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A bem da Nação

O GOVERNO DA TURQUIA “NÃO OFERECE CONFIANÇA”

 

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Ancara faz chantagem instrumentalizando o fluxo dos refugiados para a Europa

 

A Turquia, como se vê no ataque terrorista em Istambul a turistas e na guerrilha curda está a colher os frutos de uma política de confrontação e oportunismo que tem seguido especialmente desde que o partido de Erdogan orienta os destinos do país. A Turquia causou, em parte, o afluxo incontrolado de refugiados, tornando a Europa vulnerável e sujeita a chantagem. Também por isso conseguiu receber 3 mil milhões de euros da UE para ter mão nos refugiados.

 

O especialista alemão em Médio Oriente e em terrorismo, Doutor Guido Steinberg, afirma em entrevista ao HNA 14.01.2016: “O afluxo de refugiados, do ano passado (2015), devemo-lo, pelo menos em parte, a uma decisão consciente do governo turco, de abrir as fronteiras para a Grécia para criar problemas aos europeus”

 

A Turquia tolera o ISIS prestando-lhe “apoio passivo” desde 2013 permitindo que use o seu território como região de retiro: "não só todos os combatentes estrangeiros do mundo árabe, mas também os da Europa e do resto do Ocidente, usaram a Turquia como área de preparação... A Turquia não é de confiança, como mostra o seu comportamento em relação ao ISIS e a outros jiahdistas… A Frente Nusra e Ahrar al-Scham (uma espécie de Talibans) recebem apoio da Turquia”, afirma o especialista. Além disso os seus ataques às zonas curdas da Síria e do Iraque, sob o subterfúgio de atacar o ISIS, são situações que apontam para o uso impróprio dos bombardeamentos.

 

Deste modo a Turquia age contra os interesses da NATO, de que é membro e mina também os interesses da UE. Naturalmente, o quase milhão e meio de refugiados que entraram na Alemanha em 2015 provocam tantos problemas à Alemanha que esta terá de implementar estratégias efectivas, a nível internacional, que fomentem a riqueza nos países produtores de emigração e não se reduza à acumulação de problemas, estabelecendo quotas de refugiados para os diferentes países da UE.

 

A UE precisa da Turquia devido à sua posição geográfico-estratégica, à quantidade de turcos na Alemanha, e também para o combate ao terrorismo e para a regulação do fluxo de refugiados. A Turquia tem um grande potencial de chantagem em relação à Europa (sua presença migratória e refugiados) e à NATO (instrumentalizando-a indirecta e militarmente também contra os Curdos). Também é facto que os Curdos refugiados especialmente na Alemanha, França e Holanda apoiam economicamente os seus irmãos de luta na defesa da liberdade e da independência. Enquanto não for organizado um Estado curdo resultante dos curdos a viver nas regiões fronteiriças de alguns países, não haverá paz na região. As potências têm sacrificado o povo curdo a interesses nacionais e estratégicos.

 

Agora com o atentado de Istambul, por razões económicas, o governo turco ver-se-á obrigado a agir mais decisivamente contra o ISIS: o turismo turco recebe da Alemanha dez milhões de turistas por ano.

 

O presidente Recep Erdogan tem feito tudo pela islamização da Turquia (continuando também a discriminar os cristãos) e contra o projecto de secularização do Estado iniciado por Atatürk fundador do Estado turco. Erdogan tirou o poder aos militares, impediu o movimento democrático no país, rescindiu o contrato de tréguas com os curdos, fomentando assim a guerra civil e prosseguindo uma política externa pró-árabe e anti-israelita.

 

A Turquia quer fazer história com o “Estado Islâmico” (ISIS)!

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António da Cunha Duarte Justo

 

A TURQUIA, O PETRÓLEO E O ESTADO ISLÂMICO

 

Russia's air force destroyed 500 ISIS tanker truck

 

O jogo duplo de grandes e pequenas potências é desmascarado neste artigo. Não parece tratar-se de propaganda sectária ou de desinformação mas sim de leitura prioritária!!!

http://www.zerohedge.com/news/2015-11-27/how-turkey-exports-isis-oil-world-scientific-evidence


How Turkey Exports ISIS Oil To The World: The Scientific Evidence

Submitted by Tyler Durden on 11/28/2015

Over the course of the last four or so weeks, the media has paid quite a bit of attention to Islamic State’s lucrative trade in “stolen” crude.

On November 16, in a highly publicized effort, US warplanes destroyed 116 ISIS oil trucks in Syria. 45 minutes prior, leaflets were dropped advising drivers (who Washington is absolutely sure are not ISIS members themselves) to “get out of [their] trucks and run away.”

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The peculiar thing about the US strikes is that it took The Pentagon nearly 14 months to figure out that the most effective way to cripple Islamic State’s oil trade is to bomb... the oil.

Prior to November, the US “strategy” revolved around bombing the group’s oil infrastructure. As it turns out, that strategy was minimally effective at best and it’s not entirely clear that an effort was made to inform The White House, Congress, and/or the public about just how little damage the airstrikes were actually inflicting. There are two possible explanations as to why Centcom may have sought to make it sound as though the campaign was going better than it actually was, i) national intelligence director James Clapper pulled a Dick Cheney and pressured Maj. Gen. Steven Grove into delivering upbeat assessments, or ii) The Pentagon and the CIA were content with ineffectual bombing runs because intelligence officials were keen on keeping Islamic State’s oil revenue flowing so the group could continue to operate as a major destabilizing element vis-a-vis the Assad regime.

Ultimately, Russia cried foul at the perceived ease with which ISIS transported its illegal oil and once it became clear that Moscow was set to hit the group’s oil convoys, the US was left with virtually no choice but to go along for the ride. Washington’s warplanes destroyed another 280 trucks earlier this week. Russia claims to have vaporized more than 1,000 transport vehicles in November.

