Era uma espécie de jesuíta republicano e de cogumelo liberal de natureza duvidosa, como medram tantos [deputados] sobre a estrumeira popular do sufrágio universal.
Guy de Maupassant
in «Bel-Ami», Abril Controljornal, Edipress, Agosto de 2000, pág. 191 e seg
Nicolas Boileau-Despréaux (Paris, 1636 — Paris, 1711) jurista, crítico e poeta francês. Publicou o seu primeiro volume de sátiras em 1666. Foi apresentado na corte em 1669 após a publicação de seu Discurso sobre a sátira.
Desde cedo aprendeu a não ter qualquer ilusão e cresceu com "o desprezo pelos livros estúpidos". Foi educado no Colégio de Beauvais e continuou os seus estudos de Teologia na Sorbonne. Mudou de curso, para Direito. Seguiu-se breve carreira como advogado. O pai morreu em 1657 deixando-lhe uma pequena fortuna, de forma que se pôde dedicar às letras.
PAROLES DU POÈTE À SON JARDINIER, ANTOINE
Antoine, de nous deux, tu crois donc, je le vois,
Que le plus occupé dans ce jardin, c’est toi.
Oh! Que tu changerais d’avis et de langage,
Si, deux jours seulement, libre du jardinage,
Tout à coup devenu poète et bel esprit,
Tu t’allais engager à polir un écrit
Qui dît, sans s’avilir, les plus petites choses,
Fît des plus secs chardons des oeillets et des roses…
* * *
Sim, eu também não duvido de que os trabalhos braçal e intelectual produzem cansaços bem diferentes.
Henrique Salles da Fonseca
BIBLIOGRAFIA
Wikipédia
«Anthologie de la poésie française», Annie Collognat-Barès, LE LIVRE DE POCHE, Libretti, 1ª edição, Setembro de 1998
O narrador, um antigo advogado que dirige um confortável escritório onde ajuda homens ricos a lidar com hipotecas e títulos de propriedade, relata a história do homem mais estranho que ele já conhecera.
O narrador possui dois escrivães, Nippers e Turkey. Nippers sofre de indigestão crónica e Turkey é um bêbado, mas o escritório sobrevive porque pela manhã Turkey está sempre sóbrio apesar de Nippers estar irritado, na parte da tarde Nippers acalma-se e Turkey fica bêbado. Há também o office boy Ginger Nut, que possuía este nome devido aos biscoitos (um tipo de cookie aromatizado com gengibre) que regularmente servia ao patrão. Turkey (peru), Nippers (alicate) e Ginger (gengibre) eram os apelidos daquela gente.
O narrador publica um anúncio procurando um novo escrivão. É quando Bartleby aparece disposto a assumir o cargo. O velho homem, aparentemente desesperado, contrata o jovem esperando que a sua calma influencie os outros escrivães. Inicialmente, Bartleby revela-se eficiente e interessado realizando uma quantidade extraordinária de trabalho como se estivesse «faminto» por algo para ler e escrever e até parecia querer devorar os documentos que lhe eram entregues.
Certo dia, quando o narrador pediu a Bartleby para rever um documento, o jovem simplesmente respondeu: "Eu preferiria não o fazer". Foi a primeira de inúmeras recusas de Bartleby. Para consternação do narrador e irritação dos outros escrivães, Bartleby executava cada vez menos as tarefas no escritório. O narrador tentou por diversas vezes entender Bartleby e aprender sobre ele, mas o jovem repetiu sempre a mesma frase quando era requisitado a fazer as suas tarefas ou dar informações a respeito delas: "Eu preferiria não o fazer". Num fim de semana, quando o narrador passou pelo escritório, descobriu que Bartleby morava no próprio escritório. A vida de solidão de Bartleby comoveu o narrador: à noite e aos Domingos, Wall Street é tão desoladora como uma cidade fantasma. E ficou ora com pena, ora com raiva pelo comportamento bizarro de Bartleby.
