GENERAL HAFTAR
Conheci o Bruno C. e sua mulher em 2013 quando a minha mulher e eu fizemos um cruzeiro no Danúbio. Ficámos na mesma mesa e conversámos muito durante as refeições. Em inglês, porque a mulher dele é americana e porque ele, italiano, continua com Napoleão um pouco de través.
Engenheiro naval, na casa dos 70, bem aposentado depois de larguíssima carreira no mar, está zangado com os italianos, vive em Nice e apenas vai regularmente à fronteira comprar um jornal para não «perder o pulso ao desvaire».
Lembro-me de que nos disse com plena convicção de que o tráfico de imigrantes vindos do Norte de África está plenamente controlado pelas forças navais italianas, quer dos Carabinieri quer da própria Marinha Italiana, de tal modo que não há «perdas» quando são elas as receptadoras dos traficados. Sim, tudo por certo com ligações mafiosas à mistura. E já lá vão uns anos que esta conversa aconteceu… Kadhafi morrera dois anos antes.
Confesso que não prestei então muita atenção ao tema. Mas não o esqueci.
Acho, contudo, que está na altura de o retomar porque o movimento imigratório não dá, entretanto, sinais de abrandamento e o que salta agora à vista é uma alteração fundamental no cenário líbio com o aparecimento do General Haftar a entrar em Trípoli, vindo de Tobruk.
O Governo sediado em Trípoli e reconhecido internacionalmente é conivente com a situação de descalabro no país com as suas mais de 140 tribos em zaragata permanente, com os traficantes de escravos negros à rédea solta, com os negócios do petróleo em descontrole completo.
As forças «rebeldes», controlando a metade leste da Líbia e com sede em Tobruk, são lideradas pelo general Haftar, dos tempos de Kadhafi, homem de 75 anos que está numa de pôr um ponto final à situação caótica a que o seu país chegou. E marchou sobre Trípoli sem demagogias nem promessas miríficas duma democracia que os muçulmanos sunitas não estão em condições de usar sem o medonho jugo clerical sharioso. Mais: considera que os seus opositores são radicais islâmicos que urge domar, que são divisionistas das tribos que há que controlar, que são intervenientes nos negócios do petróleo que há que integrar nos interesses do Estado Líbio, que são traficantes de escravos negros que há que aniquilar.
Trípoli tem o apoio de António Guterres e de Itália, nomeadamente da sua ENI; Tobruk tem o apoio do vizinho Egipto, de Putin e de Macron.
Creio que Macron está dentro da razão.
Abril de 2019
Henrique Salles da Fonseca