Of course the most intriguing questions when it comes to Islamic State’s $400 million+ per year oil business, are: where does this oil end up and who is facilitating delivery? In an effort to begin answering those questions we wrote:

Turkey's role in facilitating the sale of Islamic State oil has been the subject of some debate for quite a while. From "NATO is harbouring the Islamic State: Why France’s brave new war on ISIS is a sick joke, and an insult to the victims of the Paris attacks", by Nafeez Ahmed:

"Turkey has played a key role in facilitating the life-blood of ISIS’ expansion: black market oil sales. Senior political and intelligence sources in Turkey and Iraq confirm that Turkish authorities have actively facilitated ISIS oil sales through the country. Last summer, Mehmet Ali Ediboglu, an MP from the main opposition, the Republican People’s Party, estimated the quantity of ISIS oil sales in Turkey at about $800 million—that was over a year ago. By now, this implies that Turkey has facilitated over $1 billion worth of black market ISIS oil sales to date."

Here's what former CHP lawmaker Ali Ediboglu said last year:

“$800 million worth of oil that ISIS obtained from regions it occupied this year [the Rumeilan oil fields in northern Syria — and most recently Mosul] is being sold in Turkey. They have laid pipes from villages near the Turkish border at Hatay. Similar pipes exist also at [the Turkish border regions of] Kilis, Urfa and Gaziantep. They transfer the oil to Turkey and parlay it into cash. They take the oil from the refineries at zero cost. Using primitive means, they refine the oil in areas close to the Turkish border and then sell it via Turkey. This is worth $800 million.”

Earlier this month, Ediboglu told Russian media that "ISIL holds the key to these deposits and together with a certain group of persons, consisting of those close to Barzani and some Turkish businessmen, they are engaged in selling this oil" ("Barzani" is a reference to Masoud Barzani, President of the Iraqi Kurdistan Region).

But even as Turkey's ties to the ISIS oil trade have been hiding in plain sight for the better part of two years, the Western media largely ignores the issue (or at least the scope of it and the possible complicity of the Erdogan government) because after all, Turkey is a NATO member.

Unfortunately for Ankara, Erdogan's move to shoot down a Russian Su-24 near the Syrian border on Tuesday prompted an angry Vladimir Putin to throw Turkey under the ISIS oil bus for the entire world to see. Here's what Putin said yesterday after a meeting in Moscow with French President Francois Hollande:

"Vehicles, carrying oil, lined up in a chain going beyond the horizon. The views resemble a living oil pipe stretched from ISIS and rebel controlled areas of Syria into Turkey. Day and night they are going to Turkey. Trucks always go there loaded, and back from there – empty. We are talking about a commercial-scale supply of oil from the occupied Syrian territories seized by terrorists. It is from these areas [that oil comes from], and not with any others. And we can see it from the air, where these vehicles are going."

“We assume that the top political leadership of Turkey might not know anything about this [illegal oil trade although that's] hard to believe," Putin continued, adding that “if the top political leadership doesn’t know anything about this, let them find out."

 

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Obviously, Putin is being sarcastic. He very clearly believes that the Erdogan government is heavily involved in the transport and sale of ISIS crude. In the immediate aftermath of the Su-24 incident, Putin said the following about Ankara:

  • PUTIN: OIL FROM ISLAMIC STATE IS BEING SHIPPED TO TURKEY
  • PUTIN SAYS ISLAMIC STATE GETS CASH BY SELLING OIL TO TURKEY

As part of our continuing effort to track and document the ISIS oil trade, we present the following excerpts from a study by George Kiourktsoglou, Visiting Lecturer, University of Greenwich, London and Dr Alec D Coutroubis, Principal Lecturer, University of Greenwich, London. The paper, entitled "ISIS Gateway To Global Crude Oil Markets," looks at tanker charter rates from the port of Ceyhan in an effort to determine if Islamic State crude is being shipped from Southeast Turkey.

* * *

From "ISIS Gateway To Global Crude Oil Markets"

The tradesmen/smugglers responsible for the transportation and sale of the black gold send convoys of up to thirty trucks to the extraction sites of the commodity. They settle their trades with ISIS on site, encouraged by customer friendly discounts and deferred payment schemes. In this way, crude leaves Islamic State-run wells promptly and travels through insurgent-held parts of Syria, Iraq and Turkey.

Since allied U.S. air-raids do not target the truck lorries out of fear of provoking a backlash from locals, the transport operations are being run efficiently, taking place most of times in broad daylight. Traders lured by high profits are active in Syria (even in government-held territories), Iraq and south-east Turkey.

The supply chain comprises the following localities: Sanliura, Urfa, Hakkari, Siirt, Batman, Osmaniya, Gaziantep, Sirnak, Adana, Kahramarmaras, Adiyaman and Mardin. The string of trading hubs ends up in Adana, home to the major tanker shipping port of Ceyhan.

 

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Ceyhan is a city in south-eastern Turkey, with a population of 110,000 inhabitants, of whom 105,000 live in the major metropolitan area. It is the second most developed and most populous city of Adana Province, after the capital Adana with a population of 1,700,000. It is situated on the Ceyhan River which runs through the city and it is located 43 km east of Adana. Ceyhan is the transportation hub for Middle Eastern, Central Asian and Russian oil and natural gas (Municipality of Ceyhan 2015).

 

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The port of Ceyhan plays host to a marine oil terminal that is situated in the Turkish Mediterranean and has been operating since 2006. It receives hydrocarbons for further loading in tankers, which carry the commodity to world markets.

Additionally, the port features a cargo pier and an oil-terminal, both of 23.2m depth that can load tankers of more than 500 feet in length (Ports.com 2015). The annual export capacity of the terminal runs as high as 50 million tonnes of oil. The terminal is operated by Botas International Limited (BIL), a Turkish state company that also operates the Baku-Tbilisi-Ceyhan pipeline on the territory of Turkey.

The quantities of crude oil that are being exported to the terminal in Ceyhan, exceed the mark of one million barrels per day. Putting this number into context and given that ISIS has never been able to trade daily more than 45,000 barrels of oil (see Section 2, ‘The Upstream Oil Business of ISIS’, page 2), it becomes evident that the detection of similar quantities of smuggled crude cannot take place through stock-accounting methods. However, the authors of the present paper believe that there is another proxy-indicator, far more sensitive to quantities of ultracheap smuggled crude. This is the charter rates for tankers loading at Ceyhan.

