«...E VÓS, TÁGIDES MINHAS,,,» - 6
OU
O MUNDO VISTO A PARTIR DE LISBOA
- «Liberdade, liberdade, quem a tem chama-lhe sua» - Vitorino, cantor português de intervenção política;
- «Os Países lusófonos são modelo para o Colonizador» - Elias Quadros, filósofo português;
- «Todos os seres humanos são livres e iguais em direitos e dignidade.» - art.º 1º da «Declaração Universal dos Direitos Humanos», ONU 1948
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A grande pecha do Poder instituído em Portugal ao longo de muitos dos seus séculos de História foi o desprezo pela instrução pública. Honra às grandes excepções a esta regra, o rei D. Dinis (instituição da língua portuguesa e da Universidade de Coimbra), a rainha D. Maria II (instituição das Academias de Ciências e de História), a I República (instituição das Universidades de Lisboa e do Porto) e a III República (democratização do Ensino a todos os níveis).
Por causa da dita pecha e apesar das excepções, a nossa actual situação ainda se encontra afastada dos padrões da instrução e da formação nos demais países europeus.
E se isto se passou durante séculos na sede do Império, território relativamente pequeno, imagine-se o que terá sido em territórios muito maiores tais como Angola, Brasil e Moçambique… Recordemos o conflito entre Adriano Moreira (Ministro do Ultramar) e Venâncio Deslandes (Comandante Chefe das Forças Armadas em Angola) aquando da instituição dos Estudos Gerais (futuras Universidades) de Angola e de Moçambique: o Ministro queria as Universidades mas o General não as queria porque “instruir o povo era perigoso”. E se este “perigo” fez doutrina em Portugal durante séculos com os perniciosas efeitos conhecidos sobre a clarividência geral da população, imagine-se o estado de indigência intelectual a que os povos ultramarinos eram votados. Tal «mãe», tais «filhos». Por outras palavras, «os Países lusófonos são modelo para o Colonizador».
E, de repente, a todos foi destinada a responsabilidade das independências políticas e a responsabilidade da vida em democracia. E porque a democracia é o regime político que mais responsabilidade (individual e colectiva) exige, eis-nos, a todos os povos lusófonos, a ter dificuldades diversas na aprendizagem da convivência democrática: Partidos mais ou menos únicos, corrupção, discussão sobre pessoas e factos em vez de ideias de política, ameaças militares, insultos favelares…
Eis por que deixei passar as eleições em Angola e no Brasil sem referências especiais. Contudo, em ambos os países há elites de elevada formação e de altos padrões éticos que parece fugirem da política. Para o pior dos males dos seus países, alheiam-se do mais que conseguem, «põem as barbas de molho» (enviam as poupanças para fora) e deixam a selva arder.
Certa vez, li um texto do Doutor Salazar em que ele dizia que o seu Governo era o melhor de todos os que poderiam existir (não me recordo se ele se referia a Portugal ou se a todo o mundo) porque era constituído pelos mais conceituados Professores universitários.
Peço a quem me lê que ignore a minha ironia na frase anterior mas que, no polo oposto, se lembre dos «frente-a-frente» televisivos entre Bolsonaro e Lula.
Perante cenas como as referidas, a pergunta é a de saber como havemos de conciliar a governação de qualidade com o voto universal. Platão respondeu em «A República».
Lisboa, 3 de Outubro de 2022
Henrique Salles da Fonseca
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