vários guarda-costas para estar ali num espaço público a fazer não sei o quê. Sei apenas que fiquei impressionado com a segurança. É preciso temer muito para se fazer rodear de tanto «polícia». Eu, por exemplo, andava na terra dele totalmente desarmado e tranquilo. Mas eu nunca fiz mal a ninguém e isso deve ser o que o distingue de mim e da gente comum que me rodeava. Também nas terras boas há gente má e o mais grave é quando essas pessoas assumem cargos relevantes. Também nós, em Portugal, temos tido alguns casos desses mas ninguém que desmembre e decapite inocentes para, lançando o terror, desertificar humanamente certas áreas que se diz serem ricas em jazidas disto e daquilo.
Lastimo, Caros Leitores, concluir este conjunto de crónicas com uma anotação negativa mas a realidade não pode ser escamoteada: em Moçambique também há bandidos que ainda andam à solta e que ainda não foram expulsos do Partido que assume a governação.
No dia seguinte, avião para Lisboa e a mulher do amigo que me dera o bastão mágico vinha no mesmo vôo. O pai dela vivia (ou ainda vive) em Tavira, onde eu escrevi estas linhas sobre Moçambique, um país que merece tudo de bom.
FIM
Agosto de 2019
Henrique Salles da Fonseca