The Baltic Exchange (2015 a) tracks the charter rates on major seaborne trading routes of crude oil. To render its service more efficient and easily understood, it uses the system of Baltic Dirty Tanker Indices (Baltic Exchange 2015 b). One of these indices used to be the BDTI TD 11, 80,000 Cross Mediterranean from Baniyas, Syria to Laveras, France (see Map VI). Route 11 was discontinued in September 2011, due to Syria’s civil war and soon thereafter, it was replaced by BDTI TD 19 (TD19-TCE_Calculation 2015), of exactly the same technical specifications as BDTI TD 11, with the exception of the loading port of Ceyhan instead of Baniyas.

From July 2014 until February 2015, the curve of TD 19 features three unusual spikes that do not match the trends featured by the rest of the Middle East trade-routes (see Graph IV):

  1. The first spike develops from the 10th of July 2014 until the 21st, lasting approximately ten days. It coincides with the fall of Syria’s largest oil field, the AlOmar, in the hands of ISIS (Reuters 2014);
  2. The second spike takes place from the end of October until the end of November 2014, lasting one month. It happens at the same time with fierce fighting between fundamentalists and the Syrian army over the control of the Jhar and Mahr gas fields, as well as the Hayyan gas company in the east of Homs province (International Business Times 2014; Albawada News 214);
  3. The third spike lasts from the end of January 2015 until the 10th of February, stretching roughly ten days. It happens simultaneously with a sustained US-led campaign of airstrikes pounding ISIS strongholds in and around the town of Hawija east of the oil-rich Kirkuk (Rudaw 2015);

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The authors of this paper would like to make it clear from the very beginning that this has not been the case of a ‘smoking gun’. The evidence has been inconclusive. But even if volumes of ISIS crude found their way, beyond any reasonable doubt, to the international crude oil markets via the Ceyhan terminal, this fact would not conclusively point to collusion between the Turkish authorities and the shadow network of smugglers, let alone ISIS operatives.

However, having clarified such a politically sensitive issue, the authors believe that there are strong hints to an illicit supply chain that ships ISIS crude from Ceyhan. Primary research points to a considerably active shadow network of crude oil smugglers and traders (see section 2.1, page 3), who channel ISIS crude to southeast Turkey from northeast Syria and northwest Iraq. Given the existence of Route E 90, the corresponding transportation of oil poses no unsurmountable geographic and topological challenges.

An additional manifestation of the invisible nexus between Ceyhan and ISIS became evident through the concurrent study of the tanker charter rates from the port and the timeline of the terrorists’ military engagements (see section 3.4 on this page). It seems that whenever the Islamic State is fighting in the vicinity of an area hosting oil assets, the 13 exports from Ceyhan promptly spike. This may be attributed to an extra boost given to crude oil smuggling with the aim of immediately generating additional funds, badly needed for the supply of ammunition and military equipment. Unfortunately, in this case too, the authors cannot be categorical.

 

* * *

 

No, it can't be categorical and frankly, if the authors claimed to have discovered indisputable proof, we would be immediately skeptical. What they have done however, is identify a statistical anomaly and develop a plausible theory to explain it.

The key thing to note, is that this is a state-run terminal and it certainly seems as though charter rates spike around significant oil-related events involving Islamic State. Indeed, the fact that the authors mention collusion between Turkish authorities and ISIS operatives (even if they do so on the way to hedging their conclusions) indicates that the researchers think such a partnership is possible.

 

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Finally, note that Ceyhan is less than two hours by car from Incirlik air base from which the US is flying anti-ISIS sorties. In other words, ISIS oil is being shipped to the world right down the road from Washington's preferred Mid-East forward operating base.

Now that we can add what looks like quantitative evidence that ISIS oil is shipped from Turkey to the voluminous qualitative evidence supplied by ex-Turkish lawmakers, investigative reporters, and the Russian government (to name just a few sources), we can now proceed to consider one final question: where does the crude that helps to fund Bakr al-Baghdadi's caliphate ultimately end up? More on that over the weekend.

 

 * * *

É preciso salientar dois ou 3 pontos fundamentais:


a) As hesitações hamletianas de Washington, como revela o autor:
"...it took The Pentagon nearly 14 months to figure out that the most effective way to cripple Islamic State’s oil trade is to bomb... the oil.”

b) Segundo Vladimir Putin – e faz todo o sentido – o petróleo do Estado Islâmico é exportado para a Turquia para benefício, muito lucrativo, diga-se de passagem, do Estado Islâmico.

c) O terminal petrolífero de Ceyhan, na costa turca, perto da zona de fronteira regista anomalias, no sentido da alta, que não se registam nas demais regiões produtoras do Médio Oriente e que coincidem com períodos de maior actividade bélica no terreno (vizinho, entenda-se), o que pode traduzir-se na necessidade de "cash" por parte do Daesh (acrónimo do Estado Islâmico, segundo designação árabe) para a compra de armamento. O envolvimento do governo turco fica por demonstrar, mas é certo e sabido que a Turquia tem lucrado com o negócio e o Estado Islâmico tem escoado a sua produção através do contrabando transfronteiriço.

 

É extremamente interessante, elucidativo e, além disso, bastante objectivo este artigo de que recomendo adequada leitura e reflexão. Que se extraiam as conclusões que se impõem!

 

Lisboa, Dezembro de 2015

 

Francisco Henriques da Silva.jpgFrancisco Henriques da Silva

OS JOVENS TURCOS

 Um manifestante na avenida Istiklal, nas proximidades da praça Taksim em Istambul, a 14 de julho.

 

Os jovens turcos cresceram na era da Internet, falam inglês e querem poder consumir álcool, se assim desejarem, em qualquer altura do dia ou da noite, ou terem a liberdade de beijar, na rua, aqueles que amam. Evidentemente, não renegam nem a sua fé nem a sua religião, mas é claro que entendem essas limitações como uma ingerência no seu espaço privado, na sua liberdade pessoal.

