A VISITA DE FILIPE VI
“Olivença é terra portuguesa” - uma evidência!
Não deixa de ser significativo que Portugal seja o primeiro país que o novo Rei de Espanha visita, oficialmente, após a sua coroação.
Mesmo tendo em conta que o convite tenha partido do Presidente Português.
O significado é, sobretudo, político e estratégico.
Tudo deve ser seguido e analisado com a máxima atenção.
Lamentavelmente, “Sua Muito Católica Majestade”[i] não vai ser recebido por ninguém de estirpe real, alguém de sua igualha, com o titulo de “Majestade Fidelíssima”[ii], mas pelo republicaníssimo Professor Cavaco Silva – o qual, obviamente, não usa o titulo, que passou naturalmente para a Nação Portuguesa, quando a Monarquia caiu sem lustre nem glória, no arrepiante dia 5 de Outubro de 1910.
Filipe será bem recebido como representante de um país que estimamos seja nosso amigo e bom vizinho, mas que deve ter sempre presente que será repudiado no dia em que além de ser Filipe VI de Espanha, se engane na numeração romana e intente ser, também, IV de Portugal.
É certo que a Monarquia Espanhola foi visitar primeiro Sua Santidade o Papa, o que é lógico, não só porque para além de uma visita de Estado, tem um carácter espiritual. Mais a mais o Papa é falante natural do castelhano…
Mas para nós portugueses, tal facto não deixa de se dever ter em conta, face à luta que os dois reinos travaram pelo favor Papal, ao longo dos séculos.
Recorda-se, só para ilustrar, que a Santa Sé levou 51 anos a reconhecer “de jure” a independência de Portugal e tornou, mais tarde, a não ter pressas em reconhecer a Restauração/Aclamação de 1640, o que só ocorreu em 1670, passando já dois anos da assinatura do Tratado de Paz entre as duas coroas.
Para já não falar, entre muitas outras coisas, nos 600 anos que Roma levou a canonizar D. Nuno Álvares Pereira, a que não é seguramente alheia a diplomacia de Madrid.
Filipe VI não perdeu, aliás, tempo e logo convidou Francisco a visitar Espanha, em 2015, a propósito do 500º aniversário do nascimento de Santa Teresa de Ávila.
Depois de Portugal segue-se Marrocos, onde será recebido pelo Rei Mohamed VI, o “Comandante dos Crentes”, da dinastia Alauita, que teve início em 1664 – embora a Monarquia marroquina remonte ao ano de 788 – cuja lema é “Deus, Pátria, Rei”.
Com Marrocos as relações da Espanha são tensas, não só por um historial antigo de disputas, algumas ainda não resolvidas - como é o caso de cidades, enclaves e ilhotas, sobre soberania espanhola, que Rabat reivindica – mas também por problemas sobre direito marítimo e a magna questão da emigração.
Estas relações contrastam com as que Portugal mantém com Marrocos, que se podem considerar exemplares desde a assinatura do Tratado de Paz de 1774, apenas toldadas pelo apoio – apesar de tudo moderado – que aquele país prestou aos movimentos de guerrilha que combateram a presença portuguesa no Ultramar entre 1961-1974.
O périplo termina em França – numa prioridade nitidamente regional – país com quem a Espanha sempre manteve uma relação de desconfiança, mesmo nos períodos de alternância entre serem aliados ou inimigos, que os caracteriza e que atingiu o rubro nas contendas entre a Casa dos Bourbons e dos Habsburgos.
Já não reina em França “Sua Majestade Cristianíssima”[iii] que, não raras vezes, não teve escrúpulos em se aliar aos inimigos da Fé Cristã, já de si fortemente abalada pela “Reforma” e quase subvertida pela Revolução Jacobina de 1789.
E sempre que a França se alia à Espanha contra as potências marítimas, Portugal viu sempre a sua independência em perigo.
