Precisa-se urgentemente de medidas drásticas que revertam o caótico quadro em que se encontra o sistema de Saúde do país. Há pouco mais de uma década que as coisas vão se agravando com tentativas pífias de melhorar a situação fechando os olhos para os mais graves problemas e focando a solução em situações que visam resoluções de cunho ideológico, que em nada resolvem as nossas abismais deficiências. Programa Mais Médicos, abertura de mais Escolas de Medicina sem infra-estrutura humana e física para formar profissionais competentes, inaugurações de postinhos de Pronto-atendimento, tudo em vão...porque não é essa a principal falha, a falta de uma boa gestão.
Medidas paliativas, ineficazes, administrações fraudulentas, feitas por gente perdida e incompetente que não sabe atacar os problemas, ceifam vidas diariamente.
O povo carente que depende do SUS morre à míngua nas portas e corredores dos hospitais por falta de atendimento e medicamento, por negligencia e irresponsabilidade das autoridades (in)competentes, é a morte anunciada, é a Mistanásia patrocinada pelo governo! Médicos e agentes de saúde não têm mais o que fazer para minorara as deficiências do sistema de saúde por isso cada vez mais abandonam o serviço público por falta de condições para atender os pacientes.
Acredito que toda sociedade se assenta, principalmente, na educação e cultura dos homens que a constituem. Por isso as diferenças no comportamento e na evolução dos povos. Leia esta carta que saiu nas redes sociais. Ela demonstra de maneira simples o que acabo de dizer.
Maria Eduarda Fagundes
Angolanos,
Assim como vários outros nórdicos e europeus no geral, eu também vim para cá pela primeira vez, para trabalhar. O que eu não poderia imaginar é que passaria 4 anos dentro das vossas fronteiras.
Aprenderia muito sobre a sua cultura, a sua língua, os seus costumes e que, no final do ano passado, eu me casaria com uma das suas moças.
Não é segredo para ninguém que vocês estão passando por alguns problemas. Existe uma crise política (adormecida mas latente), económica, problemas constantes em relação à segurança, uma enorme desigualdade social e agora o paradigma do Petróleo mudou, esse produto não vai ser mais tão caro, os países que o têm não vão ser mais ricos.
No passado, eu tinha muitas teorias sobre o sistema de governo, sobre o colonialismo, políticas económicas, etc. Mas recentemente eu cheguei a uma conclusão. Muita gente provavelmente vai achar essa minha conclusão meio ofensiva, mas depois de trocar várias ideias com alguns dos meus amigos, eles me encorajaram a dividir o que eu acho com todos os angolanos.
Então aí vai: é você.
Você é o problema.
Sim, você mesmo que está lendo esse texto. Você é parte do problema. Você não só é parte, como está perpetuando o problema todos os dias.
Não é só culpa do Zé Dú ou do M. Não é só culpa do preço do petróleo, do aumento do dólar ou da desvalorização do Kwanza.
O problema é a cultura. São as crenças e a mentalidade que fazem parte da fundação do país e são responsáveis pela forma com que os angolanos escolhem viver as suas vidas e construir uma sociedade.
O problema é tudo aquilo que você e todo mundo à sua volta decidiu aceitar como parte de “ser angolano” mesmo que isso não esteja certo.
Quer um exemplo?
Imagine que você está de boleia no carro de um amigo à noite. Vocês passam por uma rua escura e totalmente vazia. O papo está bom e ele não está prestando muita atenção quando, de repente, ele arranca o retrovisor de um carro super caro. Antes que alguém veja, ele acelera e vai embora.
No dia seguinte, você ouve um colega de trabalho que você mal conhece dizendo que deixou o carro estacionado na rua na noite anterior e ele amanheceu sem o retrovisor. Pela descrição, você descobre que é o mesmo carro que o seu brother bateu “sem querer”. O que você faz?
A) Fica quieto e finge que não sabe de nada para proteger o seu amigo?
ou
B) Diz-lhe que sente muito e força o seu amigo a assumir a responsabilidade pelo erro?
Eu acredito que a maioria dos angolanos escolheria a alternativa A. Eu também acredito que a maioria dos nórdicos escolheria a alternativa B.
Nos países mais desenvolvidos o senso de justiça e responsabilidade é mais importante do que qualquer indivíduo. Há uma consciência social onde o todo é mais importante do que o bem-estar de um só. E por ser um dos principais pilares de uma sociedade que funciona, ignorar isso é uma forma de egoísmo.
Eu percebo que vocês angolanos são solidários, se sacrificam e fazem de tudo por suas famílias e amigos mais próximos e, por isso, não se consideram egoístas.
Mas, infelizmente, eu também acredito que grande parte dos angolanos seja extremamente egoísta, já que priorizar a família e os amigos mais próximos em detrimento de outros membros da sociedade é uma forma de egoísmo.
Sabe todos aqueles políticos, empresários, polícias e professores corruptos? Você já parou para pensar por que eles são corruptos? Eu garanto que quase todos eles justificam as suas mentiras e falcatruas dizendo: “Eu faço isso pela minha família”. Eles querem dar uma vida melhor aos seus parentes, querem que os seus filhos estudem em escolas melhores e querem viver com mais segurança.
É curioso ver que quando um angolano prejudica outro cidadão para beneficiar as sua famílias, ele se acha altruísta. Ele não percebe que altruísmo é abrir mão dos próprios interesses para beneficiar um estranho se for para o bem da sociedade como um todo.
Além disso, o seu povo também é muito vaidoso. Eu fiquei surpreso quando descobri que dizer que alguém é vaidoso por aqui não é considerado um insulto como é nos nossos países. Esta é uma outra característica particular da vossa cultura.
Há tempos recebi a visita de familiares da Europa, desejosos de conhecer Angola, as praias do Mussulo e da Ilha do Cabo não são tão bonitas como imaginavam (viam nas fotos) e ainda por cima estavam sujas.
Quando contamos às pessoas sobre a nossa percepção, algumas delas imediatamente disseram: “Ah, pelo menos os seus familiares puderam ver e tirar algumas fotos de bikini e mostrar no FB aos que ficaram lá o quanto é gostoso o calor, né?”
Parece uma frase inocente, mas ela ilustra bem essa questão da vaidade: as pessoas por aqui estão muito mais preocupadas com as aparências do que com quem elas realmente são.
É claro que aqui não é o único lugar no mundo onde isso acontece, mas é muito mais comum do que em qualquer outro país onde eu já estive.