 

Não é a pobreza que os empurra para a rua, mas a perceção de que vivem num país onde o regime político está longe dos seus ideais

 

Tudo isso está também de acordo com o atual estatuto geopolítico e geoeconómico do país. A Turquia é membro da NATO já há muito tempo e demonstra um crescimento económico positivo e uma constante subida do nível de vida. E porque representa uma ponte entre o Ocidente e o Oriente, os Estados Unidos sempre lhe dedicaram uma atenção especial. E é por isso que, mesmo com o nível de vida a subir, os jovens saem à rua. É claro que não pedem pão, mas liberdade. Não é a pobreza que os empurra para a rua, mas a perceção de que vivem num país onde o regime político está longe dos seus ideais. A imagem da professora da Universidade de Istambul, vestida à ocidental, a ser agredida pelas forças da ordem, é o símbolo máximo dessas manifestações.

 

A Turquia aproxima-se do “fim da História”

 

Após um longo período de regimes militares, o Governo de Erdoğan é, na verdade, um regime civil. Mas há um paradoxo na governação do país. É justamente um regime político civil que põe em perigo a estabilidade e o equilíbrio trazidos pelos (antigos ditadores) militares.

 

Cada vez que há eleições neste género de países, são ganhas por um partido religioso fundamentalista que promete o regresso à tradição. Foi isso que aconteceu no Egito e vai ser isso que, muito provavelmente, acontecerá na Síria ou noutros lados. Isso diz muito sobre a imensa distância que ainda separa a Turquia do nosso mundo ocidental.

 

Para resolver essa enorme contradição, o mundo muçulmano precisa de uma revolução religiosa, semelhante à Reforma [protestante] realizada por Martinho Lutero, que possa estabelecer um equilíbrio entre a sua fé religiosa e a aspiração tipicamente humana de civilização e estabilidade. A Turquia não pode partir do zero. Tem uma tradição, basta olharmos para qualquer período da sua história ou lembrarmo-nos de Kamal Atataurk no início do século XX.

 

A Europa e os Estados Unidos podem ajudar a negociar uma solução de paz social para manter a estabilidade do país, numa zona cinzenta em termos de conformidade com as normas da democracia: nem democrática, nem antidemocrática. Este país poderá ter um grande potencial para se tornar, a médio prazo, uma grande potência, membro da NATO e da UE, um verdadeiro vetor de civilização com uma fronteira com o sempre problemático Médio Oriente.

 

A liberdade económica traz consigo a liberdade política. Na Turquia, os sinais do “fim da História” – tal como o imaginaram Hegel e Fukuyama – estão mais próximos do que noutros Estados muçulmanos. Por “próximos”, entendam não um ano ou dois, mas talvez algumas gerações. Mas o que é que isso significa à escala da História e da paciência de que o tempo dá provas em relação a nós? É absolutamente essencial que até lá o país continue estável.

 

in «Dilema Veche», Bucareste

ANATÓLIA – 3

 

Cidadão de país com um modelo de desenvolvimento comprovadamente caduco, a minha admiração foi total com o que vi ao longo dos cerca de mil quilómetros que percorremos entre Antália – capital da «Riviera» turca – e lonjuras tais como Kusadasi e Izmir, ribeirinhas do Egeu. E como andámos para lá e para cá à procura de teatros e mais teatros tanto gregos como romanos percorrendo auto-estradas e outros caminhos mais próprios de funâmbulos, tenho a certeza de que vi de tudo e não apenas o que a propaganda nos quereria mostrar.

 

 

O meu amigo «Pepe» Damas Mora e eu frente à Biblioteca de Efesos

 

Mas também sei o que não vi: miséria, bairros de lata, pedintes, gandulos, florestas ardidas, campos abandonados ou graffitis. Nada disso vi e se o não vi pelos sítios que cruzei, é porque não há disso na Turquia.

 

O que mais me espantou foi a pujança da economia agrícola com os terrenos aproveitados até aos limites do razoável. Se ao longo de vales férteis, de aluvião, a estrada se desviava ligeiramente do sopé das montanhas periféricas, o terreno entre a estrada e as primeiras pedras da encosta estava sempre agricultado. Sem exagero, posso dizer que não vi um metro quadrado de terreno agrícola por cultivar.

Para um português atento a esse tipo de situações no seu próprio país, dá que pensar. E é claro como a água limpa que quando entramos numa cidade ao longo dessas estradas, pululam as empresas industriais e comerciais de apoio à actividade agrícola. Para quem não acredita no velho princípio de que a agricultura é a mãe dos outros Sectores económicos (indústria e serviços), vá de passeio à Anatólia e deixe-se de outras ideias, as peregrinas que nos atiraram para o actual buraco.

 

O resultado não espanta: a Turquia tem uma Balança Alimentar largamente superavitária, uma Balança Comercial positiva (tem que importar petróleo) e uma Balança de Transacções Correntes igualmente positiva pois, lembremo-nos, ainda há muitos turcos emigrados cujas remessas assumem uma grande importância. Tomando em conta uma política monetária algo contida, duas Liras Turcas valem um Euro. Ou seja, a Turquia é um país de moeda relativamente séria.

 

Outra coisa que me espantou: a raridade de lenços nas cabeças femininas.

 

Das estatísticas oficiais extraiu o nosso guia, o Senhor Ata, que a população turca ronda actualmente os 75 milhões de pessoas, das quais cerca de 25 milhões são da etnia curda. Cerca de 6,5 milhões (8,7% da população total) vão semanalmente à mesquita e 2,5 milhões (3,3%) fazem-no diariamente. O Ramadão é, contudo, seguido pela generalidade da população que não come nem bebe enquanto o Sol se encontra acima do horizonte. Fora disso, bebem álcool como qualquer europeu e o vinho tinto tem mesmo uma qualidade aceitável. Mas o Senhor Ata, culto e totalmente ocidentalizado, ao ser perguntado por alguém lá nos bancos traseiros da camioneta, não sabia como se decide a data de início do Ramadão. Respondeu que, sendo lunar o calendário árabe e solar o turco, há sempre alguns dias de diferença entre o início do Ramadão no mundo árabe e na Turquia. Segredei-lhe o critério de determinação da data de início para que investigasse da veracidade e usasse futuramente se assim lhe aprouvesse: quando dois clérigos em Meca confirmam que viram a Lua Nova.

