HISTÓRIA EM LISBOA – 2
LISBOA DO SOL NASCENTE
D. Catarina, Infanta de Portugal e irmã do nosso rei D. Afonso V, nasceu em Lisboa a 26 de Novembro de 1436. Pessoa culta, dominava o latim e o grego traduzindo para português algumas obras importantes da sua época mas entregou-se à vida monástica depois do falecimento prematuro do seu primo D. Carlos, príncipe de Navarra, por quem se tinha apaixonado e a quem se prometera em casamento. Morreu aos 27 anos em Coimbra a 17 de Junho de 1463, pouco antes que a casassem com Eduardo IV de Inglaterra.
Trasladada de Coimbra para Lisboa, foi-lhe construído túmulo na Igreja do então novo Hospital de Todos os Santos e depois do terramoto de 1755 foi novamente trasladada para o Convento de Beato onde ainda hoje se encontra em local que parece actualmente desempenhar a útil mas pouco ilustre missão da armazenagem de massas alimentícias.
Para quem se preparara para ser rainha de Navarra e Aragão e posteriormente se viu quase a ter que ser rainha de Inglaterra, reconheçamos que nos estamos a esquecer um pouco de um valor histórico nacional que poderia ser enaltecido de múltiplas formas e nunca abandonado sob prateleiras de vitualhas industriais.
Para quem teve honras para figurar no painel de Nuno Gonçalves, mal parece que hoje esteja esquecida entre prateleiras de esparguete
Tenhamos esperanças de que o IPPAR se debruce sobre a questão com a brevidade conveniente, já que tanto se esmerou para que nada se viesse a saber quanto ao ADN de D. Afonso Henriques. Antes que o Convento do Beato vá para obras... Sim, mais vale que vá para obras do que ficar como está que não é carne nem peixe no sentido de que não está recuperado mas também não é ruína. É uma coisa assim «a modos que» inacabada, com materiais modernos a segurar uma mistura de várias épocas de arquitectura, desde as medievais às renascentistas, tudo a revelar que foi local importante por várias vezes e que por outras tantas terá caído no esquecimento e abandono... Até que se passou para o esparguete e finalmente para as remunerativas festas de casamentos e baptizados.
Convento do Beato: da serenidade monacal aos bailaricos de casamentos e baptizados...
Erigido por ordem de D. Isabel, mulher de D. Afonso V, no local onde se encontrava uma capela em honra de S. Bento, ali mesmo sobre a margem do Tejo, o Convento do Beato começou por se chamar de S. Bento de Xabregas e teve como primeiro Dom Prior a Frei António da Conceição, membro da Ordem dos Cónegos Seculares de S. João Evangelista. De hábito azul, chamou-lhes o povo de lóios, sinónimo da dita cor.
O proselitismo religioso é norma de todo o Clero mas se há os religiosos que se dedicam a servir os confessos, outros há que optam pela conquista de novas almas para o rebanho e dentre estes sobressaíram sempre estes Cónegos de S. João Evangelista praticando aquilo a que hoje poderemos chamar uma verdadeira “política de fronteira”. Por isso foi tão forte a presença dos Lóios nas terras alentejanas e daí a necessidade de disporem de um local de apoio e refúgio na retaguarda da primeira linha de combate na missão que se atribuíram. O Convento de Xabregas, implantado no então limite da antiga terra cristã, passou a servir de local de tratamento e repouso aos membros da Ordem que se apresentassem doentes e cansados das tarefas de missionação. Aproveitava-se igualmente da sua localização para servir as populações vizinhas, sempre carentes de cuidados de saúde, alimento e conforto espiritual.
De tanto bem-fazer, quando Frei António da Conceição morreu, logo o povo o tratou de Santo não perdendo a Ordem a oportunidade de encetar junto da Santa Sé o respectivo processo de canonização. Assim se formalizou a beatificação de Frei António.
Mas os residentes no Convento de Xabregas começaram a envelhecer e a morrer com toda a naturalidade até que chegou ao fim da vida o último Cónego encarregue do dito processo de canonização. Não houve quem o substituísse até à extinção das Ordens religiosas em Portugal, o Beato António não chegou a Santo e o Convento de S. Bento de Xabregas passou a ser conhecido por Convento do Beato.
Henrique Salles da Fonseca