Isso explica porque os angolanos ricos não se importam em pagar três vezes mais por uma roupa de marca ou uma jóia do que deveriam, ou contratam empregadas e babás asiáticas. É uma forma de se sentirem especiais e parecerem mais ricos. É por isso que muita gente comum compra aquela TV gigante que não se adapta à sala, veste fato e gravata (escuro que atrai mais calor é melhor...) com temperaturas a mais de 30°c, em lugares e ocasiões que não precisam de formalidade. No fim das contas, esse é o motivo pelo qual um angolano que nasceu pobre e sem oportunidades está disposto a matar por causa de um telemóvel. Eles também querem parecer bem sucedidos, mesmo que não contribuam com a sociedade para merecer isso.
Muitos europeus acham os angolanos preguiçosos. Eu não concordo. Pelo contrário, os angolanos têm mais energia do que muita gente noutros lugares do mundo (vejam-se as festas que nunca mais acabam, almoço de fds que vai até depois das 0h).
O problema é que muitos focam grande parte da sua energia em vaidade em vez de produtividade. A sensação que se tem é que é mais importante parecer popular ou glamouroso do que fazer algo relevante que traga isso como consequência. É mais importante parecer bem sucedido do que ser bem sucedido de facto.
Vaidade não traz felicidade. Vaidade é uma versão “photoshopada” da felicidade. Parece legal vista de fora, mas não é real e definitivamente não dura muito.
Se você precisa pagar por algo muito mais caro do que deveria custar para se sentir especial, então você não é especial. Se você precisa da aprovação de outras pessoas para se sentir importante, então você não é importante. Se você precisa mentir, puxar o tapete ou trair alguém para se sentir bem sucedido, então você não é bem sucedido. Pode acreditar, os atalhos não funcionam aqui.
E sabe o que é pior? Essa vaidade faz com que seu povo evite bater de frente com os outros. Todo mundo quer ser legal com todo mundo e acaba ou ferrando o outro pelas costas, ou indirectamente só para não gerar confronto.
Para uma saída de lazer, se alguém está 1h atrasado, todo mundo fica esperando essa pessoa chegar para sair. Se alguém decide ir embora e não esperar, é mal visto. Se alguém na família é irresponsável e fica cheio de dívidas, é meio que esperado que outros membros da família com mais dinheiro ajudem a pessoa a se recuperar. Se alguém num grupo de amigos não quer fazer uma coisa específica, é esperado que todo mundo mude os planos para não deixar esse amigo chateado.
É sempre mais fácil não confrontar e ser bom camarada. Só que onde não existe confronto, não existe progresso.
Como nórdico que geralmente não liga sobre o que as pessoas pensam de mim, eu acho muito difícil não ver tudo isso como uma forma de desrespeito e auto-sabotagem. Em diversas circunstâncias eu acabo assistindo os angolanos recompensarem as “vítimas” e punirem aqueles que são independentes e bem resolvidos.
Por um lado, quando você recompensa uma pessoa que falhou ou está fazendo algo errado, você está dando a ela um incentivo para nunca precisar melhorar. Na verdade, você faz com que ela fique sempre contando com a boa vontade de alguém em vez de ensiná-la a ser responsável.
Por outro lado, quando você pune alguém por ser bem resolvido, você desencoraja pessoas talentosas que poderiam criar o progresso e a inovação que esse país tanto precisa. Você impede que o país evolua e cria ainda mais espaço para líderes medíocres e manipuladores se prolongarem no poder.
E assim, você cria uma sociedade que acredita que o único jeito de se dar bem é traindo, mentindo, sendo corrupto, ou nos piores casos, tirando a vida do outro.
As vezes, a melhor coisa que você pode fazer por um amigo que está sempre atrasado é ir embora sem ele. Isso vai fazer com que ele aprenda a gerir o próprio tempo e respeitar o tempo dos outros.
Outras vezes, a melhor coisa que você pode fazer com alguém que gastou mais do que devia e se enfiou em dívidas é deixar que ele fique desesperado por um tempo. Esse é o único jeito que fará com que ele aprenda a ser mais responsável com dinheiro no futuro.
Eu não quero parecer o estrangeiro que sabe tudo, até porque eu não sei.
Só que em breve, Angola, você será parte da minha vida para sempre. Você será parte da minha família. Você será meu amigo. Você será metade do meu filho quando eu tiver um.
E é por isso que eu sinto que preciso dividir isso com você de forma aberta, honesta, com o amor que só um amigo pode falar francamente com outro, mesmo quando sabemos que o que temos a dizer vai doer.
E também porque eu tenho uma má notícia: não vai melhorar tão cedo.
Talvez você já saiba disso, mas se não sabe, eu vou ser aquele que vai lhe dizer: as coisas não vão melhorar nessa década.
O seu governo não vai conseguir pagar todas as dívidas que ele fez a não ser que mude toda a sua constituição. Os grandes negócios do país pediram dinheiro demais emprestado quando o dólar estava baixo, em 2008-2010 e agora não vão conseguir pagar já que as dívidas dobraram de tamanho. Muitos vão falir por causa disso nos próximos anos e isso vai piorar a crise.
O preço do petróleo está extremamente baixo e não apresenta nenhum sinal de aumento num futuro próximo, isso significa menos dinheiro entrando no país. A sua população não é do tipo que poupa e sim, que se endivida. As taxas de desemprego estão aumentando, assim como os impostos que estrangulam a produtividade da classe trabalhadora.
Você está ferrado. Você pode tirar o Zé Dú de lá, ou todo o M. Pode (e deveria) refazer a constituição, mas não vai adiantar. Os erros já foram cometidos anos atrás (na guerra pode-se errar na táctica mas não na estratégia... o M errou na estratégia) e agora você vai ter que viver com isso por um tempo.
Se prepare para, no mínimo, 5-10 anos de oportunidades perdidas. Se você é um jovem angolano, muito do que você cresceu esperando que fosse conquistar, não vai mais estar disponível. Se você é um adulto nos seus 30 ou 40, os melhores anos da economia já fazem parte do seu passado. Se você tem mais de 50, bem, você já viu esse filme antes, não viu?
É a mesma velha história, só muda a década. A democracia não resolveu o problema. Um Kwanza estável por uns anos não resolveu o problema. Tirar milhares de pessoas da pobreza não resolveu o problema, construir centralidades em cada província, universidades se espalhando por todas as províncias, o problema persiste. E persiste porque ele está na mentalidade das pessoas, todos querem exibir diploma e procurar emprego ao invés de trabalho, querem parecer no lugar de ser.