 

Não há dúvida, a Fé tem muita força!

 

Quando estávamos à espera que o fim-de-semana turco fosse à 6ª feira como nos outros países maioritariamente muçulmanos, ficámos a saber que desde a implantação da República em 1923, os turcos descansam ao Sábado e ao Domingo.

 

Apesar da relativamente fraca influência da religião muçulmana na população, a paisagem exibe a presença de mesquitas em todas as aldeias, vilas e cidades. Curiosidade: os minaretes são todos iguais (apenas varia a decoração exterior) pelo que admito serem produzidos em série. Perguntei – mas não obtive resposta – se não seria pela justaposição de grandes manilhas em cimento. O remate superior, em bico, é também modelo único.

 

Mas a cena política turca está especialmente activa com o Partido no Governo a promover a islamização e com o Partido herdeiro de Atatürk (laicizante) na oposição. Os ocidentalizados (muçulmanos, de outras confissões ou agnósticos) estão nervosos com aquilo que consideram a demagogia do actual primeiro-ministro e depositam uma confiança final no Exército. Reconheçamos que na perspectiva democrática, há outros horizontes mais límpidos...

 

Lisboa, Maio de 2011

 

Henrique Salles da Fonseca

ANATÓLIA – 2

 

 

Na Turquia, nós somos a paz telúrica!

 

Se o não fossemos, a terra não esperaria que puséssemos as rodas no ar de regresso a Portugal para tremer na Anatólia donde acabávamos de sair. Rezam as novas que o tremor foi benigno para as gentes, o que muito me reconfortou.

 

Nesta minha segunda visita à Turquia só não me foi dado diploma comprovando a frequência de um curso intensíssimo de História. E foi ao longo desse curso que testemunhei a violência dos terramotos que abalaram a Ásia Menor não deixando pedra sobre pedra e obrigando ao abandono de cidades inteiras. Foi o caso de Afrodisias, de Efeso, de Aspendos, de Simena e de tantas outras que ainda não regressaram aos mapas. Dizia o Padre Raphael Bluteau em 1712 que «hoje tudo são campos onde foi Tróia».

 

E se em Afrodisias as pedras apenas foram derrubadas mas não saíram do local, o mesmo não pode ser dito das demais em que a pilhagem assentou arraiais. Ironicamente, os maiores gatunos foram os arqueólogos que ficaram na História como os grandes e ilustres descobridores dessas cidades. Bastaria referir a vergonha por que passou Tróia às mãos alemãs de Heinrich Schliemann que na década de 1870 escavou a área transferindo para o Museu de Berlim a joalharia encontrada. E o nosso guia lá ia referindo os museus estrangeiros onde se encontram algumas das pedras (estátuas, frisos, etc.) que nos locais em que deveriam ter sido reerguidas foram substituídas por materiais modernos. Todos podemos assim testemunhar que os novos arqueólogos não andam por ali a enganar ninguém. E os actuais «escavadores» tanto são turcos como estrangeiros. Mas não são gatunos.

 

Tetrapylon, Afrodisias

 

Os campos de férias para intensificação das escavações decorrem normalmente no período do Verão mas nestes dias de Maio vi em Afrodisias a Universidade de Nova Iorque mantendo a actividade de remontagem dos elementos estruturais de diversos edifícios. A estatuária fica entretanto exposta no museu do próprio campus arqueológico aguardando pelo regresso à origem quando a reconstrução estiver concluída e a segurança do edifício assegurada. Basta comparar as fotografias do livro (1ª edição de 1989 à venda no museu) com o que observei para notar uma quantidade preciosa de trabalho no terreno. É claro que «a procissão ainda vai no adro».

 

E o mesmo se diga de Efeso em que a liderança dos trabalhos no terreno está a cargo duma Universidade alemã muito importante mas cujo nome me passou: escavações no Verão; remontagens e pormenores ao longo do ano. Lá estava um artista a fazer qualquer coisa no lintel da porta principal do prostíbulo, lá estavam gruas a erguer pedregulhos e lá estávamos nós, a multidão de turistas, a pagar o bilhete de ingresso para financiar todo o processo.

 

E que multidão era esta? Heterogénea, claro. Mas S. Paulo esteve em Efeso e foi aos efésios que dirigiu uma epístola solene. Foi na cena do enorme teatro que falou aos milhares que o escutaram e foi na prisão da cidade que aguardou pelo salvo-conduto que lhe restituísse a liberdade e lhe permitisse cumprir a sentença de expulsão. Sim, Efeso é hoje importante local de peregrinação cristã e bastou verificar a solenidade de muitos visitantes para percebermos que nem todos andavam ali de ânimo leve.

 

(*)

Teatro de Efeso onde S. Paulo pregou a nova Fé

 

 

Mas foi em Mira que testemunhei a Fé ortodoxa russa junto do túmulo de S. Nicolau: camionetas e camionetas de turistas russos empunhando uma pequena imagem vendida localmente que solenemente colocavam junto do túmulo do Santo enquanto – imagino eu – faziam alguma oração. Pode não ser a nossa mas é sempre com o maior respeito e emoção que observo as manifestações de Fé. Sim, eu sou dos que pensam que a Fé não se discute. E cumpro!

 

(**)

 Afinal, o «Pai Natal» era turco e foi bispo de Mira

 

Todos foram os dias em que regressámos aos hotéis de pernoita completamente estafados mas satisfeitos na perspectiva cultural. Mesmo assim, ainda conseguimos ter um dia para nadar sobre Simena, a cidade submersa na sequência de enorme cataclismo.

 

Como poderiam Conimbriga, Miróbriga e Balsa constituir instrumentos do desenvolvimento por que todos ansiamos? É claro que deve dar muito mais votos a distribuição de subsídios às companhias de teatro mesmo que estas nada interessem ao público...

