DA CAUSA E DO EFEITO
Na minha busca das causas do modo alemão e do nosso, dei por mim a pensar se os filósofos são causa ou consequência do comportamento dos povos a que pertencem. E cheguei à conclusão de que começam por ser consequência, passam a influenciar as classes letradas e daí - mais geração, menos geração - chegam à generalidade da sociedade.
Nestas deambulações, «encontrei-me» com os hiperbóreos, com a mitologia nórdica (a que, por redução, há quem chame germânica), com Lutero, Göthe, Nietzsche, Wagner, Schopenhauer… e, de toda esta erudição, cheguei à boçalidade hitleriana.
E se a minha grande motivação era a de perceber menos superficialmente por que é que a Alemanha se recompôs rapidamente de derrotas militares devastadoras enquanto nós, em paz, temos ciclicamente que recorrer à esmola internacional das Troikas, acabei por dar um ar jocoso à causa através das condições climáticas que induzem os alemães a trabalhar (é claro que não e que aqui impera a fé inicialmente calvinista e depois luterana de que o trabalho serve Deus) e as doces praias atlânticas nos induzem a folgar (é claro que não, o analfabetismo é a causa mais clamorosa do nosso subdesenvolvimento). Neste interim dei por mim a vasculhar outros Autores que me trouxessem a filosofia devidamente «empacotada» para eu não ter que ler montanhas de livros e, no final, ter baralhado tudo e continuado na grande ignorância. Assim encontrei Peter Sloterdejk e o seu pequeno livro «Temperamentos filosóficos» sobre que escrevi em https://abemdanacao.blogs.sapo.pt/temperamentos-filosoficos-1702900
E, de conversa em conversa, referi este livro à Dr.ª. Maria Emília Gonçalves, nossa «colega» de blog, que assim me respondeu:
Estimado Dr. Henrique Salles da Fonseca,
Fiquei de tal forma entusiasmada com o excerto que transcreveu no seu blog, relativamente aos prefácios de Peter Sloterdijk, que já encomendei o livro na FNAC. Tenho sempre um grande interesse por esta temática.
Entretanto e enquanto não leio o livro, e mais uma vez recorrendo aos meus apontamentos, “atrevo-me” a deixar algo do que aprendi, sobre alguns dos filósofos que citou.
A ordem pela qual me refiro aos filósofos é absolutamente aleatória.
PLATÃO
Filósofo idealista , discípulo de Sócrates, Platão defendia uma concepção idealista do mundo e lutou activamente contra as teorias materialistas do seu tempo.
O homem para Platão é dualista ( corpo e alma ) sua filosofia não se interessa pelo homem em sociedade e sim o divino no homem.
O mundo das ideias, o mundo das formas e o mundo dos conceitos passam a serem primordiais em sua filosofia.
Sua crítica à democracia ateniense e a procura de soluções políticas do mundo grego foram preocupações centrais da vida e da obra daquele que é por muitos o maior pensador da Antiguidade.
Achei muito interessante o que diz Peter Sloterdijk: que a tradição platónica concorda com a doutrina estóica , posteriormente, com a epicurista no facto de definir o filósofo como aquele que é versado na pesquisa da paz das almas.
Sobre Aristóteles também achei muito curiosa a referência que faz, dizendo que o cérebro de Aristóteles era como que o senado de uma universidade rica de faculdades.
Quanto a Descartes diz ele no seu livro que “a filosofia moderna de tipo cartesiano permanece caracteristicamente suspensa entre a teologia e a teoria das máquinas, não tendo sido em vão que os grandes arquitectos de sistemas do Idealismo alemão celebraram em Descartes o seu predecessor.
DESCARTES
Descartes julgava necessário colocar previamente em dúvida tudo quanto existe. Este principio, é aquele de que “Penso, logo existo”. Desta tese, Descartes tentava também inferir a existência de Deus e depois a convicção de que o mundo exterior é real.
Descartes é o fundador do racionalismo que se formou como consequência de entender o carácter lógico do conhecimento matemático.
LEIBNIZ
No seu discurso da Metafísica, Leibniz refere-se a: “fazer sempre o que for mais perfeito e realizar o que parecer ser o melhor. À razão cabe, como regra, a escolha do melhor, que será reconhecido pelos homens segundo o bem aparente, segundo o que parece ser o melhor”.
O racionalismo de Leibniz muito difundido no séc. XVII tornou-se a filosofia academicamente mais influente da época.
Refere Peter Sloterdijk, que o seu papel intelectual é de uma ponta à outra o do diplomata hábil na palavra, do cortesão na teoria e conselheiro do príncipe(…)
Igualmente interessante a referência a Schelling. Diz-nos que o rei Maximiliano da Baviera, que foi aluno dele, mandou colocar no monumento de 1854 ao filósofo as seguintes palavras: “Ao primeiro pensador da Alemanha”.
Quase no final do livro, Peter Sloterdijk ,referindo-se a Marx, Nietzsche e Freud, diz que os três desangelistas parecem proclamar um e o mesmo destino, quando referiram “A verdade avassalar-vos-á”.