O “jeitinho Angolano” precisa morrer. Essa vaidade, essa mania de dizer que Angola sempre foi assim e não tem mais como também precisa morrer. E a única forma de acabar com tudo isso é se cada angolano decidir matar isso dentro de si mesmo.
Ao contrario de outras revoluções externas que fazem parte da sua história, essa revolução precisa ser interna. Ela precisa ser resultado de uma vontade que invade o seu coração e a sua alma.
Você precisa escolher ver as coisas de uma nova forma. Você precisa definir novos padrões e expectativas para você e para os outros. Você precisa exigir que o seu tempo seja respeitado. Você deve esperar das pessoas que te cercam que elas sejam responsabilizadas pelas suas acções. Você precisa priorizar uma sociedade forte e segura acima de todo e qualquer interesse pessoal ou da sua família e amigos. Você precisa deixar que cada um lide com os seus próprios problemas, assim como você não deve esperar que ninguém seja obrigado a lidar com os seus.
Essas são escolhas que precisam ser feitas diariamente. Até que essa revolução interna aconteça, eu temo que o seu destino seja repetir os mesmos erros por muitas outras gerações que estão por vir.
Você tem uma alegria que é rara e especial, Angola. Foi isso que me atraiu em você muitos anos atrás e que me faz viver aqui. Eu só espero que um dia essa alegria tenha a sociedade e os líderes que merece.
Estamos vivendo um retrocesso no processo de desenvolvimento humano.
Ao contrário das políticas públicas de países mais desenvolvidos, que priorizam o financiamento da assistência à saúde e o bem-estar do cidadão gastando em média 6,08 % do PIB, o governo brasileiro, apesar das galopantes carências nessa área, gasta apenas 4,32%. Assim não é de se estranhar que a média da expectativa de vida do brasileiro seja actualmente 73,62 anos, enquanto a dos ingleses é de 82,62 anos. E para agravar a situação, quando o governo resolve investir, investe mal, sem prioridades e distorcidamente, sem julgar as reais e urgentes necessidades da população. Ignora o que todos sabem, falta-nos, principalmente, o básico; remédios e hospitais suficientes e aparelhados!
Sensação de indignação nos toma quando vemos na TV gastos absurdos em propagandas populistas de Programas de Saúde, enquanto pessoas morrem em filas de espera para conseguir uma internação ou ganhar algum medicamento. É revoltante ver nos hospitais das Faculdades Federais de Medicina prateleiras de medicamentos vazias, aparelhos hospitalares encostados por falta de manutenção, tetos de salas de Pronto Socorro com fungos, cheios de infiltrações, carências de leitos e UTIs, para os mais prementes atendimentos. É inacreditável que médicos do Estado sejam obrigados, por ordem superior, a suspender internações e cirurgias electivas, por falta de luvas...! Os Pronto-Socorros não atendem, por ordem superior, sem antes o paciente passar pelas UPAs, o que pode ser uma importante perda de tempo para garantir a sobrevivência em casos graves que demandam serviços hospitalares de emergência! É a burocracia aliviando os hospitais artificialmente e emperrando o salvamento de um possível paciente! Onde estão as prioridades? Onde está o bom-senso? Onde está o honesto e bom gerenciamento dos escassos recursos que chegam espoliados e desfasados às entidades da Saúde e Educação?
Enquanto esse degradante quadro da saúde pública nos é oferecido, proliferam, com o aval do governo, escolas médicas sem hospitais e professores suficientes para um honesto e verdadeiro ensino. Para quê mais Postinhos de Atendimento Ambulatorial, com salas ociosas e até desactivadas, se não há escoamento dos doentes que lá chegam precisando de internação ou tratamento hospitalar especializado? Problemas de pequena complexidade são fáceis de resolver, programas preventivos são desejáveis, são medidas de economia e de poucos gastos! Mas o que urge é resolver os problemas de saúde que uma receita comum não trata; o país precisa de vagas hospitalares, de oferecer exames e tratamentos de média e grande complexidade, coisas que não cabem no bolso da grande maioria da população.
Mas o governo que só vê o que lhe interessa, finge que não conhece as estatísticas alarmantes que se apresentam: só 6,5% das cidades brasileiras têm UTIs! Só 49,6 % dos nossos municípios têm condições hospitalares de atender parturientes e recém-nascidos NORMAIS! Com estes números dá para entender porque o governo actual se empenha em fazer propaganda para estimular os partos naturais, com parteiras em casa... A explicação simplista é que somos recordistas mundiais em cesarianas, o que é uma realidade. Mas a solução propalada não é uma tentativa honesta de protecção à mulher, mas uma saída oportunista encontrada para a falta de hospitais públicos ou conveniados, que possam disponibilizar vagas suficientes para o atendimento profissional integral e permanente às pacientes e seus rebentos, que precisam ao nascer de avaliações de vitalidade e testes preliminares para diagnósticos precoces de doenças. Em casa não vão ter esse atendimento, e talvez os pais só consigam marcar uma consulta pra o bebe daqui alguns meses, ou talvez nem o façam...
Para acompanhar uma gestante em trabalho de parto, o indicado é ter-se no Hospital ou Maternidade uma equipe de plantão 24 horas/por dia, com enfermagem, médicos obstetras, pediatras e anestesistas disponíveis para assistir as pacientes e intervir quando necessário em qualquer dificuldade intercorrente (um descolamento prematuro de placenta, um sofrimento fetal, uma discinesia ou atonia uterina por estafa muscular, uma desproporção cefalo-pélvica,...) no trabalho de parto que ponha em risco a vida da parturiente e seu rebento. E após o parto, o hospital deve estar preparado para oferecer leito para a mãe e o recém-nato, o que pelas estatísticas levantadas não se tem a contento...!
É triste ver os hospitais da rede federal (Hospitais Escola) que no passado foram referência em qualidade de formação profissional atendendo precariamente. Falta tudo, de professores a todo tipo de material e medicamento, enquanto o dinheiro dos impostos, que deveria reverter para o bem-estar da sociedade, escorre para esgoto da corrupção político-governamental.
E para concluir, uma nota que é de rir, para não chorar; recentemente, em instituição pública hospitalar regional, os funcionários que ficavam no Pronto Socorro, além de terem que improvisar nas deficiências, não tinham alternativa para se alimentar durante o plantão; ou traziam marmita de casa ou comiam o que havia na despensa: ovo.
