LE DÉSERT DES CHAMEAUX
Nota prévia: texto originalmente escrito em francês a propósito dos «coletes amarelos» e posteriormente traduzido e adaptado à circunstância portuguesa; mas mantive o título original
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Qu'ils sont joyeux au désert des chameaux!
Por favor, não confundir Balduíno com beduíno – para além de prestigiado rei da Bélgica no século XX, outro Balduíno houve que foi «só» chefe da Primeira Cruzada e o primeiro rei cristão de Jerusalém; os que cabem na segunda palavra a não confundir, são os calcantes das dunas do Sahara, guardiães de camelos e cumpridores da lógica de Talião.
A actual desorientação europeia resulta muito da destabilização que os beduínos provocam na vida dos balduinistas, mas não só - o relativismo cultural[i], o hedonismo e o silencio em torno da definição do bem comum, são responsáveis por grande parte do resto do desnorte global por que passamos. Abreviadamente, o triunfo efectivo do anarquismo.
Eis por que aqui cabe referir o perigo do mau uso do liberalismo que se transforma em anarquia, a deturpação do uso da liberdade transformada em libertinagem, a autoridade transformada em autoritarismo, a eleição democrática assumida como missão de caudilhismo… Não muito longe do «politicamente correcto» em vigor.
Todos com políticas iguais, apenas discutindo factos e pessoas, conduziram a Europa à vacuidade do debate de ideias. E quando aparece alguém a sugerir a discussão de conceitos que fundamentem políticas, logo o establishment se une ostracizando o inovador, alcunhando-o de extremista ou, no sentido ascendente das hierarquias políticas e muito benignamente, classificando as suas mensagens de SPAM.
Então, o que é necessário é que os dirigentes europeus reconheçam que se equipararam a beduínos e fizeram da Europa o deserto dos camelos, nós.
Dezembro de 2019
Henrique Salles da Fonseca
[i] - O relativismo cultural é um processo de observar sistemas culturais sem uma visão etnocêntrica em relação à sociedade do pesquisador, ou seja, realizar a observação sem usar o parâmetro da cultura ocidental. E, com isso, realizar a avaliação sem privilegiar os valores de um só ponto de vista e estruturar o corpo social a partir das suas próprias características. (adaptado da Wikipédia)