CLAUSURA – 10
Páscoa feliz para quem ler este escrito. E também para quem o não ler.
No meu escrito anterior prometi que desta vez seria mais objectivo e me deixaria de volatilidades literárias como aquelas de que nele tratei. Vamos, então, a temas concretos.
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O Natal comemora a passagem do tempo do Pai para o tempo do Filho e a Páscoa celebra a passagem do tempo do Filho para o tempo do Espírito Santo, este em que estamos. E é neste tempo que ficaremos até à Parúsia e, então e só então, passaremos ao Juízo Final. E porque a Páscoa significa a ressurreição de Cristo com a Sua desmaterialização e passagem à imaterialidade espiritual, o Espírito Santo que permanece entre nós, esta é de facto a festa maior do Cristianismo. A ressurreição é o fundamento da fé cristã.
Mas o Cristianismo é mais do que a sua Religião pois há quem não se sinta ligado aos dogmas da fé mas cumpra “religiosamente” os seus preceitos morais e, por consequência, adopte o respectivo código ético. E, dentre estes, há-os certamente que nascem, vivem e morrem sem nunca terem assistido – e muito menos participado - a cultos religiosos.
E os outros, esses que não são religiosos – de qualquer religião - e não cumprem princípios morais nem regras éticas? Esses são casos de Polícia e foi sobretudo por causa deles que nasceram os quadros jurídicos em que todos navegamos.
No Ocidente, conseguimos laicizar a definição do bem e do mal, conseguimos avançar na parametrização do bem comum.
Mas não deixa de ser interessante recordarmos algumas questões em torno do bem e do mal.
O mal está no contrário do bem. Portanto, basta encontrarmos o bem para que, no seu oposto, nos deparemos com o mal.
E o que é o bem?
O bem é o que está conforme à ética e à moral sendo esta a questão dos princípios e aquela a dos factos.
A condição ética definida pela síntese do «eu, tu, ele», enquadra-nos na síntese do ideal social definido pela questão: o que é que eu quero, posso e devo fazer por ti sem o prejudicar a ele, esse terceiro que pode nem sequer ser nosso conhecido?
Uma atitude inicial que parte do voluntarismo traduzido pelo «quero», que reconhece – com mais ou menos humildade – as limitações pessoais através do «posso» e que se auto impõe o «dever»: altruísmo, humildade, sentido do dever.
Aí está ele, o contrário do bem, o mal representado pelo egoísmo, pela arrogância e pela irresponsabilidade.
E se passarmos do singular ao plural na síntese do «nós, vós, eles», chegamos ao bem-comum (a que também poderemos chamar «Sentido de Estado»): o que é que nós podemos fazer por vós sem os prejudicar a eles, esses terceiros que não sabemos sequer quem são.
Eis-nos assim regressados aos primórdios da distinção entre o bem e o mal.
Estes são temas sobre que nunca é demais pensar, sobretudo num dia em que celebramos a transição para um tempo anterior ao Juízo Final. Até porque, como dizia Pascal no seu argumento ontológico, mais vale crer, em que tudo se pode ganhar, do que não crer e tudo se perde pela certa.
(continua)
Abril de 2020
Henrique Salles da Fonseca