LIDO COM INTERESSE – 81
Título – ENQUANTO SALAZAR DORMIA…
Autor – Domingos Amaral
Editora – Casa das Letras
Edição – 23ª, Setembro de 2017
«Memórias de um espião em Lisboa» é o sub-título.
Como de costume, recorro à contra-capa e às badanas para descrever minimamente o enredo sem incorrer em inconfidências que estraguem a leitura dos leitores futuros.
Assim, diz o narrador que a vida é aquilo de que nos recordamos, ou seja, as grandes histórias que vivemos. Nada, de repente, existia a não ser Lisboa, cinquenta anos atrás. A minha Lisboa, onde amei tanto e tantas vezes. A minha Lisboa, das pensões e dos espiões, dos barcos ingleses e dos submarinos alemães; a Lisboa das ligas da Mary em cima de um lençol branco; a Lisboa dos coscktails no Aviz enquanto eu perseguia Alice; a Lisboa do penteado «à refugiada» da minha noiva, a Carminho; a Lisboa dessa menina frágil e alemã, Anika, por quem arrisquei o pescoço; a Lisboa de Michael…
Lisboa, 1941, um oásis de tranquilidade numa Europa fustigada pelos horrores da guerra…
Narrativa que põe o leitor «dentro» do ambiente que se vivia naquela época na grande Lisboa num estilo leve de muitos diálogos entre personagens reais e fictícias, o que só é possível quando tudo se configura numa grande compatibilidade entre o real e o imaginário. Curiosa alternância entre o passado e o presente em que o personagem principal assume a função de narrador e a de actor.
Interessante, a cena em que a antecessora da PIDE, a PVDE, se vê na necessidade de prender dois figurantes (fictícios) para os livrar das garras da Gestapo. Si non é vero, é ben trovato.
Quanto ao que me tocou, refiro que parte substancial da trama romanesca é passada num cenário que corresponde às ruas que me são vizinhas, as das Embaixadas inglesa e alemã nesse período da História, ao da residência oficial do então Presidente do Conselho de Ministros, ao hotel em que o narrador se instala 50 anos depois de a paz ter regressado. Conheço-lhes o aroma das «damas da noite», tudo me pareceu acontecer em frente ao meu bigode. Mais: conheci pessoalmente um dos personagens verídicos que o Autor tanto cita e que tinha um dos primeiros Jaguar E que houve em Portugal.
O livro poderá não vir a dar o Prémio Nobel ao Autor mas eu li-o com interesse.
Outubro de 2018
Henrique Salles da Fonseca
(Jakarta, templo chinês, Setembro de 2018)