AMAZÓNIA – 3
Já referi algumas facetas do ambiente político que encontrei no Brasil e de certas particularidades da geografia. Falta agora contar tudo o resto.
Tinha pensado deixar para o fim mas acho melhor contar já que alguém deve ter posto o projecto do aeroporto de Manaus ao contrário sobre a mesa de trabalho e tudo foi construído às avessas. Como assim? Exactamente, às avessas.
Eu creio que mandaria a lógica pôr a aerogare entre a pista e a cidade e não no meio da selva obrigando a contornar a pista por uma das extremidades para se ir para Manaus num percurso bem mais longo do que o razoável. Numa cidade sem ligações rodoviárias com o exterior, a desculpa de que a intenção era desenvolver a selva parece-me completamente esfarrapada. Sim, os macacos e as preguiças não se desenvolveram mais lá porque lhes puseram a aerogare frente aos focinhos e os homens continuaram a rumar à cidade deixando a selva para a bicharada. Ou terão os «experts» imaginado construir avenidas e arranha-céus na floresta? Imagine-se o que seria então o alarido dos ecologistas por esse mundo além...
Deixem-se, pois, de desculpas tolas e assumam que tomaram umas caipirinhas a mais, que o projecto foi posto ao contrário e fiquem-se assim.
Mas há mais.
Não é que durante a presidência do cefalópode se construiu uma ponte sobre o rio Negro ligando Manaus a... nenhures? Pois é isso mesmo: partindo do pressuposto discutível de que aquela belíssima ponte começa em Manaus e acaba do outro lado, ela começa numa cidade importante que actualmente tem um pouco mais de dois milhões de residentes e acaba numa floresta onde residem algumas centenas de pessoas dispersas por inúmeras pequenas aldeias sendo que a maioria dessa pouca gente vive em regime de auto-suficiência não precisando de Manaus praticamente para nada, a não ser em casos de emergência médica. E num caso destes, a ambulância demora cerca de 30 a 40 minutos a chegar junto do paciente para depois demorar outros 30 a 40 minutos a chegar ao hospital enquanto a «ambulancha», sempre presente na outra margem, demora não mais que 30 minutos a percorrer a distância mais longa entre o extremo dos caminhos que podem ser percorridos por uma ambulância e o cais de Manaus. E a pergunta é: justificava-se construir uma ponte (que tem a fama de ser a ponte mais cara do mundo, tal a corrupção que rodeou a sua construção) para acorrer a casos de excepção?
E se a outra margem se começar a desenvolver com avenidas e arranha-céus, lá teremos de novo os ambientalistas a berrarem urbi et orbe e os políticos verdes a legislarem proibições sucessivas de tudo o que possa ser o derrube de uma árvore ou a destruição de um ninho.
Mas é claro que estes são problemas que uma qualquer boa dose de corrupção resolverá com presteza. E no Carnaval seguinte o samba soará na mesma.
Este, o ambiente moderno, dito civilizado, do branco. No próximo texto vou abordar alguma mitologia indígena.
Até logo.
Março de 2016
Henrique Salles da Fonseca