 

Lisboa, Maio de 2011

 

Henrique Salles da Fonseca

 

(*)http://www.google.pt/imgres?imgurl=https://1.bp.blogspot.com/_7-f0UlTmT6A/S7zU7IUh8OI/AAAAAAAAATM/CtMvVvJmQ80/s1600/ephesus_theater.jpg&imgrefurl=http://phronemata.blogspot.com/2010/04/efeso-um-estudo-historico-cultural-e_11.html&usg=__Me2qNlumsrlIL0s1jfJt1BWQuNw=&h=450&w=600&sz=75&hl=pt-PT&start=0&zoom=1&tbnid=EdmGKUgEJ6D5VM:&tbnh=124&tbnw=154&ei=bs_YTdL3JdGDhQfV9-m_Bg&prev=/search%3Fq%3Dteatro%252BEfeso%26um%3D1%26hl%3Dpt-PT%26sa%3DN%26biw%3D1007%26bih%3D681%26tbm%3Disch&um=1&itbs=1&iact=rc&dur=0&sqi=2&page=1&ndsp=20&ved=1t:429,r:6,s:0&tx=76&ty=76

 

(**)http://www.google.pt/imgres?imgurl=https://1.bp.blogspot.com/_PcUOJHJ3New/R3FKejn271I/AAAAAAAAD9A/zh7s4oTSl2U/s400/church-of-st-nicholas-postcard.jpg&imgrefurl=http://cronicasdaanatolia.blogspot.com/2007/12/o-pai-natal-nasceu-e-viveu-na-turquia.html&usg=__bC6adcVyMti6_jq10TmnJ8rlGlY=&h=242&w=350&sz=25&hl=pt-PT&start=0&zoom=1&tbnid=b5dPOX0xPW5h8M:&tbnh=120&tbnw=160&ei=WtHYTev6Ho2WhQf65I3LBg&prev=/search%3Fq%3Dchurch%252BS.%252BNicolau%252BMira%26um%3D1%26hl%3Dpt-PT%26sa%3DG%26biw%3D1007%26bih%3D681%26tbm%3Disch&um=1&itbs=1&iact=rc&dur=219&sqi=2&page=1&ndsp=24&ved=1t:429,r:0,s:0&tx=95&ty=80

ANATÓLIA – 1

 

 

Bem me lembrei de Timor Lorosae quando Ata, o nosso competente guia turco, nos disse que Anatólia significa «o brilho do Sol no leste». Pela Wikipédia fiquei a saber que: O nome deriva do grego Aνατολή (Anatolē) ou Aνατολία (Anatolía), que significa "brilho do sol" ou "leste"; a forma turca Anadolu deriva da versão grega original e é frequentemente associada com ana ("mãe") por etimologia popular.

 

Saídos de Lisboa, fizemos um voo de quase 5 horas e ao aterrarmos em Antália deparei com uma aerogare que me deixou «bouche bée». Passada a manga que nos traz do avião, entramos num recinto (de grande, não lhe posso chamar sala nem sequer salão) com um lago central e com esculturas clássicas a toda a volta como se estivéssemos a entrar num museu cuja missão fosse a de nos embasbacar.

Pese embora alguma da minha militância anti-adjectivante, nada de mais apropriado me ocorre do que «lindo». Podia também invocar outras classificações tais como «grandioso», «fantástico», etc., mas volto à primeira forma: lindo! Tudo sobre chão de mármore que devia ter sido acabado de limpar.

 

Alexandre, o grande, espera pelos turistas

(cópia do original que se encontra no Museu)

 

 

Cumpridas as formalidades policiais e aduaneiras (sabiamente, a Turquia não é membro da UE), foram os vários grupos de turistas constituídos e lá seguimos em autocarros tão bons como os nossos a caminho do hotel.

 

O plural que usei até aqui não é majestático mas sim correspondente a um grupo de um pouco mais de 200 turistas portugueses que se sentiu atraído por um programa que me chegou pela Bertrand mas que a outros terá chegado pelo Círculo de Leitores ou pelo Automóvel Clube de Portugal. Nenhuma destas instituições me paga para eu aqui lhes fazer publicidade (o que logicamente eu recusaria pois o SAPO não o permite) mas na verdade há que as referir como «pieds à terre» em Portugal de uma qualquer instituição governamental turca que suporta os custos da nossa hospedagem em hotéis de 4 e 5 estrelas. Nós, os turistas, só pagamos a viagem de avião e as excursões locais.

 

Até ao momento em que escrevo estas linhas ainda não percebi exactamente qual o interesse do Governo Turco em nos proporcionar tanta mordomia mas do que não duvido é que nós, os turistas, saímos de tudo isto muito claramente beneficiados. Creio que todos os meus companheiros de viagem me acompanham em uníssono: venha mais disto!

 

Bem se vê que não somos Contribuintes turcos; se o fossemos, não sei se concordaríamos assim tão abertamente.

 

Com os ouvidos cheios da «crise» em que a demagogia pretérita nos meteu e de que a austeridade “strauss-kahniana” nos trata, a benigna recepção turca soou-nos como a melodia mãe de todas as harmonias.

 

(continua)

 

Lisboa, Maio de 2011

 

Henrique Salles da Fonseca Henrique Salles da Fonseca

ISTAMBUL – 5

 

 
Com a rendição no final na Grande Guerra, a ocupação aliada da Turquia foi uma realidade não apenas na perspectiva estritamente militar mas assumindo mesmo uma dimensão civil a ponto de, ao abrigo do Tratado de Sèvres (1920), o próprio Governo (civil) ter sido confiado às forças ocupantes.
 
Ao abrigo do referido Tratado foram estabelecidas zonas de influência dos vários aliados vitoriosos, determinou-se a independência da Arménia, o Curdistão adquiriu autonomia, internacionalizou-se a zona dos estreitos do Bósforo e de Dardanelos e a Grécia absorveu a Trácia e a zona envolvente de Esmirna.
 
Ficheiro:TreatyOfSevres (corrected).PNG
 
O cúmulo do vexame turco foi a entrega da região de Esmirna à Grécia assim despoletando uma onda de nacionalismo naturalmente liderada pelo militar turco que mais prestigiado saira da guerra, Mustafá Kemal Paxá.
 
A participação activa de Mustafá Kemal Paxá no Movimento Nacional Turco começou com a sua nomeação em Maio de 1919 para o cargo de Inspector-Geral encarregado de supervisionar a desmobilização das unidades militares otomanas e organizações nacionalistas. Constatando de imediato que a independência turca estava a ser posta em causa, não hesitou: desertou do Exército em 8 de Julho desse mesmo ano e passou à clandestinidade, o que lhe valeu a condenação à morte.
 