Aliás, quando Filipe VI atravessar a fronteira sabe que deixa atrás de si um confortável poderio militar, ilustrado pelos 347 carros de Combate “Leopardo” e 103 “Centauro”;368 “Pizarro” (ligeiros); 31 helicópteros de ataque “Tigre”, 37 “NH90”, 37 “Cougar” e 18 “Chinook”; 102 peças autopropulsionadas de 155 m/m, M 109 e 184 viaturas ligeiras de transporte de tropas “RH41”, 396 “Lince” e 1600 “URO”. Tudo material moderno e letal; só para referir isto, que pertence ao Exército. Nem vale a pena falar nos outros Ramos…
Por seu lado o Ducado de Alba continua a ser a casa nobre mais poderosa de Espanha…
Convinha não esquecer estas coisas[iv].
É curioso como o filho daquele que foi o mais “português” Rei de Espanha – sê-lo-ia, porventura, no coração, porém, não na razão – deixou os “filhos” da Espanha para outras núpcias.
Estamos a referir-nos a todos os países que os espanhóis colonizaram, sobretudo nas Américas, cujas bandeiras emolduram uma sala no notável Mosteiro de La Rábida, perto de
Huelva, o que constitui o símbolo da Hispanidade, cujo dia se comemora a 12 de Outubro. A data em que Cristóvão Cólon chegou, oficialmente, ao Novo Mundo, afirmando que tinha chegado à Índia…
Cristóvão Cólon que está muito ligado a La Rábida onde terá deixado o filho mais velho a ser educado e onde conferenciava com um sábio franciscano português, Frei António de Marchena, que por lá pontificava.
Cristóvão Cólon que, estamos em crer, a coroa espanhola sempre conheceu como sendo um nobre navegador português, mas nunca quis que se soubesse…
Filipe VI vem pois, a Portugal, numa campanha de charme e também para marcar o seu terreno. Não só perante potências exteriores, mas outrossim, para o interior de Espanha, querendo significar que antes das autonomias e dos regionalismos, está a unidade da Espanha, se possível da Península Ibérica, que sendo uma realidade geográfica sempre quiseram fazê-la coincidir com uma única unidade política.
Serve ainda para descansar o polo geopolítico mais forte da Meseta, que é Castela, no sentido em que realça o facto de Portugal continua aqui ao lado e pode sempre constituir uma compensação para o caso de alguma das 17 comunidades autonómicas (mais duas cidades) fugir ao seu controlo.
Como dizia José de Carvalhal y Lencastre[v] “a perda de Portugal foi de puro-sangue e, por isso, o ministro espanhol que não pense constantemente na reunião, ou não obedece à lei ou não sabe do seu ofício”.
Parece que Filipe VI está bem preparado para o seu ofício e já jurou cumprir a Lei.
Por isso perceberá sem dificuldade um repto de exigência que daqui lhe lanço, pois não sou, nem nunca serei seu súbdito (embora lamente ser eu a fazê-lo e não as autoridades que me deviam representar): Influa em tudo o que estiver ao seu alcance para que o governo de Espanha devolva a cativa, mas portuguesíssima terra de Olivença e seu termo.
Tanto eu como V. Majestade sabemos que aquela terra não vos pertence.
Folgo que tenha uma boa estadia, mas compreenderá que enquanto este assunto não estiver resolvido, eu não lhe possa desejar as boas vindas.
6/7/14
João J. Brandão Ferreira
Oficial Piloto Aviador
Português sofrido
[i] - Titulo que começou por ser outorgado a Fernando e Isabel, (Reis Católicos) pelo Papa Alexandre VI
[ii] - Titulo atribuído aos Reis de Portugal, pelo Papa Bento XIV, em 23/12/1748
[iii] - Titulo usado regularmente desde o Rei Carlos VI, por o Papado considerar a França, desde Clóvis I, a “filha mais velha da Igreja”.
[iv] - Não teria sido má ideia, “alguém” ter lembrado tudo isto, na última reunião do Conselho de Estado (ocorrida a 4/7/14), mas parece que andam preocupados com outras coisas