DA ESTÉTICA
Sempre ouvi dizer que «gostos não se discutem» e isso levou-me a estranhar que a estética pudesse ter algo a ver com a filosofia. E vai daí, cruzei-me há dias numa estante da “Bertrand” com Edmund Burke (1729-1797) cujo tratado sobre a estética tem o apelativo título de «Uma Investigação Filosófica Acerca da Origem das Nossas Ideias do Sublime e do Belo»[1]. E não foi tarde nem cedo: comprei e li. E, bem a propósito, gostei.
Escrita enxuta, perceptível por qualquer mortal que não seja completamente analfabeto, lê-se quase de um só trago (cerca de 200 páginas) e corrige erros de palmatória como o da desqualificação do tema em que eu próprio incorria.
Assim, começando pelo fim, concluo que a Estética tem qualidade para ser integrada na Filosofia. Dito de modo mais prosaico: a Estética é um tema – como tantos e tantos outros - abordável filosoficamente.
Então, o que é um Gosto? Aquilo a que chamamos Gosto consiste parcialmente numa percepção dos prazeres primários dos sentidos, dos prazeres secundários da imaginação e das conclusões da faculdade de raciocinar.
A causa de um Gosto errado é um defeito no juízo. E este pode surgir de uma fraqueza natural no entendimento ou pode surgir de uma falta de exercício apropriado e bem dirigido, que é a única coisa capaz de dar ao entendimento força e prontidão. As paixões, os vícios, a ignorância, a desatenção, a precipitação, a leviandade e a obstinação pervertem o juízo e, portanto, pervertem por certo a capacidade de delicadeza e de elegância que são fundamentais ao Gosto.
A rectidão no juízo sobre as artes, a que se pode chamar Bom Gosto, depende em grande medida da sensibilidade porque se a mente não tem inclinação para os prazeres da imaginação, nunca se aplicará suficientemente às obras desta espécie a ponto de nelas adquirir um conhecimento competente.
Apesar de ser necessário um certo grau de sensibilidade para formar um bom juízo, este não surge necessariamente de uma aguda sensibilidade aos prazeres dos sentidos. É que muitas vezes, um fraco juiz, apenas por ser dotado de muita sensibilidade primária através dos sentidos, é mais afectado por uma coisa nova, que se situe para além do normal, grande ou apaixonante mas que possa ser considerada uma obra má do que um bom juiz se deixe afectar por uma obra boa por não receber tanto impacto na sua exigente escala de prazeres da imaginação.
Eis por que Ovídio disse que «Meu coração é brando e vulnerável às feridas mais ligeiras e sempre há um motivo para que eu esteja enamorado», ao que Terêncio contrapôs com a conveniência de se ser «um observador requintado da beleza».
Então, para não fazermos grande burrada, o raciocínio que trabalhe os prazeres da imaginação e se não quede pelos primários sentidos.
Até porque… «gostos não se discutem». Mas filosofam-se.
Julho de 2014
Para saber mais sobre Edmund Burke, v. p. ex.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Edmund_Burke