ARÁBIA FELIX – 4
«Gargara», é a única palavra em língua urdu que conheço e significa algo como «ondulante». Pelo menos, foi esse o sentido da conversa que nos fez um dos condutores do rally amalucado pelas dunas do deserto dubaiano. Logo me lembrei de «gargarejo» que também é algo de sonoridade ondulante. E isso vem de «garganta». Quanta da etimologia resulta das malhas tecidas pelos Impérios…
E porquê urdu no Dubai? Porque é a tal questão da nacionalidade. Quem assim falou já nasceu no Dubai mas, não sendo filho de nacionais do Emirato, não conseguirá alguma vez na vida adquirir a nacionalidade. Mas se se casar com uma mulher que também lá tenha nascido, então os filhos comuns poderão ser admitidos no grupo restrito dos nacionais dubaianos. Deste modo, aquela família, não conseguindo adquirir a nacionalidade local, não teve até agora motivos para cortar com a cultura de origem e mantém a língua dos respectivos antepassados que, neste caso, é o urdu.
E também são muçulmanos, perguntei. Que sim mas nem mesmo assim conseguem a nacionalidade. E se vierem a ser pais de crianças com a nacionalidade? Nada feito. Serão pais de dubaianos mas disso não passarão.
Realmente, pensando melhor, se o Emir quiser manter as rédeas firmes do poder, não poderá deixar muitos forasteiros aderirem à nacionalidade sob pena de, a partir de certa altura, o Emirato passar a ser dominado por quem pensa como estrangeiro e os autóctones genuínos, árabes, perderem a exclusividade da Nação. Não esquecer que isto é um regime monárquico ditatorial em que a «abertura» política se limitou a promover a constituição de um Conselho Consultivo do Emir que este consulta se e quando quer e a quem não confere qualquer poder decisório.
Segue-se uma particularidade: os funcionários públicos têm a obrigação de vestir a indumentária típica do Emirato, ou seja, a Kandurah que é a túnica comprida usada pelos homens, geralmente branca mas que também pode ser bege, castanha e, raramente, preta; ao pano na cabeça chama-se Guthra e ao cordão que o segura na cabeça chama-se Agal.
E já que de início referi a Revolução Francesa, parece que aquela gente imita os «sans culotte». Em terras que podem aquecer até aos 50º Centígrados, sempre ficam mais arejados. E não repito os comentários que as excursionistas expenderam…
(continua)
Março de 2019
Henrique Salles da Fonseca
(no topo do Dubai Burj Khalifa)