Azar para quem não pudesse ingerir o saboroso produto da galinha, seja por alergia, problemas metabólicos ou intolerância gustativa! Acredito que para matar a fome houve quem pedisse pizza..., pelo celular!
Porquê de tanta violência? Porquê de tanto fanatismo, pergunto-me quando vejo jovens e até crianças de armas em punho, aliciadas por gente que se diz religiosa, mas que no fundo quer é dominar o Homem através do medo e do terror à sua presença. O que faz essa juventude transviada se bandear para o lado escuro da alma humana?
Em geral, o que se percebe ao se ouvir os noticiários sobre o terrorismo que atinge actualmente Europa e África, é que quem executa esses actos bárbaros de violência são jovens potencialmente agressivos emergidos de ambiente ou história conflituantes, onde a sociedade de alguma maneira lhes bloqueia oportunidades ou desempenhos.
Procuramos entender; será que toda essa insatisfação pessoal/social encontra na violência das acções terroristas a válvula de escape, visível e contundente, que todos os dias nos jogam na cara? Será que essas criaturas encontram nas drogas ou nas promessas religiosas a recompensa de um mundo quimérico, após a morte, de sensações compensatórias que as impedem de se comunicar de uma maneira real e normal com o mundo que as cercam? Ou será que são pessoas portadoras de um desequilíbrio da função psíquica entre o ego-superego-id, onde o instinto não encontra repressão e o comportamento moral é tolhido ou simplesmente ignorado? Ou ainda será que existe nessas gentes uma conjugação de factores que, mentalmente trabalhados, se tornam veículo de manobras intimidatórias de poder de mentes doentias? Não é simples responder a tanta loucura que destrói e mata sem sentimento culpa.
Combater o terrorismo é uma luta inglória, pois mesmo que se acabe com este grupo que agora nos assombra, à força de armas e de retaliação responsiva, outro virá como outros no passado.
Combater o mal não é apenas fazer repressão à violência, com violência, é um acto diário de paciência e tolerância, diálogo, acordo e inclusão social.
Combater o mal social é acima de tudo respeitar o Homem nas suas múltiplas diferenças.
Um breve resumo histórico do açúcar e a sua importância na ocupação madeirense das terras brasileiras
Formas de pão-de-açúcar madeirenses
Fonte: Wikipédia livre
Desde a antiguidade a cana-de-açúcar (saccharum oficcinarum L.) é cultivada na China e na Índia, de onde é originária. Chegou ao Ocidente com o regresso dos Cruzados do Oriente e com a invasão dos mouros na Espanha. Na Europa, principalmente em Veneza, ganhou fama e importância comercial com o seu produto principal, o açúcar.
Considerado uma especiaria com qualidades medicinais, conservante e adoçante, o açúcar foi tão valorizado no passado que provocou disputas entre reinos, enriqueceu Estados, estimulou a escravidão, propiciou o descobrimento e ocupação de novas terras, entrou em dotes de princesas e até como herança, em testamento de reis.
O lucro que advinha da produção açucareira estimulou o cultivo da cana na região mediterrânea e nas ilhas atlânticas, principalmente na Madeira, onde se iniciou e serviu de teste para outras possessões ultramarinas portuguesas. Com a descoberta do caminho marítimo para as Índias, e com o inicial sucesso do cultivo e produção da cana na Ilha, em pouco tempo, Portugal desbancava a rica Veneza, até então a maior comerciante e distribuidora de açúcar da Europa.
A política reinol que incentivou a monocultura da cana (vinda da Sicília) e a exportação de açúcar levou a Pérola do Atlântico à diminuição da produção cerealífera e o arquipélago a crises periódicas de fome e violência. O Brasil passou então a ser visto como uma outra oportunidade de desenvolvimento e riqueza pelos ilhéus. Candidataram-se à emigração pobres lavradores sem terras (pelas divisões sucessivas das glebas entre os descendentes, que recebiam nacos de terreno cada vez menores, inviáveis para assegurar a subsistência), os filhos segundos da nobreza (deserdados pelo regime de morgadio), os clandestinos e homiziados, e os mercadores cristãos-novos, na busca de liberdade religiosa no novo mundo, longe da Inquisição Portuguesa.
Na América Espanhola (São Domingos) as primeiras mudas chegaram com Colombo e no Brasil com os portugueses, no início de século XVI, a maioria oriundos da Madeira e de São Tomé .
Em diáspora, os madeirenses incorporaram armadas da Índia e depois do Brasil. Atingiram a embocadura do Senegal, o norte da África, levaram a sua tecnologia açucareira para os Açores, São Tomé, Cabo Verde e América portuguesa. No Brasil chegaram para colonizar, gerenciar e defender interesses e fronteiras. Com a cana, sem a mão-de-obra do índio, trouxeram os primeiros escravos negros para as plantações do nordeste e São Vicente.
Embora já houvesse em Itamaracá uma plantação de cana (1515/1519) de Pedro Capico, com produção de açúcar ( 1526), documentos dizem que D. João III mandou em 1530 uma forte armada comandada por Martin Afonso de Souza para o Brasil, onde numa das naus havia mudas de cana-de-açúcar. Nessa armada vinha o inglês Thomas Cresley que afirma, em carta enviada a um mercador londrino, que em passando pela Ilha da Madeira, a pedido de um cristão-novo, o capitão permitiu que o homem, a mulher e os 4 filhos embarcassem rumo ao Brasil.
Segundo historiadores, como curiosidade, é bem possível que o nome do morro carioca “Pão de Açúcar” venha deles, os madeirenses, pois era em formas cónicas, furadas na extremidade (pão-de-açúcar) que produto tratado da cana era drenado e os cristais de açúcar formados.
Com o grande crescimento da produção da cana em terras brasileiras, as dificuldades ilhoas se acentuaram. Sem condições de disputar com vantagem o mercado, os madeirenses passaram a negociar também o açúcar brasileiro. Apesar das leis do reino, que protegiam os interesses dos engenhos da ilha, o açúcar americano continuava a chegar. Diversificou-se então a economia com produtos para exportar: doces, confeitos, roupa e vinho madeirenses eram trocados pelo açúcar, tabaco, pau-brasil brasileiros e escravos angolanos. Um comércio triangular entre Angola-Madeira e Brasil se desenvolveu, o cobiçado açúcar era ainda a moeda circulante.
