DIZE TU – DIREI EU
Costuma ser comum entre os católicos – e é lógico que assim seja – pensar que a visão reformada intenta substituir uma Igreja, a sua, por outra. Semelhante empenho parece absurdo na medida em que, como um recente documento papal referendou, a única Igreja verdadeira e com plenitude de meios é a Igreja Católica e as outras confissões não chagariam a essa entidade. O ponto de vista é razoável – insistamos nisso – porém, parte duma ignorância grave sobre a concepção da Reforma acerca da Igreja. Para Lutero – e para os reformadores em geral – a Igreja é uma realidade visível mas não se identifica com uma instituição concreta com exclusão de outras, mas sim com os seus membros, os cristãos. É essa soma de cristãos como povo de Deus que forma a Igreja e não uma instituição eclesial. Sem dúvida que essa Igreja, como Lutero assinalou, tem umas marcas que são “o baptismo, o sacramento (a Eucaristia) e o Evangelho, não Roma nem este ou aquele lugar”. Sobre esta Igreja, formada pelos verdadeiros crentes e não por uma estrutura eclesial específica, quem se encontra è Cristo ou, para utilizar a expressão de Lutero, “Cristo é a cabeça e só Ele governa”.
Compreender este aspecto é essencial no diálogo interconfessional. Se a Igreja Católica afirma – e é lógico que o faça – que é a única Igreja verdadeira e com plenitude de meios de graça, as Igrejas reformadas sempre responderão que a Igreja, apesar da sua visibilidade, é, fundamental e essencialmente, uma comunhão de fiéis que não se identifica com esta ou aquela confissão pois está formada pelos que experimentaram uma conversão a Cristo. Se a Igreja Católica contrapõe – e é lógico que o faça – a sua unidade formal à divisão em diferentes confissões surgidas da Reforma, as Igrejas reformadas responderão que essa divisão não existe pela simples razão de que todos os seus membros formam parte de um a só Igreja, a verdadeira, que é uma realidade espiritual por cima das visíveis e humanas. Se a Igreja Católica afirma – e é lógico que o faça – que essa única Igreja verdadeira mantém uma sucessão apostólica cujo elemento essencial é o facto de o Papa ser o sucessor de Pedro, as Igrejas reformadas sempre responderão que a sucessão apostólica não é uma sucessão similar à dinástica – por outro lado, interrompida historicamente em várias ocasiões – mas uma identificação com o ensino e o comportamento dos Apóstolos. Se a Igreja Católica afirma – e é lógico que o faça – que o Papa é o vigário de Cristo na Terra, as Igrejas reformadas sempre responderão que Cristo não precisa de vigário algum porque governa directamente a Sua Igreja através do Espírito Santo.
In El Caso Lutero, Edaf, Madrid, 2008, pág. 144 seg.