HISTÓRIA VIVIDA - 1
COEVOS E COESOS
Coevo é sinónimo de contemporâneo e os historiadores estão sempre a procurar documentos coevos do acontecimento que querem historiar porque os consideram as fontes verdadeiramente fidedignas, credíveis; que tudo o mais é susceptível de dúvidas, de interpretações.
Ora, se ser contemporâneo é prova historicamente reconhecida de fidelidade ao acontecimento, então nós próprios – os que vivemos certos acontecimentos – somos esses «documentos» coevos historicamente reconhecidos como válidos. Ou seja, os nossos relatos pessoais são tão válidos (ou mesmo mais) do que as crónicas de Fernão Lopes relativas a D. Pedro I e a D. Fernando ou de Gomes Eanes de Zurara relativamente a D. João I. Estes cronistas relataram o que presenciaram mas também dá para crer que escreveram o que os respectivos «patrões» lhes mandaram escrever. E nós, que vivemos os acontecimentos de que falamos e não temos «patrões», não somos credíveis, porquê?
Fernão Lopes
Gomes Eanes de Zurara
Coeso é aquele em que há coesão, o que une, liga; o que é fiel à verdade dos acontecimentos a que se sente ligado.
E a questão é a de saber por que razão Fernão Lopes e Zurara hão-de ser mais credíveis que nós, os que vivemos nos tempos dos Consulados do Doutor Salazar e do Professor Marcello Caetano.
Nós, sendo coevos e coesos, somos provavelmente mais credíveis que esses afamados cronistas pois nós assistimos às ocorrências e não nos submetemos a quem nos queira dizer o que devemos escrever.
E quem são esses «nós»? Não sei. Falo por mim e digo o que penso. Eu sou o tal «documento» coevo e coeso porque assisti a muitos acontecimentos das épocas relativas aos Consulados que refiro e não tenciono escrever de modo diferente ao que observei.
Janeiro de 2018
Henrique Salles da Fonseca