Na América portuguesa , onde o clima não ajudava, não se plantava, investia-se na criação de gado para alimento, transporte, vestuário, força motriz dos engenhos. Documentos relatam que o madeirense Gabriel Cristóvão de Menezes, aos 29 anos, já era um abastado criador de gado (Devassa de 6/12/1728).
A presença madeirense não só se fez presente nos primeiros séculos de ocupação e produção económica, como também na defesa do espaço territorial e marítimo contra corsários, piratas e principalmente armadores franceses.
Para ilustração, alguns ilhéus madeirenses de destaque na formação do Brasil:
Francisco de Aguiar (Capitão do Espírito Santo)
Vasco Fernandes Coutinho (Capitão do Espírito Santo)
Antonio Teixeira de Melo (Capitão do Pará)
Pedro Vogado (Governador de Itamaracá, na ausência de João Gonçalves)
Luis de Melo da Silva, Bartolomeu de Melo Berenguer (Capitães do Maranhão)
Tristão de França (combateu os franceses)
Catarina Ferreira (porto santense, mãe de André Vidal de Negreiros)
Manuel Dias de Andrade (actuou na Bahia)
E outros mais como Antonio Freitas da Silva, Fernão Dias de Andrade, Antonio Freitas da Silva...
Homiziados da Ilha da Madeira:
Nicolau de Brito de Oliveira e seu filho Nicolau de Brito (responsáveis por mortes de parentes em disputa de terras)
Rafael Accioli de Vasconcelos (degredado com hábito de Cristo e tença)
João Vieira Pita, Egas Moniz (cristão-novo), Manuel Leme (bígamo).
Mercadores:
Diogo Aragão Pereira, Baltasar Aragão Ayala
João Fernandes Vieira
Diogo Fernandes Branco (negociava marmelada)
Colonizadores Pioneiros
Domingos de Góis e sua mulher Catarina de Mendonça (S. Vicente)
Manuel Escórcio Drumond e família
João de Souza Botafogo (Rio)
Família Lira (Pernambuco) Gonçalo Novo e a esposa Isabel de Lira
Salvador Taveira
Família Mendonça de Vasconcelos (Gaspar Mendonça de Vasconcelos)
Família Cunha (Pedro da Cunha Andrade)
Família Madeira (Gaspar Lopes Madeira casado com D. Luísa Ferreira)
Família Montes Barreto (Duarte Moniz Barreto, Diogo Moniz casado com D. Felipa Mendonça)
Família Furna (Antonio Fernandes Furna)
Família Carvalho (Bernardino Carvalho, irmão de Sebastião Carvalho)
Família Aguiar (Francisco Aguiar donatário do Espírito Santo)
Outras Famílias: Berenguer, Câmara, Accioli, Gadelha, Aragão, Faria, Bulhões, Aranha, Regueira, Saldanha, ... chegaram nos primeiros tempos da construção do país, principalmente , no nordeste e no sudeste para colonizar e cultivar a cana–de-açúcar. Deixaram raízes na incipiente sociedade brasileira.
Uberaba, 21/10/15
Maria Eduarda Fagundes
Resumo e dados compilados de
- «Os Madeirenses na Colonização do Brasil» (Maria Licínia Fernandes dos Santos) Edição: Centro de Estudos de História do Atlântico CEHA. Secretaria Regional do Turismo e Cultura.
Conhecidos pela sua origem judaica, os marranos portugueses, judeus convertidos à força (em pé) à religião católica, foram alvo da perseguição sistemática do Santo Ofício nos tempos da Inquisição portuguesa (1536/1821). Obrigados a migrar à medida que a Inquisição se instalava, no Brasil, judeus e cripto-judeus aportaram com os primeiros descobridores e povoadores no século XVI.
Marranos. Pintura de Moshe Maimon (1893) retrata o Sêder de Pessach realizado secretamente em Espanha, à época da Inquisição
Fonte: Wikipédia livre
Pau-brasil
Fonte: Wikipédia livre
No nordeste, pela qualidade do pau-brasil e pela maior proximidade da Europa, as terras recém-descobertas eram atractivas para esses cristãos-novos que, longe dos olhos da metrópole portuguesa, encontravam oportunidade de viver a sua religiosidade, plantar a cana, construir engenhos, processar e comercializar o açúcar, produto extremamente valorizado naquele tempo.
O solo de massapé foi generoso com os primeiros colonos. A produção de cana foi tão abundante que a Capitania de Pernambuco ficou conhecida nos séculos XVI e XVII como a Terra do Açúcar. Mas foi só depois de muitas lutas e labutas que a prosperidade chegou, espalhou gente pela terra, e atraiu a cobiça estrangeira.
No início dos anos de 1500, ignorando o Tratado de Tordesilhas, contrabandistas franceses de pau-brasil atreviam-se cada vez mais pelas costas brasileiras. Negociavam com os índios, atacavam feitorias, traficavam madeira tintureira, plantas e animais exóticos desconhecidos no Velho Mundo. Voltavam para a Europa com os porões das naus abarrotados de produtos dessas bandas. Até que D. João III, alertado sobre os constantes assédios às costas litorâneas da sua Colónia Americana, resolveu dividir o território em capitanias hereditárias e doá-las, sob condições, à colonização ultramarina. Foi a primeira tentativa civilizatória do espaço brasileiro, antes destino de náufragos e degredados portugueses.
Quinze parcelas de terra foram oferecidas a 12 donatários, homens da segunda nobreza portuguesa (filhos segundos da nobreza que buscavam gloria e riqueza), altos funcionários e militares do reino.
Capitanias hereditárias (Luís Teixeira. Roteiro de todos os sinais..., ca. 1586. Lisboa, Biblioteca da Ajuda)
Fonte: Wikipédia livre
A enorme distancia entre a Colónia e a Coroa, com o imenso mar-oceano a dividi-las (ou a ligá-las), o desinteresse de alguns pelo enorme desgaste físico e financeiro que se exigia de cada donatário, o despreparo da maioria e a extrema agressividade do meio (clima e território inóspitos aos europeus, ataques de selvagens, degredados que nem sempre colaboravam e que muitas vezes patrocinavam revoltas e distúrbios) determinaram, com algumas excepções, o retumbante fracasso da empresa.