Entretanto, Bartleby continuava a recusar os trabalhos que tinha para fazer, respondendo sempre com um "Eu preferiria não o fazer". Assim continua até chegar ao ponto em que Bartleby não faz absolutamente nada. Mesmo assim, o narrador não despede o jovem. O relutante escrivão tem um estranho domínio sobre o patrão que sente que não pode fazer nada para prejudicar o desesperado empregado. A urgência aumenta quando os sócios do narrador perguntam sobre a continuação de Bartleby no escritório ao repararem que o jovem não faz nada.
Prevendo que a sua reputação possa ser arruinada, o narrador vê-se obrigado a agir. As tentativas de despedir Bartleby, no entanto, são ineficazes. Então o narrador muda o escritório para uma nova morada, pensando que assim se livraria de Bartleby. Embora isso funcione para o narrador, pois Bartleby não os segue, os novos inquilinos do antigo escritório pedem ajuda ao narrador, pois Bartleby não quer sair do velho escritório. Embora os novos inquilinos tivessem expulsado Bartleby, ele simplesmente voltava pelo saguão. O narrador vai até Bartleby numa última tentativa de se entender com ele mas Bartleby rejeita o contacto.
O narrador decide então ausentar-se durante alguns dias, com medo de se envolver na nova campanha dos inquilinos para evitar Bartleby. Quando regressa, vê que Bartleby foi preso por se recusar a sair do velho escritório. Na prisão, Bartleby parece ainda mais melancólico que antes e recusa a amizade do narrador. Contudo, o antigo patrão suborna o guarda que cuida de Bartleby para garantir que o jovem seja bem alimentado; após alguns dias regressa à prisão e descobre que Bartleby morreu - ele "preferiria não" comer e morreu de fome.
Algum tempo depois, o narrador ouve um rumor que desfaz o discernimento da vida de Bartleby. O jovem trabalhava no Dead Letter Office (o departamento dos Correios em que se arquivam as cartas que não se conseguiu fazer chegar ao destino), mas perdeu o emprego. O narrador percebe finalmente que as «cartas mortas» teriam posto qualquer um com o temperamento de Bartleby afundando-se em grande melancolia. Aquelas cartas são emblemas da nossa mortalidade e da falha das nossas boas intenções. Através de Bartleby o narrador passou a olhar o mundo como os miseráveis escrivães o vêem. As últimas palavras da história são do narrador: "Oh Bartleby! Oh Humanidade!"
A bem dizer, este texto deveria ser «RELIDO COM INTERESSE» pois na minha juventude já lera uma tradução francesa de que não gostei. E se naquela época não percebi por que é que não gostei, hoje percebi perfeitamente: apenas porque não tinha maturidade para perceber. Portanto, não gostei e atirei todas as culpas para cima da tradução. Injustiça óbvia.
A história é sobejamente conhecida mas dá para referir que se passa no Sul do México na primeira metade do séc. XX quando o regime político se azedou pelas mãos de uns quantos jacobinos e perseguiu ferozmente a Igreja, nomeadamente fuzilando os Padres que não renunciassem ao celibato, às celebrações e às confissões. O personagem central é Padre, decide não renunciar e foge durante uns quantos anos até que…
E agora não conto mais para não estragar a leitura de quem ainda não tenha lido a obra numa qualquer língua.
Mas respigo passagens que chamaram a minha atenção.
«Na infância há sempre um momento em que se abre uma porta para deixar entrar o futuro.» (pág. 22)
«Sob a sua mirada séria transformava-se (…) num fantasma que quase podia ser soprado para longe (…) nessa idade não temos medo de muitas coisas, da velhice e da morte, nem de tudo o resto que poderá acontecer, das mordidelas das serpentes, das febres, dos ratos e dos maus cheiros.» (pág. 45 e seg.)
«(…) o argumento do perigo só se aplica àqueles que vivem numa segurança relativa» (pág. 106), não a quem vive numa insegurança total e permanente.
«O sentido da inocência que acompanha o pecado é espantoso e só os homens duros e corajosos – e os santos – estão livres dele.» (pág. 192)
«Para que servia a confissão quando se amava o resultado do crime?». (pág. 196)
* * *
E por aqui me fico.
Quer saber mais? Leia o livro. Custou apenas uma mexeriquice.
Sobre esta obra já terá havido recensões mais do que suficientes para que eu possa agora referir alguma perspectiva que tivesse passado despercebida à multidão de eruditos que a leram antes de mim. E lendo-a na tradução, muito provavelmente me poderá escapar a pureza do estilo literário do Autor, Stendhal.
