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A bem da Nação

CURTINHAS Nº CXLI

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O RABO DA LAGARTIXA - I

 

  • Nunca é demais recordar que, sem dinheiro (liquidez), as economias de base contratual (como a nossa e tantas outras) não funcionam – ponto final. E dinheiro, nos tempos que correm, é dívida e só dívida: dívida à vista dos Bancos Centrais; dívida à vista dos Bancos Comerciais (Bancos, de ora em diante).

 

  • Cá como em qualquer parte do mundo, se nada for feito – se o Banco Central não intervier, directamente ou através de um Esquema de Garantia dos Depósitos – o colapso de um Banco implica a perda total dos fundos nele depositados – ou, pelo menos, a total indisponibilidade desses fundos durante largo tempo.

 

  • Com as consequências que são fáceis de antever: (i) redução súbita da liquidez em circulação (na exacta medida dos depósitos bancários perdidos ou indisponíveis); (ii) contracção da procura interna (quase sempre mais que proporcional à quebra da liquidez, também por razões psicológicas); (iii) abrandamento da actividade económica (causada pela quebra na procura interna); (iv) aumento do desemprego (dependendo dos sectores de actividade que sejam mais afectados pela contracção da procura interna).

 

  • Se não for um só Banco isolado a ficar insolvente, mas vários em simultâneo; ou se esse Banco tiver grande peso no sistema de pagamentos; ou se a sua insolvência desencadear um efeito dominó, arrastando outros Bancos para a insolvência; ou se bastar o colapso de um Banco para gerar um ambiente de pânico, com corrida aos Bancos para levantar o dinheiro neles depositado – é o caos.

 

  • Entre nós, a dívida à vista dos Bancos (daqueles estabelecidos em Portugal, escusado será dizer) representa mais de 90% do volume de liquidez em circulação (o resto é o stock de notas, tendo as moedas metálicas uma importância, apenas, marginal).

 

  • E, no final de 2013, os sete maiores Bancos (por ordem decrescente dos respectivos depósitos: CGD, BCP, BES, BST, BPI, MG e BANIF) representavam praticamente a totalidade dos depósitos bancários (um pouco menos de 90% da liquidez em circulação).

 

  • Desde então, um deles foi liquidado (BANIF) e outro foi esquartejado (BES) na tentativa de salvar o que fosse possível.

 

  • Em ambos os casos, os depósios bancários permaneceram intactos, transitando para o BST que por eles passou a responder (no caso do BANIF) e para um Banco constituído expressamente para o efeito (NB, no caso do BES).

 

  • Em ambos os casos, a causa de fundo do colapso foi a manifesta insuficiência, não de liquidez, mas de Capitais Próprios para absorver, quer as perdas já incorridas, quer as perdas esperadas que inquinavam os respectivos Balanços. E sem Capitais Próprios mínimos adequados ao seu modelo de negócio nenhum Banco está em condições de funcionar – pelo que terá de ser liquidado.

 

  • Em ambos os casos, porém, o golpe de misericórdia foi dado pelo BCE que recusou continuar a ceder-lhes liqudez – quando os mercados interbancários há muito também não os viam com bons olhos.

 

  • Excepção feita ao BST (que está integrado num Grupo Bancário considerado sistemicamente importante a nível europeu e global - e, por isso, é visto de maneira diferente), os restantes Bancos enfrentam, de há vários anos a esta parte, problemas que não são diferentes, em natureza, daqueles que levaram BES e BANIF ao colapso: insuficiência (talvez não tão extreme) de Capitais Próprios para acomodar os riscos a que estão expostos mais as perdas já incorridas que ainda têm de reconhecer nas suas contas.

 

  • Contribuíram para esta insuficiência três factos que o BdP, aparentemente, nunca levou a sério: (i) as perdas incorridas não eram prontamente levadas a Resultados (ficavam a “fazer Balanço” na esperança de melhores dias); (ii) as provisões constituídas não davam, nem de longe, para absorver a totalidade das perdas esperadas (que, em geral, também não eram estimadas com um mínimo de rigor); (iii) o modelo de negócio (sim, porque todos eles seguiam o mesmo modelo de negócio, que outro não conheceriam) era, e é, especialmente exigente quanto a Capitais Próprios.

 

  • A solução milagrosa que parece estar em cima da mesa consiste em retirar dos Balanços dos Bancos todas as perdas já incorridas, mais as posições de Balanço que podem, com elevada probabilidade, redundarem em mais perdas, reunindo tudo numa sociedade criada expressamente para o efeito (sociedade instrumental) - a qual tentará cobrar o que for cobrável e realizar o que for realizavel. Em curtas palavras, minimizar o prejuízo.

 

  • “Banco Mau” é o nome que usualmente se dá a sociedades instrumentais assim, ainda que de Banco nada tenham. Aliás, nem sempre ficam sujeitas a supervisão prudencial - e, por cá, ainda não se sabe como será (veja-se o que se tem passado na liquidação do BPN).

 

  • Esta solução depara-se, invariavelmente, com três dificuldades de tomo: (i) se, quanto às perdas já incorridas, dúvidas não haverá - como identificar, porém, as posições de Balanço ainda vincendas, mas que representam já um risco agravado? (ii) que preço atribuir a cada posição de Balanço a transferir para o “Banco Mau”? (iii) será que o contexto actual da economia portuguesa é amigo de um “Banco Mau” - ou tolher-lhe-á os movimentos?

 

  • A experiência com a constituição do NB, baseado naquilo que o BdP julgava ser o são no Balanço do BES (mais exactamente, do Grupo BES), não augura nada de bom sobre a habilidade dele, BdP (ou, para o efeito, de renomados Auditores), para identificar, nem mesmo as perdas já incorridas, quanto mais as posições de Balanço ainda periclitantes.

 

  • O mais provável (como no caso BES/NB) é assistir-se durante largos meses a um “tira, põe & deixa” entre os Bancos e o “Banco Mau” - que só fragilizará ainda mais os Bancos que se queria robustecer.

 

  • Mas o passo mais complicado nesta solução é, sem dúvida, como atribuir um preço razoável a cada um dos activos ditos “tóxicos” (crédito malparado, imóveis sobrevalorizados ou invendáveis, títulos sem mercado secundário minimamente fiável) a transferir dos Bancos para o “Banco Mau”.

 

(cont.)

Palhinha Machado.jpgA. Palhinha Machado

Junho de 2016

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