Mas nem tudo deu errado. Duarte Coelho Pereira, natural de Miragaia, filho bastardo de Gonçalo Coelho, era um militar experiente com extensa folha de serviços prestados à Coroa. Conquistou o respeito e a Capitania de Pernambuco, junto ao rei. Empreendeu com gente pobre do norte de Portugal a ocupação do seu quinhão. O litoral da colónia não lhe era desconhecido, já o havia navegado em 1501 e 1503 com o pai e Américo Vespúcio.
Embora o povoamento do território brasileiro se tenha iniciado com efectividade a partir do parcelamento da Colónia portuguesa, em Itamaracá, no Sitio dos Marcos, em frente a uma feitoria que Cristóvão Jaques construiu (1515-1519), outro colono português, Pedro Capico, já plantava cana-de-açúcar trazida de Cabo-Verde. Processava-a em engenho produzindo açúcar que era enviado para Lisboa (Registo em 1526, no livro da Casa da Índia da Alfândega, do produto vindo do Brasil).
Itamaracá em 1637, por Frans Post
Fonte: Wikipédia livre
Em 1535, Duarte Coelho Pereira, o primeiro donatário de Pernambuco (em tupi = pedra furada) chegou à Capitania com 200 colonos, alguns fidalgos, a esposa D. Brites (Beatriz) de Albuquerque, provavelmente a primeira dama portuguesa a se instalar no Brasil, o cunhado Jerónimo de Albuquerque e Vasco Fernandes de Lucena, feitor de impostos reais. Duarte Coelho dirigiu-se primeiramente para o sul da ilha de Itamaracá (Pedra do Sino, em Tupi), área ocupada pelos Tabajaras, aliados dos portugueses, que delimitava as Capitanias de Pernambuco e a de Itamaracá de Pêro Lopes (3ª. parcela) onde habitavam os Caeté, aliados dos franceses.
Expulsos os índios, fundou a vila de Igaraçu e iniciou a construção de Olinda. Erigiu seu “castelo”, preservou matas, protegeu fontes e rios, estimulou a miscigenação entre colonos e indígenas, plantou cana-de-açúcar, algodão, e alimentos para a subsistência. O solo fértil favoreceu os assentamentos. Casas e engenhos de trapiche foram levantados, principalmente na Várzea do Rio Capibaribe.
Porém logo os índios da região, Caetés e mesmo os Tabajaras, se insurgiram. Conflitos e ataques indígenas destruíram engenhos, queimaram plantações, sitiaram os portugueses. Colonos descontentes e traficantes que exploravam o pau-brasil, proibido por ser exclusividade do rei, traziam prejuízos humanos e financeiros. Precisou-se de mais dinheiro e de pacificar a região. Duarte Coelho escreveu ao rei que não respondeu às suas demandas. Socorreram-lhe os judeus com empréstimos, pagos com o tráfico de escravos e o cunhado Jerónimo de Albuquerque, casado com a índia Maria do Espírito Santo Arcoverde, promovendo a paz com os índios. Após isso chegaram os criadores de gado vindos da Bahia, incrementando a economia.
Em Portugal, Branca Dias mulher do cristão-novo Diogo Fernandes, que se encontrava em Pernambuco, era denunciada por sua mãe (Violante Dias) e sua irmã (Isabel Dias), presas no Estaus do Rossio, por práticas judaizantes, o que para uma cristã-nova a manutenção dos ritos da antiga religião era uma violação da conduta cristã. Julgada e sentenciada em 1543 a dois anos de prisão, abjuração pública e uso de habito penitencial (sambenito), no caso túnica de algodão cru, pintada de amarelo, com uma cruz vermelha de Santo André, ao centro, reputando a humildade e sofrimento. Não cumpriu a pena por completo, pois solicitou ao Santo Ofício a permissão para sair e cuidar dos filhos ainda pequenos. Foi libertada em 1545 com o compromisso de não deixar o país, coisa que fez quando teve oportunidade fugindo com os sete filhos para o Brasil, onde estava o marido.
Sabe-se que em 1551 já se encontrava em Pernambuco, onde encontrou Diogo e a enteada Briolanja Fernandes, filha natural do marido com a criada Magdalena Gonçalves. O casal teve mais quatro filhos, criou todos, os dela e os dele.
Cerimónia religiosa de índios tupinambás em gravura de
Theodor de Bry
Fonte: Wikipédia livre
Apesar de pouco conhecermos àcerca do passado marrano no início da colonização, pessoas houve que deixaram na historiografia, na literatura ou na lenda marcas de sua presença. Mulheres como Brites de Albuquerque, Brites de Carvalho, Brites de Lucena destacaram-se pela sua representatividade e influência na formação da incipiente sociedade brasileira, substituindo os maridos nas suas ausências. Branca Dias foi uma dessas pioneiras. Matriarca, raiz de várias famílias nordestinas, nasceu em data imprecisa do início dos 1500 na região nortenha portuguesa (Viana da Foz do Lima). Casou com Diogo Fernandes, cristão-novo, mercador de tecidos, também natural do norte de Portugal, em finais dos anos 1520. Sua vida é envolta em situações nebulosas que geraram lendas e fonte literária de muitas historias. Mulher, viúva, cristã-nova, com dificuldades financeiras, dirigindo em Olinda, na sua casa, uma escola de prendas domésticas para as filhas dos colonos e provavelmente também uma esnoga, tornou-se símbolo de perseverança e resistência dos marranos no Brasil dos séculos XVI e XVII.
Para construir uma maior rede de influência e criar raízes, a família de Branca Dias facilitou e incentivou o casamento com cristãos-velhos, gente da governança, ricos senhores de engenhos e plantadores de cana. Foi a táctica marrana para obter a” limpeza de sangue” que, no novo mundo, encorajava os casamentos exogâmicos, e desestimulava os endogâmicos, tirando o direito ao dote. Nela, a intenção religiosa submetia-se ao interesse social.
Emblema da Inquisição (1571), fonte Wikipédia livre
Branca Dias faleceu entre 1588/1589. Mesmo morta, quando finalmente o braço da Inquisição chegou a “Nova Lusitânia “ (Pernambuco) em 1593, representado pelo Inquisidor Heitor Furtado de Mendonça, sua imagem sofreu denuncias judaizantes de antigas alunas que envolviam a colonizadora e família. Julgada e sentenciada, seus ossos foram desenterrados e incinerados em fogueira inquisitorial em Lisboa.
