DA VERDADE NA POLÍTICA
«Homem de um só parecer,
De um só rosto, de uma fé,
De antes quebrar que torcer,
Ele tudo pode ser
Mas de Côrte homem não é.»
Sá de Miranda
«Basta repetir muitas vezes uma mentira para que ela se torne verdade» - Joseph Göbbels, Ministro da Propaganda nazi
«Não é por repetir muitas vezes uma mentira que ela se torna verdade» - Todos e cada um dos meus leitores
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A verdade é unicitária mas a mentira é plural pois pode revestir as formas de meia-verdade, de sofisma ou de falácia – as duas primeiras são voluntárias e, daí, pecaminosas mas a terceira é involuntária e, portanto, inocente. Isto, tanto na política como nas outras facetas da vida.
Contudo, na política tudo se complica, pois nós próprios, os «documentos coevos» do golpe do 25 de Abril de 1974, nos dividimos na respectiva classificação com «verdades» incompatíveis entre nós: o que para uns é a verdade, para os outros é mentira. Apenas nos une a verdade factual: «os carros de combate desceram a rua e lá ao fundo viraram à esquerda» - a mera verdade factual. A partir daqui chegando à verdade substantiva, dividimo-nos entre o bem e o mal; o Capitão do Largo do Carmo foi um herói ou um inocente manipulado pelos «cordelinhos» de Moscovo?
Eis a diferença entre a verdade factual que é objectiva e a substantiva que permite/exige a ponderação entre o bem e o mal, ou seja, carrega a subjectividade.
No plano da verdade substantiva, é relativamente fácil encontrar consensos entre os democratas cujas normas éticas, princípios morais e valores civilizacionais mais se aproximam ou, até, coincidem. Com os outros, não.
Entre os democratas, as polémicas resultam amiúde de uns acharem que o copo está meio cheio e os outros dizerem que ele está meio vazio. Polémicas artificiais e na «peixeirada», ninguém quer saber onde está a verdade. O que interessa é apear o adversário. Disputas que só se justificam no âmbito da estratégia do «bota abaixo» e do «sai daí para entrar eu» E o Contribuinte cá está para pagar o «folclore». Assim fica a verdade- mesmo a de cada um -por identificar. E, contudo, bastaria que o discurso assumisse um tom afirmativo sobre o conceito de bem-comum para que as verdades assumissem a primazia num novo e saudável debate político.
Verdade política procura-se!
Setembro de 2023
Henrique Salles da Fonseca