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A bem da Nação

A REVOLUÇÃO COMUNISTA EM PORTUGAL E A CONTRA-REVOLUÇÃO PARTIDÁRIA – 5

 Ruínas - Leiria, Leiria


Desencantar e dessacralizar o mito de Abril


Cada nação precisa dos seus ideais e dos seus mitos; de facto precisamos de utopia mas não da alienação. Em nome de uma superioridade moral vendemos o mito da revolução. Portugal perde a guerra do ultramar e vende-a como libertação de Portugal. A derrota de um ultramar entregado ao bloco soviético é empacotada na cor dos cravos de Abril. Uma descolonização que já há muito deveria ter sido feita, deu-se na confusão e na traição em nome da auto-estima. Todos nós sofremos do mito de Abril que nos levou para onde nos encontramos. Portugal ajoelhado não aos pés duma civilização, mas ajoelhado aos pés da troika que apesar de tudo, com o seu ditado, ajudou Portugal a sair da bancarrota (de que nos libertamos, esta semana, ao voltar aos mercado financeiros internacionais).


Agora seria óbvia a era da recuperação da dignidade individual assumindo responsabilidade pessoal. Primeiramente seria necessário desencantar os feitores da revolução. Antes deixávamos o negócio do Vinho do Porto nas mãos dos feitores portugueses a serviço das quintas inglesas. Com o 25 de Abril entregamos o negócio da nação, primeiramente, a feitores da ideologia, aos representantes soviéticos e à fé no movimento 68 para depois colocarmos o nosso destino na UE. Abandonamos a consciência lusófona e de portugueses para seguirmos a anónima internacional. Em nome da moral e contra a razão endinheiraram-se os novos-ricos produzidos pelo Abril à custa do esvaziamento cultural e da auto-estima da nação.


Para começarmos de novo teremos de deixar nas ruínas do “império” os seus “heróis”, aqueles que lhe fizeram o enterro. Temos que da ruína da nação enferma, agora ajoelhada erguer-nos de novo como noutros tempos contra os interesses daqueles portugueses traidores que arquitectavam o seu futuro na entrega de Portugal a Castela. 1640 é um dia do povo, agora que a liberdade individual e do povo se encontra mais que nunca ameaçada, há que o restaurar. Mandemos para o ferro-velho da história muitas das aquisições de Abril para readquirirmos Portugal readquirindo-nos a nós. Não queremos já ideais floridos nem a libertinagem enganadora; não precisamos da roupa velha mas duma vontade firme para cada um se erguer. Também o entusiasmo e valores do 25 de Abril nos poderão ajudar. Um estado que domina e mantém o povo à trela da ideologia e das dívidas perde a confiança.


Talvez fosse melhor dizer adeus a alguns direitos para recuperarmos a nossa dignidade ultrajada numa massa de ovelhas em que a perspectiva prometida era a erva e o traseiro da “ovelha” vizinha. Para nos tornarmos cidadãos adultos teremos de deixar de ser massa partidária, confessional ou nacional. Ter-se-á de sair de novo para a rua para aí se construir o nosso Abril, um Abril de liberdade para cada um. Uma rua trabalhada e enfeitada por todos mas sem ladrões das flores e dos frutos e sem os protagonistas da nação apresentados na imprensa e na televisão. Somos um povo a caminho à semelhança do de Israel a realizar-se em comunidade.


RUMINAR A REVOLUÇÃO


A revolução não pode ser analisada apenas sob o aspecto moral; precisa também de uma abordagem histórica séria que ainda não chegou à consciência pública. Na análise da ditadura e da revolução exigimos dos protagonistas que sejam heróis ou pelo menos pessoas admiráveis. Os que fizeram a revolução revelaram-se muito normais (excepto Ramalho Eanes) e a nível de liderança será difícil encontrar uma personalidade da craveira de Salazar. Seria hipocrisia continuar-se a apostar numa “vítima de lavradores” como dizem os Alemães para ilibarem os restantes, quando todos faziam parte do sistema. Karl Marx dizia “As pessoas fazem a própria história, mas, sob circunstâncias auto-selecionadas, não o fazem livremente”. Trata-se de viver uma cultura da memória com capacidade para se rever no positivo e no negativo sem passar tudo a ferro nem com heroizações.


É melhor uma controvérsia honesta que contribua para a construção de uma sociedade civil crítica na continuidade da paz civil. Entretanto o 25 de Abril tem-se tornado numa carga que transforma a mudança do nome da ponte Salazar para ponte 25 de Abril numa usurpação. O armazém da memória da comunidade democrática aguenta e deve ser resistente, na certeza de que não foi o 25 de Abril que inventou a liberdade, a igualdade e a fraternidade e na consciência que cada época tem os seus padrões e normas. Liberdade só o é se for ao mesmo tempo uma conquista individual e social.


O sociólogo Laurene Peter fala de um princípio que pode explicar parte da situação portuguesa. Fala de uma “sublimação sem barulho” e de um “cair pela escada acima” uma pseudo-promoção. Segundo o Princípio de Peter, cada funcionário tende a subir na carreira até atingir o seu grão de incompetência. Enquanto não se atinge o grau da incompetência ganha-se aplauso, reconhecimento e influência. Depois, uma vez atingido o último degrau, fica-se lá, em vez de se ter ficado no grau anterior onde se era criativo e competente.


As novas gerações (pós 25 de Abril) receberam, gratuitamente, uma herança que agora desemboca na crise e que é preciso ruminar. Acordamos num jardim zoológico muralhado quando sonhávamos a liberdade de passarinhos sem gaiola nem fronteiras. Julgávamos que o sonho era realidade e que a realidade era sonho. Julgávamos que era possível uma sociedade só de académicos e por isso acabamos coma as boas escolas comerciais e industriais de então. A revolução nascida mais da ideologia do que da realidade desprezava o trabalho manual. A discriminação do trabalho manual em relação ao intelectual levou-nos a onde nos encontramos.


O 25 de Abril envelheceu deixando os mais velhos desiludidos dos marxistas, maoistas, comunistas, anarquistas que queriam uma mudança radical. Constatou-se que o sonho era só para eles, como podemos verificar nas suas posições, remunerações e pensões. Tudo corria para o partido que dava mais.


Somos todos corresponsáveis. Quando um dedo da nossa mão aponta para a responsabilidade dos outros pelo menos outros três apontam também para nós. Sou crítico porque amo o meu país, procurando ver o porquê das coisas irem mal.

 

(continua)

 

 António da Cunha Duarte Justo
Formado em Ciências da Educação (Português e História)
Conferência proferida na sede da ARCADIA a 4 de Abril de 2014

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