E refere ainda que todos eles procuraram e acharam leitores ágeis que reconheceram nos seus escritos as palavras –chave para carreiras, e até pretextos para golpes de estado, fundações de sociedades e revoluções radicais do modo de pensar e viver.
HEGEL
Para Hegel, não existe algo que seja impossível de ser pensado. Ele afirma que o real é racional e o racional é real. Não é possível separar o mundo do sujeito, o objecto e o conhecimento, o universal e o particular.
A sua dialéctica é fundamentada na tese e na antítese.
MARX
Se Hegel era um idealista em termos filosóficos, Marx era um materialista, ou seja, para Hegel as ideias vêm antes das coisas, para Marx, as relações sociais é que precedem as ideias.
Para Marx, a história humana desenvolve-se a partir da acção concreta dos seres humanos em sociedade. Por isso Marx é um materialista, ao contrário de Hegel .
Marx inspirou-se na dialéctica de Hegel para propor os possíveis caminhos revolucionários. A contradição existente entre a classe dominante (burguesa) e a classe proletária, deve fazer surgir uma nova síntese.
O Estado e o capital fazem parte do sistema dominante.
SARTRE
Existe uma certa ligação entre a sua filosofia e a de Kierkegaard. Tem sido escrito que Freud também o influenciou.
Sartre empreende a tentativa de demonstrar o existencialismo recorrendo à filosofia do marxismo. Ele participou na Resistência francesa durante a Segunda Guerra Mundial e lutou activamente contra o renascimento do fascismo, em defesa da paz.
É um representante do existencialismo “ateu”.
SCHELLING
Aproveitou as ideias de Kant e a teoria de Leibniz tendo introduzido o conceito de desenvolvimento na interpretação da natureza. Tentou combinar o idealismo subjectivo de Fichte com o idealismo do seu próprio sistema.
Schelling, tal como Fichte, concebia a liberdade como necessidade; não via a liberdade para o individuo isolado, mas a conquista da sociedade.
SANTO AGOSTINHO
A filosofia agostiniana é uma constante busca da verdade, que culmina na Verdade, em Cristo. É um movimento incessante, uma paixão, e, precisamente, a paixão principal: o amor.
“O amor é o peso que dá sentido à minha vida. Verdade e Amor.“Fizeste-nos, Senhor, para Ti e o nosso coração estará inquieto enquanto não descansar em Ti”, diz nas Confissões.
Em Santo Agostinho, não existem provas formais para demonstrar a existência de Deus. Ainda que toda a sua obra seja uma espécie de itinerário em direção a Deus. Tudo fala de Deus.
Já no final da sua vida, diz que o homem tem em si, enquanto é capaz, “a luz da razão eterna, na qual vê as verdades imutáveis”.
KANT
A filosofia Transcendental de Kant delimitou o conhecimento científico, tal como era entendido à época (Aritmética, Geometria e Física), fundamentando-o nas estruturas do sujeito. Portanto, tudo aquilo que tais estruturas não abrangessem estaria fora dos domínios do saber legítimo.
Kant tentou aliar o racionalismo ao empirismo, para ele não haveria conhecimento sem percepção sensível e, tampouco, sem entendimento. Em termos kantianos, o filósofo estaria muito longe de ser aquele que sobre tudo indaga, como se julgava em tempos remotos. Legitimamente, o filósofo investigaria as condições de possibilidade do conhecimento e também os fundamentos do dever moral.
Kant ensina-nos que o nosso conhecimento tem a base da sua validade na razão. O factor “a priori” não procede, segundo ele, da experiência mas sim do pensamento, da razão, pelo que foi o fundador do apriorismo.
Kant mostra ao longo da sua crítica quais são as condições para qualquer experiência possível, na "Estética Transcendental", analisando quais são as condições a priori para que um dado fenómeno possa ser dado na intuição, chegando às condições de "espaço", para as intuições externas, e "espaço" e "tempo" para as intuições internas.
Após a Estética, Kant prossegue para a análise da forma pela qual aquilo que é dado na experiência é organizado em relações que constituem conhecimento. Estas são as categorias do entendimento, determinadas pela razão pura e que, sendo preenchidas pela matéria proveniente da experiência, podem formar um conhecimento. Ambas as análises são feitas na chamada "Analítica Transcendental".
Em seguida ele segue para a "Dialéctica Transcendental", parte do livro na qual ele usa esse pensamento elaborado na analítica para mostrar erros de raciocínio impregnados no modo de pensar filosófico de então.
===================================
Sinta-se, por favor, perfeitamente à vontade, para publicar (ou não) o que entender, até porque o mail é longo e será cansativo lê-lo.
Os meus melhores cumprimentos
Mª Emília Gonçalves
* * *
Agradeço à Dr.ª Maria Emília Gonçalves pois assim ficamos com um interessante resumo do que cada um foi pensando e influenciando, sendo consequência do que aprendeu e viu e causa de evolução.
Continuemos…
Novembro de 2019
Henrique Salles da Fonseca