AÍNDA NIETZSCHE
O pai de Friedrich Nietzsche, Karl Ludwig, morreu aos 38 anos de idade com aquilo a que à época era chamada «moleza cerebral», doença que provocava períodos dolorosos e de prostração e, na fase terminal, coma permanente.
O pai foi autopsiado confirmando-se o diagnóstico em vida mas o filho, que morreu louco, não o foi e, portanto, ficou-se sem se saber se herdara algum problema do pai.
Mas pai e filho tiveram vidas muito diferentes. O pai, sacerdote luterano, viveu sempre em paz com mulher e filhos na residência paroquial que lhe fora atribuída enquanto o filho deambulou pelos campos de batalha durante a guerra entre a França de Napoleão III e a Prússia de Bismarck como auxiliar de ambulância e teve aos seus cuidados os feridos e doentes mais graves, nomeadamente de doenças infeciosas. E, tanto quanto a medicina da época conseguiu apurar, terá, num primeiro diagnóstico, contraído disenteria grave e, num segundo diagnóstico, difteria.
Posta a situação nestes termos clínicos, foi-lhe ministrada a terapêutica mais moderna que então se conhecia e que consistia em clisteres de nitrato de prata, ópio e ácido tâmico.
Por incrível que pareça, o doente sobreviveu à doença e à terapêutica mas passou a sofrer horrores pois tinha os intestinos destruídos, tinha icterícia, insónias, vómitos, hemorroidas, um gosto constante a sangue na boca e sofria com todos os horrores psicológicos que os campos da batalha lhe haviam gravado no cérebro.
E a questão é: como é que este desgraçado não havia de enlouquecer?
Setembro de 2019
Henrique Salles da Fonseca
BIBLIOGRAFIA:
«EU SOU DINAMITE – a vida de Friedrich Nietzsche», Sue Prideaux, Círculo de Leitores, 1ª edição, Abril de 2019