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A bem da Nação

KALIMERA – 4

 

 

Sobrevoei pela primeira vez de cima a baixo o mar Egeu pois das vezes anteriores só o atravessara de lado a lado. Ao pôr do Sol, ainda era dia para nós no avião e lá em baixo já começavam as sombras a alongar... E muito. Deixando Salónica para trás, logo vi uma ilha montanhosa cujos cumes brancos me levaram a perguntar o que fazia ali tanta neve. E logo me lembrei duma professora que chegara ao Liceu Francês de Lisboa vinda de Salónica nos dizer que aquela região primava pela rudeza invernosa. Assim como me lembrei de que em tempos ali também era o Império Otomano e que aquela era a cidade natal de Mustafá Kemal Paxá, Atatürk. E mais me lembrei de que aquela região fora a terra permitida para uma parte importante dos sefarditas que ali reconstruíram as vidas sem renegarem a Pátria que os ostracizara. Em 1913 havia muitas sinagogas na cidade mas quatro delas chamavam-se «Évora», «Nova Lisboa», «Velha Lisboa» e «Portugal». Por aqui se imagina a importância da colónia sefardita portuguesa de Salónica e durante a Primeira Grande Guerra muitos foram os que retomaram a nacionalidade portuguesa. Gentio, foi com simpatia que sobrevoei as terras e os mares que os acolheram e lhes deram vida aos filhos e netos.

 

Era noite quando aterrámos perto de Larnaka e nem sequer passámos pela cidade. O táxi (um Mercedes não muito longínquo do topo da gama) que nos esperava meteu logo pela auto-estrada e só parámos 45 minutos depois à porta do hotel em Limassol.

 

E como o dinheiro abunda em Chipre, as auto-estradas não têm portagens.

 

Instalados, demos uma volta pelas redondezas do hotel e jantámos no primeiro boteco que encontrámos cheio (melhor cartão de visita para qualquer forasteiro). Simpatia esfusiante, logo veio o Cristiano Ronaldo à baila quando souberam da nossa nacionalidade. Há uns anos, na Tailândia, a referência era o Luís Figo e na Alemanha em 1961 eram Amália e as sardinhas. Portugal sempre teve quem o representasse bem.

 

O primeiro impacto com a tradição culinária cipriota teve a ver com a quantidade absurda que aquela gente consegue ingerir. A partir de então a minha mulher e eu passámos a encomendar uma dose para os dois para que não sobrasse tanto como desta vez. E foi logo ali que ficámos a saber que para eles o que é grego é bom; o que não é grego, logo se vê...

 

Limassol tem uma bela frente de mar, um «calçadão» muito frequentado por quem pratica jogging, muitas esplanadas de apoio às praias, uma areia compacta da cor do cimento e até vimos uns quantos corajosos que nadavam a tentar convencer os sensatos de que a água estava apetecível.

 

Lemestos é o nome vernáculo da cidade mas como havia muita gente que não conseguia pronunciar correctamente, inventou-se o nome Limassol. Já tenho ouvido muita tontaria ao longo da vida mas por etimologia tão anedótica é que eu não esperava. Venha outra explicação que esta não passa. Todos os cartazes e sinais de trânsito indicam Lemestos e Limassol tanto em alfabeto grego como latino pelo que ninguém se perde por falta de informação. Bela cidade, avenidas amplas, casario de qualidade e uma quantidade enorme de locais históricos a visitar. O mais espectacular é Kourion, cidadela imponente que me fez lembrar a judia Massada mas com um teatro grego que parece acabado de inaugurar. E fez-me sonhar com o que nós podíamos fazer em Balsa se os tavirenses tivessem um mínimo de interesse cultural. Mas...

 

 

Foi de Limassol (ou Lemestos para quem quiser ser mais genuíno) que partimos em direcção aos montes Troodos e lá no alto, à porta do hotel que se situa no miradouro, ainda havia vestígios da neve que caíra durante a noite. Não deixa de ser curioso o facto de a poucos quilómetros uns dos outros, andarem uns pândegos a nadar no mar e outros a fazer bolas de neve.

 

 

 

Dali fomos para o Mosteiro de Kikkos onde viveu Makarios até ser eleito Arcebispo e, depois disso, Presidente da República. E é lá que está o seu túmulo, em local de que se avista a sua terra natal, Panagia, junto de Paphos. Belos frescos e mosaicos por toda a parte. Neste maciço montanhoso há uma profusão enorme de mosteiros e igrejas, muitas das quais classificadas pela UNESCO e que a certo passo deixam o turista um pouco desejoso de zarpar dali para fora.

 

A visita a Paphos é indispensável pois a arqueologia local está de tal modo preservada que dá a sensação de nos podermos cruzar a qualquer momento com uma personagem das antiguidades grega ou romana.

 

 

 

Finalmente, uma breve referência a essa cidade dinâmica e moderna que é Larnaca, no extremo oriental da parte sul da ilha. O significado do nome da cidade, sarcófago, nada tem a ver com o que dela vemos. Pelo contrário, vi uma cidade toda «p’rá frentex», com belas praias (lá está o que mais parece cimento em pó no local onde devia estar a areia), um calçadão a perder de vista e hotéis a disputarem o top da qualidade. De cansado, não fui à marina que se situava mesmo em frente do meu hotel mas deu para ver que os mastros não eram de barquitos do lago do Campo Grande.

 

Apetece-me consultar a bola de cristal para tentar ver algo sobre o futuro de Chipre. Relativamente à zona etnicamente turca, já a tenho como Região Autónoma da Turquia; quanto à República de Chipre, a do sul, admito que a «enosis» não vingue mas...

 

Entretanto, está na hora de zarpar até Haiffa...

 

Março de 2014

 

 Henrique Salles da Fonseca

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