KALIMERA – 14
Δεκατέσσερα (dekatéssera) = catorze
OS ANÉIS E OS DEDOS
Da fé
A povoação mais famosa de Santorini chama-se Oia mas a linguística grega diz que o «O» é mudo pelo que se pronuncia apenas «Ia». Essa povoação é a que aparece em todas as fotografias turisticamente mais divulgadas com o casario a descer em terraços até ao limite do precipício. Na pequena praça principal há uma Igreja e o muito movimento no adro despertou-me a atenção. Entrei. Escura, lá dentro, mas repleta de gente. Turistas que, como eu, estariam cansados e aproveitaram as cadeiras para refazerem o fôlego gasto nas escadarias. Sentei-me. Junto ao altar, numa penumbra recatada, o Padre desempenhava a função que vi em todas as Igrejas que visitei na Grécia, a de guardião presencial da parafernália decorativa e das valiosas alfaias destinadas ao culto. Mas, para além dos turistas, apareceu um devoto que silenciosamente se dirigiu ao Padre e pediu autorização para se aproximar dos ícones expostos. Obtida a autorização também por gesto silencioso, o fiel simulou um beijo no vidro que cobre cada ícone devidamente encaixilhado, fez uma breve vénia frente ao altar e retirou-se. Tudo em silêncio.
Se esta foi ou não uma encenação para impressionar turistas, não sei; eu tomei tudo como uma expressão de fé sincera e gostei de ver.
Contudo, na perspectiva religiosa, o que mais me impressionou aconteceu em Patmos e teve como protagonista a nossa própria guia, uma pequena Senhora com «S» maiúsculo mas de nome indizível que falava inglês com uma distinção só equiparável à dos melhores locutores da BBC. Sim, absolutamente notável. Foi ela que nos conduziu até ao mosteiro onde se localiza a gruta do Apóstolo João e nos falou do que conta a tradição ortodoxa acerca do local e do próprio Evangelista. E quando se referia a matérias de fé, terminava as frases num diminuendo de autêntica sensibilidade íntima que por certo tocaria o coração mais empedernido que por ali passasse. A elegante eloquência com que o fazia também realçava a seriedade do tema e isso não deixou de ser importante para quem, como eu, notou a profundidade da sua fé. Lindo!
E fiquei a pensar…
Fiquei a pensar que a fé move montanhas e que a crise por que a Grécia continua a passar não tem qualquer importância perante Valores como os que sustentam uma Civilização, a qual é suportada por uma Religião, a qual se traduz numa fé como esta que presenciei. Isto, sim, é importante; tudo o mais parece irrelevante. Assim penso, apesar de se tratar duma grave crise económica e eu próprio ser economista. Mas… vão-se os anéis e fiquem os dedos.
Abril de 2018
Henrique Salles da Fonseca