A mobilização dos nacionalistas foi imediata e os confrontos militares contra os gregos tiveram um sucesso constante até à vitória total em 1922 com a Grécia a devolver todos os territórios que lhe haviam sido entregues pelo Tratado de Sèvres.De notar que nesta guerra, para além dos gregos, os arménios e os franceses também foram derrotados pelos turcos.
 
Reposto o poder político genuinamente turco, Mustafá Kemal Paxá e os que o acompanharam na luta pela restauração nacional decidiram abolir o Sultanato, proclamaram a República da Turquia e negociaram o Tratado de Lausanne ao abrigo do qual o novo regime turco foi internacionalmente reconhecido. Assim foi formalmente abolido o Tratado de Sèvres.
 
Foi então que a Mustafá Kemal Paxá passaram a chamar Atatürk, o Pai dos Turcos.
 
O processo de laicização e ocidentalização da Turquia começou imparavelmente assumindo grande relevância psicológica a proibição do fez (barrete otomano) que foi substituído pelo chapéu mole tipicamente europeu, foi proibida a poligamia, convocadas eleições gerais e constituído um Parlamento que votou uma Constituição ao abrigo da qual o Islão foi removido como religião do Estado, Constantinopla passou a chamar-se Istambul, as mulheres obtiveram o direito de voto e a capital foi transferida para Ankara.
 
 Laicização e ocidentalização, palavras de ordem da República da Turquia
 
Foi a partir de então que Istambul passou a valer pelos seus méritos próprios e não mais pela força política que durante séculos os Senhores do Mundo nela exerceram.
 
Eis como chega ao fim a minha história sobre o nome de um rapazinho que se chamava apenas Mustafá e que todos os companheiros foram abandonando até que morreu isolado no Poder que edificou. O seu nome era então Mustafá Kemal (perfeição) Paxá (comandante) Atatürk (pai dos turcos).
 
Passados 72 anos da sua morte, o meu guia, o professor universitário[1] Dinç Tümerkan, referiu-se-lhe como um grande e venerado ditador que impôs a modernidade onde imperava o obscurantismo. Mas ele próprio admite que os Imãs, Ayatollahs e outros clérigos muçulmanos pensem de modo diverso…
 
Lisboa, Janeiro de 2010
 
 Henrique Salles da Fonseca

 
 
BIBLIOGRAFIA:
 
Wikipédia


[1] - Professor de História de Bisâncio no curso de Guias Turísticos numa das muitas Universidades privadas de Istambul

ISTAMBUL – 4

 

 
 
Fundador da Turquia moderna, Mustafá Kemal Paxá, Atatürk, nasceu em Selánik (Salónica, actualmente na Grécia) em data incerta na Primavera de 1881. De seu nome simplesmente Mustafá, foi o professor de matemática que lhe pôs Kemal como segundo nome (que significa "perfeição" ou "maturidade" em reconhecimento da sua excelência académica) e que ele adoptou como definitivo.
 
Logo na juventude optou pela carreira militar concluindo a formação em 1905 na Academia de Guerra, em Istambul, sendo de seguida enviado para Damasco (capital da actual Síria) como Tenente. Insatisfeito com o estilo de vida otomano, juntou-se a outros oficiais reformistas numa sociedade secreta intitulada “Pátria-Mãe e Liberdade”. Em 1907, já Capitão, foi transferido para Manastir (na actual República da Macedónia) onde aderiu ao “Comité para a União e o Progresso” cujos membros eram conhecidos como os «Jovens Turcos». Foram estes que em 1908 se revoltaram e tomaram o poder derrubando o Sultão Abdülhamid II. Mas o Império Otomano manteve-se apenas mudando a liderança do Sultão derrubado para o seu irmão Mehmet V que recebeu o poder das mãos dos revoltosos em 27 de Abril de 1909[1].
 
Em 1910 Mustafá Kemal participou em manobras militares que se realizaram em França e – muito influenciado por Pierre Loti – optou pela sua própria europeização; em 1911 foi enviado para a província otomana de Trablusgarp (actual Líbia) a fim de fazer frente à invasão italiana; em 1912 foi transferido para a frente búlgara; em 1914, como Adido Militar em Sofia, foi promovido a Tenente-coronel.
 
 
Esplanada do Café Pierre Loti em Istambul
 
Na Grande Guerra o Império Otomano alinhou com a Alemanha contra os Aliados e perdeu; os «Jovens Turcos» que efectivamente governavam – Cemal, Enver e Talat – fugiram num submarino alemão e o Império ficou à deriva. Mas entretanto, Mustafá Kemal foi o primeiro e único comandante militar de origem otomana que desde a época das Cruzadas derrotou (em Galipoli) um exército ocidental; tornou-se herói nacional e recebeu o título de Paxá ("Comandante"). Eis como o pequeno Mustafá viu o seu nome crescer para Mustafá Kemal Paxá.
 
 
Estátua de Mustafa Kemal sobre o campo de batalha de Galípoli, onde adquiriu reputação como comandante militar
 
Ainda durante a Grande Guerra, em 1917, foi comandar o 2º Exército no Cáucaso frente a uma ofensiva russa que pusera em perigo interesses estratégicos otomanos. Reconquistou essas posições mas qual não foi o seu espanto quando os Exércitos do Czar debandaram sem lhe darem grande luta – dera-se a revolução bolchevique. Tratou-se duma vitória real mas que Mustafá Kemal Paxá não levou a sério.
 
O Armistício encontrou-o na Campanha do Sinai e da Palestina no comando do 7º Exército face às forças do General britânico Allenby que acabara de derrotar o alemão von Sanders. A posição que defendeu tornou-se a linha de base para o Armistício de Mudros. A sua última missão para o Exército Otomano foi organizar a retirada das tropas que haviam sido deixadas ao sul desta linha.
 
