LACRIMOSA - 3
Õ fenómeno migratório está directamente relacionado com a determinação de melhoria das condições de vida – da guerra para a paz, do locacionismo para a liberdade de escolha de assentamento, dos condicionalismos económicos para a liberdade de estabelecimento, da autocracia para a democracia, da corrupção para a transparência, das sociedades fracturadas para as solidárias. Em suma, sempre no sentido da liberdade e da solidariedade.
Se tomarmos em conta que o conceito de solidariedade corresponde à
miscigenação dos conceitos de igualdade e de fraternidade, lá estamos todos simbolicamente «virados» para a República Francesa que, grosso modo, é o modelo ocidental.
Independentemente da localização geográfica, o modelo ocidental é alvo de imigração; outros modelos são geradores de emigração.
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Durante séculos, Portugal gerou grandes fluxos migratórios porque não proporcionava aos seus nacionais as condições por que muitos ambicionavam sobretudo no plano material, o palpável.
As questões relativas ao desenvolvimento facilmente formalizam extensos conteúdos (mesmo que abandonando o plano teórico e baixando a análises de casos concretos) pelo que, para o caso português, me limito a constatar que foi a progressiva atenção dada à melhoria das condições de vida da generalidade da população sem o equivalente zelo nas questões da produção, da produtividade e, sobretudo, da competitividade que vêm gerando sucessivos colapsos financeiros do país. Mas, paralelamente, o perfil do actual emigrante português é muito diferente do do emigrante de uma ou duas gerações anteriores: o actual emigrante português não busca a sobrevivência (emigrante definitivo), escolhe entre as várias opções que o livre estabelecimento europeu ou norte-americano proporciona ao nível mais ou menos sofisticado de uma determinada condição profissional (emigrante temporário).
Em paralelo, os imigrantes em Portugal são oriundos de países que não oferecem esperanças aos seus nacionais e vêm para cá em busca de segurança e de uma «tábua de salvação» sujeitando-se a fazer o que nós, já rodeados de mordomias, não queremos fazer. O quê? Todo o trabalho braçal ou cuja remuneração seja inferior aos subsídios públicos a mândria.
Sugiro aos meus leitores em «Portugal e nos Algerves d’Aquém e d’Além mar em África, na Guiné, Arábia, Pérsia e Índia…» que façam uma análise ao caso que se lhes aplique e tirem as consequentes conclusões já que toda a emigração é simultaneamente esperançosa e lacrimosa.
Dezembro de 2021
Henrique Salles da Fonseca