Perguntar-se-á então o meu leitor, por que razão venho aqui tratar de algo sobre que já tudo foi dito e cujo estilo original pode não estar preservado.
Muito bem, venho apenas ler a tradução e quase dispensaria o original de cujo enredo me permitiria prescindir se ele não fosse fundamental para o que me interessa que, como já disse, é o trabalho dos tradutores.
Então, foi assim: João Gaspar Simões disse ao meu tio António José Branquinho da Fonseca que não gostara nada da tradução que por aí andava e que seria bom tratar de arranjar nova versão portuguesa que não achincalhasse Stendhal. Se ele, o meu tio, sabia de quem pudesse deitar mãos a uma nova tradução. Era óbvia a «cunha» que Gaspar Simões estava a meter ao meu tio para ser ele a fazer o trabalho. Mas, entre gerir as Bibliotecas Itinerantes da Gulbenkian e escrever obra nova, o meu tio tinha muito mais que fazer e ficou de pensar em alguém que pudesse fazer o trabalho. E, sim, lembrou-se. Lembrou-se da mulher dele, a minha tia Maria Manuel.
Eis como se chegou a um compromisso de a obra ser traduzida (claro que a partir do original e não da má tradução anterior), por ela, a minha tia, com a supervisão do meu tio. A função de cada um ficando previamente definida cabendo a Maria Manuel o grosso do trabalho e a ele a garantia da maior fidelidade ao estilo de Stendhal.
Eis por que na ficha técnica vem referido que a tradução é de Maria Manuel e Branquinho da Fonseca.
E eu, que já sabia disto tudo há mais de 50 anos, nunca lera o livro quer em francês (em casa dos meus pais havia um exemplar em francês que desapareceu na voragem das mudanças póstumas) quer nesta tradução. A outra, a chamada má por Gaspar Simões, nem sei qual era. Até que há dias deparei com esta edição relativamente recente numa prateleira da biblioteca da casa que tomo de renda numa praia próxima de Lisboa.
Suspendi as leituras que trazia e dediquei-me a esta com o à-vontade que me dá a certeza de uma obra notável traduzida por quem não trabalhava ao cronómetro e sabia ser fiel ao estilo do Autor traduzido.
E só para dar um cheirinho do que tenho estado a ler entre dois mergulhos nas salsas atlânticas, passo a transcrever pequenos trechos que chamaram a minha atenção. São só três citações e não maço mais.
«Para se obter a consideração pública em Verrières é preciso não adoptar (…) qualquer plano trazido de Itália (…). Tal inovação acarretaria sobre o imprudente a eterna reputação de má cabeça, ficando perdido para sempre no conceito das pessoas sensatas e moderadas que distribuem a consideração no Franco Condado. Com efeito, essas pessoas exercem ali o mais aborrecido dos despotismos; e por causa desta feia palavra é que a vida nas cidades pequenas se torna insuportável para quem viveu na grande república que se chama Paris. A tirania da opinião – e que opinião! – é tão estúpida nas pequenas cidades de França como nos Estados Unidos da América.» (pág. 8)
Fala o Presidente da Câmara de Verrières à «esposa»:
«- Eu falo, Senhora, como o falecido Senhor Príncipe de Condé, apresentando os camaristas à sua nova esposa: Todos estes homens, disse ele, são nossos criados. (…) Todos os que não são fidalgos e vivem em nossa casa recebendo um salário, são nossos criados.» (pág. 46)
«Desde a queda de Napoleão, todas as aparências de galanteria foram severamente banidas dos costumes da província. Receia-se ser-se demitido. Os patifes procuram apoio na congregação; a hipocrisia fez os maiores progressos, mesmo nas classes liberais. O tédio aumenta. Os únicos prazeres que restam são a leitura e a agricultura.» (pág. 50)
E muito mais haveria a referir mas o meu leitor tem muito mais que fazer como o meu tio também tinha quando Gaspar Simões lhe «encomendou um sermão» que ele não queria proferir.