Todas as vezes que os descendentes de Branca Dias se quiseram habilitar à Ordem de Cristo, entidade que naqueles tempos dava prestígio e dinheiro aos seus postulantes, foram assombrados e obstados nas investigações de limpeza de sangue pela origem marrana da colonizadora.
Gravura neerlandesa mostrando o cerco a Olinda em 1630
Fonte Wikipédia livre
Em 1630, a cidade de Recife foi invadida pelos holandeses que se instalaram em Pernambuco com seus fortes recursos, liberdade religiosa e cultura até 1654, quando então foram expulsos com os judeus, pelos luso-brasileiros.
Apesar de outras sinagogas (esnogas) terem existido, espalhadas em casas de engenhos e urbanas no século XVI em Pernambuco, a primeira Sinagoga oficial da América, Kahal Zur Israel, foi levantada na Rua dos Judeus no Centro histórico de Recife no século XVII.
A presença holandesa liberou, aprofundou e disseminou costumes judaicos à cultura nordestina como cortar as unhas e banhar os defuntos antes de enterrá-los directamente no chão, envoltos em mortalha de linho, trocar as roupas de cama nas sextas-feiras, orar acendendo velas virgens, preparar o bolachão (espécie de pão-ázimo), abater animais pela degola, empregar símbolos nos portais das casas,..., marcas que, assimiladas pela sociedade plural brasileira, se diluíram e perderam as raízes no ostracismo do tempo e do ambiente.
Uberaba 09/10/2015
Maria Eduarda Fagundes
FONTES DOS DADOS:
O Nome e o Sangue (Edvaldo Cabral de Melo)
Mercadores e gente de Trato. Dicionário Histórico dos Sefarditas Portugueses. Direcção Científica de A.A. Marques de Almeida
Dicionário Mulheres do Brasil (De 1500 até actualidade) Jorge Zahar Editora.
Arquivo Histórico Judaico de Pernambuco. Branca Dias (Internet).
Capitães do Brasil. A saga dos primeiros colonizadores. (Eduardo Bueno)
Gracia Há-Nassi, também conhecida como Grazi Nasi, Gracia Nasi, Gracia Mendes, Gracia Mendes Benveniste, Gracia Miguez, nasceu em Portugal, possivelmente em Lisboa em 10/06/1510 no seio de uma família de judeus conversos, originária de Aragão, sob o nome cristão de Beatriz de Luna. Era filha de Álvaro de Luna de Aragão e de Philipa Benveniste. Segundo Cecil Roth, casou em 1528, em rito católico em sociedade, e provavelmente em rito cripto-judaico em ambiente familiar, reservado, com um rico comerciante e banqueiro, Francisco Mendes Benveniste (Tezmah Benveniste), que na época dos descobrimentos marítimos, também se tornou grande negociante de especiarias. Em 1536, com a morte de seu marido, pouco tempo após o nascimento de sua filha, Ana Mendes (Reyna), Beatriz de Luna torna-se uma das personalidades femininas mais importantes do seu tempo. Empresária, rica, filantropa, culta e bonita tinha prerrogativas desconhecidas à maioria das mulheres do século XVI. Mas a cobiça de D. João III logo se estendeu ao seu grande património. Mesmo com os protestos da viúva, o inventário foi levantado por ordem do rei que tenta também levar-lhe a filha, uma das herdeiras da família, para a corte da rainha, D. Catarina, visando um casamento futuro com alguém da realeza. Com a Inquisição se instalando no mesmo ano, Beatriz decide estrategicamente partir para Antuérpia onde seu cunhado e sócio, Diogo Mendes, abrira uma filial bancária da família com outro parente.
Apesar de alguns percalços e até prisão, livre e enobrecido por Carlos V, Diogo torna-se banqueiro de vários reis europeus. Com ele, Beatriz passa a gerir os negócios e estrutura uma rede secreta de ajuda aos judeus fugidos da Inquisição. Quando a irmã, Brianda de Luna, casa com seu cunhado Diogo em 1539, as relações familiares e económicas tornam-se ainda mais estreitas. Mas os anos de 1539 e 1540 ficam difíceis para as comunidades cristãs-novas de Antuérpia, delações e interrogatórios surgem. Morre Diogo Mendes e pelas suas disposições testamentárias Beatriz torna-se administradora da Casa Mendes (com auxílio de Guilherme Fernandes e João Micas) e da herança da sobrinha na menoridade desta, facto que criou uma situação de intolerância e desconforto entre as irmãs, até ao fim de suas vidas. Caso houvesse alguma coisa com Beatriz o património seria gerido por Agostinho Henriques (Abraão Benveniste), parente deles.
Mais uma vez é a cobiça que leva o Imperador de Antuérpia a exigir o inventário dos bens do falecido banqueiro. Acusam Diogo de ter mantido práticas judaicas e a hipótese de confisco aguça o interesse da Coroa. Beatriz tenta salvar a situação, paga 40 mil ducados para retirar a acusação sobre a reputação judia de Diogo e 200 mil, em dois anos, à Rainha Maria da Hungria para evitar que outros membros da família fossem também acusados. O dinheiro ajudava mais uma vez a salvaguardar o relativo sossego que perseguia. Com o Papa, Beatriz consegue um salvo-conduto que lhe permitia ficar em Roma. Não o usa, mas tem-no como estratégia para uma possível fuga. Porém, mais uma vez a Coroa resolve oferecer um partido dentro da realeza paras se casar com a filha, D. Francisco de Aragão ou Gaspar Ducchio. Beatriz recusa tal oferta. Então, cristão-novos são presos, entre eles gente da família. Beatriz interfere pagando avultadas quantias em dinheiro e consegue libertá-los. A situação torna-se insustentável, prepara nova fuga.
