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A bem da Nação

LIDO COM INTERESSE – 92

Nietzsche-Prideaux.jpg

 

  • Título - "EU SOU DINAMITE – A vida de Friedrich Nietzsche”
  • Autora – Sue Prideaux
  • Tradutor – Artur Lopes Cardoso
  • Editora – Círculo Leitores
  • Edição – 1ª, Abril de 2019

* * *

Leitura muito instrutiva para quem, como eu, nada sabia sobre Nietzsche, da pessoa e das respectivas ideias.

A vida de Nietzsche dividiu-se em três fases fundamentais:

  • A da infância e juventude a que corresponde a formação escolar e académica;
  • A da idade adulta, a que corresponde a produção intelectual;
  • A da loucura com perda total de raciocínio congruente, capacidade de leitura e até de fala minimamente entendível.

Em todas as fases há informações interessantíssimas mas vou apenas referir que:

  • Na primeira fase, Nietzsche frequentou as Universidades de Bonn e de Leipzig sem nunca concluir a licenciatura em Filologia Clássica (nem em qualquer outra) pois a Universidade de Basel convidou-o para ele assumir a cátedra de Filologia Clássica mesmo sem a respectiva licenciatura pois era do conhecimento geral que ele sabia mais da matéria do que qualquer outro, licenciado ou doutorado;
  • Da segunda fase retiro apenas as quatro ideias-chave que refiro mais à frente e deixo muita informação importante por referir pois este texto não é (nem pretende ser) um tratado sobre a filosofia nietzschiana;
  • Da terceira fase retiro a dependência total em que Nietzsche ficou dos cuidados mais elementares da mãe (de muito fraca cultura) e da irmã que era uma nazi assumida que não hesitou em deturpar toda a obra do irmão para o enquadrar no nazismo. É claro que ela sabia que o próprio não estava em condições de a contradizer e os amigos do filósofo puseram-se à distância com medo da Gestapo. Foi necessário chegar ao derrube do nazismo para limpar todo o lixo que infestou a obra de Nietazsche, já ele morrera muito antes.

Nietzshe-Munch.jpg

(Edvard Munch)

Ideias-chave[i]

 

  • Eterno retorno – Ideia que vem da Antiguidade (o Universo e toda a existência regressam sucessivamente através do tempo segundo um padrão cíclico) que Nietzsche retomou. O eterno retorno nietzschiano relaciona-se com a filosofia do determinismo, na qual as pessoas são predestinadas a repetir os mesmos actos sucessivamente: “Como uma ampulheta, a vida sempre se reverterá e esgotar-se-á novamente - um longo momento transcorrerá até que todas as condições das quais se evoluiu retornem na roda do processo cósmico. E então encontrar-se-á toda a dor e todo o prazer, todo o amigo e todo o inimigo,(…)”
  • Niilismo – Para Nietzsche há dois tipos de niilismo, o passivo e o activo. O passivo (ou incompleto), em que, por exemplo, através do anarquismo, há a demolição dos valores dando lugar a novos valores. É a negação do desperdício da força vital na esperança vã de uma recompensa ou de um sentido para a vida; opondo-se frontalmente a autores socráticos e, obviamente, à moral cristã, nega que a vida deva ser regida por qualquer tipo de padrão moral tendo em vista um mundo superior pois isso faz com que o homem minta a si próprio enquanto vive a vida fixado numa mentira. Assim no niilismo não se promove a determinação de valores fixos uma vez que tal determinação é considerada uma atitude negativa. O niilismo activo (ou completo) é onde Nietzsche se coloca  propondo uma atitude mais activa: renegando os valores metafísicos, redirecciona a sua força vital para a destruição da moral. Após essa destruição, tudo cai no vazio: a vida é desprovida de qualquer sentido, reina o absurdo e o niilista não pode ver alternativa senão esperar pela morte (ou provocá-la). Há-de-se considerar, contudo, que Nietzsche nunca sugeriu práticas suicidas. O próprio filósofo apenas indaga com ironia em "A Gaia Ciência" se "aquele que quer chegar à 'felicidade do céu' se se deve também preparar para ser 'triste até à morte”. O autor respondeu à sua própria pergunta: "É certo que com a ciência se pode favorecer um e outro objetivo. Talvez agora se conheça mais a ciência por causa da sua faculdade de privar os homens do prazer e de os tornar mais frios, mais insensíveis, mais estóicos. Mas nada impede também que nela se descubram as  faculdades de grande aliviadora de dores! - E então, talvez fosse descoberta ao mesmo tempo a sua força contrária, a sua prodigiosa faculdade de fazer brilhar para a alegria geral um novo céu estrelado!". Para Nietzsche, o fim último do niilismo consiste em que, no momento em que o homem nega os valores de Deus, deve aprender a ver-se como criador de valores e no momento em que entende que não há nada de eterno após a vida, deve aprender a ver a vida como um eterno retorno, sem o qual o niilismo seria sempre um ciclo incompleto.
  • RessentimentAssim mesmo, em francês, trata-se do sentimento de superação de uma situação de constrangimento associada à inveja e à necessidade de culpabilização de alguém por esse sofrimento.
  • Übermensh – O super-homem é o que consegue a hipertrofia de todos os valores do indivíduo, possui a sede do poder manifestado criativamente pela superação do niilismo, pela reavaliação dos velhos ideais e pela criação  de novos ideais, sempre num processo contínuo de superação.

* * * 

Sue Prideaux apresenta-nos um personagem bem diferente do que eu esperava como alguém com um verdadeiro sentido do humor, com gosto pela vida, abominando a beatice da mãe e o nazismo da irmã, um europeísta «avant la lettre», uma vítima da medicina arcaica, um doente para quem a ciência chegou tarde de mais.

Lido com interesse e com gosto.

 

Junho de 2020

Henrique Salles da Fonseca

 

[i] - Nesta secção, segui a Wikipédia e não o livro

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