ELEIÇÕES LIVRES… OU NÃO
O Professor Catedrático em Ciências Políticas José Filipe Pinto escreveu, no Diário de Notícias de 24-4-2014, sobre os "três Dês" do 25 de Abril. Desse artigo, transcrevo:
"As eleições, agora sim, são tão livres como na livre Inglaterra”.
As eleições para o Parlamento inglês são por círculos uninominais, isto é, cada círculo eleitoral elege um deputado, que naquele país tem o nome de Member of Parliament (MP). Os candidatos (de sua iniciativa e não “nomeados” por alguém) podem pertencer a um partido político ou serem independentes. Em democracia, o poder pertence aos cidadãos eleitores e, portanto, esse é um dos direitos inerentes.
O candidato mais votado (não necessita de ter maioria absoluta) é eleito MP. A Inglaterra elege 650 MP. (A população da Inglaterra é de 53 milhões de pessoas, mais de cinco vezes a de Portugal, que elege 230 deputados).
Em Portugal os círculos eleitorais coincidem com os distritos. Alguns círculos elegem dezenas de deputados, outros um número muito menor. Enquanto o círculo de Lisboa elege 47 deputados e o do Porto 39, o de Portalegre elege 2 e os de Évora, Beja e Bragança elegem 3 cada um.
Os eleitores não se podem candidatar a deputados, uma liberdade que os ingleses têm. (Na outra ditadura podiam. Mas os entraves postos à sua eleição eram tais que só conseguia ser eleita a lista apresentada pela União Nacional, o partido único). Em Portugal, os candidatos a deputados são exclusivamente apresentados pelos partidos e em listas com ordem fixa. Um tal sistema é muito “conveniente” para garantir que alguns candidatos (muitos, nos distritos que elegem muitos deputados), os primeiros da lista, estejam eleitos à partida, algo que não existe em democracia, excepto nos casos de candidato único. As listas são elaboradas por quem manda nos partidos e de forma tão ditatorial como as da antiga União Nacional. Há anos, numas eleições gerais, os dirigentes locais de um partido (PS) declararam não querer um candidato que era cronicamente eleito por esse partido. Mas o Secretário-Geral decidiu, ditatorialmente, que esse candidato seria o cabeça-de-lista e foi mesmo eleito. Noutro caso, também há bastantes anos, vi e ouvi, na televisão, o chefe de uma distrital dum partido (PSD) declarar que quem nomeava os candidatos da sua distrital era ele. Como o sistema é o mesmo para todos, isto podia suceder com qualquer partido.
Os eleitores têm toda a “liberdade” de escolher uma de meia dúzia (ou mais) de listas de candidatos que, repito, têm ordem fixa e imutável.
Será que alguém pode dizer que, em Portugal, "As eleições, agora sim, são tão livres como na livre Inglaterra”?
Publicado no Público de 22 de Maio de 2014
Miguel Mota