Em 1545 pede a Maria da Hungria permissão para ir às famosas termas de Aix-la-Chapelle. Viaja com a parte feminina da família, mas encaminha-se para Lyon onde tinha vários interesses e depois para Veneza; não volta a Antuérpia. Tem como objectivo um dia chegar a Constantinopla. Envia João Micas para acertar negociações com a Regente. Em Veneza, Beatriz faz importantes contactos e negócios. Mas também tem aborrecimentos com a irmã que leva ao tribunal veneziano encarregado de causas estrangeiras, o processo da herança, em 1547. Porém, em 1548 chega o Santo Ofício e mais uma vez se vê na contingência de fugir, sem a deliberação do tribunal. Atinge Ferrara e fica na casa do cristão-novo português Sebastião Pinto, que a ajudou na passagem por Londres anos atrás. Porém, por questões financeiras, o Duque Hercules II oferece-lhe o aluguel de um palacete (Palácio Magnanini) por dois anos, de 1549 a 1551, por 200mil ducados/ano. Aí se estabelece e tenta anular o resultado favorável do processo de Veneza, que se decidira por Brianda. Dedica-se também a patrocinar artistas e trabalhos literários, como os de Samuel Usque (literato português, sefardita), Alonso Nuñez Reinoso (poeta espanhol de origem judia), Bernardim Ribeiro (romancista) e de alguns italianos, Ortensio Lando e Girolamo Ruscelli. Também financiou e apoiou os estudos científicos do médico judeu português Amato Lusitano (Dr. João Rodrigues de Castelo Branco) que descreveu pela primeira vez o sistema circulatório e suas válvulas, e escreveu tratados médicos, dos mais importantes do século XVI. Sua casa recebia intelectuais e pessoas ilustres do seu tempo. Mas apesar de toda essa vida de brilho, ao final do contracto, Beatriz vê-se diante da possibilidade de abandonar Ferrara, já sugerida pelo Duque. E assim, em 1551, encontra-se novamente em Veneza e faz um acordo final com a irmã. Após resolver alguns negócios, vai para Ragusa, onde sua Casa tinha interesses. Dali, atinge finalmente Constantinopla. Em 1553 está livre para assumir seu nome hebraico e sua verdadeira religião. Daí em diante passa a ser Gracia Nasi. Sua filha Ana, agora Reyna, casa-se em 1554 com o primo João Micas (Joseph Nasi) que ao que parece faz parte de uma rede de informações sobre as movimentações turcas no Golfo Pérsico. Preocupa um eventual ataque do sultão às possessões portuguesas na Índia. Os interesses são provavelmente comerciais. Gracia Nasi exerce intensamente sua religiosidade. Constrói Sinagogas e Escolas para os estudos do Talmude. Torna-se mediadora entre as comunidades judaicas em Constantinopla. Amplia a rede de apoio aos cristãos-novos que começara em Antuérpia. Recebe então a alcunha de a “Senhora” e outras como a “Coroada”, a “Hagevirá” (a herdeira da realeza).
Em 1555 sobe ao papado Paulo IV e recrudesce a perseguição aos cripto-judeus. Muitos dos seus contactos e conhecidos são encarcerados ou têm seus haveres confiscados. Tenta então desviar o comércio de sua Casa para Pesaro. O Porto de Ancona não é mais seguro. Consolida, no entanto, a sua posição junto à corte turca.
Depois de conseguir junto ao governador de Damasco a administração de um sub-distrito, implanta um local de acolhimento aos judeus da diáspora (Tiberíades).
Morre em 1569 sem notórias notícias, após anos de mobilizações constantes e muitas acções de ajuda a comunidades sefarditas.
Gracia Nasi é considerada como iniciadora da primeira onda sionista de retorno à terra prometida. Suas acções corajosas, políticas e económicas deixaram marcas indeléveis na história do mundo ocidental e judaico.
Uberaba, 02/08/15
Maria Eduarda Fagundes
Resumo e compilação das fontes:
- Os judeus, o dinheiro e o mundo (Jacques Attali)
- Mercadores e Gente de Trato (Dicionário Histórico dos Sefarditas Portugueses) Direção científica de A.A. Marques de Almeida
A vocação uberabense para a pecuária deu-se desde os primórdios da ocupação da região pelos colonos brancos. Saint Hilaire em 1819, ao passar pela região já dizia: “... devido a existência de bons pastos, vão se dedicar à criação de gado lanígero, porcos e principalmente gado vacum,...”
O comércio de Uberaba começou através das rotas salineiras com Formiga e São João Del Rei. Mais tarde com a produção de cana e café, a chegada dos imigrantes (portugueses, italianos, espanhóis), da estrada de ferro (Mogiana), e o aumento populacional provocado pela circulação dos militares que vieram de passagem para a guerra do Paraguai, houve um incremento notório dos negócios. Porém, quando a estrada fez novos trajetos e desviou o comercio, Uberaba, abandonada, perdeu a hegemonia comercial da região e voltou-se novamente para as origens, a pecuária.
A introdução do gado zebu (com corcova) no Brasil se deu inicialmente na Bahia (1813) e depois no Rio de Janeiro na segunda metade do século XIX (GIR, CANCREJ/GUZERA e ONGOLE/NELORE. O gado misturou-se ao trazido de cabo Verde, no século XVI(dito na região “curaleiro”), e se espalhou principalmente Minas Gerais, sul Goiás, Mato Grosso.
Com a mudança dos rumos da economia na região, os cafeicultores aos poucos tornaram-se criadores de gado e muitos assumiram as duas atividades. Adquiriram reprodutores bovinos principalmente com pecuaristas do Rio de Janeiro. Mais tarde alguns fazendeiros foram buscar pessoalmente, com muitas dificuldades, até morte (João Martins Borges), no inicio do século passado exemplares zebuínos na Índia. Animais estes e seus descendentes que fizeram a riqueza da região do Triangulo Mineiro no século XX.
Quanto às plantas o mineiro gosta bastante de cambiá-las e experimentar os plantios. Em Minas pode-se encontrar espécies vegetais de várias partes do mundo ( herança portuguesa?)
É fato e seu primo bem o sabe, as famílias ricas da região enviavam os filhos para estudar fora, viajavam para o exterior e de lá traziam novidades que maravilhavam e despertavam inveja. Fazendas e casas havia que tinham na sua bela arquitetura e mobiliário mármore de Carrara, pinturas em trompe l’oeil, louça inglesa, indiana, chinesa, porcelana germânica (Rosenthal), magníficos relógios de carrilhão alemães, assoalhos e tetos em madeira trabalhados( marchetados), toalhas bordadas da Ilha da Madeira, cristais da Boemia,... até carro importado(Cadilac). Mas hoje tudo isso mudou, as grandes empresas é que dominam a economia, embora ainda se possa ver bonitas propriedades antigas preservadas que guardam a história de Uberaba.
Gostei muito da dissertação de Francisco Amorim , mostrou conhecimento e Sensibilidade.
Uma pequena observação; a Igreja da foto é de São Domingos, um dos primeiros templos dominicanos construídos no Brasil. As freiras dominicanas foram no inicio do século passado as responsáveis pela instrução das jovens uberabenses.