Francisco, o Papa a que me refiro; José Tolentino Mendonça, o Padre a quem o Papa agradece a orientação espiritual durante o retiro quaresmal de 2018 que toda a Cúria Romana e o próprio Papa realizaram; «ELOGIO DA SEDE», o livro de cuja pág. 166 retiro a frase que chamou a minha atenção.
“(…) Como dizia a madre superiora [da congregação] às suas irmãs, «Somos homens, pecadores, todos»”.
Ainda havia uma estátua de Lenine em cada povoação russa. A de Arcangel representava o Dirigente, com quinze metros de altura, a sair de um bloco de granito, de rosto determinado, sobretudo a esvoaçar, um rolo de papéis na mão estendida. Parecia estar a chamar um táxi.
In «ARCANGEL», Robert Harris, Livros Condensados das Selecções do Reader’s Digest, Dezembro de 1999, pág. 380
NOTA: Imagem da estátua de Arcangel não disponível na Internet; a imagem apresentada é a de São Petersburgo
SANÇÃO SECRETA –Brian Haig – Livros condensados, Selecções do Reader’s Digest, Fevereiro de 2003
Os representantes do Ministério Público são os enteados mimados da lei. Têm sempre a possibilidade de escolher que casos é que vão levar a julgamento. Se os factos não lhes são favoráveis ou se detectam alguma infracção aos direitos do acusado, passam ao lado. Os advogados de defesa, pelo contrário, são os eternamente prejudicados. São nomeados apenas despois de um magistrado do Ministério Público ter concluído que existem pelo menos noventa e nove por cento de hipóteses de condenação. Há uma imensidão destes magistrados que ganham constantemente as suas causas enquanto, por outro lado, se contam pelos dedos de uma mão os advogados de defesa que conseguem ganhar metade das respectivas causas.
(pág. 328)
A Albânia é um pequeno país muito pobre, habitado por gente de roupas muito simples e onde os edifícios e monumentos, de inspiração estalinista, se encontram seriamente degradados.
Os albaneses são um povo muito aguerrido e muito determinado. Não se metem com os outros e esperam, em troca, que não se metam com eles. Sendo a história agitada dos Balcãs aquilo que se conhece, muitos albaneses acabaram por ir viver para outros locais, como a Macedónia e o Kosovo.
O Kosovo é assim como que uma Jerusalém dos sérvios, recheado de velhas igrejas ortodoxas e lugares de importância histórica e embora apenas uns dez por cento da gente que lá vive possam reclamar ter, quando muito, uma gota de sangue sérvio, o velho e egoísta Milosevic resolvera varrer de lá os albaneses matando-os ou obrigando-os a deslocarem-se para lá das montanhas, para as vizinhas Macedónia ou Albânia.
Nicolas Boileau-Despréaux (Paris, 1636 — Paris, 1711) jurista, crítico e poeta francês. Publicou o seu primeiro volume de sátiras em 1666. Foi apresentado na corte em 1669 após a publicação de seu Discurso sobre a sátira.
Desde cedo aprendeu a não ter qualquer ilusão e cresceu com "o desprezo pelos livros estúpidos". Foi educado no Colégio de Beauvais e continuou os seus estudos de Teologia na Sorbonne. Mudou de curso, para Direito. Seguiu-se breve carreira como advogado. O pai morreu em 1657 deixando-lhe uma pequena fortuna, de forma que se pôde dedicar às letras.
PAROLES DU POÈTE À SON JARDINIER, ANTOINE
Antoine, de nous deux, tu crois donc, je le vois,
Que le plus occupé dans ce jardin, c’est toi.
Oh! Que tu changerais d’avis et de langage,
Si, deux jours seulement, libre du jardinage,
Tout à coup devenu poète et bel esprit,
Tu t’allais engager à polir un écrit
Qui dît, sans s’avilir, les plus petites choses,
Fît des plus secs chardons des oeillets et des roses…
* * *
Sim, eu também não duvido que os trabalhos braçal e intelectual produzem cansaços bem diferentes.
Setembro de 2017
Henrique Salles da Fonseca
BIBLIOGRAFIA
Wikipédia
«Anthologie de la poésie française», Annie Collognat-Barès, LE LIVRE DE POCHE, Libretti, 1ª edição, Setembro de 1998