Mustafá Kemal Paxá tornou-se um dos líderes do Partido Nacionalista Turco que tinha como objectivo a defesa dos territórios de língua turca nas zonas continentais do Império concordando com a retirada de todos os territórios onde a língua predominante não fosse o turco. No fim da guerra tinha 37 anos de idade e em Novembro de 1918 regressou a uma Istambul ocupada.
 
Em conformidade com os acordos de partilha do Império Otomano, as forças britânicas, italianas, francesas e gregas ocuparam a Anatólia mas foi a ocupação de Istambul, juntamente com a de Esmirna, que mobilizou o Movimento Nacional Turco e deu origem à Guerra de Independência Turca. Estava-se em 1919.
 
(continua)
 
Janeiro de 2010
 
 Henrique Salles da Fonseca
 
 
 
BIBLIOGRAFIA:
  • Wikipedia (Kemal Atatürk)
 


[1] - Governou até 1918, no final da Grande Guerra

ISTAMBUL – 3

 

 Hagia Sophia Outside View
Hagia Sofia - Sagrada Sabedoria
 
Quando terá sido que o homem descobriu Deus? Eis uma questão de resposta difícil se não mesmo impossível.
 
E quando foi que o primeiro sacerdote se constituiu arauto da palavra divina? Eis outra questão de resposta tão difícil como a anterior.
 
E quando foi que a classe sacerdotal tomou consciência de que podia controlar a sociedade a quem se dirigia? E quando foi que as religiões optaram pelo Deus castigador e vingativo ou pelo Deus infinitamente bom e do perdão?
 
E as perguntas poderiam continuar numa sucessão quase infinita não faltando respostas titubeantes ou mais acertadas …
 
Sim, foi dentro desta temática que Istambul viveu desde os tempos da sua fundação. Começando com o eventual animismo que reinasse naquelas paragens a ser substituído pelo politeísmo grego, com este a ser substituído pelo equivalente romano, com o cristianismo a impor-se como religião imperial, com este a dividir-se entre o romano e o ortodoxo, com ambos a alternarem na História e finalmente com a conquista muçulmana.
 
Istambul, a cidade a que os Deuses chamaram casa…
 
Não! Na realidade, Istambul foi durante séculos a arena em que se digladiaram as teocracias numa disputa de vida ou de morte para imposição do respectivo «teo business».
 Hagia Sophia
Interior de Hagia Sofia - construida em 537 por Justiniano como igreja, serviu nessa função durante 916 anos até que em 1453 foi transformada em mesquita e em 1935 passou à actual função de museu
 
Mas a bem da verdade, diga-se que nunca ali prevaleceu qualquer verdadeira hierocracia na certeza, porém, de que vontade não terá faltado às diferentes classes sacerdotais que a disputaram. Sempre estas tiveram que se juntar ao Poder e este sempre se foi apoiando nas religiões como modo de conter as gentes pela imposição de sucessivos códigos de conduta e pela ameaça da ira divina sempre mais temida que a temporal.
 
Eis como por ali sempre funcionou uma grande interdependência entre o Tempo e o Templo.
 
Até que na cadeira do Poder se sentou um antigo «jovem turco»: Mustafá Kemal Pachá, o que ficou na História conhecido por Atatürk, o Pai dos Turcos.
 
(continua)
 
Lisboa, Janeiro de 2010
 
Henrique Salles da Fonseca

ISTAMBUL – 2

 

 
No século III a. C. houve uma grande migração de gauleses para oriente. Percorreram a Europa, atravessaram a Grécia e chegaram à Ásia Menor em cuja zona central, a Capadócia, assentaram assim formando uma região que se passou a chamar Galácia. Os seus habitantes passaram a chamar-se gálatas (do grego Galátai, ou seja, gauleses) e erigiram como capital uma cidade a que chamaram Ancyra, a mesma a que hoje chamamos Ancara.
 
Algures na História, um grupo relativamente numeroso de gálatas abandonou a Ásia Menor e estabeleceu-se na margem europeia do Bósforo. Mais concretamente, no promontório que inicia a margem norte do Corno de Oiro. Ponto estratégico para o comércio, clima relativamente ameno, comunicações fáceis, enfim, o verdadeiro centro do mundo de então.
 
Integrados no Império Bizantino, ali fizeram a sua vida até que se iniciaram as Cruzadas e por volta de 1100 da nossa era tudo se complicou. De facto, o Imperador Aleixo I Comneno pediu aos genoveses que o apoiassem com uma frota naval na luta contra os muçulmanos mas os «italianos» só acederam ao pedido mediante a outorga duma área na qual se pudessem estabelecer perenemente. Os gálatas não foram expulsos do seu promontório mas o Imperador obrigou-os à convivência com os genoveses que ali passaram a mandar.
 

A torre, chamada inicialmente Christea Turris, foi construida em 1348 como parte da expansão da colónia genovesa de Constantinopla. Tratava-se da construção mais alta das fortificações que rodeavam a cidadela. A torre actual não é a mesma que a antiga, originariamente bizantina, chamada Megalos Pyrgos e que controlava o extremo norte do mar para a entrada do Corno de Ouro. Encontrava-se noutro local mas foi destruída durante a Quarta Cruzada, em 1204.

 
 
Eis por que aquela zona de Istambul se chama Gálata e seja igualmente conhecida como «bairro italiano». O predomínio cristão católico romano passou a prevalecer sobre o cristianismo ortodoxo e ainda hoje é ali que se mantêm as igrejas católicas abertas ao culto.
St. Antoine Church
Igreja de Stº António
 
A título de mera curiosidade, refira-se que em turco palácio se diz «saray» e que terá sido num palácio deste bairro que nasceu o famoso Galatasaray tão conhecido dos futebolistas e seus adeptos. Nunca me passaria pela cabeça referir esta simples curiosidade se na Turquia o futebol não tivesse a importância que efectivamente tem. Lá, como cá, o clubismo é motivo de paixões e antagonismos; lá, como cá, o futebol serve os políticos às mil maravilhas para distrair o povo das misérias deste mundo.
 
 Beyoglu
Avenida Istiklal,
o centro cosmopolita
 
(continua)
 
Lisboa, Janeiro de 2010
 
Henrique Salles da Fonseca
 

 

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